Chereads / The Earth's Echo / Chapter 4 - Treino ou Tortura?

Chapter 4 - Treino ou Tortura?

Aric acordou sobressaltado com um grito que ecoou pela cabana.

Acorda, Aric! — a voz de Varek soou firme e inabalável.

Aric levantou-se de um salto, o coração a bater forte no peito.

O quê? Estamos a ser atacados? — exclamou ele, desorientado e com os olhos ainda meio fechados.

Varek cruzou os braços, a expressão de tédio evidente.

Não — respondeu ele secamente. — Está na hora de treinar.

Aric soltou um gemido profundo, atirando-se de volta para a cama.

Pode esperar mais uns minutos... só mais uns minutos... — murmurou, tentando esconder-se debaixo das cobertas.

Varek, sem paciência para discussões, agarrou-o pela camisa e, com um só movimento, arrastou-o para fora da cama e pela cabana fora.

Levanta-te ou vais acabar morto a dormir! — gritou ele, arrastando Aric até ao pátio.

Estou acordado, estou acordado! — resmungou Aric, tentando libertar-se do aperto do velho.

Quando finalmente o largou, Aric caiu no chão com um baque, ainda meio atordoado. Ao olhar à volta, viu que o chão estava longe de ser estável. O terreno começava a mover-se, abrindo fendas debaixo dos seus pés.

O quê?! — Aric levantou-se num salto, o pânico evidente no seu rosto.

Varek observava tranquilamente.

Hoje vamos começar com a dança da terra. O chão vai tentar devorar-te. Se não fores rápido, vai conseguir.

Aric revirou os olhos, o cansaço a pesar nos ombros.

Ah, claro, porque é isso que eu faço todas as manhãs. Andar por terrenos que me querem comer vivo. — disse ele, com um tom sarcástico.

O solo à sua volta abriu-se numa série de fendas ameaçadoras, e Aric teve de usar toda a sua magia para estabilizar o chão debaixo dos seus pés. A cada passo que dava, o terreno cedia um pouco mais, como se estivesse a brincar com ele.

Concentra-te, Aric! — gritou Varek. — Sente o fluxo da terra. Não é força bruta, é controlo!

Controlo?! — gritou Aric de volta, enquanto saltava por cima de uma fenda que quase o engolira. — Estou a ser devorado pela terra e tu falas de controlo?!

Mesmo enquanto reclamava, Aric conseguiu estabilizar-se, as suas raízes mágicas entrelaçando-se com o solo. Por fim, parou numa posição segura, a respiração acelerada.

Isso! Melhoraste. Mas se fôssemos atacados agora, já estarias morto. — Varek comentou, num tom que era quase uma zombaria.

Antes que Aric pudesse responder, uma enorme pedra começou a rolar colina abaixo, diretamente na sua direção. Os olhos de Aric arregalaram-se.

Desvia-te ou molda a pedra! — ordenou Varek, sem mostrar qualquer preocupação.

A sério?! Mais pedras?! — exclamou Aric, levantando as mãos e tentando controlar o caminho da pedra.

A força do impacto era demasiada. Sem conseguir pará-la, Aric fez o chão mover-se, criando um desvio. A pedra passou por ele, raspando o chão onde estivera segundos antes.

Quase. — Varek olhou para ele, franzindo o sobrolho. — Da próxima vez, ou controlas totalmente, ou serás esmagado.

Aric ofegava, completamente exausto.

Isto foi perigoso demais! Não é normal! — gritou ele, apontando para a pedra. — Estou convencido de que tu és maluco! Quem faz isto?

Varek encolheu os ombros, indiferente.

Treino perigoso, sim. Mas nada como o que vem a seguir.

Aric engoliu em seco.

O que vem a seguir? — perguntou, temendo a resposta.

Um deslizamento de rochas. É o próximo exercício. — disse Varek, apontando para uma colina repleta de pedras prontas para descer.

Aric fitou a colina, incrédulo.

Deslizamento? Achas que uma pedra gigante é pouco, agora queres rochas a caírem-me em cima?! — exclamou, o pânico a começar a tomar conta de si.

Varek, como sempre, não mostrou qualquer emoção.

Leva a sério, ou vais morrer de verdade. — disse ele, já a caminhar em direção à colina.

Sim, claro. Porque é isso que uma pessoa normal faz! — resmungou Aric, seguindo atrás, já a prever mais momentos de puro terror.

Chegando ao topo da colina, Varek fez um gesto com a mão, e as rochas começaram a mover-se. O som era ensurdecedor, e Aric sabia que tinha de agir rápido.

Agora é a sério! — gritou Varek.

Como se já não fosse! — exclamou Aric, correndo para desviar-se das rochas.

Ele estendeu a mão, tentando controlar a descida das pedras, mas eram muitas. Conseguiu moldar o chão sob os pés, criando pequenos desvios, mas uma rocha enorme veio em direção a ele, deixando-lhe apenas segundos para reagir.

