Chapter 32 - Confiança

Kowalsk foi o primeiro a responder:

— Gostei muito da sua história, Senhor Kaminski. No entanto, sou um intruso neste lugar e tudo o que desejo é sair daqui. Acho que minha resposta não vai ajudar muito, pois sempre trabalhei sozinho, ou quase sempre. Mas, diante de tudo o que o senhor contou, se quiser me acompanhar depois que eu sair daqui, será muito bem-vindo.

Gareno foi o segundo a se pronunciar:

— Pois bem, Senhor Kaminski, a primeira coisa que aprendi com meus superiores é que na vida ou na guerra a confiança não se adquire do dia para a noite, mas se conquista dia após dia. Estou disposto a dar esse voto de confiança ao senhor. Mas meu companheiro já disse, e eu faço das palavras dele as minhas. Não estou no comando deste grupo e também não quero ficar aqui.

Thilláila também queria dizer algo, mas chorava tanto que quase não conseguia:

— Por mim, o senhor pode ficar, Senhor Kaminski. Mas eu também não sou a chefe deste grupo e nem mesmo sei para onde vou. Sendo assim, como posso pedir que o senhor me acompanhe? No entanto, agora com você, eu quero ter uma conversinha, Senhor Kowalsk.

Kowalsk se virou para Thilláila, pronto para receber uma bronca, que ele sequer iria se importar.

— Que o senhor não quer ficar aqui, isso não é novidade para ninguém. Provavelmente é o desejo de todos aqui. Você também diz que não é o chefe deste pequeno e estranho grupo. Sem problema algum, apesar de achar que o senhor seria o mais qualificado para isso. Agora, convidar apenas o Senhor Kaminski para acompanhá-lo... Sem querer ofendê-lo, mas para mim isso é um grande insulto a todos os demais.

Após uma pequena pausa e olhando a reação de todos, Thilláila continuou:

— O que pensa que vai fazer? Para onde vai? Por que não fica conosco ou vamos todos juntos? Você seria o chefe do grupo, e acredito que nossas chances de sobrevivência diante de tudo isso que está acontecendo aumentariam muito. O que acha? Diga que sim... Por favor!

Gareno deu uma olhada de lado para ela, mas, por fim, acabou concordando.

— É verdade, Kowalsk! Sou obrigado a concordar com Thilláila. O que me diz? Eu não acho que, neste mundo com dragões, você irá encontrar uma oferta melhor.

Após quase dois minutos de silêncio, Kowalsk respondeu:

— Bem... Eu aceito, mas com três condições.

Respondeu Kowalsk com ar bem sério.

— Primeiro, que vocês nunca digam que foi minha culpa por ser o chefe de vocês, independentemente do que aconteça. Mas, se for minha culpa, deixem que eu me pronuncie e assuma o erro. Entenderam?

Todos concordaram, acenando com a cabeça.

— Segundo, não discutam sobre minhas ordens no quesito sobrevivência. Estou na ativa desde o início deste pesadelo de seres humanos versus dragões. Sei que parece ser uma guerra perdida, mas, se sobrevivi tanto tempo sozinho, acredito que posso fazer com que sobrevivam também. Assim como acredito que existem muitos sobreviventes escondidos por aí.

Após mais um minuto de pausa, todos perguntaram a Kowalsk:

— E qual seria a terceira condição?

— Isso é bem óbvio. Quanto e quando será meu pagamento?

Todos riram e deram tapinhas nas costas de Kowalsk, que percebeu apenas um integrante daquele grupo tristonho, cabisbaixo, como se estivesse condenado a ficar sozinho pelo resto de sua vida.

— Eu sei que a Thilláila iria me criticar muito se eu não fizesse isso... Então pode vir com a gente também, se quiser, é claro.

— E com quem você está falando? — Perguntaram todos.

— Eu não acredito que vocês já esqueceram do Troy.

Respondeu Kowalsk enquanto pulava nas costas do dragão que parecia entender tudo o que estava acontecendo. Todos estavam felizes, sorrindo, exceto o Senhor Kaminski.

— Não se preocupe com isso, Senhor Kaminski, eu entendo. Afinal de contas, nem mesmo sabemos quanto tempo o senhor ficou prisioneiro dentro de Troy. Ele também já tentou me matar, me arranhou um pouco e só não acabou comigo por causa do meu parceiro Gareno. Mas eu já o perdoei. Naquela luta contra os dragões, ninguém viu, mas ele impediu que eu fosse massacrado pelos dragões menores. Quem sabe Troy ainda pode fazer algo de bom para o senhor. Afinal, não foi o senhor mesmo que disse que toda vida é importante?

— Toda vida humana, meu filho... Não a de um dragão. — Respondeu o Senhor Kaminski, um tanto sério.

A procura por equipamentos

O grupo estava eufórico, mas Kowalsk chamou a atenção para um importante detalhe. A menos que todos saíssem daquele lugar em 24 horas, ninguém suportaria o cheiro das carcaças daqueles bichos mortos. Isso sem contar a grande quantidade de moscas que estariam não só sobre as carcaças, mas incomodando a todos eles sem exceção.

