Mais um domingo, dia que para muitos é um dia de descanso e comunhão em família. Clara e Jonas, estavam ainda dormindo, com seus respectivos travesseiros "encharcados" de baba. Clara do nada desperta, aparentemente de um sonho bem impactante e diz em voz alta — Deus ama vocês! Jonas, ainda babando e sem ter a exata noção se estava na realidade ou na "fantasia" de seus sonhos, levantou-se lentamente. — Escutou alguma coisa? — perguntou ele. Clara, ao dizer que havia sido ela, se levantou, ainda impactada com o sonho que tivera e foi preparar o café da manhã. Ele, ao deitar-se novamente, voltou a dormir.
Alguns minutos depois Clara exclama: — Acorda seu preguiçoso! O café está pronto! Jonas, desperta e se levanta de forma demasiadamente veloz, pois, sabia a esposa que tinha. — Tive um sonho muito louco! Nele eu ouvia uma voz dizendo: Deus ama vocês— disse Jonas. — Foi eu, cabeção! — retrucou Clara. Ela tinha em suas mãos duas canecas de café consideravelmente cheias e quentes, pensando seriamente em entornar uma delas, ou até mesmo as duas em Jonas, quão grande era a sua falta de paciência matinal. — Hehe, eu estava te testando! — disse Jonas com medo do rosto avermelhado de sua esposa.
Após o café da manhã, Jonas pediu que ela lhe contasse o sonho que havia tido. Então, Clara começou a contar; nele, ela estava em um lugar onde havia muita destruição, onde o caos era tudo o que havia, o céu estava estranho (uma mistura de roxo com cinza), como nunca havia visto antes. Se sentindo assustada, ela olhava para os lados e via pessoas chorando, feridas e desesperadas, o desespero era tanto que ela não conseguia raciocinar direito, quão grande e quão forte era o lamento daquelas pessoas. Um pouco mais adiante, após uma pequena caminhada sem rumo, ela viu um homem que se destacava dos demais, ele vestia uma blusa branca simples e uma calça jeans surrada, já em seus últimos dias, ela pôde observar também que ele estava descalço, caminhando em uma rua cheia de entulhos, porém, isso não o impedia de prosseguir. Se aproximando mais, ela viu que ele ajudava as pessoas que estavam caídas, as ajudava a se levantar, se limpar, as consolava, dava um abraço bem apertado e, por fim, sussurrava algo em seus ouvidos, que parecia ser uma espécie de ensinamento ou orientação.
Vendo as atitudes daquele homem, até mesmo Clara que observava cada vez mais de perto, sentia paz e consolo. — Quem é este homem? — Se perguntava Clara em voz alta. Ao se aproximar cada vez mais, ela via que todos os que eram consolados por ele, passavam a segui-lo. O homem, prosseguia ajudando a todos os que necessitavam de consolo, ela o seguia também e em quanto isso cada vez mais pessoas se juntavam a eles. De repente, esse homem parou e começou a observar algo que ocorria mais adiante, ela tentou ver o que chamava a atenção dele e conseguiu enxergar apenas mais pessoas caídas e se lamentando, só que desta vez com muito mais fervor e sofrimento.
Aquele homem, depois de aproximadamente 7 minutos parado, começou a correr em alta velocidade em direção aquelas pessoas, enquanto a multidão de pessoas que ele já havia resgatado o seguiam. — Deus ama vocês! Deus ama vocês! — Exclamava ele enquanto corria. Clara, por sua vez, corria tentando alcançá-lo e ao chegar mais perto viu que aqueles que estavam no chão, estavam sendo amparados por outras pessoas, com isso, percebeu que aquele homem exclamava em alta voz, apontando para aqueles que ajudavam o próximo e não para os que estavam caídos. — Deus ama vocês! Foi a última coisa que ouviu Clara antes de despertar dizendo a mesma frase.
