Chapter 7 - CAPITULO 07

A urgência em encontrar um cavaleiro de confiança aumentava a cada dia. Letícia decidiu, então, investigar a fundo as habilidades de Aleph. Começou colhendo informações com os cidadãos do reino. 

 

Na confeitaria, ouviu as jovens funcionárias elogiarem a perspicácia e a sabedoria de Aleph na resolução de conflitos. Mas Letícia precisava de mais. Precisava saber sobre suas habilidades como guerreiro. 

 

Em uma taverna próxima, alguns homens conversavam animadamente. Letícia se aproximou disfarçadamente, apenas o suficiente para captar a conversa. 

 

— Aquele Aleph é um garanhão! — comentou um dos homens, com um sorriso malicioso. — Todo dia ele sai com uma mulher diferente. 

 

— Duvido que seja tudo isso — rebateu outro. — Uma amiga minha disse que ele não tentou nada com ela. Ela até se ofereceu, e ele recusou! Eu não tinha dispensado. 

 

A mesa irrompeu em gargalhadas. 

 

As fofocas da cidade se mostravam inúteis. Letícia resolveu, então, seguir Aleph discretamente. Observou-o durante seu turno de trabalho, impressionada com sua habilidade em mediar conflitos e apaziguar ânimos exaltados, sem recorrer à força bruta. Notou também que, ao final do expediente, sempre era abordado por alguma mulher. A natureza dessas conversas, porém, permanecia um enigma. Aleph, sem dúvida, era popular entre as damas e mantinha boas relações com os homens da cidade. 

 

Intrigada, Letícia questionou uma das jovens que costumavam conversar com Aleph. Ela explicou que, dependendo do local sugerido pelas moças, ele as acompanhava, mas que, geralmente, buscava apenas informações sobre os costumes do reino. Sendo recém-chegado, desejava se integrar rapidamente. E acabava conquistando a simpatia das pessoas com sua curiosidade genuína e seu interesse em suas histórias, sem qualquer intenção romântica. 

 

A popularidade de Aleph, porém, não era o que Letícia buscava. Precisava avaliar suas habilidades de combate. E para isso, teria que recorrer a medidas mais drásticas. 

 

Letícia, como princesa do reino do Inverno, recebera treinamento real em combate, interrompido pela morte de sua mãe, a Rainha Elyza. Para manter suas habilidades afiadas, treinava esporadicamente com alguns cavaleiros da cidade — evitava os cavaleiros do castelo, que a tratavam com condescendência e não a levavam a sério nos duelos de treino. Decidiu, então, ir até o local de treinamento dos cavaleiros, um bosque isolado nos arredores da cidade. 

 

"É hora de testar as habilidades de Aleph" — pensou, com determinação. 

 

... 

 

O treinamento dos sucessores reais ocorre sob a tutela do enigmático Mestre Yoshihito Schneider, uma figura lendária cuja sabedoria transcende gerações. Apesar de sua aparência perene de 25 anos, Mestre Yoshi, como é carinhosamente chamado, acumulou a sabedoria de incontáveis ciclos de estações. Sua figura imponente de 1,86m de altura é adornada por vestes tradicionais japonesas, brancas com detalhes dourados, que contrastam com seus longos cabelos prateados e seus penetrantes olhos azuis celestes. Dizem que ele manipula as energias positivas que mantêm o equilíbrio da própria dimensão, um poder sutil, porém imenso. 

 

Há séculos, Mestre Yoshi molda as mentes dos futuros governantes, incutindo-lhes não apenas conhecimentos políticos e administrativos, mas também um profundo respeito pela harmonia da natureza. Seu rigoroso treinamento, com duração de dois anos, abrange desde intrincadas estratégias de governança até diversas artes marciais e disciplinas essenciais para a formação de um líder justo e sábio. Ele ensina a arte de governar sem perturbar o delicado equilíbrio do mundo natural, uma filosofia que ecoa por todos os reinos. 

