Um jovem garoto de aparência esguia, com pele morena, longos cabelos brancos acinzentados e olheiras escuras sob os olhos azuis, caminhava por uma rua bem cuidada em direção à delegacia de polícia. Ele segurava uma xícara de café – não aquele tipo sintético e barato, mas o verdadeiro café, feito a partir de grãos especiais, disponíveis apenas para cidadãos de alta posição. Aquela xícara custou a maior parte de suas economias. Mas, naquele dia, Ariandel decidiu se mimar.
Desfrutando do calor da bebida, levantou a xícara e saboreou o aroma. Hesitante, deu um pequeno gole… e lentamente se regozijou.
"Ah! Que delícia!" exclamou, um brilho de prazer em seus olhos.
Olhando para a xícara de café, Ariandel suspirou, permitindo-se um momento de prazer. O rico aroma envolveu-o como um abraço acolhedor, e o leve amargor dançou em sua língua, deixando-o satisfeito com o que havia gasto. Isso é o ouro negro, pensou.
Mas então, como um eco distante, veio a sensação de dissonância. Ele encostou-se à parede, sentindo-se ligeiramente pesado, e cochilou por um instante. Um tapa no rosto o trouxe de volta à realidade, a pressão da vida lá fora invadindo sua mente mais uma vez.
"Acho que é apenas a insônia," murmurou, balançando a cabeça.
Terminando o café, ele se levantou, notando os olhares das pessoas ricas que passavam pelo parque. Com sua roupa barata e aparência descuidada, Ariandel realmente estava fora de lugar.
Observando-os sonhadoramente, jogou a xícara em uma lixeira.
"Eu realmente quero um banho quente e uma cama macia." A xícara errou a lixeira e caiu no chão. Ariandel apertou os lábios em exasperação, foi até lá e a pegou, colocando-a cuidadosamente no lixo. Com um leve sorriso em seu rosto cansado, atravessou a rua e entrou na delegacia de polícia.
Dentro, encontrou um garoto pálido e doentio, de cabelos e olhos pretos, e um policial mal-humorado que olhou além dele para Ariandel com desgosto.
"O que vocês garotos querem?" perguntou o policial, a voz áspera.
O garoto pálido olhou para Ariandel, surpreso, com dúvida e cautela. Ariandel observou o ambiente, placas de armadura reforçada nas paredes e ninhos de torres mal escondidos no teto. O oficial parecia descuidado e mal-humorado. Todas as delegacias de polícia são assim? pensou.
"Ei! Estou falando com vocês!" o policial insistiu.
"Ah, desculpe," Ariandel respondeu, despertando de seus pensamentos.
O garoto pálido então disse: "Conforme exigido pela Terceira Diretriz Especial, estou aqui para me entregar como portador do Feitiço do Pesadelo."
A expressão do oficial mudou, de irritada para cautelosa. Ele se virou para Ariandel, com uma leve urgência nos olhos.
"E você?", perguntou o policial, hesitante.
"O mesmo," Ariandel respondeu, tentando manter a compostura.
O policial olhou para os dois. "Têm certeza de que estão infectados? Há quanto tempo apresentam sintomas?"
O garoto pálido deu de ombros. "Há uma semana."
Ariandel sorriu, como se isso tornasse a situação um pouco mais leve. "Há sete dias."
O oficial ficou visivelmente horrorizado. "M***a."
Então, trêmulo, pressionou um botão em seu terminal. "Atenção! Código Preto na recepção! Repito! CÓDIGO PRETO!"
***
O Feitiço do Pesadelo surgiu pela primeira vez no mundo algumas décadas atrás. Na época, o planeta estava começando a se recuperar de desastres naturais e guerras subsequentes.
No início, uma nova doença que causava fadiga constante e sonolência não atraiu atenção. Mas quando as pessoas começaram a cair em sono profundo, sem sinais de acordar, os governos entraram em pânico. Era tarde demais. Quando os infectados começaram a morrer durante o sono, seus corpos se transformando em monstros, ninguém estava preparado.
As Criaturas do Pesadelo sobrecarregaram os exércitos, mergulhando o mundo em desordem. Ninguém sabia o que o Feitiço era ou como lutar contra ele.
No final, foram os Despertos – aqueles que sobreviveram e voltaram vivos – que restauraram a paz, armados com habilidades miraculosas conquistadas em seus pesadelos.
Mas, para Sunny, nada disso importava até alguns dias atrás, quando começou a ter problemas para ficar acordado. Para uma pessoa comum, ser escolhido pelo Feitiço era um risco e uma oportunidade. Crianças aprendiam habilidades de sobrevivência e técnicas de luta na escola, na esperança de serem infectadas. Famílias ricas contratavam tutores para treinar seus filhos em artes marciais. Aqueles dos clãs Despertos tinham acesso a legados poderosos, manipulando Memórias e Ecoas herdadas no Reino dos Sonhos.
Quanto mais rica a família, maiores eram as chances de sobreviver e se tornar um Desperto. Mas para Sunny, que não tinha família e passava a maior parte do tempo procurando comida, ser escolhido pelo Feitiço era uma sentença de morte.
Alguns minutos depois, Sunny e o outro jovem lutavam contra a sonolência enquanto policiais os prendiam em algemas. Logo foram colocados em cadeiras volumosas, uma mistura estranha entre uma cama de hospital e um dispositivo de tortura. A sala, no porão da delegacia, tinha paredes espessas e uma porta de cofre imponente. Outros policiais estavam de pé perto das paredes, rifles automáticos em mãos e expressões sombrias.
