Luciene recuou rápido com o susto, tropeçou nos próprios pés e caiu de costas na calçada sentindo também os cotovelos arderem do impacto. Levantou o rosto, para entender o que aconteceu, mas viu apenas um homem pulando em cima dela.
Fechando os olhos rapidamente no impulso, suas costas bateram na pedra fria, e uma grande mão tapou sua boca empurrando sua cabeça com força para baixo.
O impacto de seu crânio no chão fez sua visão se embaçar. Ainda atordoada e sentindo um peso em cima de si, com a adrenalina no sangue, não esperou para ver ou pensou no que estava acontecendo.
Ela deu uma mordida forte na mão que segurava seu rosto, sentindo o gosto leve de sangue na língua, e enquanto o aperto afrouxava levemente, conseguiu puxar o rosto para a direita rapidamente enquanto empurrava a mão do outro para a esquerda, conseguindo tirá-la de si e desequilibra-lo. Dobrou as pernas e deu um forte chute no estômago do homem, que caiu de lado e se dobrou de dor.
Luciene rolou duas vezes, se afastando e se impulsionou para frente num pulo, correndo com todas as suas forças o mais rápido que conseguia.
Sentiu a mão latejar novamente, ainda agarrada à bolsa. Com o coração acelerado, e a adrenalina no sangue, viu o mundo andar mais lentamente enquanto sua mente estava a mil. Se eu conseguir chegar na esquina, a vigilância do condomínio vai me ajudar! Foi a única coisa que conseguiu pensar claramente naquele momento enquanto outros pensamentos confusos se misturavam.
'O que é isso?' 'O que aconteceu ali?' 'De onde aquele cara saiu?' 'Ele pulou da árvore?' 'O que ele quer?' 'Um assalto!' 'Vou ser sequestrada?' 'Ele era bonito?' 'Pera, o que?'
Luciene passou da banca de flores e viu ao longe a guarita do condomínio. Tudo se silenciou em sua mente. Só preciso chegar lá. Pedir ajuda.
A luz dos postes na calçada oposta iluminou seu rosto e sua esperança aumentou, mas antes que pudesse dar o segundo passo em direção à luz, sua visão retrocedeu sendo coberta de sombras.
Seu cabelo foi puxado para trás.
Ela gritou e deu uma cotovelada para trás, tentando alcançar o rosto do homem, mas o outro percebeu o movimento e a segurou "O que você está fazendo? Me solta! Isso dói! Está me machucando! Me solt..." Quando ia gritar a plenos pulmões, foi puxada novamente e teve seu pescoço agarrado.
A bolsa escapou de sua mão em direção aos canteiros do parque enquanto Luciene era lançada com força e pressionada contra a vidraça da pequena floricultura que estalou com o impacto, suas costas doeram e a falta de ar a impediu de se mover por alguns segundos, dando tempo suficiente para o homem alto a imobilizar novamente.
Seu braço esquerdo foi esticado no alto e a mão machucada pressionada contra o vidro, com o homem aproximando sua cabeça coberta de cabelos negros. O braço esticado do homem segurava seu pescoço, seus pés quase não encostavam no chão e pouquíssimo ar passava por sua garganta.
Sentiu a mão que estava presa se rasgar, como pregos perfurando sua carne. Um líquido quente escorria por seu braço. Com a dor, lágrimas encheram seus olhos, embaçando sua visão e dificultando ainda mais sua respiração.
Não entendia o que estava acontecendo, não conseguia gritar por socorro ou misericórdia, sua garganta ardia e começava a sufocar.
Ouviu um som de um carro solitário se aproximando ao longe e lutou para se soltar. Mas mesmo ao tentar se livrar do aperto em seu pescoço ou ao dar chutes nas costelas do outro, não conseguiu sair ou fazer o outro recuar.
Sua voz não saia e o som de sua resistência foi abafado pelo barulho do motor.
O carro foi embora, sem que seu motorista sequer soubesse do desespero dela. Sua esperança estava sendo minada.
Ela tinha se preparado para esse tipo de situação. Quando mais jovem, Luciene tinha passado quase cinco anos treinando jiu-jitsu para defesa pessoal, então devia saber como agir, não?