Jonas, ficou impressionado ao ouvir o sonho de Clara e juntos tiveram a mesma interpretação. Aquele Homem era Jesus Cristo, sempre pronto para estender a mão aqueles que precisam e o mundo caótico representava o mundo em que viviam, com diversas pessoas desesperadas, como se estivessem em um buraco fundo e escuro, a procura de uma saída, em busca da luz que há na superfície. Jesus, está acima desse buraco escuro, Ele é a Luz que as pessoas procuram em meio a toda essa escuridão. Já aqueles, que o Homem observava ajudando o próximo, são os cristãos com os quais Ele conta e que usa como uma corda para ajudar o necessitado a sair desse buraco fundo e escuro, enquanto ainda houver tempo.
Clara e Jonas eram cristãos, ela diaconisa e ele cantor da igreja. Na correria, eles se arrumavam para ir á mais um culto de domingo à noite, pois acabaram perdendo a noção do tempo assistindo TV. Clara se arrumava já há 45 minutos, enquanto Jonas ainda assistia ao jogo de futebol de seu time. Quando percebeu que só faltava para ela pentear o cabelo e passar um batom, ele começou a se arrumar e um pouco mais de 5 minutos depois já estava pronto, ao mesmo tempo que ela.
Atrasados, foram eles correndo pra igreja, a pressa era tão grande que Jonas esqueceu de levar sua bíblia sagrada e quando chegaram no carro, Clara perguntou: — Amor, onde está a sua bíblia? — Esqueci! — respondeu Jonas. — Você não vai buscar? — Não precisa, com certeza vão pregar as mesmas coisas de sempre.
A igreja, ficava a poucos minutos de carro e chegando lá, já estava no momento do louvor (música inicial), Clara sentou-se em um dos bancos e Jonas correu para perto dos outros cantores, pois, já havia um microfone separado para ele.
A segunda música era de responsabilidade dele, que por sinal havia chegado no exato momento de cantá-la. Ao se ajustar, Jonas contou aos membros da igreja, o sonho que sua esposa tivera, e logo após, cantou uma música que falava do amor de Jesus. A igreja (como um todo), se sentiu impactada quando ouviu sobre o sonho, muitos ficaram pensativos e outros louvavam a Deus de forma frenética, mas, o que a igreja não sabia é que Jonas não era um bom exemplo de cristão e muito menos tinha amor ao próximo.
Jonas, tinha muito talento, sua voz era linda, diferente e autêntica. Ele cantava na igreja desde criança, encorajado por seus pais, que o puseram para fazer aula de canto e teclado desde cedo. Quando chegou a adolescência, ele passou a ter uma grande ambição e obsessão em ser um cantor famoso. Seu pai, era pastor da Igreja, militar aposentado e dono de uma concessionária, ou seja, Jonas havia sido criado em berço evangélico e com certa comodidade finaceira, inclusive trabalhava com seu pai desde os 18 anos, em um ótimo cargo na empresa.
Ele, nunca se converteu de verdade, nem mesmo, em nenhum momento, chegou a aceitar e declarar Jesus como seu único e suficiente Salvador. Jonas era arrogante e metido, lá no fundo achava que por ser filho de pastor não precisava de toda essa "baboseira" de levantar as mãos, confessar e aceitar a Jesus em seu coração, seus pais por outro lado, nunca se atentaram para este fato, preocupavam-se demasiadamente com a igreja e tentavam compensar fazendo as vontades do filho, muito mais a sua mãe que o mimava mais do que o normal.
Ele se batizou cedo, não por sentir que era a hora certa, mas, por conta da influência de um interesse amoroso. No ato do batismo, ele não chegou a declarar publicamente sua fé em Jesus, seja por palavras ou sentimentos, apenas balançou a cabeça friamente, quando perguntado pelo seu pai - que foi quem o batizou - se ele declarava toda sua fé e amor em Jesus.
Da mesma forma, isto é, precocemente, foi seu enlace com Clara, ambos se casaram com 20 anos de idade e se não fosse pelos princípios dela - que também era cristã - ambos teriam sucumbido aos desejos da carne em meio ao namoro, muito mais ainda após o noivado, pois, Jonas ia investindo e insistindo cada vez mais, para que eles viessem a se relacionar sexualmente e isso os fez apressar a data do matrimônio.