Por que é que todas as manhãs são assim contigo?! — gritou Aric, saltando para o lado enquanto a rocha esmagava o local onde estivera.

Varek sorriu, satisfeito.

Porque é assim que se treina a sério.

Ofegante e coberto de terra, Aric finalmente caiu de joelhos, exausto.

A sério, Varek, eu vou queixar-me... a alguém... quando isto acabar. Preciso de uma pausa. — murmurou, completamente derrotado.

Varek aproximou-se com um sorriso leve.

Se tiveres força para te queixar depois de hoje, fico impressionado.

Aric revirou os olhos, deitando-se de costas no chão.

Eu juro... este treino é uma tentativa de homicídio encoberta.

Varek cruzou os braços, olhando para o jovem.

Ou talvez seja só um treino eficaz.

Aric suspirou, ainda sem forças para discutir.

Aric ainda estava de joelhos, ofegante, quando Varek, em vez de dar uma pausa, fez um gesto com a mão.

— Agora, vamos para o próximo exercício! — disse Varek, com um brilho de excitação nos olhos.

Aric ergueu a cabeça, os olhos esbugalhados.

— O quê? Mais? Mas eu ainda estou a recuperar da tentativa de homicídio anterior! — protestou ele, levantando-se lentamente, a dor nas costas a incomodá-lo.

— Não sejas exagerado. — Varek deu-lhe um empurrão amistoso. — Isto é apenas o início. O próximo exercício chama-se "A Tempestade de Terra".

— "A Tempestade de Terra"? Isso não soa nada bom. — Aric disse, fazendo uma careta.

Varek sorriu, ignorando o aviso do jovem.

— Para este exercício, precisarás de controlar a terra e a água ao mesmo tempo. O meu amigo, o rio ali perto, vai ajudar. — Ele apontou para um pequeno rio que corria ao lado do pátio de treino.

— Espera, como assim "ajudar"? — Aric olhou para o rio com desconfiança.

Varek deu-lhe uma palmada nas costas.

— Vamos, não tenhas medo! O que pode correr mal?

Aric não sabia ao certo como responder a isso. O rio parecia calmo, mas a sua intuição dizia-lhe que algo estava prestes a dar errado. Eles foram até à margem do rio, e Varek começou a invocar a magia. A água começou a ondular e a elevar-se, formando pequenas ondas.

— O objetivo é controlar a terra e a água para criar uma tempestade que não te engula. — disse Varek, sem qualquer preocupação.

— "Controlar"? Isso é uma palavra que usas muito. Eu diria que é mais como "sobreviver"! — Aric respondeu, já sentindo a pressão.

Varek acenou com a mão.

— Para começar, quero que levantes a terra e a água ao mesmo tempo. Vamos lá, faz isso!

Aric respirou fundo e fechou os olhos, tentando reunir a sua magia. A água começou a subir, mas a terra não respondia. Ele sentiu uma pressão crescente, como se o próprio rio estivesse a rir-se dele.

— Concentra-te, Aric! — Varek gritou, mas a sua voz parecia distante.

Aric abriu os olhos e viu que a água estava a escorregar para trás, formando uma onda cada vez maior. Ele fez o que lhe pareceu mais sensato: recuou.

— Varek, isto é uma ideia terrível! — gritou ele, enquanto tentava controlar a situação. A onda estava a crescer e a terra estava a começar a despedaçar-se.

— Para de reclamar! Foca-te! — Varek gritou, enquanto Aric tentava recuperar a concentração.

Com um último esforço, Aric fez uma barreira de terra à sua volta. As bolas começaram a colidir com a barreira, criando um som de batidas surdas.

— Agora, molda-as! — Varek gritou, entusiasmado.

Aric, ainda ofegante, focou-se. As bolas de pedra começaram a moldar-se sob seu comando, girando e formando formas estranhas, antes de serem lançadas de volta para Varek, que as desviou com um gesto da mão.

— Isso é! Agora sim! — Varek estava radiante.

Exausto e suado, Aric desabou no chão, a respiração acelerada.

— Isto é loucura! Se sobreviver a isto, vou considerar-me um verdadeiro guerreiro... ou um idiota! — murmurou, enquanto Varek se aproximava dele.

— Se sobreviveres, vou considerar que valeu a pena! — Varek disse, estendendo a mão para ajudar Aric a levantar-se.

— Nunca mais vou querer ver uma bola de pedra na minha vida. — Aric resmungou, aceitando a ajuda.

Varek riu, os olhos brilhando de diversão.

— E se pudesses escolher entre um treino normal e isto? O que escolherias?

Aric olhou para Varek, os lábios a tremerem de tanto esforço para não sorrir.

— Bem, considerando a minha sanidade, talvez... talvez um pouco de treino normal não fosse má ideia.

