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Chapter 3 - Carry

Ao abrir meus olhos, vejo um local silencioso, de paredes brancas, e uma forte luz iluminando meu rosto de maneira incômoda. Ao mesmo tempo, minha vertigem impossibilita meus movimentos, e o homem de jaleco me olha com um sorriso suave. Não tenho dúvidas de que a sensação de suas mãos gentis acariciando minha cabeça e o calor de seu toque são coisas que jamais esquecerei, apesar desse estado. Antes mesmo de poder falar com ele, eu apago novamente...

...

...

São Francisco, Califórnia (3 de março, 2025 D.C.)

Assim que começo a lentamente recuperar minha consciência, o barulho do motor de um veículo chega aos meus ouvidos. É difícil definir quanto tempo se passou desde que adormeci.

— Olá! — uma voz robótica feminina me cumprimenta animada. — Que bom que... Você acordou!

Sem sucesso, tento descobrir onde estou, tateando este escuro e apertado local. Até que, um forte brilho vindo do meu pulso direito fisga a minha atenção.

— Ei! Já verificou... Os seus sinais vitais... Hoje?

— Quem é que tá falando!?

— Ei! Basta... Olhar... O bracelete no seu braço, não tem por que se assustar!

Imediatamente, olho para aquele painel brilhante em meu pulso.

Nome: Não consta nos registros

Idade: Estimativa de 19 anos

Tipo Sanguíneo: AB+

Frequência Cardíaca: 83bpm

Quociente de Laplace: Menor que 1%

Data e Hora: 7:42 AM, 03/03/2025

Tudo indica que eu dormi bastante. Mas, o que significa esse Quociente de Laplace?

— Quem é você? — questiono aquela voz robótica.

— Olá! Eu me chamo Carry... E sou a melhor inteligência artificial do mundo... Ou quase isso...

— Um robô? Isso é bem surpreendente...

— Sim! Na verdade, não sou apenas... Uma robô. Eu sou a... Melhor!

— É um prazer te conhecer, Carry. Mas, sabe de uma coisa? Eu estou muito curiosa para descobrir o que levou a melhor inteligência artificial a me prender na mala de um carro.

— Então, a senhorita... Percebeu! Você é realmente... Muito esperta. Não se preocupe, eu estou apenas... Te levando para... Ser desmembrada e ter... Seus órgãos vendidos no mercado negro, é claro...

— Como assim!?

— ... Que não! Entendeu, senhorita? Foi uma... Piada.

— Por que você precisa falar tão pausadamente, hein? Que tipo de robô conta uma piada dessas?

— Não se... Preocupe comigo, senhorita! Foque apenas... Na sua... Missão!

— Missão? Eu não concordei com nenhuma missão! Você trabalha para aquele velho calvo?

— Nós... trabalhamos, senhorita! Você deve... Sua vida a ele

— Eu não devo nada a ninguém! Me deixa falar com o motorista, me deixa falar com ele agora! — grito irritada, enquanto chuto a mala do automóvel.

— Você... Já está falando! Eu sou... A motorista.

— Esse carro tá sendo pilotado por um robô!?

— Sim! Inclusive... Sou... Excelente... Nisso!

Sua frase é seguida por um estrondo que faz-me pensar que o carro bateu em algo.

— Me solta, então! Eu não concordei em fazer nada!

— Me desculpe... Não tenho ordens para soltar a… Senhorita ainda... Apenas...Te soltarei quando... Estiver... Em segurança.

— E você acha que eu estou em segurança aqui!?

— Nas mãos de Carry... Você... Sempre estará...

— Ah, que saco! Qual é a dessa missão, afinal? E o que é esse tal Quociente de Laplace no bracelete?

— Me desculpe, senhorita... Creio que não é... O momento correto para... Esse tipo de explicação.

Eu não posso confiar nesse robô em hipótese alguma. Na verdade, se ela quisesse me matar provavelmente já teria feito isso...

