Kowalsk simplesmente não conseguia entender o que Thilláila estava fazendo ali ao seu lado, mas sentia-se aliviado vendo-a acalmar a fera como se fosse um cãozinho doméstico. Ficou ainda mais admirado ao ver seus demais companheiros rodeados por inúmeros dreikis que, tão imóveis, pareciam estátuas; tanto um quanto o outro pareciam estar impedidos de se mexer.
Sempre acompanhados de perto por Thilláila, que apenas acalmava o enorme dreikis de tempos em tempos, a curiosidade de Kowalsk só aumentava. Ao chegarem perto dos demais companheiros, Kowalsk não se conteve e perguntou:
— Mas o que está acontecendo aqui?
— O líder do bando desafiou nosso líder, ou seja, você. — Disse Thilláila sem muita perspectiva.
— E se por acaso eu não quiser lutar? — Perguntou Kowalsk, já adivinhando quem seria o tal líder do bando.
Dessa vez foi o doutor Kami quem respondeu:
— Creio que o senhor não tem essa alternativa, senhor. Thilláila, por ter a capacidade de se comunicar com essas feras e não portar armas, nem sequer é considerada ameaça. Seguidamente, eu também não sou atacado por algum motivo desconhecido, eles parecem até demonstrar algum respeito por mim.
— E por que fala isso? E cadê o Troy? — Perguntou Kowalsk, avistando em seguida um dragão imobilizado por mais de dez dreikis, que parados, pareciam aguardar a ordem para destroçar aquele dragão em poucos minutos.
— Eles pararam de atacar o Troy quando, em desespero, eu gritei pedindo isso. Não acreditei quando aconteceu. E antes que pergunte por Gareno, veja-o lá mais adiante, totalmente imobilizado. Então só restou...
— Eu! — Respondeu Kowalsk, antecipando o doutor Kami.
— E se eu ganhar o combate, o que eu ganho?
— Eles se retiram sem levar o que vieram buscar, ou seja, os corpos dos dragões abatidos. — Afirmou Thilláila com a maior certeza.
— E se eu perder, o que acontece?
— Bem, senhor Kowalsk, então eles se retiram levando as carcaças dos dragões e a sua. Levam Gareno como alimento futuro, destroçam o Troy e levam a carcaça, abandonando o doutor Kami e a mim aqui nesta base.
Kowalsk achou essa última parte estranha, mas não teve dúvida ao declarar:
— Então, o que estamos esperando? Vamos lutar.
Kowalsk decididamente não estava ansioso por aquele combate e, se dependesse dele, só o faria se tivesse uma bela e carregada arma ou, de preferência, duas, uma em cada mão.
— Antes que eu seja servido como prato principal desses dreikis, preciso que vocês negociem urgentemente os termos desse combate.
— Como assim? — Quis saber Thilláila.
— Preciso que você e o doutor Kami estejam bem próximos do líder do bando e tentem a todo custo inserir algumas regras nesse combate. A primeira é que haja o que houver, ninguém poderá interferir. A segunda é que o vencedor terá um prisioneiro e este não será atacado de forma alguma. E a terceira é que esse combate é até a morte, e este assunto termina aqui.
— E você acha que vou conseguir explicar tudo isso para essas feras? — Perguntou Thilláila, admirada com tanta ousadia.
— Estou contando muito com você, minha jovem.
— E por que acha que eles aceitarão esses termos, senhor Kowalsk? — Perguntou o doutor Kami.
— Porque é extremamente vantajoso para eles. Oferecer vantagens ao exército inimigo, seja ele homem ou animal, dificilmente será recusado.
— Acha que dá conta de enfrentar um líder dreikis e sair como vencedor, senhor Kowalsk? — Perguntou Thilláila, sem acreditar muito.
— Não me resta outra opção. Preciso ganhar.