Jonas, se apaixonou por Clara assim que a viu, enquanto ele cantava, ela entrava pela primeira vez na igreja; tímida, com cabelos escuros, pele branca e um olho que estava entre o castanho claro e o verde, sua única certeza naquele momento, era que dali em diante ela ocuparia um lugar muito importante em sua vida.
Eles, se casaram após 1 ano e 6 meses de namoro, antes que completassem 6 meses de noivado. Foi uma linda cerimônia na igreja, com todos os membros da mesma presentes, além, é claro, de seus familiares. O pai de Jonas, foi o pastor que os uniu em matrimônio e isso tornou tudo ainda mais bonito e emocionante, ainda melhor do que Clara havia imaginado, já Jonas só pensava em...
Consumado o casamento, literalmente, ou seja, após a lua de mel, tiveram muitas dificuldades no início de tudo, por conta do atrito de suas diferentes criações, algo comum no início de uma vida conjugal e que leva muitos a uma precoce separação. Jonas era muito mimado, não sabia fazer absolutamente nada e muito menos se esforçava para aprender, já Clara foi criada juntamente com sua irmã e ambas dividiam as tarefas domésticas com sua mãe. Ele não fazia nada em casa, nem mesmo lavar suas roupas íntimas e isso acabava à sobrecarregando. Em determinados momentos, ela não aguentava tanta apatia, o que causava constantes discussões entre eles.
Demorou um tempo, até chegarem a um consenso, graças a muitos conselhos paternos e pastorais, Jonas caiu em si, tomou vergonha na cara e passou a ajudar mais em tarefas domésticas, isso acabou os fazendo amadurecer tanto como pessoas, quanto como casal. Os 5 anos de casados, e o amadurecimento precoce de jovem para adulto, não fez Jonas mudar seu caráter, cada vez mais arrogante, amante apenas de si mesmo e de sua esposa, ele ia se afastando cada vez mais dos caminhos do Senhor, mesmo estando "tão próximo".
Após o término do culto, Jonas buscava chegar rápido em casa, pois, pela manhã do dia seguinte teria uma importante reunião com um representante de gravadora, que havia pedido que o enviasse um E-mail contendo suas músicas, ao ouvi-lo cantar na igreja. Isso representava um grande passo, era uma oportunidade que já não estava tão distante, mas, que se tornava cada vez mais palpável, isto é, a realização de seu sonho de adolescência, que era ser um cantor famoso, estava mais perto do que nunca.
Ele corria com o carro, que por sinal era lindo, com tudo o que tinha de mais moderno na atualidade, para chegar em casa o mais rápido possível, mas, quando estavam quase chegando em casa, ao parar para abrir a garagem, eles observaram que um carro preto havia parado em sua traseira e uma moto de cor vinho ao lado direito, os impedindo de ter qualquer tipo de reação. Saíram dois homens do carro preto, um deles armado e apontando a arma para o vidro do lado do motorista, já na moto, haviam dois homens e o que estava na garupa apontava a arma para o vidro, no lado do carona. — Perdeu, patrão! Pode ir saindo do carro agora! — disse o assaltante que apontava a arma na direção de Jonas. Clara, desesperada pegou sua bolsa, saiu do carro afobada e acabou tomando uma coronhada. Jonas, em estado de choque, ficou paralisado e foi retirado do carro de forma agressiva, sendo jogado no chão.
Os homens chutaram Jonas, antes de partirem levando o carro do casal, bastante machucado e revoltado, ele se levantou e exclamou em alta voz: — Seus marginais, espero que vocês morram, idiotas filhos da ...! Clara, lúcida e com o rosto levemente machucado, chamou um táxi para que fossem à delegacia. No caminho até lá, Jonas possesso de tanta raiva só fazia maldizer os ladrões, enquanto Clara, mesmo muito nervosa e abalada, tentava o deixar calmo da forma que podia. Algumas horas depois, feitos os procedimentos na delegacia, pediram outra condução para que pudessem ir pra casa.
