No deserto gelado, onde o vento cortante ecoava entre as estruturas destroçadas, a base Último Refúgio erguia-se como um bastião solitário contra a invasão dos dragões.
Antes um reduto de esperança, agora estava reduzida a metade de suas estruturas originais, testemunha dos inúmeros ataques que a assolaram. Seus corredores eram labirintos de ruínas congeladas, onde o gélido silêncio era quebrado apenas pelo lamento do vento e pelos guinchos distantes das criaturas aladas.
E era exatamente para esse lugar que Kowalsk liderava seu grupo, o qual ele considerava cada um como heróis.
Eles seguiam em seus veículos com determinação inabalável, enquanto ele os guiava através dos destroços e dos vestígios de batalhas passadas.
Ao seu lado, Thilláila mantinha a mente focada, pronta para qualquer desafio que se apresentasse. Gareno, em outro veículo, sempre vigilante, mantinha seus sentidos aguçados diante da iminente presença dos dragões.
Num veículo mais longe ainda, no compartimento de carga, Troy, o dragão mascote, habilidoso e astuto, observava tudo, avaliando cada movimento que entrava no seu raio de ação.
Na direção do veículo que carregava Troy, o doutor Kami, como carinhosamente começaram a chamá-lo, estava atento a qualquer detalhe daquela região que era novidade para ele. Mais longe ainda, correndo e acompanhada de mais de uma centena de dreikis, estava a "noiva Drakissa" de Kowalsk.
O percurso demorou quase duas horas, e fosse por sorte ou por ter uma rainha dreikis acompanhando-os, mesmo que ao longe, não houve qualquer acidente de percurso.
— Thilláila, sei que já avisei a todos, e principalmente a você, mas eu recomendo fortemente que não faça movimentos bruscos e desnecessários quando chegarmos na base Último Refúgio.
— Eu já sei, senhor Kowalsk. Com certeza todos estarão desconfiados e temerosos por receber uma visita de um grupo tão estranho quanto o nosso. E nem mesmo desconfio o porquê de oferecermos nossa ajuda para um exército que foi derrotado pelos dragões.
Kowalsk apenas ouviu e não disse nada. Esse assunto não era algo que valia a pena discutir com Thilláila.
— Você entenderá em breve, Thilláila. Avise nossos amigos que estaremos chegando em 15 minutos. Diga que mantenham distância, aguardem em posição e esperem o aviso.
Rapidamente, Thilláila fez o comunicado entre eles e começou a se preparar para o momento que estava próximo, um encontro de patentes onde cada um era especialista em sua área. Não estava com medo, sentia confiança nas decisões de Kowalsk e sabia que eles conseguiriam enfrentar aquela situação numa boa. Afinal, naquela época nada era mais perigoso do que enfrentar dragões e vencê-los como eles haviam feito.
"Então, isso vai ser bem mais fácil!", pensou Thilláila, num breve sorriso.
— Não pense que isso será fácil só porque podemos vencer alguns dragões, Thilláila. E antes que me pergunte, eu não sou telepata. Mas, por causa desse seu sorriso, posso adivinhar perfeitamente seus pensamentos.
Thilláila olhou surpresa para Kowalsk. Como ele havia acertado seus pensamentos daquele jeito?
— E por que não vai ser fácil, senhor Kowalsk? — perguntou, mais que curiosa.
— Porque nós temos que convencê-los de que estamos querendo ajudá-los. E a menos que apareça um dragão por aqui e nós possamos mostrar que podemos derrotar...
— Achei que os dragões eram mais perigosos do que pessoas, senhor Kowalsk.
— Sim, Thilláila, a menos que sejam pessoas comuns confrontando pessoas com patentes, aí as coisas mudam de figura.
— O que faremos se o seu plano de arrumar aliados não der certo? — perguntou Thilláila, encarando-o.
— Entenda uma coisa, minha cara Thilláila, esse plano tem que dar certo, com ajuda do Coronel Cleaner ou sem ajuda dele. Tenho grande estima e respeito por ele, mas em comparação a levar a liberdade para as pessoas que estão sobrevivendo embaixo de túneis e escombros, isso não é nada. Então tenha em mente que devemos nos preparar para o pior, o mais difícil.
— Mas isso não é pessimismo, senhor Kowalsk?
— Não! Isso se chama "uma nova aba disponível no meu leque de opções".
— Não era mais fácil o senhor dizer "oportunidades"?
Kowalsk sorriu. Aquela jovem estava cada vez mais acompanhando sua linha de raciocínio. E isso era bom.
— O importante é que você me entendeu, não é mesmo? — perguntou Kowalsk com um meio sorriso no canto da boca.
E, compartilhando aquele momento, a jovem também sorriu.
— Perfeitamente, senhor Kowalsk.
E voltaram sua atenção para a frente do veículo, pois agora já era visível a entrada da base.
— Posso pedir um favor, senhor Kowalsk? — perguntou Thilláila, fazendo uma cara fofa demais para ter seu pedido recusado.
— O que estiver em meu alcance, Thilláila, é só você pedir.
E, pegando na mão do velho soldado de súbito, ela disse:
— Por favor! Vê se não morre. Ainda temos muitos lugares para ir.
— Eu vou tentar, Thilláila. Eu juro que vou tentar.
— Não é isso que eu quero ouvir, senhor Kowalsk. Quero que me prometa que vai sobreviver de uma forma ou de outra.
De repente, Kowalsk sentiu uma pressão sobre sua cabeça ao mesmo tempo que seus olhos começaram a arder.
— Tenha calma, Thilláila. Guarde seu poder para o momento certo. Não precisa ficar ansiosa desse jeito. Além do mais, todos nós temos o nosso dia de partir dessa terra.
— Me desculpe, senhor Kowalsk. Só quero que o senhor sobreviva.
— E o que fará se por acaso eu não conseguir, minha querida?
— Então, não vou deixar nenhum soldado vivo.