E quando mais uma vez as duas estavam no apartamento, verdadeira confusão de roupas espalhadas pelo chão, foram surpreendidas por gritos histéricos de alguém que sacudia o portão que dava acesso ao apartamento.
– É ela! – Disse Nika se levantando de um pulo.
Meu Deus, e agora, o que vamos fazer?
– Mandar entrar! – Foi a resposta de Bia, que nesse momento só conseguiu pensar que poderia mostrar que Nika estava sendo muito feliz e não precisava mais do antigo amor.
Agora seria a hora decisiva, a hora do teste, onde ela veria por quem o coração de Nika batia mais forte.
– Ela está bêbada! – A voz de Nika mal se fez ouvir entre os gritos que ecoavam pela rua.
– Manda entrar! – Repetiu Bia, que fizera questão de ficar enrolada apenas num lençol, prova contundente que estava ali, porque estava com Nika.
E ela desceu para abrir o portão, subindo depois com uma garota, bêbada e descomposta, que berrava dizendo que queria matar a puta que estivesse ali naquele apartamento.
Bia preparou-se para a cena triunfal quando a ex de Nika entrasse no quarto e só percebeu a realidade quando os gritos que ecoavam da rua, soaram no quarto:
– Mãe! A puta é você!
E naquele instante, Bia percebeu que toda a dor que sentira ao ser abusada por seu pai e ao ser estuprada pelos moleques do bairro não havia sido nada.
As dores do corpo, mesmo não sendo esquecidas, são apaziguadas...
As dores da alma, não... E a alma de Bia doeu...
Parada ali, a sua frente, olhando para ela protegida de sua nudez por um lençol, bêbada, drogada e descomposta, estava Maira.
E Bia quis estar morta...
E sentiu seus cabelos sendo puxados ferozmente, enquanto as unhas e os dentes de Maira se enterravam em sua pele.
Nika, pálida e muda, a tudo assistia. Parecia petrificada, não esboçava nenhum movimento.
Não sabia o que fazer, apenas tinha a consciência que mãe e filha estavam ali, seu passado e seu presente se encontrando de maneira trágica.
E faltavam dez minutos para as vinte e duas horas, o horário em que Allan vinha buscar Bia na saída do Centro de Aperfeiçoamento.
O medo de assaltos fazia com que a rua estivesse quase deserta.
Mas a raiva de Maira, não seria freada por nenhum medo.
E descendo as escadas, puxou Bia pelos cabelos sem permitir que pelo menos pegasse suas roupas. Somente o lençol, agora rasgado, cobria parte do seu corpo.
Encostado ao seu carro, em frente ao Centro de Aperfeiçoamento, Allan esperava pacientemente por Bia.
E ao ver a filha bêbada, trazendo a mãe quase desnuda sendo puxada pelos cabelos, não teve nenhuma reação, a não ser os braços cruzados que penderam ao longo do corpo.
Não havia condições para dirigir... Não havia o que pensar, não sabia o que fazer.
Um motorista de táxi assistia a tudo. Então Allan pediu-lhe que encontrasse um estacionamento para o seu carro e os levasse para casa.
Na cabeça de Bia, a rua... A perda da família, do emprego, os trinta e seis anos, dificultando a entrada no mercado de trabalho, com apenas uma experiência no currículo... E a saída do trabalho por causa de um escândalo.
Ficar longe de Allan, seu doce companheiro, de Cris e de Marina, sua caçula. Agora, somente agora, via o quanto iria sentir falta dessas pessoas que eram tão importantes para ela.
Quanto a Maira? Tinha raiva dela, talvez ela tivesse herdado a maldade dos avós. De seus pais Pedro e Ana.
Quase sem sentidos devido à quantidade de álcool e drogas ingeridas, Maira agora estava encharcada de vômito dentro do carro.
Allan não dava uma palavra e Bia pensava que preferia uma surra de cinto como a que sua mãe lhe dera quando fora pega em flagrante com Maressa. Com certeza, iria doer menos que o silêncio de Allan.