CECÍLIA
6 de Dezembro — Quarta
Na terça correu tudo normal (e chato), exceto a movimentação que Liz Rodriguez causou por chegar com uma garota desconhecida na escola em um carro que não era o seu, todos já especulavam se ela tinha trocado Maya por outra amiga.
Não sei porque estou contando esse fato... Na verdade sei sim, primeiro porque Ingrid falou disso o tempo todo e ainda contou que Liz Rodriguez faltou ao treino da torcida na segunda e que Madelaine ficou a ponto de torcer o pescoço de alguém.
Imaginei que Liz tenha faltado por estar doente ou apenas mal porque a cara dela não era das melhores quando a vi no corredor.
Não falo mal de Liz, mas gostaria de não ter vontade de olhar para ela (só que ela é bonita e atrai meus olhos sempre) pelo que Ingrid conta ela é a própria reserva de Madelaine, que é o ser mais idiota que conheço.
Madelaine Becker vive difamando as pessoas, instruindo o bullying e se acha a melhor pessoa do mundo, como se o resto das pessoas fossem meros mortais. Mas acho que para ela Liz é do mesmo patamar que si mesma.
Ela nunca mexeu comigo ou Ingrid e Martin, claro que isso tem uma explicação. Eu sei um segredo dela, acho que é algo até surpreendente.
O bom que de ter um segredo dela é que ela mal olha para o meu lado depois que impus a condição de deixar meus amigos e eu em paz.
Prova que ela cumpre seu o trato foi demonstrado hoje quando esbarrei em Sina Reinhart sem querer e a capitã que estava perto nem me olhou, se fosse outra pessoa ela teria feito uma graça.
Sina quase ficou irritada, mas quando viu que era eu pedindo desculpas relevou. Ela me conhece porque saio com Tiera vez ou outra e elas são irmãs.
Tiera deve contar que rola alguns encontros casuais entre nós. Ingrid acha que a garota é totalmente afim de mim (não acho isso) mesmo que seja eu não namoraria com Tiera por mais que ache ela o ser mais fofo do mundo.
Depois que esbarrei em Sina consegui entra na minha sala de Inglês, Sr. Jackson não parecia animado como os outros dias, estranho...
Espero que ele esteja bem, pensando nisso eu vejo uma pessoa nada bem. Maya. Ela e Liz realmente devem estar brigadas, não tenho coragem de perguntar pois não sou intrometida.
Pensar nisso me fez ficar distraída, já sentada no meu lugar habitual fiquei olhando os alunos entrarem e sentarem nos respectivos lugares, minha turma era enorme então a sala lotava.
— Boa tarde! — Sr. Jackson não parecia animado, porém ainda era educado. — Espero que estejam lembrando de realizar os trabalhos que serão apresentados na próxima semana...
Depois disso não sei mais o que ele falou porque eu olhei para Maya com os olhos arregalados, assim como os outros alunos olharam seus respectivos pares. Nós nem tínhamos nos encontrado ainda desde que pegamos os nomes dos autores que Sr. Jackson nos escolheu.
Maya fez um sinal que na minha compreensão significou "depois nós decidimos isso", não sou boa em interpretação então poderia significar qualquer coisa.
Sr. Jackson falava do quanto os trabalhos era importantes e de como teriam que ser bem apresentados porque cada um dos autores dos trabalhos seriam cobrados em testes.
Escutei tudo que ele falou olhando para o estacionamento da escola, o sol aparecendo de forma preguiçosa lá fora.
Adoro os períodos da tarde porque quer dizer que logo posso ir embora e praticar algum tipo de atividade ao ar livre. Ficar dentro de sala cansa muito.
Pensando em cansar, lembrei que ontem eu estava cansada de esperar o dia passar para chegar hoje e ver um novo bilhete (se é que teria). Às terças não tenho aulas de Inglês e não tive coragem de inventar uma desculpa para vir procurar o bilhete na sala.
Já capturei o papel debaixo da mesa e leio ansiosa:
"Espero que você esteja sendo sincero quando diz que quer me ajudar. Não quero ninguém se aproveitando de mim por algum tipo de interesse bobo porque no geral é assim que as pessoas agem comigo. Sinto por dizer isso, mas não confio em você o suficiente para lhe passar algo que possa me identificar. O máximo que vou lhe mandar é o meu user do twitter, oitnbguezz. Obrigada por (ao menos tentar) ser legal."
— Oh meu Deus! — Exclamo sem acreditar, ela me deu o user do twitter, já é algum passo.
Pelo jeito é um fc para a série Orange Is The New Black (só não entendi a outra parte do user), todo gay (lésbica inclusa aqui mesmo que não seja o correto) ou bissexual de respeito assiste essa série...
Será que ela é lésbica? Será que é isso que a perturba tanto? Ok... Depois penso nisso.
NÃO.
AGORA.
Tem uma lésbica em potencial por aí que assiste oitnb! Quero saber quem... A primeira coisa sobre ela é que não quer se identificar, merda.
Tem uma garota com problemas e só penso que ela assiste uma das minhas séries favoritas. Sou uma pessoa insensível.
*****
— Ainda não aceitei que você torce logo para os Dodgers.
Agnes ri, pois, todas as vezes que vamos sair para assistir aos jogos do time dela eu faço essa mesma afirmação.
— E pelo jeito nunca vai aceitar.
Sorrio sem dizer mais nada. Continuamos andando por mais alguns metros na rua bem iluminada, deixei meu carro mais atrás por falta de vaga perto de onde estávamos indo.
— Conheceu esse pub quando?
Perguntei pois nunca tinha ido até esse lugar, só passei em frente a ele minutos atrás quando procurava um lugar para estacionar meu querido carrinho.
