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Chapter 5 - Visões Premonitórias

Reid claramente sabia que estava havendo tantas coincidências com o "sonho" que tivera, coisa que nunca lhe aconteceu antes, ao ponto de estranhar, além de seu olho ter mudado enigmaticamente sem notar nada. Até que ponto era real ou não aquele sonho incomodava o rapaz, pois, se estava prescrito tudo que ocorreu até agora, poderia estar garantido o caos que aconteceria. Logicamente, não comentou nada com Rebecca, precisando de mais provas para entender em qual situação estava. Pensando tanto no assunto, o tempo que o professor dera aos alunos havia-se esgotado, levantando de sua mesa e dizendo:

— Classes... de... Anomalias... — falava Nolan. — Por que precisamos classificar seres que claramente não fazem parte da nossa realidade? Nem todas as Anomalias são monstros insensíveis que causam destruição por onde passam; mas ainda são seres perigosíssimos...

"A frase está... igual", pensou Reid. Cada palavra batia com aquelas que se lembrava, e, por conseguinte, olhou para a novata do canto da sala, acertando em cheio a pergunta que ela faria.

— Tem alguma forma de saber só de ver como uma Anomalia pode ser enquadrada?

Como esperado, professor Nolan lhe respondeu citando as classes das Anomalias como previsto: Barachiel, as bonançosas; Azazel, as impremeditadas; Leliel, as predadoras; e Zafiel, as descomunais. A mão de Reid tremeu e ele começou a suar frio. Suas pupilas, paralisadas, focando no nada, lembraram-no do que aconteceria horas depois. Mesmo não entendendo a situação em que estava, teve uma ideia quando saísse da aula, tentando agir normalmente até o horário do sinal. Todas as Anomalias que vira no caderno estavam quando as leu novamente. Todos os Espécimes que seu professor explicara também estavam nos slides, demarcando as mesmas imagens, textos, falas e até as pausas para respirar que Nolan fazia.

Dando o sinal do almoço e interrompendo a fala do professor quando falava do Espécime 8-9-9-4-9, Rebecca, com fome, foi perguntando a seu amigo:

— Ufa! Ainda bem que chegou a hora do almoço... 'Cê quer comer algo no Axe & Palm? Quem sabe encontramos a Veronica?

— Pode ser; mas preciso passar em um lugar antes, vou demorar uns dez minutinhos. Vai indo lá que eu te encontro, que tal?

— Saindo assim do nada... Vai encontrar ela, né??

— Quê?! — exclamou Reid, assustado com o pensamento da amiga. — Não, Becca, é uma coisa que esqueci de fazer cedo porque me atrasei.

— Hm... Ok, te espero então, não demora! — Quase saindo da sala, parou e voltou, abraçando Rebecca.

— Obrigado por ser minha amiga há tanto tempo...

— Ownt, 'tá carente? Fica assim não, 'cê sabe que te amo muito; mas foi bem espontâneo, não esperava — respondeu-lhe, dando um leve sorriso pelo abraço que recebera.

Enquanto passava pelas ruas até ir ao abrigo encontrar o chefe Karl Smith, decidiu que o avisaria previamente de que poderia haver uma mudança na trajetória do Espécime 2-0-0-9-1, já que sabia que os alarmes de aviso noticiariam tardiamente. Chegando ao abrigo e descendo algumas escadas até a sala onde os guardas ficavam, foi atendido pela recepcionista.

— Boa tarde, em que posso ajudá-lo?

— Boa tarde, gostaria de falar com o chefe de segurança, ele está?

— Poxa, ele acabou de sair para almoçar, deve fazer cinco minutos. Qual seu nome? É algo pessoal ou posso passar algum recado?

— Sou Reid Calhoun, e olha... — respondeu Reid. — Parece estranho; mas eu vi na TV que tem um Espécime vindo do mar, e estou com um mau pressentimento de que alguma coisa aconteça, entende?

Quando a recepcionista lhe responderia, a televisão ao fundo dos seguranças estava ligada no noticiário, o qual transmitiu a seguinte mensagem:

"Uma Anomalia do tipo Zafiel foi avistada ontem pela marinha americana a oeste de Seattle, seguindo para o sul. A Fundação se pronunciou que não se sabe qual o efeito da criatura, e acredita que seguirá fora do território americano se tudo ocorrer bem. As forças aéreas do Canadá foram ordenadas pela Fundação a seguirem a Anomalia. A marinha mexicana foi acionada pela Sede Leviatã para seguir atenta e ajudar no relatório da trajetória da Anomalia. Quaisquer outras informações serão ditas assim que possível."