 

Dotado de um poder mágico que desafia a compreensão humana, Mestre Yoshi inspira respeito e, em alguns, um temor reverencial. Sua palavra é lei, seus pedidos raramente questionados. Contrariá-lo é convidar o destino a se manifestar de formas imprevisíveis e, frequentemente, devastadoras. 

 

... 

 

Aleph chegou ao local de treinamento dos cavaleiros, um amplo campo aberto nos arredores da cidade. Os cavaleiros presentes comentavam sobre sua força, mas logo a conversa se voltou para um outro guerreiro, uma figura lendária entre eles. 

 

— Ninguém aqui consegue derrotá-lo — disse um dos cavaleiros, com admiração. 

 

— Parece que ele veio treinar hoje — comentou outro, olhando em direção à entrada do campo. — É a sua chance, Aleph. Lute contra ele e veja do que é feito. 

 

— Quero ver se esse cavaleiro é verdadeiramente forte. — respondeu Aleph, com um sorriso confiante. 

 

Sua empolgação, porém, se transformou em surpresa quando viu quem se aproximava. Era Letícia, disfarçada com roupas masculinas, uma armadura leve que protegia seu tórax e um gorro que ocultava seus longos cabelos. Aleph ficou impressionado ao descobrir que ela treinava com aqueles cavaleiros. 

 

O líder dos cavaleiros fez as apresentações. 

 

— Aleph, este é o cavaleiro mais habilidoso de nossa divisão — disse, apresentando Letícia. — Apesar da aparência, sua força é impressionante. 

 

Letícia se dirigiu a Aleph, sua voz disfarçada por um tom mais grave: 

 

— Gostaria de testar suas habilidades, cavaleiro. Aceita um duelo? 

 

Os cavaleiros ao redor vibraram com a perspectiva de uma luta entre os dois guerreiros. Aleph, intrigado pela reputação de Letícia, aceitou o desafio prontamente. 

 

— Será uma honra — respondeu, com uma leve inclinação de cabeça. 

 

Pegaram suas shinais, as espadas de bambu utilizadas nos treinos, e colocaram as proteções faciais. Cumprimentaram-se formalmente e iniciaram o duelo. Letícia, determinada a avaliar as verdadeiras habilidades de Aleph, atacou com ferocidade. Aleph, por sua vez, analisava seus movimentos com atenção. 

 

"Será que devo levar a sério essa luta?"— pensou. — "Mas aquele olhar… ela não vai pegar leve." 

  

Letícia desferiu um golpe frontal rápido e preciso, que Aleph bloqueou com facilidade. Ele percebeu a velocidade e a técnica apurada de seus ataques, a precisão de sua defesa. Contra-atacou, mas com força contida. Letícia bloqueou o golpe, percebendo que ele não estava lutando com toda a sua capacidade. 

 

— Detesto quem não leva uma luta a sério — disse, com um tom de reprovação. 

 

— Me desculpe a descortesia — respondeu Aleph, um sorriso se formando em seus lábios. 

 

A partir daquele momento, a luta mudou. Aleph aumentou a velocidade e a força de seus ataques, utilizando técnicas refinadas e imprevisíveis. Letícia, embora pressionada, se defendia com bravura, animada pelo desafio. Aleph, porém, reconheceu em seus movimentos algumas técnicas específicas do estilo ensinado por Mestre Yoshi. Com um golpe preciso, desarmou Letícia e venceu o duelo. 

 

Recuperando o fôlego, ambos se cumprimentaram, reconhecendo a habilidade um do outro. 

 

— Agora tenho certeza — declarou Letícia. — Eu o quero... como meu cavaleiro. 

