O sol estava a pôr-se, tingindo o céu com tons de laranja e vermelho, enquanto Aric e Varek se preparavam para o que seria o último treino. O jovem guerreiro já não era mais o aprendiz inexperiente que Varek arrastara para a cabana semanas atrás. Os seus olhos estavam mais firmes, e os movimentos, mais precisos.
— Este é o último exercício. — Varek falou, a voz grave carregada de significado. — Se passar por ele, estarás pronto para sair da floresta.
Aric assentiu, sentindo o peso da declaração. Já sabia que a sua jornada estava prestes a mudar, mas o que viria a seguir ainda era um mistério.
— O que será desta vez? Mais rochas? Terrenos traiçoeiros? Ou algo mais simples, como... sobreviver a uma tempestade de raios? — Aric perguntou com um sorriso de canto, tentando aliviar a tensão.
Varek não sorriu.
— Desta vez, irás enfrentar a floresta inteira. — Ele apontou para os arredores. — Sente as árvores, a terra, o vento. Tudo isso pode ser teu aliado ou teu inimigo.
Aric engoliu em seco. Tinha treinado durante semanas, enfrentando perigos que nunca imaginara, mas agora era hora de testar tudo o que tinha aprendido.
— Estás pronto? — Varek perguntou, os olhos fixos nos de Aric.
Aric olhou para a floresta ao redor. O vento soprou, mexendo nas folhas e agitando o solo. Ele respirou fundo, sentindo a conexão que havia desenvolvido com a terra e os elementos. Estava pronto.
— Estou.
Varek deu um aceno de cabeça. Com um gesto rápido, as árvores ao redor começaram a mover-se, as raízes subindo do chão como serpentes, as folhas rodopiando no ar. O som da floresta mudou, como se estivesse viva e atenta a Aric.
Aric fechou os olhos e concentrou-se. Sentiu as raízes sob os seus pés e controlou-as, moldando-as para afastar os obstáculos que surgiam. O vento uivava, mas Aric manteve-se firme, a sua magia fluindo naturalmente como nunca antes. Quando abriu os olhos, as árvores ao seu redor estavam imóveis. Tinha vencido o desafio.
Varek observou, satisfeito.
— Agora, estás pronto. Podes deixar a floresta.
Aric ficou de pé à entrada da cabana de Varek, o coração pesado com o peso da despedida. A floresta ao redor, que antes parecia uma prisão, agora parecia mais familiar, quase como um lar.
— Não pensei que este dia chegasse tão rápido. — Aric comentou, olhando para o caminho que seguiria.
— O tempo sempre passa mais rápido do que imaginamos. — Varek respondeu, os braços cruzados, observando o jovem com um olhar avaliador. — Mas lembra-te, Aric, o treino nunca termina de verdade. Lá fora, o mundo vai testar-te de formas que eu nunca poderia. Mas estás preparado.
Aric assentiu. Sabia que o que Varek dizia era verdade. O mundo lá fora seria mais imprevisível do que qualquer exercício que enfrentara na floresta.
— E se eu falhar? — Aric perguntou, a voz mais baixa, quase como se confessasse um medo que nunca havia dito em voz alta.
Varek sorriu levemente.
— Todos falhamos. Mas é o que fazemos depois que importa. — Ele deu um passo à frente e colocou uma mão no ombro de Aric. — Tens mais força do que pensas. Usa-a.
Aric sorriu de volta, grato pelas palavras.
— Obrigado, Varek. Por tudo.
— Não precisas de agradecer. Apenas continua a melhorar. E se um dia quiseres voltar, a floresta estará aqui.
Aric deu um último olhar ao seu mentor e à cabana que havia sido sua casa. Com um suspiro profundo, ele virou-se e começou a caminhar em direção à trilha que o levaria para fora da floresta. Cada passo era mais leve, mais firme. Ele não sabia o que o aguardava, mas estava pronto para enfrentá-lo.
Enquanto Aric começava a sua jornada para fora da floresta, o ambiente que antes parecia sereno e conhecido rapidamente se tornou um desafio imprevisível. Embora ele tivesse aprendido a conectar-se com a natureza, a floresta parecia lutar contra a sua partida. O caminho que antes parecia claro estava agora cheio de obstáculos, como se a própria floresta tentasse impedi-lo de partir.
As árvores ao redor pareciam mais densas, os galhos entrelaçados bloqueavam a luz do sol, criando uma penumbra opressiva. Aric avançava com dificuldade, os pés afundando no chão coberto de folhas húmidas e raízes traiçoeiras que surgiam como se tivessem vida própria. O som do vento, que antes era um companheiro constante, agora soava como um sussurro ameaçador, carregando fragmentos de vozes antigas.
Ele sentiu a magia fluir nas suas veias, mas desta vez era diferente. Não era como durante os treinos com Varek, quando ele sentia controlo absoluto sobre os elementos. Agora, a floresta parecia resistir a ele. Cada vez que tentava manipular as raízes para abrir caminho, elas moviam-se de maneira errática, como se estivessem relutantes em obedecer.
Depois de horas de avanço difícil, o cansaço começou a pesar. Aric parou por um momento, respirando fundo, tentando reconectar-se com a floresta. Sabia que tinha o poder de controlar os elementos ao seu redor, mas algo estava errado. Era como se a floresta estivesse a testá-lo uma última vez. "Talvez este seja o verdadeiro teste de Varek", pensou Aric, lembrando-se das palavras do seu mentor.