Olhando estranhamente o jovem, a recepcionista perguntou ao garoto qual noticiário ele assistiu, uma vez que avisos de Anomalias eram noticiados somente nos jornais da tarde e da noite, próximo aos horários de almoço e jantar, e como a criatura foi vista de madrugada, seria a primeira vez que a informação seria disponibilizada.

— Nossa... Eu vi essa mesma notícia num blog. — Tentou disfarçar.

— Mas não era na TV que você assistiu?

Não sabendo o que responder à moça, nitidamente gaguejou e tentou sair dali.

— Não, não, eu falei errado... Mas a minha preocupação ainda está em jogo, né? Poderia avisá-lo do meu pedido? Eu agradeceria muito!

— Ei, espere, preciso dos seus documentos para enviar pedidos formais ao chefe.

— Acabei esquecendo minha carteira, perdão, preciso voltar para a aula, desculpe o incômodo...

Saindo rapidamente do abrigo, foi em direção ao Axe & Palm encontrar Rebecca, a quem combinou de encontrar-se para comerem algo. Demorou um pouco até chegar à sanduicheria, encontrando sua amiga sentada na mesma mesa que se sentaram da primeira vez... Mesmo que aquela tenha sido a primeira vez do dia. O tempo estava confuso para o jovem.

— Oi, desculpe a demora, já escolheu algo?

— Eaê! Meu prato já 'tá vindo, não vai pedir o seu?

— Ah não — disse Reid —, 'tô sem fome. Você pediu o quê? Frango?

— Hahaha! Como adivinhou? Sou tão previsível assim?

— Bem... Foi um palpite...

Após o pedido de Rebecca chegar e comê-lo, ficou preocupada com Reid, tentando dividir seu almoço para que não passasse fome, mesmo que o garoto insistisse que não estava faminto. Levantando-se da mesa e prontos para irem à universidade, Rebecca comentou com Reid:

— Nunca me arrependo de pedir esse lanche com frango, na próxima, peça também, Reid!!

— Pois é, na próxima eu vou pedir um igual ao seu. Aliás, adorei seu cabelo, fez antes de vir?

— Ah, 'cê notou? Que bom que gostou, achei que combinou com a blusa!

— Sim, combinou bastante! — Reid sentiu a necessidade de elogiar seu penteado com medo de fazer algo errado desta vez e perdê-la novamente.

Depois de Rebecca comer, saíram do lugar e voltaram a Stanford. Chegando à sala de aula universitária, tiveram de esperar alguns minutos após sentarem-se em suas carteiras até o professor Nolan retomar sua aula antes do sinal interrompê-lo.

— Antes de seguirmos de onde paramos, alguém se lembra quais os três parâmetros que definem se um ser é ou não uma Anomalia?

Ninguém se havia manifestado, até que Rebecca levantou a mão e respondeu:

— Regeneração.

— Exato! Anomalias possuem um fator de cura que varia entre fraco, moderado e forte. Cada Anomalia possui um, sendo classificado nesses três tipos dependendo do tempo que demora para se curarem. Quem mais?

— Envelhecimento retardado? — falou um dos alunos do fundo da sala.

— Isso, Kenny. Anomalias envelhecem num tempo muito menor do que o normal... — O rapaz dos cabelos castanhos, distraído com tudo em volta, mal ouviu a explicação, até que uma frase específica de Nolan retomasse seu foco. — Algumas Anomalias possuem uma saciedade alimentícia, ou seja, não se alimentam como um ser vivo, podendo ficar dias sem comer; mas isso é só uma observação...

Reid começou a achar estranha a coincidência de não sentir uma grande fome que algumas Anomalias poderiam desenvolver. Percebeu que não havia bebido nada desde que acordou e que, mesmo não tomando café da manhã, não teve necessidade alguma de almoçar, diferentemente do dia "anterior" que pediu um lanche no Axe & Palm. Seria possível? Lembraria se ele se tivesse tornado uma Anomalia; ao menos, imaginou isso.

