Chapter 6 - Capitulo 5

— Certo... certo, vamos começar — disse o velho Nathan juntando as mãos com uma jovialidade ensaiada.

Nathan assentiu, os olhos cansados, mas cheios de determinação. Ele andava mancando, não por estar ferido, mas porque havia se torcido de forma incômoda enquanto engatinhava pelos túneis. Arrastava os passos pelo chão de pedra até o canto da cela.

— A janela dos guardas abre duas vezes ao dia — explicou Nathan, observando atentamente o pequeno vão por onde o balde de dejetos passaria. — Primeiro, para os dejetos, onde podemos esconder o entulho. Depois, à noite, para a comida.

O plano era simples, mas exigia paciência. Cavávamos em segredo, removendo os entulhos pouco a pouco e escondendo-os nos baldes de dejetos. A cada dia, avançávamos um pouco mais, mas nunca rápido demais, para não chamar a atenção dos guardas. Ainda assim, o novo esquema — com duas celas e dois baldes — prometia dobrar nossa velocidade.

— Anda logo, velho, coloca essa tigela aqui! — gritou um dos guardas, trazendo a comida para a cela.

Nathan, com sua calma habitual, obedeceu sem pressa. Não era possível ver o que ele fazia por causa da porta. O som dos passos do guarda ecoava pelas paredes de pedra.

— Felizmente, ele não muda a rota há anos — sussurrou Nathan.

O guarda sempre seguia o mesmo ritmo, e o som metálico de suas botas nos alertava com tempo suficiente para escondermos o que fosse necessário. Era como uma dança, e havíamos aprendido a coreografia.

Uma pequena porta na base da cela foi aberta, estreita o bastante para passar apenas uma concha rasa de comida. Quando a tigela entrou, Nathan a pegou e agradeceu, como de costume.

— Obrigado — murmurou, como se fosse um hábito rotineiro.

Nunca entendi por que ele agradecia pela comida miserável que recebíamos. Quando perguntei, ele mencionou algo sobre o valor sagrado de todo alimento. 

Meus pensamentos foram rápidos e amargos: "Deveria agradecer por estar preso todo esse tempo também?" Mas me contive. O velho Nathan não merecia meu cinismo. Por mais rabugento que eu fosse, ainda não era um desgraçado a ponto de descontar minha frustração nos outros.

Nathan passava as horas gravando símbolos nas paredes da cela. Era um trabalho rudimentar, quase primitivo, mas eficaz. Ele não ousava desenhar nada elaborado, para não levantar suspeitas. Seus rabiscos pareciam sem sentido para qualquer um que os visse, mas para nós, eram mapas, cálculos e palavras.

Assim como eu, Anor também visitava Nathan uma vez por ano, por causa de seu ritual. Aquele homem... era realmente um desgraçado, não?

— Esses são os únicos momentos em que os guardas checam nossas celas — explicou Nathan, apontando para as paredes enquanto mantinha o olhar fixo no trabalho. — Isso significa que podemos trabalhar em paz o resto do tempo.

A negligência dos guardas era nossa maior vantagem.

— Então, a negligência. se tornou. nossa. principal. aliada. — li o que Nathan havia rabiscado nas paredes.

— Perfeito — respondeu Nathan, balançando a cabeça em concordância. Eu estava começando a pegar o jeito das palavras.

Trabalhávamos até tarde, sem interrupção, exceto pelo som ritmado de nossas ferramentas improvisadas. Quando chegávamos a um ponto onde cavar mais seria arriscado, Nathan me ensinava a ler.

A princípio, parecia difícil, e finalmente percebi que não apenas parecia; era, de fato, incrivelmente difícil. Sério, como diabos as pessoas inventavam cada palavra? Olha só para isso: "adstrito".... 

Que droga de palavra é essa? Isso não faz sentido!

À noite, sem luz, queimávamos pedaços das bandagens de Nathanael para iluminar a cela. Era um sacrifício pequeno, mas o suficiente para não nos deixar na total escuridão. Afinal, não havia velas. O lado bom era que os guardas eram obrigados a trazer as bandagens para Nathanael, e eles não pareciam se importar se alguns pedaços simplesmente desaparecessem. Quando não tínhamos mais bandagens, queimávamos cabelos.

