Capital da Cidade da Esperança. Ano 1381 do novo calendário.
A capital era um lugar movimentado, muitas pessoas iam e vinham, as áreas consideradas mais pobres da cidade eram melhores do qualquer vilarejo fora dos muros da capital, a segurança é bem rígida, por conta disso a capital era o local mais seguro do domínio humano.
Apesar de parecer um bom lugar para viver, a capital guardava segredos obscuros por debaixo da sua fachada perfeita.
Na teoria, as 10 grandes famílias eram harmoniosas e comandavam a cidade com justiça, porém, a realidade não era tão bonita assim.
A corte dos 10 era tudo menos pacífica, essas famílias tinham algum nível de inimizade entre elas, uma inimizade que existe desde a construção da cidade da Esperança.
Enquanto para o público eles se mostravam respeitosos uns com os outros, era nos bailes privados que eles mostravam sua verdadeira face.
Em uma mansão particular que ficava um pouco afastada das outras área residenciais, um lugar afastado de olhares curiosos.
O som de vidro se quebrando ressoou pelos corredores, alguns funcionários pareciam assustados, outros nem mudaram de expressão diante da fúria de seu mestre.
"Vocês são todos imprestáveis!".
Gritou o mestre de dentro da sala de reunião, a sala era luxuosa, os vasos de flores tinham padrões complexos e cores vívidas, as lamparinas na parede eram incrustadas em ouro, no meio da sala havia uma longa mesa redonda, onde várias pessoas estavam sentadas sendo repreendidas.
"A primeira vez que vocês fracassaram foi quando deixaram os experimentos 001 e 004 escaparem".
O mestre olhou para os rostos de cada uma das pessoas sentadas como se estivesse olhando para algo imundo.
"E além de não conseguirem encontrá-lo, vocês fizeram a façanha de perderem um dia meus preciosos artefatos".
O mestre andava pela sala, não se ouvia nada, a não ser os passos do homem.
"Então, vocês tem algo mais a me relatar?", perguntou o mestre com um sorriso que não era bem um sorriso.
"M-minhas desculpas senhor, 001 está sobre a proteção da família Durand, se fizermos algo eles podem desconfiar e-".
Antes que o homem pudesse terminar de falar, ele começou a convulsionar e em alguns segundos ele caiu na mesa morto.
"Alguém mais quer falar?".
A presença que o mestre estava emanando fazia todos abaixarem a cabeça, ninguém conseguia olhar para ele naquele momento.
Como ninguém falou mais nada, o mestre mandou todos embora e ordenou que se livrassem do corpo, após todos terem ido, o dono da mansão se dirigiu até seu laboratório subterrâneo.
"Boa tarde Sr. N", Uma jovem cumprimentou o mestre assim que ele adentrou o laboratório, naturalmente não era o nome real dele.
Ele usava um apelido e até uma máscara, assim mesmo que vazasse informações sobre o que acontecia alí, a sua identidade não seria exposta.
"Como estão as coisas por aqui?", perguntou Sr. N para a jovem que o seguia enquanto eles davam uma olhada ao redor.
"Por conta do incidente de três anos atrás, nós tivemos algumas complicações, os experimentos não estão tão satisfatórios quanto antes".
Sr. N assentiu, a jovem lhe entregou alguns papéis que continham informações sobre os experimentos bem sucedidos.
Após isso a jovem se retirou e voltou para o seu posto, Sr. N entrou em seu escritório junta ao seu assistente, ele juntou os documentos que estavam em cima da mesa e os guardou na gaveta.
"Os Silvermoon se movimentaram recentemente?", perguntou Sr. N, tentando não demonstrar o leve tremor de sua mão, ele ainda estava muito enfraquecido da luta que teve com um certo alguém.
"Eles estão mais alertas do que nunca meu senhor, mas por sorte eliminamos boa parte dos infiltrados".
O Sr. N tinha uma leve carranca no rosto, há 3 anos Camila havia o traído, o que lhe custou muito para fazer um novo laboratório já que o antigo tinha sido exposto.