— ...falta mais um parâmetro. — Completou Nolan, aguardando outro critério.

— Efeitos passivos, professor — disse Reid.

— Perfeito. Os efeitos passivos são a "marca registrada" das Anomalias. Esses efeitos podem ser de mudanças na estrutura física, um aumento de algum atributo ou até uma habilidade sobrenatural; mas todas as Anomalias têm algum efeito passivo...

Efeito passivo. Se fosse mesmo uma Anomalia, qual seria seu efeito? Mesmo que agisse calmamente no meio da sala, Reid estava apavorado por dentro, não sabendo o que fazer. Anomalias devem ser estudadas pela Fundação S.E.T.H. para garantirem a segurança aos humanos, e algumas delas conseguem uma liberdade parcial dependendo de suas ações e de suas habilidades; mas o jovem não sabia como proceder defronte de seus pensamentos, até que se lembrou antes de "sua morte". O senhor se assustou por que ele estava mudando fisicamente dalgum jeito? As dores no peito foram por causa disso? Foi naquele momento em que seu olho ficou azul? Teria sido um sonho ou não? Tantas perguntas; mas tão poucas respostas...

Reid obviamente não sabia o que pensar, era tanto medo e preocupação correndo em sua mente que mal teve chance de decidir o que fazer. Estaria ficando louco ou agradeceria por manter sua "humanidade"? Enquanto gastava sua atenção no que se poderia ter tornado, teve tempo do professor Lagerfeld citar a história do Espécime 8-9-9-4-9 e ter uma pequena discussão com Matthew, o qual se retirou da sala após discordar do pensamento da Fundação de conter Anomalias. O medo de Reid se revelar como uma Anomalia também levava em conta a aceitação das pessoas, já que movimentos radicais como os do grupo Mariposas Sangrentas e as ações políticas da HÓRUS também influenciavam a decisão do povo no tratamento de Espécimes além da Fundação S.E.T.H.

— Reid... Reid... Reid Calhoun! — gritava Nolan, tentando-o chamar, já que o rapaz estava distante e pensando no que fazer.

— Oi, perdão, professor, diga.

— Pode ir, estão te chamando.

Não entendendo a situação, olhou para trás e viu o chefe de segurança Karl acompanhado doutro guarda e da recepcionista. Estavam-no chamando para conversar, pois a atitude que teve no abrigo foi suspeita e causou desconfiança às autoridades. Levantando-se da cadeira e indo até onde estavam, foram à uma sala pequena e vaga, a qual foi pedida pelo chefe de segurança para conversarem a sós com Reid. Entrando nessa sala e esperando mais de quinze minutos sozinho, o chefe foi-lhe perguntando o que precisava.

— Reid Calhoun, certo? Poderia tirar o óculos, por favor?

Em silêncio, tirou o óculos e deixou-os sobre a mesa.

— Hm... Eu tive um aviso da senhorita Cross que um rapaz queria me avisar que uma Anomalia do tipo Zafiel iria atacar aqui. Ela me disse seu nome e que você saiu dizendo que "precisava voltar à aula", por isso não foi difícil de te achar. Uma brincadeira dessas é um pouco insensata, sabia?

— Não é uma brincadeira, aquela coisa vai vir logo, você precisa evacuar a cidade!

— Meu jovem, não sei o que houve; mas nós recebemos um recado da Sede de Washington quase meia hora antes das sirenes serem acionadas, e nada por enquanto. Por que acha que sua palavra conta mais que a nossa?

— Eu tive um sonho, aquilo vai aparecer daqui a pouco, você tem que me escutar, chefe Smith, por favor! — Insistiu o jovem.

— Um sonho? Ok, vamos lá... Você usou algo ontem? Não vou prendê-lo, pode falar, apenas me diga o vendedor que você pega e vai sair só com um pequeno aviso, todo adolescente já provou alguma vez, né? Eu também tive meus tempos na faculdade; mas tem que se controlar, não pode sair por aí falando que um Zafiel vai destruir a cidade.

— O quê?! Não usei nada! Nós estamos em perigo e é sério! — Batendo a mão e levantando-se da cadeira, estressado.