Thilláila foi a primeira a concordar imediatamente com Kowalsk:

— O senhor Kowalsk tem toda a razão, logo esse lugar estará fedendo tanto que ninguém vai suportar o mau cheiro.

— Mas como iremos tirar todas essas carcaças daqui? Seria preciso um guindaste ou um trator para removê-las — observou o senhor Kaminski.

— E o que vocês acham de explorarmos ainda mais este local? Talvez a gente encontre alguma coisa que possa nos ajudar — sugeriu Gareno.

— Por acaso você sabe de algo que não sabemos? — perguntou Kowalsk, desconfiado.

— Não tenho certeza, velho soldado. Como mais que uma cobaia deste lugar, eu fui prisioneiro, mas tenho uma grande desconfiança de que existe muita coisa por aqui que possa nos ajudar.

— Então vamos logo, Gareno. Quanto mais rápido encontrarmos algo que nos ajude, mais rápido nos livraremos dessa futura carniça.

Segundos depois, todos estavam seguindo rumo à saída, e até mesmo Troy, o dragão, parecia animado com a exploração. Seguiam caminhando por mais ou menos trezentos metros à frente no extenso corredor, que mantinha suas luzes sombrias quase apagadas, mas ainda assim claras o suficiente para que todos se sentissem seguros.

— Qual seria o verdadeiro motivo para que de repente mudasse de ideia e não mais quisesse ir embora, senhor Kowalsk? Eu sei que minha choradeira e a opinião dos demais não o convenceriam ao contrário se estivesse mesmo decidido a nos deixar — perguntou Thilláila, sempre ao lado do velho soldado.

— Quando eu estava sozinho e em fuga, depois de todo o ocorrido que me trouxe para cá, aqui pareceu-me um bom lugar para eu me refugiar por um breve período até as coisas se acalmarem um pouco para mim. Certamente que depois eu seguiria o meu destino sozinho.

— E qual era exatamente o seu destino, soldado Kowalsk? — perguntou Gareno, apressando o passo para acompanhá-lo.

— Na verdade, Gareno, eu não tenho um destino certo. Ou pelo menos eu não tinha nenhum lugar em mente. E eu só cheguei aqui por um acaso do destino ou falta de sorte.

— Se importaria de nos contar esse acaso do destino, senhor Kowalsk? — perguntou o senhor Kaminski, extremamente curioso, assim como todos os demais.

— De maneira alguma. Eu estava próximo daqui observando o comportamento dos dragões, pois sabia que para derrotá-los algum dia, eu teria que saber tudo sobre eles. Mas o que eu não sabia era que também eu estava sendo observado.

— E quem estava observando-o, senhor Kowalsk?

— É só olhar para o último da fila e saberão.

Foi como um reflexo puro de todos, e até mesmo Troy, vendo que olhavam para trás, não resistiu e olhou também, procurando uma possível ameaça que estaria a poucos metros de seu ataque feroz.

— O que você está procurando, Troy? O senhor Kowalsk está falando de você mesmo — disse Thilláila, se aproximando do dragão para fazer um afago.

— Agora vamos todos em silêncio, pois já chegamos à comporta número um. Gareno, procure o gerador reserva deste setor e, quando encontrá-lo, ligue-o. Thilláila, por favor, encontre o painel de controle que nos dê acesso a esta comporta, e o senhor Kaminski, procure por qualquer coisa que possa parecer um dispositivo de defesa: canos de aço embutidos na parede ou buracos igualmente suspeitos. E quanto a você, Troy, mantenha-se alerta para um eventual ataque de dragões que possa acontecer.

No momento, todos acharam que Kowalsk estava delirando ao expressar aquelas ordens para o dragão. E qual foi a surpresa de todos ao perceberem que Troy estava fazendo exatamente como Kowalsk havia ordenado. Não se passaram nem sequer dois minutos quando um pequeno rufar de asas surpreendeu a todos. Dois pequenos dragões, do tamanho aproximado de um lobo, adentraram pela abertura forjada pelo antigo peso de Troy de algumas horas atrás.

— Não percam o foco, pessoal. Por isso posicionei Troy em modo de defesa. Dessa maneira ele dá conta do recado e detém o ataque dessas pequenas crias de dragão.

E parecia que dava mesmo. Numa rápida abocanhada, Troy impediu que um dos pequenos dragões efetuasse qualquer ataque. E em seguida, o maior barulho que se podia ouvir era o estalido de ossos na boca de Troy, que se repetiram assim que ele imobilizou sua primeira presa. Em menos de dois minutos, ele havia derrotado duas pequenas feras famintas, que, ainda vivas, olhavam surpresas para ele, com a certeza de que o segundo ataque de sua matilha não seria apenas mais brutal, mas que certamente não sobreviveriam.