Para piorar a situação, ele ainda estava se recuperando da batalha que teve com Raelyna, ele não podia usar muito da sua benção por conta disso.
'Maldita seja Raelyna', pensou Sr. N com raiva, o assistente vendo o mal humor de seu mestre, sabiamente ficou quieto.
"E o Dr. Grayland? Ele ainda se recusa a cooperar?", questionou Sr. N.
"Dr. Grayland está fazendo o que lhe é pedido, mas não conseguimos fazê-lo falar, tem uma proteção mental muito forte nele, não conseguimos quebrar essa barreira, nem mesmo com os melhores equipamentos".
Sr. N sabia que eles não teriam resultados, se ele estivesse em sua força total, ele conseguiria lidar com isso, mas era impossível nesse estado.
"E como recebemos ordens de não mata-lo, não posso fazer algo muito pesado, mesmo que ele não fale, é óbvio que foi ele que ajudou Camila e o experimento 002 a escapar".
O assistente finalizou relatório, Sr. N assentiu e o mandou se retirar, o assistente saiu rapidamente após se curvar.
Para o Sr. N, só havia uma pessoa que ele conhecia que podia criar uma barreira mental tão poderosa, 'Mesmo longe essa mulher continua me trazendo problemas'.
Sr. N sabia que Raelyna não seria capaz de acabar com ele, o Sr. N aproveitou essa fraqueza nela.
O Sr. N não ligava se ele era desprezível por usar os sentimentos dela dessa forma, para ele, nada mais importava do que seu objetivo, nem mesmo ela.
No fundo, ele sentia um grande remorso, mas já não havia como voltar atrás, ele estava trilhando um caminho sem retorno, todo o mal que ele causou era irreversível, ele não podia se arrepender agora, não depois de todo o sacrifício.
Flashback on
Era primavera, as flores desabrochando no jardim mostravam isso, e lá estava ela sentada no banco contemplando as rosas.
As flores não eram tão belas quanto ela, e por um momento fiquei sem saber o que fazer a seguir.
Lentamente me aproximei, ela parecia distraída e não percebeu a minha aproximação, quando estava perto o suficiente, ela olhou para mim.
Os olhos dela brilhavam mais do que o céu estrelado, eu só queria que ela olhasse para mim assim para sempre.
"São violetas? Você trouxe para mim?", a pergunta dela me fez acordar, fiquei tão distraído que esqueci de esconder as violetas que peguei para ela.
"Você gosta de violetas, então eu peguei umas para você", entreguei para ela o buquê, desviei o olhar um pouco constrangido.
"Obrigada, elas são lindas", os olhos violetas dela pareciam mais brilhantes quando ela sorriu, senti meu coração bater mais rápido com a visão.
"De nada", as flores eram lindas, mas perto dela, o charme das flores pareciam tão pálidas em comparação, aquele sorriso ficaria marcado na minha memória, tudo o que eu queria naquela época, é que eu pudesse fazê-la sorrir assim mais vezes.
Flashback off
Sr. N balançou a cabeça para disparar as memórias, ele não podia negar que possuía lindas lembranças com ela, mas seria apenas isso, lembranças de um passado distante.
Independentemente do que aconteceu, os objetivos dele não mudaram, o passado deveria continuar no passado, Sr. N passou a revisar os documentos em sua mesa, enterrando essas doces lembranças.
Pov: Raelyna
Floresta parecia tão tranquila naquele dia, os passarinhos cantavam felizes, os peixes nadavam sem nenhuma preocupação, era um contraste gritante com o que eu sentia agora.
Não tive muito tempo para mergulhar em auto depreciação, logo senti a presença de alguém.
"Você finalmente chegou, Juniper".
Não precisei olhar naquela direção para saber quem era, a aura era bem familiar.
"Você fala como se eu tivesse te feito esperar por horas, eu cheguei no horário de sempre", Juniper é mais velha do que eu, tinha longos cabelos castanhos e olhos de mesma cor. Ela parecia delicada e frágil à primeira vista, mas a realidade não era bem assim.