— Olha... Primeiramente, se acalme e sente-se; segundo, sabe quantas ligações recebemos só neste condado? Não posso sair acreditando em tudo que me contam.

— Você não entende, milhares vão morrer, inclusive minha amiga, eu preciso salvá-la dessa vez. Se não acredita em mim, a própria agente Ashe pediu p'ra eu te chamar no sonho e...

Levantando da cadeira, com um olhar de raiva, pressionou o garoto.

— Como você conhece a agente O'Donnell?!

— Eu a vi no sonho, eu preciso que me ouça!

Olhando para o guarda que estava parado dentro da sala deles, apontou a mão e abriu-a quando o guarda lhe entregou um dispositivo semelhante a um aparelho de medir insulina, com formato retangular, uma tela em cima e com uma espécie de agulha na ponta para coletar o sangue. Pedindo para que Reid deixasse o indicador da mão direita erguido, coletou o sangue da ponta do dedo e o dispositivo sinalizou com dois apitos. Detectando a presença de partículas ômicas no sangue, Reid era uma Anomalia, comprovando seu medo.

— A conversa acabou por enquanto, vamos para a Base de Pleasanton, você precisa ser contido o quanto antes. Desde quando é uma Anomalia? Quem está te ajudando a se esconder?

— Espera, o quê?? Mas e o ataque? Ele está quase vindo e a culpa será de vocês se não evacuarem logo!

— Silêncio, chega de graça. Algeme logo ele.

Com o guarda se aproximando, as sirenes tocaram por todos os condados californianos. Reid estava certo com a chegada do monstro. Deixando o guarda com Reid, chefe Smith saiu daquela salinha, olhou para o horizonte e viu uma criatura bege se aproximando com seus braços enormes. Já estava em território americano há um bom tempo antes de tocarem o alarme. Tudo que o garoto falara estava certo; mas já era tarde para fazer algo para evitar. Virando-se para ver o guarda e Reid, a porta estava aberta e o guarda desmaiado, e, correndo à direita, estava Reid indo em direção à Rebecca.

"Droga, o que eu fiz? Eu sou uma Anomalia que atordoou um segurança da Fundação. Estou frito, estou frito... O que eu faço??", pensava enquanto corria. Achando sua amiga fora da sala, assustada, agarrou sua mão e correram para a saída da universidade, com o chefe de segurança o procurando em meio aos alunos desesperados.

— Reid, o que queriam com você?

— Não era nada, vamo', Becca, temos que nos proteger.

Ao virar para responder-lhe anteriormente, Rebecca notou seu olho com uma cor diferente e começou a ficar preocupada.

— O que aconteceu com seu olho? Por que está claro, Reid?

Ainda a evitando, continuou correndo, e, mesmo sem perceber, justo na mesma rua que acontecera o fatídico acidente. Cansada dele não falar nada para ela, Rebecca puxou sua mão. Nervosa, confrontou-o.

— Ei! Me responda, o que foi que aconteceu? Por que a segurança estava atrás de você? Não somos amigos? Sério que não confia em mim?

— Rebecca, não é hora disso, eu te explico depois!

— Para, Reid, você 'tá me assustando, o que você fez? 'Cê sumiu no almoço, o que houve??

Quando tentou parar com a discussão, enquanto se aproximava mais de Rebecca, o Espécime 2-0-0-9-1 já estava no ar contorcendo-se, e, num instante, explodiu seu crânio com diversos raios enormes que atingiram as ruas aleatoriamente. Assim como da primeira vez, por deslize de Reid não mudar a rota, a rua onde estavam foi atingida. No desespero, empurrou Rebecca para trás dum caminhão estacionado; mas ficou à vista do feixe de luz.

A garota, mesmo que machucasse o ombro com a queda, foi salva pelo amigo, o qual não teve a mesma sorte. Irônico que, mesmo tendo ficado bravo com Rebecca da primeira vez por não se desviar da luz ao salvá-lo, Reid fez o mesmo, deixando de cuidar-se e levando novamente o raio no corpo. O calor do feixe de luz, acertando Reid e as centenas de pessoas da rua, além das milhares por toda a cidade devido aos outros raios do Espécime, desintegrou toda matéria viva existente.