"Será que é por isso que Nathan é meio careca?" pensei, olhando para sua cabeça enfaixada. Não parecia que ele tinha cabelo. A imagem me fez rir baixinho, sem motivo, mas o som ecoou pela cela de qualquer jeito.

Nathan me lançou um olhar confuso, como se perguntasse: "Que diabos esse moleque está pensando?", mas não disse nada. Eu rapidamente disfarcei a risada.

"Estou definitivamente fadado ao inferno", pensei, ainda rindo internamente.

Com o tempo, comecei a notar algo em Nathan. Ele tinha uma postura rígida, uma maneira de se mover que lembrava velhos soldados ou lutadores aposentados. Não era um saco de ossos prestes a desmoronar, mas também não era um colosso de músculos. Havia algo nele, uma força silenciosa sob a superfície cansada.

Um dia, enquanto cavávamos, minha curiosidade venceu.

— Nathan, você já foi soldado? — perguntei, sem rodeios.

Ele parou por um instante, as mãos sobre a pedra que martelava. Por um breve segundo, seu olhar se perdeu, como se revivesse uma memória distante. O som de pedras sendo raspadas e marteladas preenchia o silêncio enquanto trabalhávamos para cavar nosso caminho para a liberdade. Eu mal conhecia Nathan quando o encontrei, mas ele sempre carregou um ar de mistério. Algo naquela cela e nas histórias dele fazia o tempo parecer mais denso.

— Eu já fui líder de homens. Comandava um grande e temível exército — disse Nathan de repente, a voz rouca e grave. — Nós Tínhamos tantos sonhos naquela época... sonhos de que seríamos heróis.

"Nós?" 

Ele continuou a cavar, e eu ouvia em silêncio, sentindo o peso de sua história. Cada palavra parecia uma pedra que caía sobre mim. Ele parecia perdido em suas memórias, enquanto suas mãos trêmulas seguravam a ferramenta improvisada.

— Um dia, eu e meus homens fomos enviados para caçar selvagens do oeste — continuou ele. — Eles se refugiaram em uma igreja. Nosso senhor, furioso, nos ordenou que queimássemos o lugar... com todos eles lá dentro.

Eu parei, o suor escorrendo pelo rosto. O túnel estava quente e mal ventilado, e naquele momento eu estava suando balas. Olhei para ele, embora a escuridão da cela não permitisse ver bem um ao outro.

— Você... você não fez isso, fez? — perguntei, com a voz baixa, quase um murmúrio. Eu não esperava uma resposta que me confortasse; na verdade, esperava que ele não tivesse ouvido a pergunta. Mas o silêncio que se seguiu foi sufocante.

— Para a maior desgraça de minha vida, sim... — A voz de Nathan tremeu. — E ainda ouço os gritos, mesmo depois de quarenta anos.

Um silêncio pesado se instalou, mas havia outra dúvida em minha mente, algo que eu precisava entender.

— Como você veio parar aqui? — perguntei, quebrando o silêncio.

Nathan suspirou profundamente e continuou a bater nas pedras.

— Quebrei meu juramento ao reino e abandonei o exército imperial. Não podia mais viver com aquilo... com o sangue que derramei. Jurei nunca mais tirar outra vida e me tornei sacerdote. Abandonei minhas terras, meus títulos e minha família para viver uma vida humilde na igreja.

Ele fez uma pausa, como se as memórias o torturassem.

— Mas minha família era rica e, como você sabe, o mundo não é justo. Meu irmão mais novo havia se tornado o "Senhor" da nossa família, e pouco tempo depois ele morreu... mas antes de partir, ele escondeu o tesouro da família.

— Tesouro? — sussurrei, intrigado.

Nathan assentiu, batendo novamente na parede. As pedras pareciam resistir, como se também quisessem ouvir mais da história.

— Eles queriam o ouro. Havia histórias envolvendo nossa família, que diziam que um glorioso antepassado nosso havia roubado o tesouro de um deus. Meu irmão escondeu o tesouro e, antes de morrer, rumores diziam que ele confiou o segredo a mim. Mas eu já havia abandonado tudo, e, mesmo assim, vieram atrás de mim.