Termos de luta
Kowalsk estava tenso, e não era para menos, pois os termos de luta haviam sido aceitos, porém com algumas modificações. Ele teria que enfrentar não o líder dos dreikis, mas um campeão, provavelmente o mais voraz entre eles.
— Então quer dizer que esse bicho é o meu pretensioso carrasco? — perguntou Kowalsk, não se sentindo à vontade com aquele bicharoco baforando mau hálito em seu rosto, em tom de desafio. — E vocês têm certeza de que isso é mesmo só um dreikis? Tem certeza de que não é uma cria de dragão?
Não houve resposta; afinal, quem poderia afirmar tal coisa e que diferença fazia isso naquele momento?
— Preciso de uma arma, não posso enfrentar uma fera dessas estando eu totalmente desarmado.
Imediatamente, Thilláila comunicou-se com o líder dos dreikis, que por sua vez deu um rugido, e alguma fera entre eles se pronunciou, indo até onde estava a carcaça de um dos dreikis abatidos por Kowalsk. Com uma mordida profunda, retirou a faca que estava cravada em seu companheiro de batalha e, com imenso desprezo, soltou-a aos pés de Kowalsk.
Assim que Kowalsk se abaixou para pegar a arma, não resistindo ao seu instinto básico, o dreikis avançou para mordê-lo. Tão logo tomou essa atitude, o velho soldado rolou ao chão e, com a afiada faca de combate em mãos, cravou-a certeiramente logo abaixo da mandíbula, fazendo com que a criatura urrasse de dor e recuasse instintivamente. Mas como o golpe havia sido fatal, ela não se afastou mais do que alguns passos do astucioso Kowalsk.
O dreikis carrasco apenas meneou sua cabeça, como se estivesse lamentando a ousadia de ambos. Logo a seguir, um grande círculo foi formado ao seu redor, com as dezenas de dreikis que ansiavam por aquela disputa que certamente seria rápida e mortal.
Já de pé, o velho soldado fitava os olhos de seu adversário para ver se enxergava alguma dúvida ou medo. O que ele realmente via era muita fúria e revolta. Isso era algo bem óbvio de saber, olhando apenas a quantidade de dreikis mortos por aquela pequena equipe de valentes que estavam momentaneamente encurralados.
Enquanto fitava os olhos de seu adversário, uma torrente de lembranças começou a invadir sua mente, e a cada momento sua autoconfiança tornava-se cada vez mais visível. Fosse pela postura ou pelo sorriso de desdém diante de um inimigo tão implacável, Kowalsk tinha certeza de que aquele não seria o dia de sua morte.
Uma névoa densa parecia envolver o interior de seu cérebro, fazendo seus pensamentos fluírem numa torrente interminável, enquanto o tempo ao seu redor parecia estar em câmera lenta. No entanto, na vida real, seus movimentos estavam rápidos e seus reflexos perfeitos; agora seria o momento ideal para o combate.
O feroz dreikis fez seu primeiro movimento, avançando na velocidade de um leopardo, mirando a cabeça de Kowalsk, que se desviou despreocupadamente enquanto fazia seu braço girar num estranho ângulo, enfiando a faca na cabeça do dreikis, precisamente no local que ele deveria ter protegido.
A fera urrou com o único golpe desferido por Kowalsk e tentou recuar, mas já era tarde demais; o sangue escorria aos borbotões enquanto Kowalsk repetia o golpe no outro lado da cabeça do animal, que se recusava a acreditar que esse seria seu fim. A fera ainda tentou se manter de pé, mas seu próprio sangue causou seu tombo após um breve escorregão.
Sob o olhar incrédulo de seus companheiros, que nunca haviam visto alguém movimentar-se tão rapidamente num combate, o velho soldado avançou confiante, pronto para desferir o golpe que exterminaria de vez o indefeso dreikis. Mas antes que finalizasse, um grito estridente da única mulher que havia no grupo lhe pediu:
— Por favor, não mate esse dreikis. Espere apenas que ele se recupere, e ele será seu escravo para sempre.