Chapter 8 - Capítulo 8

Estava tudo muito tranquilo naquela noite.

Ninguém tinha dado entrada no hospital desde que Samira havia começado seu turno noturno a pouco mais de duas horas. Para algumas pessoas pode ser estranho que não entre ninguém morrendo num hospital durante tanto tempo, mas ela não estava na emergência, então as noites eram mais calmas para a recepcionista, ainda mais quando pegava o turno a partir da meia noite.

Com a falta de movimento, era difícil se manter concentrada. Mesmo estando acostumada a estar acordada madrugada adentro, ainda era muito fácil se perder em pensamentos ou simplesmente olhar para o nada e esvaziar a mente. Era um exercício relaxante até.

O silêncio pacífico reinava no ambiente, quando um alguém se aproximou da porta de vidro entre a escuridão da noite. Samira não estava prestando realmente atenção à entrada naquele momento e não viu que por pouco um jovem de cabelos desgrenhados não se chocou contra a porta automática ao correr para dentro do hospital.

Os sons de passos ecoando de repente na cerâmica branca assustaram a recepcionista que tinha o olhar perdido em um ponto aleatório do corredor lateral.

Ela pulou na cadeira arrumando a postura e esperando que seu sorriso não estivesse estranho já que estava dando seu melhor para reprimir um bocejo indesejado. Sempre na pior hora.

"Boa noite, como posso ajudar?" Enquanto o jovem percorria a distância até onde ela estava, Samira percebeu o rosto meio amassado do garoto, como se tivesse acordado a pouco tempo e seus olhos inchados com um olhar desesperado, parecia a ponto de chorar, ou talvez já tivesse chorado pelo vermelho nos cantos dos olhos que se destacava na pele muito pálida. "Você está bem? Está passando mal?"

A recepcionista falou em tom preocupado quando ele não conseguiu parar antes de bater com o corpo no balcão, quase batendo a cabeça no rosto da pobre recepcionista que por pouco não virou a cadeira ao desviar.

Ainda com o coração acelerado pelo susto, Samira ouviu o garoto falar em tom urgente. "Luciene Dimar! Ela é minha irmã, deu entrada agora de noite, pediram pra eu vir aqui. Ela está bem? O que aconteceu? Onde ela está?" Falando tudo de uma vez em um único fôlego, o jovem por volta de 20 anos se inclinou para frente com as mãos no balcão de pedra negra com voz tão angustiada que fez o coração de Samira se apertar no peito.

Com os olhos castanhos assustados e a respiração entrecortada, parecia que ele ia ter um ataque de ansiedade a qualquer momento. "Calma senhor, respire fundo. Vou ajudar como puder, mas o senhor precisa manter a calma!" Ela falou se esforçando para controlar a voz com calma e passar segurança ao jovem "Meu nome é Samira. Qual o seu? Luciene é sua irmã, certo?" A melhor forma de acalmar alguém em pânico é conversar com ele, tentar desviar a atenção do problema central.

Samira imediatamente lembrou das aulas práticas que teve na semana anterior. Quem diria que precisaria aplicar o que tinha aprendido tão rápido? Que bom essa foi uma das aulas que prestei atenção!

"Sim. Ela é." Sussurrou o jovem com voz começando a ficar embargada, talvez fosse chorar novamente. Abaixou a cabeça nas mãos trêmulas e frias, parou um momento respirando fundo. "Matheus... meu nome é Matheus Dimar" Levantou a cabeça ainda nervoso.

"Você disse que entraram em contato, foi alguém do hospital?"

"Isso. Eu... não lembro o nome da pessoa. Mas ela disse... hum... que minha irmã tinha sofrido um acidente e foi trazida para o hospital. Tinha entrado na emergência, mas estava na ala... na ala B. Pediu que alguém da família viesse, mas minha mãe, viemos hoje, não, ontem aqui no hospital com ela. Não queria que ela se preocupasse, ela está com problema de pressão, então eu vim." Respondeu com voz trêmula, às vezes gaguejando, mas tentando dar todas as informações.

Samira lhe deu um sorriso compreensivo acenou, voltando-se para o computador e começando a digitar "Você veio sozinho? Está de carro?" Perguntou enquanto colocava as informações de Luciene Dimar no sistema.

O ideal era manter a mente de Matheus ocupada respondendo perguntas fáceis, isso daria mais segurança a ele, diminuindo o sentimento de 'não há nada que possa fazer', que normalmente é o que gera a sensação de pânico

"Sim, mas vim com um amigo." Sua voz estava se estabilizando. Começou a respirar mais lentamente, prestando atenção em Samira na expectativa que ela encontrasse sua irmã.

"Entendi. Você fez bem." Sorriu gentilmente, se virando para ele e tocando levemente no seu ombro, acenando com a cabeça para que ele visse que ia dar tudo certo. "Encontrei a ficha de sua irmã. Ela está bem. Não precisou fazer nenhum procedimento cirúrgico, mas está recebendo uma transfusão de sangue" O rosto de Matheus que tinha relaxado quando ouviu que Luciene estava bem, congelou novamente.

Vendo a reação dele, a recepcionista emendou, olhando nos olhos escuros do jovem do outro lado "Não se preocupe. Ela está no quarto e está sendo acompanhada pelo doutor Francisco. Ele é um ótimo médico aqui no hospital."

