Após o ataque devastador à aldeia, o mundo de Aric desmoronou em silêncio. A floresta, que antes parecia viva e vibrante, agora estava mergulhada em um manto de silêncio opressor. O cheiro de fumaça ainda pairava no ar, mas o que mais o assombrava era o vazio.
Onde antes havia risos, vozes e vida, agora só restavam cinzas, destroços e a amarga presença da morte.
Os dias após o massacre misturaram-se numa névoa de dor e incredulidade. Aric passou longas horas a vagar pela clareira destruída, com os pés pesados, como se o chão o puxasse para baixo. Ele revivia, vez após vez, os momentos que compartilhara com os seus amigos. Cada árvore, cada canto da aldeia trazia à tona memórias que agora pareciam impossíveis de suportar. A ausência de Lúpus, seu fiel companheiro, era como uma ferida aberta que não cicatrizava. Sempre ao seu lado, agora Lúpus estava irremediavelmente ausente.
Aric mal conseguia aceitar o fato de que seu lar — aquele lugar onde crescera, cercado por criaturas que o amavam como uma família — havia sido reduzido a ruínas. As noites eram as mais difíceis. Na escuridão da sua cabana, que milagrosamente sobrevivera ao ataque, ele deitava-se no chão, incapaz de dormir. A visão de Lúpus caído, com o pelo cinzento sujo de sangue, se repetia sempre que fechava os olhos. A culpa o consumia. "Eu deveria ter estado aqui... eu poderia ter feito algo", pensava ele. Mas sabia, no fundo, que mesmo sua presença não teria evitado o massacre.
Aquela cabana, que antes era um santuário, agora parecia um túmulo de lembranças. Aric olhava para sua coleção de pedras mágicas — aquelas que tanto amava, que acreditava serem sua conexão com a floresta — e se perguntava se toda aquela busca, toda sua vida até ali, tinha algum significado diante da tragédia. As pedras, que antes brilhavam com energia pulsante, agora pareciam opacas, como se a própria magia da floresta estivesse em luto junto com ele.
Durante dias, ele não falou com ninguém. Não havia mais ninguém com quem falar, na verdade. Apenas os resquícios de uma aldeia que um dia fora um refúgio seguro. Aric enterrara cada um dos seus amigos com as próprias mãos. Cavou a terra sob as árvores onde viveram, colocando seus corpos ali, sob as raízes que um dia os nutriram e protegeram. O sepultamento de Lúpus foi o mais doloroso. Ele escolheu um local especial, uma colina tranquila perto da clareira onde costumavam correr e brincar. A cada pá de terra que caía sobre o corpo de seu companheiro, Aric sentia sua alma se despedaçar um pouco mais.
Depois de dias em luto silencioso, algo começou a mudar dentro de Aric. A dor ainda era insuportável, mas lentamente começou a se transformar em outra coisa. O vazio foi preenchido por uma raiva silenciosa, uma determinação crua que ele não sabia que existia em si. As imagens dos corpos caídos, a bandeira do reino cravada no centro da clareira, tudo aquilo começou a despertar um desejo de vingança, uma necessidade de justiça.
Aric sabia que seu caminho não seria fácil, mas também sabia que não poderia mais permanecer na floresta que, apesar de ser seu lar, agora era uma prisão de lembranças dolorosas. Ele precisava de respostas, de um propósito. E, acima de tudo, precisava fazer com que aqueles que destruíram sua família pagassem pelo que haviam feito.
A floresta, que sempre o acolhera, agora parecia sussurrar-lhe um novo destino. Mesmo na dor, Aric sentia que a magia que tanto amava, aquela que fluía pelas pedras e pelas árvores, ainda estava viva dentro dele. Só que agora, estava diferente — carregada de fúria e luto.
Antes de partir, Aric retornou à colina onde enterrara Lúpus. Sentou-se ao lado do túmulo de seu companheiro e ficou ali, em silêncio, por horas. O vento agitava as folhas ao seu redor, mas ele não disse nada, apenas deixou que suas lágrimas caíssem, o último vestígio de sua dor crua. Quando finalmente se levantou, a única coisa que restava era a certeza de que ele nunca deixaria aquela dor ser esquecida.