"Raelyna, as coisas com o ministério não estão boas, com as guerras em andamento eles negaram seu pedido mais uma vez", explicou Juniper com uma expressão de desculpas.
Eu respirei fundo, não adianta perder a paciência aqui, ela não tem culpa, eu só preciso que o ministério faça uma inspeção, é óbvio que eles não se importam com os reinos inferiores, mas eles poderiam pelo menos fazer isso.
"Aqueles putos, eles estão dificultando as coisas por minha causa não é?".
A Juniper não precisou falar nada, a expressão em seu rosto mostrou que eu estava certa, aqueles velhos egoístas, só pensavam no que iriam ganhar com isso, sem se importar com os outros.
"E a Ondine? Qual a resposta dela?".
Juniper franziu a testa, eu perguntei por perguntar, a Ondine raramente se envolvia nesses problemas, seria surpreendente se ela o fizesse.
"O mesmo de sempre, a Ondine disse para você não se preocupar e fazer o que tem que fazer".
Senti meu sangue ferver, ela poderia tentar me ajudar um pouco pelo menos, fingir que se importava, mas parece que eu pensei demais.
"Aquela vadia se faz de santa, ela só está procurando um herdeiro para lidar com os problemas dela, são crianças! Ela está brincando com vida de crianças!", no meio da raiva usei muito do meu verdadeiro poder, eu podia sentir a terra tremer e o céu escurecer, mas naquele momento eu só queria algo para descontar essa raiva.
"Raelyna!! ACORDE!", o grito desesperado de Juniper me fez parar, olhando ao redor percebi que muitas árvores tinham caído e floresta estava silenciosa, não havia nenhum animal nas proximidades.
"Você enlouqueceu? Eu sei que está com raiva, mas se usar muita magia aqui o mundo vai entrar em colapso".
Juniper tinha razão, eu não deveria perder a paciência agora, eu só posso tentar o meu melhor sem ajuda deles, eu tenho que proteger esse lugar, mas eu estava de mãos atadas.
Se eu interferir demais no curso desse mundo, eu acabaria sendo expulsa pela consciência do planeta.
"Sinto muito Juniper, isso não vai mais acontecer", Juniper suspirou e deu um sorriso tranquilizador.
"Raelyna, não esqueça, você é apenas uma guardiã, eu sei que está preocupada, afinal você se apegou as pessoas desse planeta, mas você não pertence a esse lugar, se a Ondine tiver motivos o suficiente, ela vai te punir, e nem seu pai vai poder protege-la", assenti em concordância, meu pai pode ter muita influência, mas ele não pode ir contra uma Administradora.
"Juniper, como está Mellysa?".
Juniper hesitou por um momento, ela deve ter ficado surpresa pela minha pergunta, eu nunca demonstrei interesse na vida de Mellysa, não desde o dia em que tive que deixá-la.
"Ela está bem, Mellysa tem uma família muito boa".
A resposta de Juniper me deixou feliz e miserável ao mesmo tempo, eu sei que não tenho direito de entrar na vida de Mellysa agora, eu fiz uma escolha e não me arrependo dela, mas no fundo eu realmente queria poder abraçar minha garotinha de novo.
Juniper percebeu meu humor, e me abraçou dando leves tapinhas nas minhas costas.
Juniper ficou comigo mais um pouco, todo o estresse acumulado realmente me pegou dessa vez, fazia muito tempo desde que me senti tão vulnerável.
Eu conversei com Juniper por mais um tempo, e logo ela foi embora.
Fiquei sentada na margem do rio, a paz da floresta me acalmou, saber que minha filha estava vivendo bem me fez me sentir menos pior.
Eu prefiro que minha filha cresça em uma família amorosa e feliz, mas uma perte de mim quer ser egoísta.
Mellysa, espero que um dia você possa perdoar sua mãe fraca, eu sei que você vai se tornar uma jovem extraordinária.
Olhando o céu azul prometi a mim mesma que tudo valeria a pena no final, toda essa dor que ele me causou não ficaria em pune, eu não posso deixar ele machucar mais ninguém.
Amanhã é um novo dia, um dia mais perto de completar meu propósito nessa terra.