Ele parou de falar por um momento e pediu que eu trocasse as velas. Enquanto eu fazia isso, Nathan continuou:

— Pouco tempo depois, fui preso pela Mão do Rei.

— A Mão do Rei? — perguntei, confuso.

— Um homem cruel e ganancioso, com sede de poder e riqueza. Ele queria o tesouro da minha família para financiar suas guerras. Não acreditou quando eu disse que não sabia onde estava o tesouro. Me prendeu aqui, esperando que a dor ou o tempo me fizessem lembrar... que piada…

O tom dele mudou, tornando-se mais áspero, mais sombrio. Nathan começou a bater nas pedras com mais força, como se estivesse tentando exorcizar os demônios do passado.

— Desde então, minha deusa tem sido minha única companhia... até o dia em que você apareceu.

Revirei os olhos, incapaz de conter meu ceticismo. Eu não acreditava que deuses se importassem com pessoas como nós. Pelo que tinha visto antes de ser trazido a esta terra, os deuses eram, no máximo, figuras indiferentes e cruéis. Eu me recusaria a chamar algo assim de deus. Não me curvaria nem serviria a suas vontades e caprichos, como já tinha lido tantas vezes nos vários livros de Nathan.

— Sua deusa é tão real quanto seu tesouro, Nathan — murmurei, sem intenção de ser ouvido.

Mas ele ouviu. E, para minha surpresa, riu.

— Hahaha! Talvez — disse ele, com uma risada leve que contrastava com o peso de suas palavras anteriores.

Fiquei quieto, olhando para o pequeno feixe de luz que entrava pela fresta da cela. Aquela conversa havia levantado mais perguntas do que respostas. 

Talvez a redenção de Nathan fosse real, ou talvez ele estivesse apenas se agarrando a qualquer coisa para suportar sua culpa. Eu, por outro lado, continuaria a duvidar, a questionar. Talvez esse seja meu destino no fim.

***

À noite, sem luz, queimávamos pedaços das bandagens de Nathanael para iluminar a cela. Era um sacrifício pequeno, mas o suficiente para não nos deixar na total escuridão. Afinal, não havia velas. O lado bom era que os guardas eram obrigados a trazer as bandagens para Nathanael, e eles não pareciam se importar se alguns pedaços simplesmente desaparecessem. Quando não tínhamos mais bandagens, queimávamos cabelos.

"Será que é por isso que Nathan é meio careca?" pensei, olhando para sua cabeça enfaixada. Não parecia que ele tinha cabelo. A imagem me fez rir baixinho, sem motivo, mas o som ecoou pela cela de qualquer jeito.

Nathan me lançou um olhar confuso, como se perguntasse: "Que diabos esse moleque está pensando?", mas não disse nada. Eu rapidamente disfarcei a risada.

"Estou definitivamente fadado ao inferno", pensei, ainda rindo internamente.

Com o tempo, comecei a notar algo em Nathan. Ele tinha uma postura rígida, uma maneira de se mover que lembrava velhos soldados ou lutadores aposentados. Não era um saco de ossos prestes a desmoronar, mas também não era um colosso de músculos. Havia algo nele, uma força silenciosa sob a superfície cansada.

Um dia, enquanto cavávamos, minha curiosidade venceu.

— Nathan, você já foi soldado? — perguntei, sem rodeios.

Ele parou por um instante, as mãos sobre a pedra que martelava. Por um breve segundo, seu olhar se perdeu, como se revivesse uma memória distante. O som de pedras sendo raspadas e marteladas preenchia o silêncio enquanto trabalhávamos para cavar nosso caminho para a liberdade. Eu mal conhecia Nathan quando o encontrei, mas ele sempre carregou um ar de mistério. Algo naquela cela e nas histórias dele fazia o tempo parecer mais denso.

— Eu já fui líder de homens. Comandava um grande e temível exército — disse Nathan de repente, a voz rouca e grave. — Tínhamos tantos sonhos naquela época... sonhos de que seríamos heróis.

"Nós?" pensei, mas continuei escutando.

Ele continuou a cavar, e eu ouvia em silêncio, sentindo o peso de sua história. Cada palavra parecia uma pedra que caía sobre mim. Ele parecia perdido em suas memórias, enquanto suas mãos trêmulas seguravam a ferramenta improvisada.