Quando o raio o atingiu, seu olho claro, mais uma vez, brilhou; mas a dor que Reid sentia era real. Sentiu como se cada órgão, sistema e célula se desintegrasse imediatamente. No entanto, inexplicavelmente, acordou em sua cama gritando e rapidamente apalpou seu corpo, como se quisesse comprovar que estava vivo. Ele estava lá, novamente, no começo do dia. Um sonho dentro doutro sonho? Improvável. Sua dor não era falsa, ele sentiu o último sopro de vida saindo de seu corpo duas vezes; mas estava ali, vivo e confuso enquanto suava frio. O sinistro dia 22 de setembro de 2025 recomeçou pela terceira vez, e apenas o jovem sabia disso.

Reid "entendia" o que havia ocorrido com ele, mesmo que não se lembrasse muito de quando se havia tornado uma Anomalia. Com medo de terem-no enganado, decidiu comprovar por si próprio. Algo muito comum seria existir agentes de desinformação por parte da Fundação S.E.T.H., os quais lançavam informações falsas para encobrirem algo ou evitarem dar explicações quando não se sabia totalmente dalgo, e isso passava pela cabeça de Reid sobre o quão honesto o chefe de segurança Karl foi para ter uma desculpa para prendê-lo.

Mesmo que não fosse o ideal, um jeito grosseiro seria testar seu fator de cura, uma das características bases de Anomalias. Levantando-se da cama e indo à cozinha, pegou uma faca e segurou-a sobre a palma da mão; mas não conseguiu fazer nada. E se ainda estivesse num sonho estranho? E se sua sanidade estivesse no limite por conta do trauma? Não sabia se seria realmente necessário fazer aquilo.

Enquanto negava a si sobre cortar-se, olhou para a lâmina da faca, que refletia seu olhar, um olhar com duas cores. Seu olho não estava castanho, ainda estava azul, provando que poderia ter "perdido sua humanidade" de vez. Hesitando e não sabendo o que fazer, com raiva, largou a faca e, agressivamente, socou um copo que estava na pia. Os cacos de vidro perfuraram a pele da mão esquerda de Reid, fazendo-o agonizar de dor, mesmo que fosse necessário para saber a verdade.

Um modo rústico para saber sua regeneração era chamado de "regra do dois e oito": se uma ferida consideravelmente pequena se curasse em menos de dois minutos, seria uma regeneração forte; se ela se curasse de dois a oito minutos, seria uma regeneração média; e se ela se curasse após oito minutos, seria uma regeneração fraca. Mesmo que fosse inapropriado sem o auxílio de testes mais eficazes, seria o mais confiável se seguisse tal regra, ainda que o tamanho e profundidade da ferida variasse o tempo.

Como foi um machucado, ainda que doloroso, sem muitas complicações, Reid tirou alguns dos cacos de vidro que ficaram na mão e ficou observando-a. Assim como havia estudado, a cura soltava um tipo de vapor nítido, como se alguma energia estivesse queimando para as células se curarem mais rápido que o ritmo normal, e Reid percebeu isso; mas ficou incomodado com o tempo. Uma ferida mínima como aquela demorou cerca de nove minutos para curar-se, mesmo que tenha sido regenerada com nenhuma cicatriz.

Os cortes superficiais da mão, mesmo que ínfimos, demoraram quase dez minutos para voltarem ao normal, fazendo o jovem entender que não poderia contar com sua cura para sobreviver. Pegando suas coisas, trocando-se de roupa e usando novamente um óculos escuro, saiu do apartamento e foi ao ponto de ônibus. Descendo as escadas do prédio onde morava e encostando no pilar do ponto, viu o mesmo casal comentando a mesma informação sobre o atraso dos ônibus. De certa forma, estava cansado disso; mas teve de esperá-los mesmo assim. Aguardando, seu ônibus chegou e entrou no veículo com um olhar vago das coisas ao redor. Enquanto estava sentado, falou para si:

— Não posso avisar a segurança tão cedo e nem falar sobre aquela agente do nada, ele ficou louco quando comentei dela da última vez; mas por quê?... O que eu faço?