Ele fechou os olhos e concentrou-se profundamente. Sentiu o vento acariciar-lhe a pele, o calor do sol lutando para atravessar o dossel das árvores. Respirou o cheiro da terra molhada, do musgo e das folhas em decomposição. Em vez de tentar forçar o controlo sobre a floresta, decidiu relaxar, entregar-se à natureza, permitindo que a sua magia fluísse naturalmente.
Aos poucos, Aric começou a perceber uma mudança. As raízes, que antes bloqueavam o seu caminho, começaram a retrair-se, como se finalmente aceitassem a sua partida. As árvores, embora ainda densas, não pareciam tão ameaçadoras. Ele avançou novamente, desta vez com mais confiança, seguindo a trilha que a floresta lentamente revelava.
Ainda assim, a jornada não seria fácil. As criaturas da floresta, que antes o ignoravam, agora pareciam observar cada movimento seu. Ele podia sentir os olhos de animais escondidos nas sombras, o farfalhar de folhas indicando a presença de seres que não conseguia ver claramente. Em um momento, ouviu o uivo distante de um lobo. O seu coração apertou ao lembrar-se de Lúpus, o seu velho amigo e companheiro. A dor da perda ainda era recente, mas usou essa lembrança como combustível para seguir em frente.
O caminho tornou-se mais íngreme, e Aric percebeu que estava a subir uma colina. Cada passo exigia mais esforço, o terreno acidentado colocando à prova a sua resistência física. As botas estavam cobertas de lama, e ele podia sentir o suor escorrer-lhe pela testa, misturando-se com a sujeira acumulada de dias de caminhada. Mas não podia parar agora. Cada passo o aproximava da saída.
Conforme subia, o som da floresta começou a mudar. O constante farfalhar das árvores foi substituído pelo som distante de água corrente. Uma pequena esperança acendeu-se no seu peito. "Se eu encontrar um rio, posso segui-lo até sair daqui", pensou ele. Guiado pelo som, Aric forçou o corpo exausto a continuar, ignorando as dores que começavam a intensificar-se nas pernas e nas costas.
Depois de algum tempo, finalmente alcançou o topo da colina. A vista que o aguardava tirou-lhe o fôlego. À sua frente, o rio que ouvira serpenteava pela paisagem, as águas cristalinas refletindo o céu nublado. Mas não era só o rio que chamou a sua atenção. Ao longe, além da vasta extensão de árvores, ele podia ver uma pequena vila humana. Casas simples e rústicas espalhavam-se pelo vale, com colunas de fumo a subir das chaminés. "Finalmente", sussurrou Aric para si mesmo, sabendo que estava perto do destino.
Mas a descida da colina provou ser tão traiçoeira quanto a subida. O solo era escorregadio, e as rochas soltas tornavam cada passo um risco. A dada altura, Aric perdeu o equilíbrio e caiu, rolando alguns metros antes de conseguir agarrar-se a uma raiz exposta. O impacto deixou o seu corpo dorido, e ele soltou um gemido enquanto se levantava com dificuldade. "Só mais um pouco", murmurou para si, limpando a lama das roupas.
Quando finalmente alcançou o rio, ajoelhou-se na margem, molhando as mãos na água fria e cristalina. A sensação era revigorante. Bebeu profundamente, sentindo a energia voltar aos poucos. O som relaxante da água corrente acalmou-lhe os nervos, e por um momento, permitiu-se descansar.
Mas o descanso foi breve. Sabia que a vila não estava longe agora, mas ainda assim, a floresta não o deixaria partir sem um último desafio. O tempo parecia piorar, e nuvens escuras começaram a formar-se no horizonte. Relâmpagos rasgaram o céu, seguidos de trovões que faziam o solo tremer. O clima mudou tão rapidamente que Aric mal teve tempo de reagir. Uma tempestade aproximava-se.
Ele sabia que precisava sair da floresta antes que a tempestade o apanhasse no meio do caminho. Levantando-se apressadamente, Aric começou a seguir o curso do rio, os passos rápidos e determinados. A chuva começou a cair, no início como pequenas gotas, mas rapidamente transformou-se numa cortina pesada de água. O solo ao redor ficou ainda mais escorregadio, e Aric lutava para manter o equilíbrio enquanto corria.
Cada trovão que ecoava pelo céu parecia mais próximo, e os relâmpagos iluminavam o caminho à sua frente, revelando brechas entre as árvores. Mesmo com toda a sua habilidade, ele sentia a tensão no ar. O seu corpo estava no limite, cada músculo gritando em protesto, mas ele continuava. "Estou quase lá", pensava repetidamente, como um mantra.
Finalmente, após o que pareceram horas de luta contra os elementos, Aric viu o limite da floresta. As árvores começaram a afastar-se, revelando um campo aberto que levava diretamente à vila. Com um último esforço, atravessou a linha das árvores, saindo finalmente da floresta que tinha sido sua casa e campo de treino.
A chuva ainda caía forte, mas agora estava fora. O vento, que antes parecia ser seu inimigo, agora soprava nas suas costas, como se o empurrasse para a frente. A vila humana estava à sua frente, e sabia que a sua próxima jornada estava prestes a começar.
Aric parou por um momento, respirando fundo. A floresta estava atrás dele, mas sabia que carregaria consigo tudo o que havia aprendido ali. Olhou uma última vez para as árvores escuras antes de seguir em direção à vila, pronto para enfrentar os desafios que o aguardavam no mundo dos homens.