Ele olhou para o horizonte, onde o reino se estendia além da floresta, e sussurrou, como se Lúpus ainda estivesse ali para ouvir: "Eles vão pagar por isso. Eu prometo."
E então, partiu, com o luto e a fúria queimando em seu coração, pronto para enfrentar o que quer que estivesse à sua espera.
Ao sair da aldeia destruída, Aric caminhava pela estrada desolada, ainda envolto pelo luto e pela fúria que queimava em seu peito. O céu estava carregado de nuvens escuras, e o vento frio soprava entre as árvores mortas à beira do caminho. O peso das pedras mágicas em seu bolso lembrava-lhe da magia que ainda pulsava dentro dele, mesmo que agora estivesse distorcida pela dor. Ele sabia que não poderia voltar atrás, mas cada passo parecia mais pesado que o anterior.
Enquanto se aproximava de uma área mais densa da floresta, os sons à sua volta começaram a mudar. O vento ficou mais forte, mas havia algo mais, algo sutil, quase imperceptível: o som de folhas e galhos quebrando ao longe. Aric parou, seus sentidos aguçados pela vida na floresta alertando-o de que não estava mais sozinho.
Foi então que os viu.
Saindo das sombras entre as árvores, criaturas estranhas começaram a aparecer. Seus corpos eram magros e alongados, suas peles pálidas como a lua, com olhos negros e sem alma. Andavam de forma desajeitada, como se fossem marionetes deformadas, mas seus movimentos eram rápidos, quase predatórios. Aric imediatamente percebeu que aqueles monstros não eram naturais. Eram fruto de algo muito mais sombrio.
Sem tempo para hesitar, ele agarrou uma das pedras mágicas que trazia consigo. Sentiu a energia correr pelo seu braço, embora a magia agora parecesse mais selvagem e imprevisível. Os monstros avançaram em sua direção, e Aric, com um grito de fúria, lançou a pedra ao chão. Um círculo de luz azulada se expandiu ao seu redor, repelindo os primeiros monstros com uma onda de força.
Mas eles não recuaram. Mais e mais criaturas surgiam, saindo das sombras como uma maré negra. Aric percebeu que, mesmo com sua magia, estava em desvantagem. Sua mente se encheu com o caos do combate, enquanto sua dor e raiva alimentavam o poder que ele mal conseguia controlar. Uma das criaturas saltou em sua direção, e foi nesse momento, quando tudo parecia perdido, que Aric, desesperado, se concentrou em suas pedras mágicas, sentindo a familiar energia da terra correr pelo seu corpo.
Aric canalizou sua magia da terra. Ele bateu as mãos contra o solo, e o chão sob seus pés começou a vibrar e rachar. Raízes antigas, grossas e robustas, emergiram do chão, como serpentes vivas, lançando-se em direção às criaturas. As raízes enrolaram-se em volta das pernas das bestas, puxando-as de volta para o solo, esmagando seus corpos deformados com a força brutal da natureza.
Outra criatura conseguiu se aproximar mais de Aric, mas, por instinto, ele ergueu a mão, e uma parede de pedra se levantou do chão, bloqueando o ataque. A criatura golpeou a barreira de terra, mas não conseguiu romper a proteção.
Aric, ainda ofegante e com o coração acelerado, percebeu que sua magia estava diretamente ligada à dor da floresta. Ela sentia sua perda e sua raiva, e ele era apenas o canal para aquela fúria silenciosa. O poder da terra não era rápido ou brilhante, mas era implacável, esmagando os inimigos com a força paciente e destruidora que só a natureza pode ter.
Conforme as criaturas restantes eram subjugadas pelas raízes e engolidas pela terra, Aric finalmente sentiu um momento de alívio. A floresta, sua verdadeira casa, ainda o protegia. E ele sabia, agora mais do que nunca, que seu destino estava entrelaçado com as forças antigas da natureza.
Quando as últimas criaturas foram derrotadas e o silêncio voltou a reinar, Aric se ergueu, as pernas trêmulas, mas sua determinação firme. O caminho à frente era sombrio, mas ele sabia que, enquanto tivesse o poder da terra ao seu lado, enfrentaria qualquer inimigo que viesse.