Não tendo ideia de como progredir para salvar as pessoas da cidade, ao menos tentaria salvar a vida de sua melhor amiga. Outra coisa que o incomodava era o fato de não saber o que fazer quando conseguisse passar do dia. E se voltasse para o mesmo ponto de reinício após algum tempo? Apenas suas escolhas contariam para que achasse uma forma de sobreviver, mesmo que estivesse tenso após morrer duas vezes. Chegando à universidade, interrompendo a aula de Lagerfeld, o professor repetiu o que havia dito à sala enquanto Reid se sentava em seu lugar.

— Ei... Chegou atrasado por quê?

— Todos os ônibus se atrasaram porque estavam mexendo no encanamento de água...

— Você sabe que todo mundo 'tá ansioso com a prova da Fundação, e essas aulas são boas p'ra gente, se perder alguma matéria...

— ...te mandarei uma mensagem, pode deixar.

— Uau, tirou as palavras da minha boca! — exclamou Rebecca.

— Posso ajudá-los, Reid e Rebecca? — falou professor Nolan aos dois.

Reid se recordava muito bem daquela Alpha que o salvou: uma garota um pouco mais velha do que ele, com seus vinte e seis ou vinte e sete anos de idade, com um cabelo loiro não tão curto e nem tão longo, um pouco abaixo dos ombros. Era atlética de corpo e com um leve bronzeado nítido, sendo bem confiante de quando falou com ele no incidente que ocorrera... e que ocorrerá tardiamente. Seu olhar era humilde, verdadeiramente honesto.

Usava uma roupa comum, estando apenas com o distintivo na cintura, além duma camiseta polo azul-escuro e uma calça jeans clara. Como estava com mais tempo para pensar do que naquele momento inoportuno, lembrou de ler sobre uma Anomalia muito parecida com a memória que tinha dela...

E "voilà"! Lembrou de realmente ler sobre ela, um dos pactos mais produtivos da Fundação S.E.T.H. em doze anos. "Ashley O'Donnell, uma Anomalia Zafiel de ordem Humani que se filiou à Fundação na esperança de transformar o mundo em um lugar melhor. Nascida no Texas, foi afetada em 2010, indo até uma Base e entregando-se voluntariamente aos guardas, com o pedido de fazer um pacto para ajudar os humanos a sobreviverem".

Lendo apenas esse trecho que estava na apostila, com uma foto da época em que foi capturada, percebeu que realmente era aquela mulher, mesmo sendo uma garota na foto. Pactos, o modo popular de "tratados de lealdade", eram acordos Anomalia–Fundação que garantiam liberdade mínima e liberação dalguns privilégios em troca de conterem outros Espécimes. A grande maioria das Anomalias com inteligência apurada tentam fugir durante as oportunidades nas quais são usadas em pactos; mas o uso é bem recorrente e até "comum", mesmo que grupos políticos mundiais batem de frente nessa ação.

Pensando bem, Reid percebeu que o efeito passivo dela era dito apenas como "um vislumbre do Sol", a única menção de seu efeito em duas páginas exclusivas a ela. Ao perceber que o professor Nolan começaria a dar explicações, levantou sua mão quando teve oportunidade.

— Classes... de... Anomalias...

— Professor, desculpe interromper; mas qual o efeito passivo da última Anomalia da página cento e setenta e um? — perguntou Reid.

— O livro não cita seu efeito passivo?

— Se fala quase nada... — respondeu ao questionamento do professor.

Indo à sua mesa do lado do quadro-negro e abrindo na página dita, Nolan tira seus óculos e, olhando para Reid, responde:

— Essa é a 7-2-8-4, uma das mais responsáveis Anomalias que a Fundação usa. Para ter noção, ela até recebeu promoções como as de uma agente de tão obediente que foi com as ordens que recebia, um belo exemplo de que a humanidade ainda tem esperança. Se não me engano, seu efeito passivo é extremamente perigoso, e como é requerida em muitas missões, acho que ocultaram os detalhes por isso. Algo a mais?

Balançando a cabeça como se dissesse "não", Nolan continuou sua explicação e deu os exemplos que havia separado, citando diversos Espécimes, dando tempo do sinal da universidade interromper a explicação do último Espécime que comentava: o borrego russo de lã quase infinita.

— Ufa! Ainda bem que chegou a hora do almoço... 'Cê quer comer algo no Axe & Palm? — disse Rebecca. — Quem sabe encontramos a Veronica?

— Claro, pode ser; mas preciso conversar com você antes...