— Um dia, eu e meus homens fomos enviados para caçar selvagens do oeste — continuou ele. — Eles se refugiaram em uma igreja. Nosso senhor, furioso, nos ordenou que queimássemos o lugar... com todos eles lá dentro.

Eu parei, o suor escorrendo pelo rosto. O túnel estava quente e mal ventilado, e naquele momento eu estava suando baldes. Olhei para ele, embora a escuridão da cela não permitisse ver bem um ao outro.

— Você... você não fez isso, fez? — perguntei, com a voz baixa, quase um murmúrio. Eu não esperava uma resposta que me confortasse; na verdade, esperava que ele não tivesse ouvido a pergunta. Mas o silêncio que se seguiu foi sufocante.

— Para a maior desgraça de minha vida, sim... — A voz de Nathan tremeu. — E ainda ouço os gritos, mesmo depois de quarenta anos.

Um silêncio pesado se instalou, mas havia outra dúvida em minha mente, algo que eu precisava entender.

— Como você veio parar aqui? — perguntei, quebrando o silêncio.

Nathan suspirou profundamente e continuou a bater nas pedras.

— Quebrei meu juramento ao reino e abandonei o exército imperial. Não podia mais viver com aquilo... com o sangue que derramei. Jurei nunca mais tirar outra vida e me tornei sacerdote. Abandonei minhas terras, meus títulos e minha família para viver uma vida humilde na igreja.

Ele fez uma pausa, como se as memórias o torturassem.

— Mas minha família era rica e, como você sabe, o mundo não é justo. Meu irmão mais novo havia se tornado o "Senhor" da nossa família, e pouco tempo depois ele morreu... mas antes de partir, ele escondeu o tesouro da família.

— Tesouro? — sussurrei, intrigado.

Nathan assentiu, batendo novamente na parede. As pedras pareciam resistir, como se também quisessem ouvir mais da história.

— Eles queriam o ouro. Havia histórias envolvendo nossa família, que diziam que um glorioso antepassado nosso havia roubado o tesouro de um deus. Meu irmão escondeu o tesouro e, antes de morrer, rumores diziam que ele confiou o segredo a mim. Mas eu já havia abandonado tudo, e, mesmo assim, vieram atrás de mim.

Ele parou de falar por um momento e pediu que eu trocasse as velas. Enquanto eu fazia isso, Nathan continuou:

— Pouco tempo depois, fui preso pela Mão do Rei.

— A Mão do Rei? — perguntei, confuso.

— Um homem cruel e ganancioso, com sede de poder e riqueza. Ele queria o tesouro da minha família para financiar suas guerras. Não acreditou quando eu disse que não sabia onde estava o tesouro. Me prendeu aqui, esperando que a dor ou o tempo me fizessem lembrar... que absurdo.

O tom dele mudou, tornando-se mais áspero, mais sombrio. Nathan começou a bater nas pedras com mais força, como se estivesse tentando exorcizar os demônios do passado.

— Desde então, minha deusa tem sido minha única companhia... até o dia em que você apareceu.

Revirei os olhos, incapaz de conter meu ceticismo. Eu não acreditava que deuses se importassem com pessoas como nós. Pelo que tinha visto antes de ser trazido a esta terra, os deuses eram, no máximo, figuras indiferentes e cruéis. Eu me recusaria a chamar algo assim de deus. Não me curvaria nem serviria a suas vontades e caprichos, como já tinha lido tantas vezes nos vários livros de Nathan.

— Sua deusa é tão real quanto seu tesouro, Nathan — murmurei, sem intenção de ser ouvido.

Mas ele ouviu. E, para minha surpresa, riu.

— Hahaha! Talvez — disse ele, com uma risada leve que contrastava com o peso de suas palavras anteriores.

Fiquei quieto, olhando para o pequeno feixe de luz que entrava pela fresta da cela. Aquela conversa havia levantado mais perguntas do que respostas. Talvez a redenção de Nathan fosse real, ou talvez ele estivesse apenas se agarrando a qualquer coisa para suportar sua culpa. Eu, por outro lado, continuaria a duvidar, a questionar. Talvez esse seja meu destino no fim.