Após a batalha, o silêncio voltou a dominar a floresta, mas não de forma tranquila. As árvores ao redor pareciam respirar com uma energia mais densa, como se a luta tivesse deixado uma marca invisível no ambiente. Aery olhou para Leo, ainda com a adrenalina da batalha circulando pelo corpo, e sentiu uma mistura de respeito e uma curiosidade crescente.
— Vamos seguir? — Ela perguntou, tentando quebrar o gelo, seu tom mais leve do que o usual, como se tentasse desarmar a tensão que ainda flutuava entre eles.
Leo, ainda com o olhar fixo nas sombras ao redor, deu um aceno curto com a cabeça.
— Temos que ir. As criaturas não apareceram por acaso. Algo mais está acontecendo aqui. — Sua voz estava mais grave agora, e Aery percebeu que ele estava mais cauteloso do que parecia inicialmente.
Aery assentiu, mas não se afastou imediatamente. Ela ainda estava fascinada com a facilidade com que Leo havia lutado, com a forma como ele parecia ser tão imponente e ao mesmo tempo calculista. Não era um guerreiro qualquer, e ela sabia que havia muito mais nele do que ele queria mostrar.
— Você sempre é tão reservado assim, Leo? — Ela perguntou, com um sorriso travesso, tentando arrancar um pouco mais da sua fachada de indiferença.
Leo olhou para ela, seus olhos dourados brilhando sob a luz fraca da floresta.
— Você fala demais, branquinha. — Ele respondeu seco, mas havia algo mais suave em sua resposta, uma pitada de divertimento que ele não tentava esconder.
Aery sorriu, sabendo que ele estava começando a se soltar, mesmo que fosse apenas um pouco. Ela o acompanhou enquanto ele avançava pelo terreno acidentado, com passos largos e firmes.
O clima estava pesado, e a sensação de que algo mais sombrio se aproximava não saía da cabeça de Aery. As criaturas que haviam enfrentado não eram comuns, e ela sabia que havia algo mais por trás disso. Mesmo que Leo fosse o tipo de pessoa que gostava de agir sozinho, ela sentia que ele compartilhava com ela, mesmo que minimamente, o desejo de desvendar o mistério.
Eles seguiram por horas, com Aery usando sua magia para iluminar o caminho em áreas mais escuras e Leo protegendo-a de qualquer outra ameaça que surgisse. O silêncio entre eles era confortável agora, como se ambos soubessem que, por mais que fossem diferentes, suas habilidades estavam perfeitamente alinhadas.
Enquanto caminhavam, Aery finalmente falou, quebrando o silêncio.
— Eu não entendo. Por que você não gosta dos elfos brancos? — Sua pergunta veio direta, sem rodeios, mas cheia de curiosidade genuína.
Leo olhou para ela, com um olhar que parecia querer medir a profundidade da pergunta. Ele não estava pronto para revelar tudo, mas uma parte dele queria. Algo em Aery, talvez sua inocência ou a forma como ela parecia desarmá-lo com suas palavras, o fazia considerar dizer mais.
— Porque vocês se acham superiores. — Ele respondeu com uma frieza calculada. — Sempre com esse sorriso no rosto, como se nada no mundo pudesse te ferir. Vocês vivem em suas torres douradas enquanto o mundo lá fora queima.
Aery sentiu o peso das palavras, mas não se deixou abalar. Ela sabia que Leo estava sendo impulsivo, repleto de rancor, mas também percebia que sua visão estava distorcida por algo maior. Ela não ia deixá-lo se esconder por muito tempo.
— Acho que você está errado, Leo. Nem todos os elfos brancos são assim. Eu, por exemplo, só quero ver o mundo. Eu quero mudar as coisas. — Ela disse com um brilho nos olhos, a chama de sua determinação visível.
Leo olhou para ela com uma mistura de surpresa e ceticismo.
— Mudar? — Ele riu baixinho, com desdém. — Acha que uma elfa branca como você vai mudar alguma coisa?
Aery se aproximou dele, decidida.
— Acredite, posso ser mais do que uma "elfa branca". — Ela disse, seu tom firme. — Agora, se não se importar, podemos continuar nossa jornada. Eu não sou fã de monólogos.
Leo a observou por um momento, seu olhar fixo e analisador. Algo no comportamento de Aery o desarmava de maneira que ele não sabia explicar. Ele suspirou, dando um passo à frente.
— Vamos. E fique longe das criaturas... ou você pode acabar se tornando parte delas. — Ele disse, seu tom mais baixo, mas com um toque de preocupação que ele não tentou esconder totalmente.
Aery o seguiu, sorrindo para si mesma, sabendo que, apesar das provocações, havia algo mais entre eles. Algo que, se eles não tomassem cuidado, poderia virar algo muito mais forte.
A caminhada continuou por mais algumas horas, o som de suas botas se misturando ao leve farfalhar das folhas secas que cobriam o chão da floresta. O clima, que antes parecia tranquilo, estava agora mais denso. Aery podia sentir uma pressão crescente no ar, algo que fazia seus sentidos ficarem alerta. Leo, sempre em sua postura rígida, parecia tão atento quanto ela, mas não deixava transparecer o que pensava.