 

Aleph, surpreso pela proposta repentina, pensou: "Ela realmente precisa prestar mais atenção no que diz…" 

 

Os cavaleiros se aglomeraram ao redor de Letícia, elogiando suas habilidades e lamentando sua derrota, embora reconhecessem que ela havia lutado bravamente. Aleph, sentado à beira do campo, recuperava o fôlego. Então, Letícia se aproximou, oferecendo-lhe uma garrafa de água e um convite para conversar. A curiosidade brilhava nos olhos de Aleph. 

 

— Por que treina aqui? — perguntou, admirando sua determinação. 

 

— Preciso manter minhas habilidades afiadas — respondeu Letícia, com um sorriso. — Não posso me dar ao luxo de perder a força que conquistei. 

 

— Confesso que a subestimei no início, princesa Letícia — admitiu Aleph, com um sorriso divertido. 

 

— Como descobriu minha identidade? — perguntou Letícia, surpresa. 

 

— Suas técnicas, princesa. Os golpes que utilizou… somente o Mestre Yoshi os ensina. 

 

— Impressionante — elogiou Letícia. — Sua perspicácia facilitará o convite. Aceitaria ser meu cavaleiro oficial? 

 

A expressão de Aleph se fechou. 

 

— Fico honrado com o convite, princesa — respondeu, com um tom de pesar. — Mas há algo que me impede de aceitá-lo. 

 

— É por que deseja servir ao meu irmão? Tornar-se um Cavaleiro Real? — perguntou Letícia, a decepção evidente em sua voz. 

 

Aleph hesitou, sem saber como responder. 

 

— Gostaria muito de ajudá-la, princesa. Mas não posso revelar os motivos de minha recusa. 

 

— Entendo — disse Letícia, com um suspiro resignado. — Bem, pelo que soube, você em breve trabalhará no castelo. Terei outras oportunidades para convencê-lo a mudar de ideia. 

 

Com um último sorriso, Letícia se despediu e partiu, deixando Aleph imerso em pensamentos. 

 

... 

 

O treinamento de sucessão real é uma arte complexa e multifacetada, adaptada às particularidades de cada reino. Existem quatro estilos oficiais de combate, cada um refletindo a filosofia e as tradições de seu respectivo reino. Desde a maneira como a espada é empunhada até as nuances de um contra-ataque, cada estilo possui suas próprias peculiaridades, desde a posição dos pés até a forma de segurar a arma. 

 

Essas técnicas, aperfeiçoadas ao longo de gerações pelo Mestre Yoshi, são transmitidas aos príncipes herdeiros com rigor e precisão. O Mestre adapta suas instruções de acordo com a origem de cada aluno, reconhecendo que nenhum estilo é intrinsecamente superior aos demais, mas sim possuidor de características únicas que devem ser exploradas e desenvolvidas. Embora a tradição dite que apenas os sucessores reais tenham acesso a esses ensinamentos, em circunstâncias excepcionais, o Mestre Yoshi pode compartilhar seu conhecimento com aqueles que julgar merecedores, independentemente de sua linhagem. 

 

... 

 

Verônica, a florista, estava caminhando com seu filho quando foi interceptada por alguns bandidos, eles a separaram da criança. 

— Chame a moça que frequenta sua floricultura — ordenou o líder dos bandidos, a voz áspera e ameaçadora. 

 

— Qual delas? — gaguejou Verônica, o medo a paralisando. 

 

— A de cabelos longos e pretos. O nome dela é Ticy. 

 

— A que trabalha no castelo? O que vocês querem com ela? 

 

— Isso não é da sua conta, mulher. Traga-a até nós ou seu filho pagará o preço. 

 

Verônica, sem saber a verdadeira identidade de Letícia, acreditava que ela fosse apenas uma funcionária do castelo e colega de Dagmar. Desesperada, enviou um mensageiro com uma carta urgente para Dagmar, implorando por ajuda. Dagmar, por sua vez, entregou a mensagem a Letícia. Intrigada e preocupada com o tom desesperado do pedido, Letícia decidiu atender ao chamado, apesar da estranheza da situação.