— Como você espera que eu faça a missão sem me instruir direito?

Ao longe, posso ouvir algo se abrindo.

— Que bom... Ainda podemos contar com ele. — a robô diz como se estivesse aliviada

— Pera, o que aconteceu?

— O nosso informante... Conseguiu abrir os portões... Ainda bem!

— Que portões?

— Da mansão, o local onde será... A sua missão, senhorita. Lá dentro... Existe um informante que... Vai responder todas as suas… Perguntas.

— Então você tem ajuda... Nada mal. Mas, por que você mesma não me conta o que eu tenho que fazer?

— Não... Temos... Tempo... Para... Isso. — diz Carry com uma voz ainda mais travada e cheia de ruídos.

Em seguida, o carro para e a mala se abre automaticamente, fazendo entrar a forte luz do sol. Diante de mim, está uma luxuosa mansão, com um jardim tão grande quanto um estádio de futebol, completamente cercado por grades de alta tensão.

— Me desculpe... Senhorita, creio que não poderei... Ajudar mais... Por enquanto...

— Como assim? Você vai só me deixar aqui nesse lugar aleatório? Ainda tem que coragem de dizer que me ajudou em algo!?

— Provavelmente... Existe algo bloquean... sinal nessa mansão... Não estava... Sendo afeta... Mas, agora que... Cheguei mais perto...

— Me explica por que você me trouxe aqui de uma vez!

— Não... Precisa se exaltar. Nós... Salvamos sua vida... Apenas tente... Sobreviver... E siga nossas... Ordens...

Sua voz travando mais que o normal indica que ela provavelmente não vai durar muito mais tempo.

— Tudo que... Quiser... Ele vai... Te... Contar...

— Como posso identificá-lo?

O veículo desliga, e o silêncio da manhã faz-me entender que, mais uma vez, estou sozinha. Ao levantar, lembro-me do ferimento do dia anterior e passo a mão por ele. Diferente do esperado, a ferida já está cicatrizando e, mesmo não estando totalmente recuperada, sinto que posso me mover livremente, sem grandes preocupações. Então, ao caminhar próximo ao carro, tenho uma surpresa: um ursinho de pelúcia marrom sentado no banco do motorista. Apesar de ser fofo, esse tipo de coisa não é muito meu estilo.

Desta maneira, faço uma pausa para contemplar aquela enorme e luxuosa mansão, que, com sua pintura beje e detalhamento em ouro, se mostra muito elegante e exala uma riqueza que poucos homens conseguiram alcançar, algo de outro mundo, vindo diretamente da mais pura realeza. Mas, por que me trouxeram? Mesmo que tenham me salvado, eu não sou obrigada a fazer o que eles querem! De qualquer forma, os portões se fecharam e não dá para voltar, então, esse informante terá que ser útil para algo.

Logo a frente, está a entrada da residência, com sua fechadura quebrada revelando que provavelmente outra pessoa invadiu este lugar antes mim. Sendo assim, redobro meu cuidado para entrar no hall, onde duas escadas laterais se unem e dão forma a um corredor central, enquanto duas portas estão posicionadas, uma à minha direita e outra à esquerda. Além disso, há também um tapete que me recebe com os dizeres:

"RESIDÊNCIA DOS WRIGHT"

Esgueiro-me pela entrada da mansão na tentativa de chamar o mínimo de atenção possível. Porém, de nada adiantam meus esforços e eu esbarro em um jarro de flores que nem havia notado estar ali. Imediatamente, ele balança, fazendo um barulho que, apesar de baixo, poderia ser ouvido ao longe com aquele silêncio ensurdecedor. Sem demorar muito, o som de passos chega até mim, então, para escapar daquela situação, corro para o andar superior e me escondo atrás do guarda-corpo.