— Ah... É algo sério?

— Sim — falou com convicção.

— Ok, vamos p'ro Axe e conversamos lá; só não me deixa ansiosa, 'tô' curiosíssima.

Saindo de Stanford e indo à sanduicheria para almoçarem, sentaram-se e Rebecca mal pegou no cardápio, já que estava curiosa para saber do que se tratava, pois Reid evitou dizer qualquer coisa na rua.

— Vai, desembucha, 'cê me deixou atormentada até agora.

— Promete não se assustar? — perguntou Reid.

— Para com isso, por que me assustaria??

Tirando seu óculos escuro, olhou para Rebecca com seus olhos bicromáticos, surpreendendo a garota; mas fazendo Rebecca perguntar:

— Sério que 'cê 'tá usando lente? E por que só uma? Não sei se as garotas vão gostar, não combinou com você, sabe?

— Becca, eu sou uma... uma Anomalia... — cochichou Reid.

— 'Pera, isso é sério, desde quando?

— É difícil explicar; mas eu preciso que você confie em mim... Daqui a algumas horas, uma Anomalia Zafiel virá e destruirá muitas, mas muitas coisas, vai ser um terror para todos aqui, e eu preciso que você fuja logo!

— Mas como você tem tanta certeza? — perguntou-lhe.

Virando-se para a televisão do estabelecimento, cochichou com Rebecca:

— Agora vai passar na TV que tem uma Anomalia vista perto de Seattle, em que a força aérea canadense e a marinha mexicana devem tomar cuidado...

"Uma Anomalia do tipo Zafiel foi avistada ontem pela marinha americana a oeste de Seattle, seguindo para o sul. A Fundação se pronunciou que não se sabe qual o efeito da criatura, e acredita que seguirá fora do território americano se tudo ocorrer bem. As forças aéreas do Canadá foram ordenadas pela Fundação a seguirem a Anomalia. A marinha mexicana foi acionada pela Sede Leviatã para seguir atenta e ajudar no relatório da trajetória da Anomalia. Quaisquer outras informações serão ditas assim que possível".

Rebecca ficou assustada, pois sabia que não tinha como Reid saber dessa notícia tão rápido, ainda mais que ele chegou atrasado à aula, quando poderia saber disso?

— Se você está certo, então precisamos avisar à Fundação que... — Rebecca foi interrompida por Reid, o qual agarrou seu braço assim que se levantou.

— Eu já tentei isso, eles não acreditaram...

— 'Pera aí... Reid, qual seu efeito?... — perguntou ao sentar-se.

— Eu não sei explicar muito bem...

— Como você "já avisou" e eles não acreditaram?... Você avisou antes da aula, por isso se atrasou? Eu não te vi saindo de perto de mim, quando foi?

Suspirando, Reid lhe disse:

— É a terceira vez que estou aqui. É a terceira vez que eu me sento nessa mesma mesa... Eu não sei dizer como isso funciona; mas toda vez que eu... que eu morro, eu acordo no meu quarto...

— Você... Como assim "morre"? O que aconteceu? Eu... Eu... — Rebecca estava tremendo ao ouvir o que seu melhor amigo acabou de contar.

— Eu sempre sinto toda a dor antes de voltar; mas quando volto, acordo assustado, com a lembrança de praticamente tudo que houve, e eu ao menos preciso te salvar dessa vez! — Rebecca ficou em silêncio. Ela não entendia; mas sabia que não era uma brincadeira de mau gosto.

— O que posso fazer?...

— Não volte para a Universidade, vá para o ponto de evacuação mais próximo e fique lá até saber que está tudo bem, ok?

— Mas e você? E os outros??

— Você realmente acha que acreditariam em mim? Não duvido do quanto você me conhece; mas eu sei que 'tá tendo dificuldades para acreditar no que falei mesmo sendo a pessoa em quem mais confio...

— Trate de me dar notícias o quanto antes... Eu nunca te vi assustado a esse ponto, então farei isso... Mas e as pessoas daqui?

— Vou dar um jeito nisso, acho que pode funcionar.

— Não sei no que está pensando; mas boa sorte... — Abraçando-a, o jovem não queria perder sua melhor amiga de novo.

— Ei — cochichou no ouvido dela —, adorei suas tranças hoje, sabia?