De repente, a luz mágica que Aery conjurava para iluminar o caminho começou a enfraquecer. A árvore ao lado dela, com seu tronco coberto de musgo, parecia absorver a energia da floresta de maneira incomum.
— Isso não está certo. — Aery murmurou, com a testa franzida, olhando para Leo.
— Aconteceu alguma coisa com sua magia? — Leo perguntou, seus olhos dourados fixos na floresta à frente, em alerta.
— Não sei... — Aery respondeu, desconfortável com a sensação crescente de que algo os observava. Ela tentou aumentar a intensidade da luz de sua magia, mas não conseguiu. Algo estava bloqueando sua energia. — Alguma coisa está interferindo. Algo... sombrio.
Antes que ela pudesse reagir, uma sombra se moveu rapidamente entre as árvores, e uma risada baixa, quase um sussurro, cortou o ar. Leo imediatamente sacou sua espada pesada, a lâmina reluzindo à luz da magia de Aery.
— Nosso descanso acabou. — Ele disse com uma voz grave, já preparado para o que quer que fosse se aproximando.
De repente, uma série de formas grotescas e distorcidas emergiram das sombras, criaturas de aparência alienígena, com peles escuras e olhos brilhando com uma luz maligna. Seus corpos estavam deformados, como se fossem vítimas de algum tipo de magia corrompida.
— Criaturas corrompidas pela magia negra... — Leo grunhiu, reconhecendo a origem das criaturas com um olhar sombrio.
Aery, por sua vez, não hesitou. Suas mãos se elevaram, conjurando uma barreira de luz, mas sentiu a resistência da magia, a dificuldade crescente de controlar seu poder. As criaturas, no entanto, não pareciam ser afetadas por sua luz como ela esperava. Elas avançaram, rápidas e implacáveis, com garras afiadas e dentes vorazes.
— Acho que vou precisar de ajuda. — Aery disse, olhando para Leo, sua voz mais tensa do que o habitual.
Leo sorriu em diversão, seus olhos brilharam com uma feroz determinação.
— Eu já estava esperando por isso. — Ele disse, antes de avançar com um movimento rápido e mortal, sua espada cortando uma das criaturas com facilidade. — Você cuida das que estão na sua frente, eu cuido das minhas.
Com um aceno de cabeça, Aery se posicionou, focando em sua magia para conter as criaturas que se aproximavam. Ela tentou usar feitiços de luz e proteção, mas a corrupção parecia anular parte de seu poder. Mesmo assim, ela se manteve firme, conjurando raios de energia para explodir em chamas puras, queimando as criaturas que ousavam se aproximar.
Leo estava imbatível, seu estilo de combate brutal e eficiente. Ele usava sua espada com precisão, cortando as criaturas que surgiam em seu caminho com facilidade, mas Aery sabia que isso não duraria por muito tempo. Eles estavam em desvantagem, o número das criaturas era grande, e a cada momento mais surgiam das sombras.
— Aery, precisamos sair daqui! — Leo gritou, lutando ao lado dela, mas claramente preocupado com a situação.
Aery balançou a cabeça, seu olhar determinado.
— Não podemos. Eu... eu não posso deixá-los fazer isso com a floresta. — Ela se concentrou mais uma vez, sua magia agora lutando contra a resistência da escuridão. Um brilho intenso surgiu de seus dedos, envolvendo as criaturas em uma explosão de luz. Algumas recuaram, mas outras se tornaram mais agressivas, atraídas pela magia da elfa.
Leo, vendo o desgaste da magia de Aery, fez algo inesperado. Ele avançou, se colocando entre ela e as criaturas, usando seu corpo como escudo. Seu rosto estava impassível, mas Aery podia ver a tensão em seus olhos dourados.
— Você vai me fazer proteger você? — Ele disse, com um leve sorriso de escárnio, embora sua expressão revelasse a seriedade da situação.
Aery, sem perder tempo, conjurou uma poderosa barreira de luz ao redor de Leo e dela, impedindo que mais criaturas se aproximassem. Ela então usou toda sua força para amplificar sua magia, criando um campo luminoso ao redor deles, que fez as criaturas gritarem de dor e recuar, dando tempo para o elfo cortá-las ao meio.
Quando o último grito ecoou na floresta, o silêncio voltou. Aery e Leo estavam exaustos, suados e sujos pela batalha, mas aliviados por estarem vivos.
— Impressionante. — Leo disse, virando-se para Aery com um olhar calculador. — Você não é como pensei.
Aery, ofegante e com um sorriso cansado, respondeu:
— E você, Leo... não é tão ruim assim também.
O campo de luz ao redor deles desapareceu lentamente, e o sol, embora fraco, começou a se pôr no horizonte, tingindo o céu com tons laranja e dourado. A jornada deles estava apenas começando, e, apesar das diferenças, ambos sabiam que algo mais estava se formando entre eles — algo mais forte do que a simples rivalidade.
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