A revelação de Dante reverberava na mente de Kaia como um trovão. A cada passo que ela dava pelas ruas desertas daquela cidade conhecida, mas desolada, sua mente era invadida por memórias e dúvidas. Como poderia seu irmão, uma pessoa normal em sua vida, ser a fonte de uma distorção multiversal tão imensa?
Ela olhava para ele enquanto caminhavam juntos. Dante parecia... diferente. Havia um cansaço em seus olhos, como se carregasse o peso de todas as versões de si mesmo, como se, a cada segundo, ele fosse tragado pelas consciências fragmentadas que vinham à tona.
"Como... como isso aconteceu, Dante?" Kaia perguntou, tentando manter a calma na voz. "Você nunca esteve envolvido com as viagens dimensionais. Como você é a anomalia?"
Dante parou, seu olhar vagando para o céu nublado. A chuva fina molhava seus cabelos, mas ele parecia alheio a tudo ao seu redor.
"Eu também não entendo completamente," ele disse, sua voz um sussurro pesado de cansaço. "Tudo começou como um sonho... ou pelo menos eu pensei que fosse. Mas logo percebi que estava acordado dentro de outras versões de mim mesmo. Em uma realidade, eu era um soldado lutando contra máquinas, em outra, um cientista que decifrou os segredos da existência. Eu... senti todas as suas dores, seus medos, suas vidas. E então... elas começaram a se fundir."
Kaia sentiu um calafrio percorrer sua espinha. Era como se seu irmão estivesse à beira de um abismo infinito, onde cada versão dele competia para tomar o controle.
"E agora?" ela sussurrou. "O que acontece se isso continuar?"
Dante se virou para ela, seus olhos profundos, cheios de uma dor que ela não conseguia compreender por completo.
"Se não conseguirmos deter isso, todas as realidades vão colapsar," ele disse, sua voz vacilando. "O multiverso inteiro será destruído, e todos os Dantes, em todas as realidades, irão se tornar uma única entidade... uma anomalia que não deveria existir."
A gravidade da situação finalmente começou a pesar sobre Kaia. Seu irmão não era apenas uma vítima. Ele era o epicentro de uma catástrofe de proporções inimagináveis.
Eles continuaram caminhando, em silêncio. O som de seus passos na água acumulada ecoava como um lembrete do vazio ao redor deles. A cidade que uma vez estivera viva, agora era apenas uma sombra congelada no tempo, uma lembrança do que foi.
"Há uma saída," Dante disse de repente, quebrando o silêncio.
Kaia o olhou, com o coração acelerando. "O que você quer dizer?"
Ele parou diante de um prédio familiar – o antigo laboratório do Nexus, o local onde Kaia havia sido treinada. Era uma ironia cruel estar ali novamente.
"Dentro da minha mente, nas profundezas da consciência onde as realidades se encontram, há uma entidade," Dante explicou, sem olhar para ela. "Ela está tentando se libertar, usando todas as versões de mim para se tornar algo muito pior. Se a enfrentarmos... se pudermos destruir essa entidade, há uma chance de salvar todas as realidades."
Kaia sentiu um peso em suas palavras. Era uma missão suicida. Mergulhar dentro da mente de Dante, onde todas as suas versões estavam colapsando, e enfrentar uma força desconhecida e terrível? Mas havia outra opção?
Ela olhou para seu irmão. Ele parecia perdido, mas também determinado. Kaia não podia abandonar Dante. Não agora.
"E se falharmos?" ela perguntou.
Dante sorriu tristemente. "Então, não haverá mais multiverso para falhar."
Ela olhou para a entrada do laboratório, a porta enferrujada e entreaberta, um convite para uma jornada sem garantias. Cada fibra do seu ser gritava que aquilo era insano, que o risco era inaceitável. Mas a verdade nua e crua estava diante dela: seu irmão precisava dela. E além disso, o destino de milhões de mundos dependia dessa decisão.
Kaia respirou fundo. "Vamos fazer isso."