— Por favor, se cuida... — suplicou Rebecca.

Rebecca ainda estava incomodada; mas cegamente obedeceu a seu amigo. Reid tentaria falar com ela quando tudo passasse. Voltando à sala, sentou-se antes de todos e esperou, apenas esperou o destino que o aguardava. Demorando mais de vinte minutos para todos estarem ali, o senil professor abriu a aula retomando a principal característica das Anomalias:

— Antes de seguirmos de onde paramos, alguém se lembra quais os três parâmetros que definem se um ser é ou não uma Anomalia?

Ninguém se manifestou. Reid lembrou que fora Rebecca quem respondeu à pergunta de Nolan, esquecendo que ela não estava mais na aula. Levantando a mão, disse "regeneração" como havia acontecido antes.

— Exato! Anomalias possuem um fator de cura que varia entre fraco, moderado e forte. Cada Anomalia possui um, sendo classificado nesses três tipos dependendo do tempo que demora para se curarem. Quem mais?

— Envelhecimento retardado?

— Isso, Kenny. Anomalias...

Reid, esperando a explicação de Nolan, coisa que estava cansado de ouvir de forma idêntica, disse novamente uma das características quando ele terminou de falar.

— Efeitos passivos.

— Perfeito. Os efeitos passivos são...

Reid já comprovara que havia uma regeneração fraca; não sentiu fome por mais de sete horas, sem comer ou beber algo; e que seu provável efeito passivo era retornar quando morria; porém, o garoto estava confuso em como funcionava ou se poderia controlar. Após continuar explicando sobre o 8-9-9-4-9 e fazer com que Matthew saísse da sala depois de discordar de Lagerfeld, como previsto, as sirenes tomaram conta de todos os lugares depois do Espécime 2-0-0-9-1 chegar ao Parque Redwood. Assustados, os universitários e os professores saíram desesperadamente para salvarem-se do caos. Com o objetivo de encontrar Ashe no mesmo lugar de quando a conheceu, foi correndo até o beco que Rebecca o empurrou pela primeira vez.

Reid tentava fingir que os gritos não existiram e que a dor que sentira era só uma ilusão; mas a realidade mostrou o quão impetuosa seria. O Espécime 2-0-0-9-1, com seus longos braços, já havia andado muito e ergueu-se aos céus, tendo uma sobrecarga instantes depois, obrigando Reid a esconder-se de raspão na parede que o salvara da primeira vez. Berros de dor por todo lado ecoaram com o alarme dos carros apitando sem parar; o tremor da queda da Anomalia colossal ressaltando seu primeiro ataque e os clarões arroxeados se desfazendo aos poucos.

Tentando levantar-se, teve um surto de ansiedade, entrando em choque e tendo uma crise que o impediria de seguir. Reid era um jovem normal até ter que encarar tantas mortes, inclusive a dele e a morte de sua melhor amiga à sua frente. Pôs-se a ajudar o que tivesse a seu alcance; mas era uma missão às cegas e com uma responsabilidade absurdamente grande para alguém sem treinamento e nem preparo. Encostado, sentado no muro enquanto respirava de forma ofegante, uma agente militar andava rapidamente pela rua com olhares atenciosos, percebendo que Reid estava ali e voltando para ajudá-lo.

— Ei, qual seu nome? Está ferido?

— Sou Reid... — disse enquanto retomava sua respiração.

— Prazer, Reid, pode me chamar de Ashe. Respire e se acalme. O que houve?

— Eu preciso que você impeça essa criatura, ela vai fazer isso de novo...

— Como assim "impeça"?

— Eu também sou uma... Anomalia, e preciso que confie em mim, só dependo de você!... Destrua aquilo com seu efeito, por favor!!

A agente Alpha loira ficou desconfiada do pedido repentino dele, não sabendo se o que ele disse seria verdade ou não. A poderosa Espécime 7-2-8-4 estava na cidade, não havia como ser uma coincidência absurda ele precisar justamente dela naquele lugar. E quem era aquele garoto, que carecia da ajuda dela, já sabendo que ela era uma Anomalia. Fisicamente, Ashe não passava duma humana normal, como poderia saber? Levantando-o do chão e agarrando sua mão, ficaram face a face enquanto ela o encarava cheia de dúvidas.