Observei a variedade de lugares envolvendo comida nesse ponto da cidade, com certeza é uma boa parte pois amo comer qualquer coisa.
— Na sexta à noite depois da fogueira na praia. — Agnes explicou andando na frente, eu fiquei parada em frente a um restaurante sentindo o cheirinho bom que vinha dele. — Martin e eu o achamos juntos.
Corri para poder implicar com ela.
— Martin e você? Uuuh!
Agnes me empurra e revira os olhos por eu estar sendo maliciosa ao fazer o comentário.
— Já falei: foi só uma vez. — A texana fala firme comigo. — Somos bons amigos agora.
Agnes odeia ficar trazendo de volta que já ficou com Martin e o meu amigo é da mesma forma (acho que isso é amor encubado).
— Eu entendi, Agnes. — Falei com a voz bem suave para ela não me odiar pela noite inteira. — Parei com esse assunto.
Continuei andando, sem ver que Agnes estava parada. Estava para entrar no pub quando minha amiga correu para me apanhar.
— Ei, Ceci, esqueci minha bolsa no seu carro me empreste as chaves.
Agnes não perguntou e achei meio rude da parte dela, ela estava irritada comigo pelo assunto do Martin. Acabei de anotar na minha mente: não falar mais do lance dela com o Gomez.
— Não precisa pegar dinheiro eu tenho aqui. — Mesmo ela estando irritada eu tentei ser prestativa.
— Eu quero pegar.
— Ok, eu vou entrando.
Passei as chaves para ela que logo virou de costas para mim, indo na outra direção a todo vapor.
Olhei a fachada do pub e não era muito chamativa, mas se Agnes e Martin gostaram é porque não era tão ruim assim. Então entrei no Matarazzo's, um sininho me denunciou na entrada, mas ninguém nem olhou para mim, todos estavam focados na transmissão do jogo na tv no canto direito do bar, perto da abertura de entrada para trás do balcão que ocupava o final do pub quase inteira.
Vi uma cabeleira escura por trás do balcão, por estar de costas não deu para ver se eu conhecia a mulher ou era só impressão minha. Optei por ficar na mesa que ficava mais na parte da frente do pub, mesmo que Agnes pudesse se irritar mais por nós termos ficado longe da televisão.
Agnes não era muito de assistir televisão e nem mesmo tinha uma no quarto do dormitório, ela até poderia assistir na minha casa ou pelo seu notebook, mas ela achava divertido ter interações com as pessoas nessas ocasiões. Quem sou eu para querer ficar em casa tendo a oportunidade de sair?
Viemos só nos duas porque Ingrid trabalha numa pizzaria à noite e Martin é mais ligado na NFL e não no basebol, além disso ele acha que irrita Taylor por ficar perguntando demais. Martin consegue irritar até eu que sou praticamente a rainha da paciência (Ingrid que diz isso).
Só sei que prefiro sair com a Agnes para esses jogos do que com Ingrid, ela só reclama a maior parte do tempo, é engraçado até. Mas nada tão legal quando assistir a minha amiga texana usando seu uniforme de jogo e se irritando com os jogadores.
Peguei meu celular para olhar algumas conversas, era melhor do que olhar para todos os lados mais uma vez, em algum momento acabei no twitter. Lembrei da garota da escola e pesquisei o nome de usuário dela: oitnbguezz.
Não sei quantas vezes pesquisei o nome de usuário dela durante o dia e não tive coragem de mandar mensagem, acho que nunca pensei tanto para fazer uma coisa, nem se parecia comigo.
— Obrigada. — Agnes jogou as chaves perto do meu celular que estava aberto na conta do Twitter. — Vou pegar uma cerveja, vai querer o quê?
— Água.
Obviamente eu não posso beber algo com álcool, mas geralmente isso não é um problema porque Agnes já tem mais de 21 e se eu quiser ela consegue algo. Para sorte dela eu não gosto de beber e isso poupa ela de "quebrar" leis.
Também não posso beber porque vou dirigir. Sempre fico para dirigir até porque não confio meu carrinho a ninguém, até porque o único que tem carro também é o Martin. Agnes veio de outro estado e não ia atravessar o país de carro e Ingrid sempre recebe carona de alguém então não acha precisar de um.
Observo Agnes no balcão esperando pelas bebidas, o jogo está começando e ela parece mais tranquila que antes. Ao contrário da minha amiga estou uma pilha de nervos quando decido por não mandar mensagem ainda à oitnbguezz após segui-la ao menos.
Taylor volta chamando atenção de alguns caras por estar bem a caráter do seu time com o boné e blusa, além disso ela é linda.
— Acho que eu vi a Rodriguez ali. — Agnes falou com o cenho franzido. — Não acho, com certeza é ela.
— Já bebeu, Agnes? — Brinco pois não acredito nela. Taylor senta ao meu lado, num ângulo que dê para ver melhor o jogo.
— Acho que ela sim, se não for deve ter uma irmã gêmea. — Ela brinca e leva a garrafa de cerveja até a boca, minha garrafa de água bem a minha frente, perto do meu celular.
Recebo uma notificação: oitnbguezz seguiu você.
— Puta merda!
Agnes se interessa em ver o que eu xinguei no meu celular e se aproxima.
— Alguém te seguiu... Por que xingou?
Olho para Taylor que está sorrindo debochada.
— Eu não sei o que falar com essa garota.
Ela gargalha quando eu fico vermelha de vergonha.
— Você nunca hesita numas coisas assim, Cecília. Crie vergonha na cara e fale com ela.
Agnes sabe dar conselhos (se é que pode ser chamado assim), então mandei uma mensagem.