Após atravessar a escadaria, posso ver um soldado caminhando enquanto procura a origem do barulho. Seu uniforme é composto por uma máscara e uma armadura de alta tecnologia, ambos brancos com alguns detalhes em vermelho, indicando que ele trabalha na mesma empresa daqueles homens da caminhonete. Apesar da distância, consigo ver a logo em seu traje:

EDEN?

Na sequência, o soldado olha em direção as escadas como se estivesse procurando por algo e anuncia:

— É muita ingenuidade sua achar que eu não vou te ver em um esconderijo ridículo desses!

Que merda!

— Eu vou te dar três segundos para sair com as mãos levantadas. Um...

Não tenho motivos para levantar. Ele vai atirar de qualquer jeito!

— Dois...

Não... Eu não vou levantar! E se isso tudo for atuação? Não posso subestimar um soldado treinado!

— Três.

É agora...

Cinco disparos são dados, um após o outro, fazendo com que meus ouvidos fiquem surdos e meu corpo tremule dos pés a cabeça. Isso dura por alguns segundos, até que, uma mulher, repentinamente, se posiciona em minha frente.

— Ei, você tá bem? — Ela pergunta.

A mulher de cabelo curto e colorido me cumprimenta com um sorriso.

— Relaxa, gatinha, eu não atirei em você.

Ela está segurando uma pistola, utiliza uma jaqueta vermelha e azul, com apenas seu sutiã por baixo, uma saia preta e o pior de tudo, um tênis rosa-choque.

— Olha! — diz a mulher brega, apontando para o corpo caído no hall.

— Por que matou ele?

— Olha, tem vários soldados assim espalhados pela mansão. Mas, será que essa glock foi o suficiente pra penetrar a armadura dele? Que preguiça de verificar... — a mulher brega boceja enquanto faz uma declaração esquisita. — Tá olhando o que, gata? Algum problema comigo?

— Não, não, claro que não. Só reparei no seu jeito exótico de se vestir.

— Ah, ok né.

— Bem, isso foi legal. Eu acho...

— Não me agradeça por te salvar. Tem alguma arma? Algo assim?

— Não, nenhuma.

— Isso é um problema. — diz a mulher com a mão no queixo.

— Acho que eu vou indo, então.

Após isso, começo a me levantar.

— Aiai... Vamos ao ritual padrão...

Antes mesmo que eu consiga me colocar de pé, ela coloca aquela pistola bem no centro da minha testa.

— Primeiro, quem é você? Segundo, o que você tá fazendo aqui na minha casa!?

— Hã?

Então ela é a dona dessa mansão?

— Pera, você não entendeu? Que saco! Então, eu explico de novo. Eu usei cinco balas da minha glock, ainda restam onze nesse pente, tá vendo? Se uma não for o bastante pra estourar sua cabeça ainda restam onze pra isso, sacou?

— Nesse caso, acho que você vai ter que me matar...

— Hm? - diz a mulher, parecendo estar confusa com o que eu falei

— Infelizmente eu não tenho como responder as suas perguntas.

— Como assim não tem como? Tá querendo levar um tiro?

— Eu simplesmente não posso responder, já que também não sei.

— Como assim não sabe?

— Não lembro do meu nome, não sei quem sou, nem sei direito o motivo de eu estar aqui.

— Espera, então você também não se lembra? Entendo... — a mulher responde enquanto perde sua postura e expressão de hostilidade.

Ela fica em silêncio e me encara pensativa durante alguns segundos.

— Gostei de você, cara! Você é bonita e parece inteligente! Pode ser útil. Vem, levanta! Não temos muito tempo até aparecer alguém!

A mulher estende sua mão e me ajuda a levantar com um sorriso.

— A partir de agora você vai me ajudar a recuperar a minha mansão. Bem, meu nome é Esther Wright, gatinha, é um prazer te conhecer!

Parece que essa mulher impiedosa tem o mínimo de simpatia. Mesmo assim, ainda me sinto estranha em relação a ela...