Sunny não se importava particularmente com eles; sua mente só pensava em dormir.
Finalmente, a porta do cofre se abriu. Um policial grisalho entrou, com um rosto experiente e olhos severos. Depois de verificar as algemas, olhou para Sunny e o outro jovem.
"Quais são seus nomes, garotos?" perguntou, a voz firme.
Sunny piscou algumas vezes, tentando se concentrar. "Sunless."
O velho policial levantou uma sobrancelha. "Sunless? Nome estranho."
Sunny tentou dar de ombros, mas não conseguiu se mover. "O que há de estranho? Pelo menos eu tenho um nome. Nas periferias, nem todo mundo tem um."
Após outro bocejo, ele acrescentou: "Nasci durante um eclipse solar. Minha mãe era poética, sabe?"
O garoto ao seu lado sorriu antes de responder: "Meu nome é Ariandel."
O velho policial assentiu, notando a diferença entre os dois. "Querem que eu entre em contato com suas famílias?"
Sunny balançou a cabeça. "Não há ninguém. Não se preocupe."
Ariandel permaneceu em silêncio, com um olhar perdido. Por um segundo, uma expressão sombria passou pelo rosto do policial, mas ele se recompôs.
"Certo, Sunless, Ariandel. Quanto tempo conseguem ficar acordados?"
"Uh… não muito," Sunny respondeu, com a voz arrastada.
"Um pouco," acrescentou Ariandel, que se recuperara de seu estupor, tentando parecer mais otimista.
O policial suspirou, a expressão tensa. "Então não temos tempo para o procedimento completo. Tente resistir e ouça com atenção. Certo?"
Sem esperar resposta, ele acrescentou: "Quanto vocês sabem sobre o Feitiço do Pesadelo?"
Sunny o olhou com dúvida. "Tão bem quanto qualquer um, eu acho? Quem não sabe sobre o Feitiço?"
"Não estou falando das coisas que você vê nos dramas. Quero dizer, quanto você realmente sabe?"
Sunny olhou brevemente para Ariandel, que observava em silêncio, afastando-se da conversa. "Eu apenas entro no Reino dos Sonhos, mato monstros, recebo poderes e me torno um Desperto, certo?"
O velho policial balançou a cabeça. "Escute. Quando você adormecer, será transportado para o seu Primeiro Pesadelo. Pesadelos são provas criadas pelo Feitiço. Dentro, você encontrará monstros, mas também pessoas. Lembre-se: elas não são reais. São ilusões criadas para testá-lo."
"Como você sabe?"
O policial apenas o encarou, a intensidade nos olhos. "Ninguém entende o que é o Feitiço, certo? Então, como você sabe que não são reais?"
"Você pode ter que matá-los, moleque. Pense neles apenas como ilusões," ele disse, a voz grave.
"Ah."
O velho policial esperou um segundo, então continuou. "Muitas coisas sobre o Primeiro Pesadelo dependem da sorte. Não deveria ser extremamente difícil. A situação em que você se encontra, as ferramentas à disposição e as criaturas que tem que derrotar devem estar dentro do alcance de suas habilidades. O Feitiço estabelece provas, não execuções. Você está em desvantagem devido a… bem… suas circunstâncias. Mas as crianças da periferia são duras. Não desista de si mesmo ainda."
"Uh-uh."
Sunny estava cada vez mais sonolento. Estava difícil seguir a conversa.
"Sobre esses 'poderes mágicos'… você realmente os receberá se sobreviver. Quais serão depende de sua afinidade natural e do que você fizer durante o teste. Alguns estarão à sua disposição desde o início…"
A voz do velho policial soava cada vez mais distante. As pálpebras de Sunny estavam tão pesadas que ele lutava para mantê-las abertas.
"Lembre-se: a primeira coisa ao entrar no Pesadelo é verificar seus Atributos e seu Aspecto. Se receber um Aspecto de combate, como um Espadachim ou Arqueiro, as coisas serão mais fáceis. Se for reforçado por um Atributo físico, ainda melhor. Aspectos de combate são comuns, então a chance de receber um é alta."
A sala blindada estava ficando mais escura. "Se tiver azar e seu Aspecto não for de combate, não desespere. Aspectos de feitiçaria e utilidade são úteis à sua maneira. Não existem Aspectos inúteis. Bem, quase nenhum. Faça tudo o que puder para sobreviver."
"Se sobreviver, estará a meio caminho de se tornar um Desperto. Mas se morrer, abrirá um portal para uma Criatura do Pesadelo no mundo real. O que significa que meus colegas e eu teremos que lidar com isso. Então… por favor, não morram, Sunless, Ariandel."
Já meio adormecido, Sunny sentiu-se um pouco comovido. "Ou, pelo menos, tente não morrer imediatamente. O Desperto mais próximo não poderá chegar aqui por algumas horas. Apreciaríamos se não nos fizessem lutar contra aquela coisa sozinhos…"
'O quê?'
Com esse último pensamento, Sunny finalmente mergulhou em um sono profundo. Tudo ficou negro.
E então, na escuridão, uma voz levemente familiar soou:
[Aspirante! Bem-vindo ao Feitiço do Pesadelo. Prepare-se para seu Primeiro Teste…]