Mesmo que não tenha achado nenhum dojo próximo a sua casa depois que se mudou, o tempo que passou aprendendo e treinando antes devia ser suficiente para ela conseguir reagir, então porque ela não conseguia fazer nada?
Não foi suficiente? Devia ter me preparado melhor para esse tipo de situação? Mesmo precisando agora, tudo se tornou inútil porque não continuei praticando?
Estava presa. Não tinha nada que pudesse usar de arma e não conseguia atingir o outro em nenhum ponto que parecesse causar qualquer impacto. O longo braço que a segurava a impedia de se aproximar ou ver seu rosto.
O que faço? Não tenho posição pra me movimentar, não consigo aplicar golpes, quando subo as pernas pra tentar uma chave, ele aumenta o aperto, mal consigo respirar! Estando com o corpo tão afastado, ele não deveria ter tanta força pra me prender assim, muito menos exercer uma pressão tão forte!
Estava ficando tonta. A dor em sua mão aumentava, seus pés e mãos pareciam dormentes e sentia perder as forças. Seu coração antes acelerado parecia começar a perder o ritmo, o aperto em seu pulso estava quase a quebrá-lo, o sangue que parecia ser sugado de seu corpo também se derramava sobre si. O que é isso? Eu vou morrer agora? Não! Não quero!
Ela continuou lutando e tentando se soltar, mas nada adiantava.
Será que ele vai estar lá se eu for?
Aquele ser, que tinha uma força muito superior à dela, a prendia sem nenhuma chance de escapatória, e a força dela diminuía a cada momento. Era apenas uma presa ali. Quais eram suas chances? Vamos jovem, pensa! O que eu posso fazer?
Um toque de celular soou alto em algum lugar próximo. Era o dele?
O som repentino confundiu o homem, que olhou para trás por reflexo, afrouxando o aperto.
Minha chance! Lu preparou-se para aplicar o golpe.
Com concentração total, levantou as pernas apoiando-se no braço que a segurava, atacando o pescoço do outro, e mantendo a posição do estrangulamento, aplicou a força que lhe restava. O movimento repentino fez com que o homem recuasse, soltando a mão que prendia seu braço esquerdo e quase soltando seu pescoço.
Nesse momento, Lu pôde ter um vislumbre dos olhos do outro, eram de um negro profundo com as pupilas dilatadas e iris como a mais escura noite. Aquilo era assustador, não parecia humano.
E por alguns instantes, ela ficou presa neles.
Mesmo se encarando por alguns instantes, não conseguiu prestar atenção no rosto do outro, viu apenas que sua pele era muito branca e olhos profundos que pareciam brilhar em surpresa.
A reação dele veio em seguida.
Enquanto seu corpo ainda caia em direção ao chão, o homem repentinamente abaixou-se, jogando-a de vez no chão, fazendo com que Luciene batesse a cabeça e as costas na calçada numa batida inesperadamente forte. A dor a fez perder as forças, quebrando a postura e deixando cair suas pernas e perdendo a pequena vantagem que parecia ter conseguido.
A energia que lhe restara havia acabado. Sua visão escureceu e começou a perder consciência.
Com um sussurro pôde apenas suplicar "por favor" antes de perder completamente os sentidos.
O homem se levantou com sua grande sombra cobrindo a jovem desmaiada.
O som do telefone ainda soava alto em seu bolso.
Olhou ao redor. Não havia ninguém para ver. Ninguém para ajudar. Ninguém para o impedir.
Suas mãos trêmulas estavam manchadas de sangue e o sabor metálico que já tinha tentado odiar descia por sua garganta com uma sensação refrescante e saciadora.
Cometeu mais uma vez o pecado que havia há muito deixado para trás, ou assim pensou.
Pegou o celular que chamava pela segunda vez, e olhando para a tela, sorriu amargamente.
"É claro que é você" Sua voz rouca soou baixa no ambiente silencioso.
Respirou fundo e olhando para o céu, agora nublado, atendeu a ligação.
"Devia ter te escutado" Falou monotonamente para aquele do outro lado da linha, que se calou ao ouvir a amargura na voz do homem "Vem prá cá. Você estava certo."