Já era tarde, quando chegaram e após um banho calmante, foram logo se deitar, pois teriam apenas um pouco mais de 4 horas de sono. Como sempre, Clara chamou seu marido para orar de mãos dadas antes de dormirem. — Orar? Você tá de sacanagem, né? Não tenho nada pra agradecer ou pedir a Deus não. Vamos dormir, amanhã tenho que encontrar com o cara da gravadora e você vai visitar a sua mãe, o dia vai ser cheio, temos que acordar cedo. — disse Jonas revoltado. Clara, não concordando, porém, já conhecendo o temperamento de seu marido, se levantou, ajoelhou-se na beira da cama e orou. O cansaço era tão grande, que ela acabou dando um breve cochilo enquanto orava, ao despertar observou que Jonas já estava dormindo e tratou de fazer a mesma coisa.
Na manhã seguinte, após preparar o café da manhã pelo segundo dia seguido, Clara entrou no quarto e gritou: — Acorda, Jonas! Já são 7:00h, o despertador já tocou 2 vezes, vamos nos atrasar. Jonas, acordou assustado e preocupado em não perder o horário, o que significaria perder a oportunidade dos seus sonhos. A aflição era tanta, que ao terminar de tomar o café da manhã, ele ficou por 5 minutos procurando a chave de um carro que não tinha mais. — Está procurando o que? — perguntou Clara. — A chave do carro! — Que carro? — Não me estressa, Clara! — Exclamou ele ao lembrar que não tinha mais carro.
Mesmo tendo seu pai como dono de uma concessionária e podendo conseguir um carro com certa facilidade, a hora já era avançada e ele tinha que chegar na gravadora às 9:00h, com isso, após terminarem de se arrumar, eles acabaram pedindo um carro pelo aplicativo de celular. Atrasado e estressado, Jonas discutia com Clara por qualquer bobeira, tanto que acabou nem se despedindo quando o carro a deixou na rodoviária. Ela esperava por um beijo de despedida, mas ele estava ocupado mandando mensagens para o representante da gravadora, com isso, seguiu ela seu caminho, triste, mas já acostumada com o Jonas versão "pistola".
Após um pequeno engarrafamento diário, com um pouco mais meia hora de atraso, chegou ele ao prédio comercial onde se encontrava a gravadora, chateado, estressado, desnorteado e muito preocupado com a possibilidade de todo esforço com a gravação de suas músicas ter sido em vão. Ao chegar na recepção do prédio, o porteiro após ligar para a gravadora e confirmar os dados de Jonas, logo tratou de acalmá-lo, ao dizer que a secretária havia dito que a pessoa com a qual ele havia marcado a reunião, também estava atrasada e ainda não havia chegado. Após dar essa confortante informação a Jonas, o porteiro pediu que ele fosse de encontro à secretária do Sr. João Oliveira no 8º andar, sala 807; essa notícia foi um alívio para ele, que pôde relaxar, ainda que por breves minutos.
Jonas, era um rapaz bonito, tinha 1,80 m, pele morena, cabelo curto com corte em dia e embora não fosse musculoso, tinha um corpo esbelto, com isso, inevitavelmente a secretária assim que o viu entrar pela porta se interessou por sua formosura. Ao atendê-lo, ela olhava para ele de forma cobiçosa e ao terminar, sem a menor vergonha, começou a puxar assunto. Após minutos de conversa e flerte com a secretária, Jonas acabou cedendo e até mesmo passou o seu número de telefone para a mesma, embora sua consciência lhe dissesse que era errado, a sua carne e seu ego falavam muito mais alto. De repente, o telefone tocou, assustando-os e interrompendo-os; o flerte entre os dois era tão grande, que ambos nem perceberam a chegada da pessoa a qual aguardavam. A secretária, pediu que ele se preparasse, pois, o recado dado no telefone era: "Peça para que o rapaz me aguarde no estúdio."