Chego do hospital. Como é bom poder sentir o perfume de casa! Minhas mamas doíam, devido a uma cirurgia, e, com dificuldade ando até o quarto, coloco um pijama e deito na cama. Olho para o teto, respiro pausadamente para não sentir tanta dor, e, depois para meus curativos: estavam manchados de sangue, tinha levado muitos pontos. Deles emanava o cheiro da anestesia misturado com o de sangue...
Ele veio rápido... parecia ter saído do guarda-roupa. Contemplava-me de pé, ao lado da cama... era o espectro alto e de dentes aparentes.
Parecia desejar algo... eu me senti como uma oferenda. Entendi o significado do sacrifício de animais, para que uma entidade dessas venha, não bastam feridas, tem que ter dor e sofrimento.
Chegam minha mãe e irmã, pois ouço a conversa delas na sala. Vieram para cuidar de mim durante a convalescença.
Ele continua me contemplando... estou muito fraca para me defender, parece que minhas barreiras no mundo espiritual desabaram.
Chamo minha mãe e peço uma oração. Ela também o vê e o expulsa, em nome de Jesus.
- Eu vou voltar... – avisa-a.
Então se afasta, mas fica espreitando numa região do plano espiritual, onde está o guarda-roupa, atrás do espelho.
É contra esse espectro que venho lutando nos últimos meses. A mãe vai para a cozinha. Lívia entra no quarto:
- O quarto tá escuro! – brada.
- Sinto-me melhor assim... – explico devagar.
- Não! Vamos abrir a janela e deixar a luz entrar!
- Eu queria dormir, estou com muita dor...
Abre a janela e o quarto se ilumina.
- Ele gosta do escuro e está fazendo você pensar que é melhor ficar com a janela fechada.
Chega a noite... confesso que estou com medo...
- Lívia, dorme comigo?
- Tenho medo de dormir, e te machucar sem querer.
- Fica tranquila.
De madrugada ela desperta para orar, e os vê, ao meu lado da cama, o espectro e alguns pequenos. Assim que acordo...
- Ana, ele falava e a voz dele saía do seu corpo! – contava assustada.
- E o que dizia?
- Não entendi o que falava! Não interessa o que demônio fala, expulsei-o em nome de Jesus! Ah sim, avisou que iria voltar!
- Ele disse isso pra mãe também!
- Parecia existir uma espécie de hierarquia: o espectro maior era o "chefe" e os menores o obedeciam. - explicou.
"Por que ele faz isso? Por que me olha?" – indago-me.
À tarde, entro no quarto e paro em frente ao guarda-roupa. Estava furiosa, queria brigar com ele, então o chamo. Ele vem...
- O que você quer? – pergunto, com a mente.
Não responde, apenas me observa.
- Por que não diz nada?! O que você quer? – esbravejo.
Minha ira aumenta... queria ir para o outro lado, para o mundo espiritual, e brigar com ele.
Chega à noite e adormeço. Pela manhã acordo, com mãos acariciando minhas mamas. Meus olhos ainda estão fechados, quem será? Sinto dor, estão recém operadas... repentinamente ele as aperta com força:
- Aiii! Doeu! – grito.
Abro os olhos, viro a cabeça para o lado e vejo um espectro, com a forma do meu ex-marido, deitado na cama e com um sorriso sarcástico. Parecia existir uma névoa em todo o seu corpo.
Deve ser uma brincadeira, e de mau gosto! Pensei em elevar meu espírito para brigar, mas fiquei com medo que tomasse meu corpo de novo. Dei um cotovelada nele e gritei:
- Sai, seu idiota!
Tive uma forte ânsia de vômito por ter tocado no espectro... Orei o "Pai Nosso" e ele saiu da minha cama.
"Isso já foi longe demais!" – penso furiosa.
Lívia volta para a sua casa e chega a minha mãe, já abrindo a janela do quarto:
- Tá no escuro de novo! – fala enfurecida.
Conto tudo o que ocorreu e ela vai orar.
- Saí agora, em nome de Jesus! – expulsa.
- Ela me chamou... – diz o espectro a ela.
- Chamou nada! Seu mentiroso! Pega tua bagagem e vai embora, em nome de Jesus!
Penso: "Meu Deus! Eu o chamei para brigar, como confessarei isso a minha mãe?
- Satanás é mentiroso! Como ele fala que você o chamou? Mentiroso... – esbraveja.
- Não sei, mãe... – respondo cabisbaixa.
Ela vai até a sala, e se ajoelha para orar. O Senhor fala por meio dela:
- Ai de você se for para o outro lado! Vou retirar minhas mãos, vou retirar minha proteção da sua vida, e, você vai ver como é! Tenho ainda muitas bênçãos para você, mas se for para o outro lado, não vou liberar! Ai de você, se for para o outro lado! – avisa, com tom de ameaça.
Penso assustada: "Deus está bravo comigo, que medo! O que seria de mim sem Ti, Senhor, sem a Tua proteção! Perdão Deus!"
Minha mãe levanta, aproxima-se e fixa o seu olhar no meu:
- Ana, Deus falou que se você for para o outro lado, Ele vai retirar todas as bênçãos! – fala furiosa.
- Mãe, eu não vou para o outro lado! – digo baixinho.
- Deus sabe o que fala! Se falou é porque existe o risco! – esbraveja.
"Não entendo porque Deus está bravo comigo, não sei o que fiz de errado." – penso.
- Tudo o que você tem foi graças a Ele! Deus te ama muito... – diz, com uma entonação mais suave.
- Eu sei, também o amo. Nunca deixarei a Deus... – falo, engolindo o choro.
Conversamos, oramos, tomamos café da tarde e ela se vai. Sozinha, perambulo pela casa, pensando em tudo o que aconteceu, quando um anjo chega:
- Uma coisa é o inimigo vir, e a gente se defender. Outra coisa é chamar o inimigo para brigar, que é o que você fez! Você só pode entrar numa batalha espiritual com a autorização de Deus! Você faz parte de uma organização. – explica, pacientemente.
Mostrou muitos anjos andando rápido, de um lado para outro, pareciam resolver questões, e continuou:
- Você não pode fazer um ataque isolado! As batalhas espirituais são autorizadas por Deus.
- Entendi no que errei... perdão Deus!
Segundos de suspense...
- Eu dou trabalho, não é? – pergunto, aborrecida.
Então vi, pelo menos uns seis anjos balançando a cabeça positivamente. Cada um tinha a sua fisionomia, alguns eram magros, outros gordinhos, vários cortes de cabelo... mas, todos pareciam vestir a mesma túnica.
- Tenho muito a aprender anjo...