Maio de 1946
Foi no início de um mês sombrio que algo inexplicável aconteceu: portais surgiram ao redor do mundo, como cicatrizes abertas no céu. De dentro dessas fendas, monstros de todas as formas e tamanhos emergiram, trazendo caos e destruição. Cidades inteiras foram devastadas em questão de dias, e a humanidade se viu à beira do colapso. No entanto, em meio ao desespero, uma mudança inexplicável ocorreu. Pessoas comuns começaram a despertar habilidades extraordinárias, como se a presença dos portais houvesse desencadeado uma força adormecida. Assim, surgiu o primeiro herói da Terra, alguém capaz de enfrentar os monstros e devolver à humanidade uma tênue esperança.
97 anos no futuro
No topo de uma colina, duas figuras se encaravam sob um céu cinzento e carregado. O silêncio entre eles era cortante, interrompido apenas pelo som de uma brisa pesada.
"Você nunca vai conseguir me derrotar", disse a primeira figura, com um tom frio e calculista, como se a vitória fosse uma certeza absoluta.
"Isso é o que veremos", respondeu a outra, com uma firmeza que desafiava qualquer previsão. Seus olhos brilhavam com uma determinação implacável, como se estivessem prontos para lutar até o último fôlego.
20 anos antes
Era um mundo onde todos nasciam com dons mágicos. Poderes faziam parte do cotidiano, e crianças exibiam habilidades logo cedo. Mas, para Olabe Del Arco, parecia não haver nada de especial. Nenhuma faísca, nenhuma manifestação mágica. Apenas silêncio. Desde o nascimento, ele fora uma criança comum em meio a prodígios. E, para muitos, isso significava um destino inevitável de mediocridade.
"É um menino! Qual será o nome dele?", perguntou a mãe, com um sorriso cansado, mas afetuoso.
"Será Olabe, Olabe Del Arco", respondeu o pai, com o olhar fixo no recém-nascido, sem saber que o filho nascido sem dons iria desafiar todas as expectativas.
7 anos depois
Aos sete anos, Olabe já estava acostumado com as provocações. Ser "o garoto sem magia" era um fardo constante, um peso que carregava em cada olhar e cochicho à sua volta. Naquele dia, enquanto caminhava pela rua de cabeça baixa, um grupo de garotos mais velhos o cercou.
"Você nunca vai ser um caçador, seu verme sem magia", disse Adam, o mais arrogante e o líder do grupo.
"Deixe ele aí, esse fracassado", zombou outro garoto, seguido de risadas de escárnio.
Olabe ergueu o olhar e, com uma determinação que parecia inexplicável para uma criança, declarou com firmeza: "Eu vou ser o maior caçador de todos."
As risadas aumentaram, e os garotos o encararam com desprezo.
"Apenas nos seus sonhos, fracassado", debochou Adam, antes de se afastar com o grupo.
Enquanto observava os garotos se afastando, Olabe sentiu uma chama acender dentro dele, uma promessa silenciosa de provar que estavam errados. No entanto, uma voz doce e familiar interrompeu seus pensamentos.
"Maninho! Maninho!"
Ele se virou e viu Lisa, sua irmã mais nova, correndo em sua direção com os braços abertos e um sorriso radiante.
"O que foi, Lisa?"
"Papai está te chamando, ele quer conversar com você."
Olabe ergueu as sobrancelhas, intrigado. Seu pai raramente o chamava para conversar. "Sobre o que é?"
"Como eu vou saber?", respondeu Lisa, cruzando os braços. "Ele só pediu pra eu te chamar. Disse que era algo sério."
Olabe assentiu, ainda mais curioso. "Já estou indo", disse ele, vendo Lisa se afastar e desaparecendo pela rua enquanto ele seguia em direção à casa.
Dentro de casa, Olabe parou próximo à entrada, ouvindo a conversa dos pais vindo da sala. As vozes pareciam tensas.
"Eu não concordo com ele viajar por três anos", dizia sua mãe, Marina, a voz carregada de preocupação.
"Mas virar espadachim é a única solução que ele tem, já que não tem magia", respondeu Jorge, seu pai, com um tom calmo, tentando tranquilizar a esposa.
Assim que perceberam a presença de Olabe, ambos pararam de falar e o encararam.
"Papai? O que o senhor quer falar comigo?", perguntou Olabe, sentindo a tensão no ar.
Jorge suspirou e o olhou nos olhos. "Arrume as malas, você vai para o sul do país treinar para ser um espadachim. Este é meu amigo Luiz, ele será seu professor."
Olabe só então notou a figura que estava em pé ao lado dos pais. Luiz era um homem de aparência muito idosa, com cabelos grisalhos e um semblante sério.
"Quem é você?", perguntou Olabe, encarando o desconhecido com curiosidade.
"Me chamo Luiz, e como seu pai disse, serei seu professor de agora em diante, garoto", respondeu o velho com um leve sorriso. Seus olhos pareciam estudar Olabe com atenção.
Olabe, ainda cético, arqueou uma sobrancelha. "Então vou ser treinado por um velhote?"
"Olabe!", sua mãe o repreendeu pelo tom desrespeitoso.
"Ah, tudo bem, Marina. Não me importo de ser chamado assim", disse Luiz com um sorriso tranquilizador, claramente despreocupado com a atitude do garoto.
Olabe suspirou, aceitando a situação. "Tudo bem, então. Vou arrumar minhas coisas."
Ele subiu para o quarto, sentindo uma mistura de curiosidade e apreensão. A ideia de treinar com Luiz ainda lhe parecia estranha, mas, de algum modo, ele começou a imaginar como seria aquela experiência.
Dias depois
Após uma longa viagem ao sul, Olabe e Luiz finalmente chegaram ao destino. Ao descer do transporte, Olabe se espreguiçou, aliviado.
"Finalmente chegamos, não aguentava mais ficar sentado nessa coisa velha", murmurou, exausto.
Luiz soltou uma risada genuína. "Você é hilário, garoto."
Olabe franziu o cenho, confuso. "Mas eu não falei nada de engraçado. Vamos treinar", insistiu, como se Luiz fosse um velho um tanto excêntrico.
"Vamos descansar primeiro, garoto", respondeu Luiz, colocando a mão no ombro de Olabe e guiando-o até uma casa simples próxima ao local onde haviam chegado.
A casa era modesta, mas parecia bem cuidada. O interior era acolhedor e organizado, com móveis rústicos e uma atmosfera de paz.
Olabe deu uma olhada ao redor, surpreso. Talvez, ele pensou, Luiz não fosse apenas um "velhote" excêntrico. Talvez aquele lugar, e aquele homem, guardassem segredos que ele estava prestes a descobrir.