Varek soltou uma gargalhada.

— Ótimo! Então, prepare-te, porque amanhã temos uma corrida com obstáculos!

Aric deixou-se cair de novo no chão, exausto.

— Não, não, não! Não consigo mais! — gritou ele, colocando as mãos na cabeça.

— Não me diga que estás a desistir! — Varek provocou, claramente divertido.

— Se houver uma opção de desistência, vou usá-la! — Aric respondeu, virando-se de lado.

Varek inclinou-se para ele.

— Ah, mas que pena! A desistência não é uma opção, meu amigo. É hora de te levantar e enfrentar o dia!

Aric fechou os olhos, lamentando-se.

— Vou lembrar-me disto quando eu for um guerreiro lendário. Vou escrever um livro só sobre ti. Vou chamar-lhe "As Loucuras de Varek".

Varek sorriu, satisfeito.

— E eu vou ser o personagem mais interessante!

Aric riu, sabendo que, apesar de tudo, havia uma espécie de satisfação em sobreviver a tudo aquilo. Mesmo que no fundo, quisesse apenas um pouco de paz.

Depois de um dia exaustivo de treinos, Aric e Varek finalmente voltaram para a cabana, os músculos do jovem doendo a cada passo. A luz do sol começava a se pôr, lançando uma luz dourada pela janela. Aric sentou-se à mesa, quase caindo para a frente, enquanto Varek se dirigia à cozinha para preparar o jantar.

— O que é que vamos comer? — Aric perguntou, ainda ofegante.

— Algo saudável, como sempre. — Varek respondeu, enquanto mexia em uma panela. O aroma de ervas e especiarias começou a preencher o ar, fazendo o estômago de Aric roncar.

— Não achas que já passei por tortura suficiente hoje? — Aric resmungou, olhando para o prato vazio.

— Tortura? Estás a falar do meu treino? Isso é preparação! — Varek riu, colocando um prato fumegante à sua frente.

— Sim, preparação para a morte! — Aric exclamou, mas não pôde evitar um sorriso quando viu o que havia no prato. Era um guisado rico, cheio de vegetais e um pouco de carne.

Enquanto comiam, Aric notou que a atmosfera estava mais relaxada. Varek, geralmente sério durante o treino, agora parecia mais à vontade, contando histórias sobre os treinos que tinha feito quando era mais jovem.

— Havia um exercício que envolvia desviar de flechas. Fui atingido várias vezes. — Varek disse, rindo ao lembrar-se.

— Isso não é normal! — Aric exclamou, rindo também. — Como é que ainda estás aqui?

— Por sorte, creio eu! — Varek respondeu, piscando.

Depois de um tempo, enquanto terminavam a refeição, Varek olhou para Aric com um ar curioso.

— Quantos anos tens, afinal? — perguntou ele, como se essa fosse uma pergunta comum.

Aric ficou perplexo. Ele parou de mastigar e franziu a testa.

— Sabes, eu… nunca pensei nisso. Nunca soube a minha idade. — Aric respondeu, olhando para o chão.

Varek parecia surpreso.

— Como assim nunca soubeste? Não te disseram?

— Não, nunca. A minha infância foi meio… confusa. — Aric admitiu, coçando a cabeça. — Fui criado por… bem, não sei ao certo. Sempre tive mais preocupações do que saber a minha idade.

— Uau. Isso é… interessante. — Varek disse, refletindo. — Então, basicamente, não tens ideia de quantos anos tens?

Aric balançou a cabeça.

— Exatamente. — ele respondeu, um pouco envergonhado.

Varek olhou para Aric, tentando perceber o que aquilo significava.

— E agora? O que vais fazer? — perguntou ele, com um sorriso travesso nos lábios.

Aric deu um pequeno sorriso.

— Não sei. Talvez devesse contar as primaveras e outonos que vivi? — disse ele, tentando brincar com a situação.

Varek riu, mas depois fez uma expressão pensativa.

— Poderias fazer isso. Mas também poderias perguntar a alguém. Há sempre uma resposta em algum lugar.

Aric suspirou, pensando no que isso significava. Ele estava tão focado nas suas habilidades mágicas e nos treinos que nunca tinha parado para considerar algo tão simples.

— Então, de momento, sou um… jovem sem idade definida. — Aric disse, levantando os ombros.

— É isso! Um jovem misterioso! — Varek declarou, levantando a taça em um brinde.

Aric riu, mas a pergunta ainda pairava no ar. Ele não tinha a resposta, e o jantar terminou com essa questão sem resposta, criando um silêncio curioso entre os dois.

Enquanto Aric olhava pela janela, pensou em quantas coisas ainda não sabia sobre si mesmo. O jantar estava delicioso, mas a dúvida sobre a sua idade fez com que a noite se tornasse mais profunda e reflexiva.