"Ah, sim. Foi ele que nos atendeu ontem." Suspirou tentando se acalmar. O dr. Francisco pareceu ser um médico confiável. Até sua mãe, que é uma pessoa difícil de agradar, achou o doutor simpático e competente.

"Então já sabe que ela está em boas mãos"

"Sim" Matheus coçou a cabeça com um sorriso sem graça. Sua irmã vai ficar bem, eles iam ficar bem.

A porta da entrada se abriu novamente, e a recepcionista viu um jovem mais velho que Matheus entrar. Ele era alto, pele morena clara, cabelo castanho escuro um pouco curto, mais alto em cima com leves ondas nas pontas, tinha um rosto bonito apesar de parecer cansado e seus olhos cor de mel se sobressaiam mesmo com as sobrancelhas franzidas. Será que ele tem namorada?

A simpática recepcionista, que neste momento estava secando seu já possível pretendente, colocou seu mais belo sorriso, gentil e encantador, mas sem ser vulgar ou atirado para não dar na cara sua intenção.

"Matheus, não era pra sair correndo na frente desse jeito! Não me preocupe você também, já me basta aquela cabeça dura pra tirar meu sono!" Suspirou o jovem se aproximando, balançando a cabeça.

A voz dele era bonita também, um tanto grave, rouca talvez. Estava irritado, mas estava cheia de preocupação. Mas como assim 'tira o sono'? Talvez ele seja namorado da Luciene? Mas pode ser que não, e seja só por hoje? Vamos ver... "Olá, você é o amigo de Matheus e Luciene?" Talvez Samira tenha sido muito incisiva perguntando se o outro era amigo da irmã de Matheus tão diretamente, mas era uma oportunidade boa demais para perder.

"Ah, desculpe. Boa noite." Disse um tanto sem graça "Pode-se dizer assim. Sou amigo da família. Cuido desse aqui desde que usava fraudas" Ele riu da expressão de Matheus que parecia pronto para lhe esfaquear, enquanto ficava com suas bochechas vermelhas.

"Informação desnecessária, Rodrigo. E nem faz tanto tempo assim." Matheus, que estava irritado, pisou no pé de Rodrigo com força, recebendo um tapa na atrás da cabeça. "Hey!"

"Já que está tão brincalhão, suponho que Lu está bem, sim?" Rodrigo levantou a sobrancelha de forma questionadora.

Lu? Eles se tratam por apelidos porque são amigos de infância? "Sim, ela está bem. Está em tratamento na ala B, setor amarelo." Samira falou olhando diretamente nos olhos de Rodrigo, cheia de intenção no olhar e se inclinando levemente sobre o balcão, mais perto dos dois em pé, apontou para a direita, direção que estaria a ala B.

Infelizmente para ela, Rodrigo parecia não estar ciente dessa intenção, e perguntou logo em seguida se poderiam ver Luciene no quarto onde ela estava.

Matheus percebeu o que estava acontecendo e olhava curioso entre os dois na dúvida se devia falar alguma coisa ou apenas ignorar. Pobre jovem, teria mais futuro ao tentar paquerar com uma pedra do que com esse daí. Pensou lembrando de como Rodrigo era a pessoa mais densa que conhecia.

"Como está fora do horário de visita vocês não podem entrar no quarto, mas podem falar com médico e ele explicará a situação e dará melhores orientações" Samira mexeu no cabelo significantemente esperando alguma reação ou olhar de Rodrigo, mas nada aconteceu.

"Certo, muito obrigado" Rodrigo sorriu e com um aceno de cabeça começou a se dirigir na direção que ela indicava.

Momentaneamente surpresa, Samira falou rápido, antes que ele pudesse se afastar mais. "Tem algumas informações que precisamos sobre a paciente." Se eles saíssem assim, talvez ela nunca mais conseguiria falar com Rodrigo dessa forma. Precisava de mais tempo para conseguir pelo menos um sobrenome para procurar no Instogran.

Rodrigo se voltou para ela com um 'Oh' e pensou por um momento antes de dizer com expressão inocente. "É a parte burocrática para internação, certo? Vou falar com a responsável da ala enquanto Matheus fala com o médico. Não precisa se preocupar com isso" Sorriu com uma expressão confiante. "Obrigada por tudo, tenha uma boa noite!" Com um aceno de cabeça, chamou Matheus para que o seguisse.

Vendo Rodrigo se afastar, Matheus disse baixinho para que apenas Samara escutasse "Ele é um idiota, você é bonita e simpática, consegue coisa melhor!" Juntou os braços como se desejasse força para ela que o olhou boquiaberta "Tchau Samira, obrigada por tudo!" Acenou rapidamente e correu atrás de Rodrigo que já estava virando na esquina do corredor seguinte.

Agora sozinha na recepção, Samara bateu as mãos nas bochechas com um estalo "Ahhhh, por quê que isso só me acontece, meu Deus?" Abaixou a cabeça entre as pernas segurando na borda do balcão. Seu rosto estava vermelho de vergonha por ser incentivada tão abertamente por um garoto, mas seu sorriso era divertido. Espero encontrar alguém com sua sinceridade, jovem Matheus.

Aquela noite seria agitada para a imaginação da amável recepcionista.