A situação nos próximos dias fora tranquila.
Era estranho ver toda a população tão tranquila daquele jeito enquanto dias atrás havíamos cumprido uma missão tão perigosa. Não achava aquela situação nem um pouco ruim. Aquilo foi gratificante para falar a verdade. Pude ajudar algumas pessoas por mais que não fosse minha missão principal e até fizemos companheiros novos.
Por conta da conquista de ajudar na eliminação dos goblins, o grupo de Silka subiram de rank. Silka e Ottor que antes eram rank C, agora eram Rank B e Reaiger, que era rank B, subiu para o Rank A. Se tornando o mais forte de sua equipe. Vários dos aventureiros subiram para os mesmos ranks e todos estavam felizes.
"Greed-san muito obrigado, temos que te agradecer sempre!"
"Sim, podemos pagar uma cerveja para você e Asteth-san por nos ajudarem tanto!"
"Por favor, deixe a gente entrar no grupo de vocês!"
"Qual é? Eu pedi primeiro!"
"Aliás Greed-san, qual é o segredo de sua força. E você Asteth-san? Você também é forte! Dê algumas aulas para a gente!"
Esses foram os agradecimentos e pedidos que os aventureiros fizeram para a gente enquanto sentávamos em uma mesa. Asura parecia estar contente com o nosso reconhecimento por parte das pessoas. Eu também estava feliz... mas... mas eu havia chamado Asura para jantar porque queria algo romântico.
Lógico que eu nunca ficaria bravo e expulsaria as pessoas de lá, mas ter um pouco de privacidade não seria nada ruim. No entanto, se Asura estava feliz, eu também estava. Mesmo com sua máscara cobrindo suas belas feições, eu conseguia imaginar o sorriso angelical que ela emitia.
Mesmo que não fosse muito da nossa conta, precisávamos fazer algo importante.
Depois daquele jantar um pouco perturbado, andamos em direção a um estabelecimento um pouco mais afastado. A casa feita inteiramente de madeira era relaxante apenas de olhar. Um jardim esverdeado e bem cuidado tomava conta da passagem da frente. Aquele lugar nada mais nada menos que era um centro médico.
"Oh, então você é o famoso aventureiro Greed! Imagino que esta é a sua esposa que é tanto falada, Asteth, não é?"
"Sim, estamos felizes que deixaram a gente vista-lo."
"Não esquenta com isso, todos da cidade já falam bem de vocês e seria um pouco contraditório não deixar vocês fazerem esse tipo de coisa. Por favor, me sigam."
"Muito obrigado." Disse eu e Asura em uníssono.
Acompanhamos o mago curandeiro responsável pelo tratamento de Eugene. Fazia já um dia em que ele foi levado para esse centro médico e ainda não havia acordado. Eu achava bem estranho já que a maioria já havia despertado e ido para suas casas. Asura achou uma boa ideia ir visita-lo, já que ele nosso líder. É claro que fiquei muito preocupado com esse seu estado mesmo eu usando a reversão de tempo.
"Aqui está."
O mago curandeiro abriu a porta e nos deixou entrar. Lá estava ele. Seus cabelos alaranjados inconfundíveis estavam jogados pelo travesseiro. Seu rosto não estava mais pálido como antes, agora ele tinha cor. Parecia que ainda não havia acordado ainda, seu sono continuava pesado.
"Ele não despertou desde que voltou da batalha, talvez o seu cansaço pode ser responsável por isso. Mesmo assim, todo o seu quadro médico está bem. Ele ainda tem pulso e respira normalmente e adequadamente. Não parece desnutrido ainda, então só nos resta esperar acordar." Disse o mago curandeiro.
"Certo, contanto que você esteja cuidando dele, eu estarei despreocupado." Eu disse.
"Muito obrigado pela sua confiança."
Mesmo que eu dissesse isso, no fundo algo me preocupava, no entanto não sabia o que poderia ser. Os mistos sentimentos de alivio e culpa tomavam conta do meu ser naquele momento. Se eu tivesse um pouco de responsabilidade, nada disso teria acontecido. As visões infernais que presenciamos, nada seria visto.
Se eu fosse mais responsável.
***
As maravilhas do centro eram descritas como algo encantador pelos viajantes comerciantes que passavam pelo local.
O centro de Sagólia podia ser facilmente o ponto de referência de alguns amigos para se encontrarem ou algo do tipo. Mesmo que considerássemos centro, lá havia muito pouco comercio. Assim como Lálario, os planejadores optaram por deixar o distrito comercial nos dois extremos, para ser de fácil a acesso e rápido.
O centro de Sagólia era apenas um local turístico. O verde que tanto falavam era real. Os parques esverdeados eram encantadores e fariam com que aquilo se tornasse o ponto mais requisitado dos viajantes.
Mas naquele momento já não era tão belo.
"Eliminem Aros Silverstein! Eliminem Aros Silverstein!"
Esse era o grito da multidão. Mas em especifico, de um grupo rebelde. Com suas túnicas pretas, bandeiras rasgadas e alguns instrumentos incendiados, eles dominavam o centro de Sagólia e mostravam o quão barulhentos podiam ser.
"Isso aqui é uma desordem."
"Por favor pai, não fique assim, eu sei que ele conseguirá resolver."
"Se seu pai estivesse em forma, nada disso estaria acontecendo."
No centro de Sagólia, ficava o inimaginável castelo da família real. Ao alto da torre, onde ficava a sala do governante, duas figuras conversavam tristemente. O homem um pouco velho, cabelos esbranquiçados pela velhice, era o rei de Sagólia. Ao seu lado, uma linda jovem de cabelos castanhos e olhos esverdeados, era a sua filha.
"Isso não é sua culpa pai... é realmente daquele homem arrogante." Dizia sua filha com muita raiva.
"Laura, isso não é culpa de Aros Silverstein... ele está dando duro para resolver essa situação. Ele foi muito amigável em suas cartas, não há motivos para ter raiva de um homem como aquele... Na verdade, até suspeito que..."
Antes que ele terminasse a frase, a porta de sua sala se abriu.
"Majestade, aquele mesmo visitante está de volta para tratar de assuntos com o senhor. Deixo-o entrar?"
"Com certeza."
"Entendido."
O homem que havia anunciado a visita, se retira e se distancia da sala.
A filha do rei, Laura, se senta no sofá. Aquilo não era assunto para sua idade. Ela sabia que era nova demais para entender. Mesmo assim, como seu pai recomendara, ela tinha que ficar e se acostumar com conversas tediosas como essa. Afinal, mesmo com seus quinze anos, ela ainda era sucessora do trono.
Ela não entendia o motivo de seu pai não ter ódio de Aros Silverstein. Seu reino estava sendo destruído por conta daquele homem arrogante. Então por que ele não o elimina de uma vez? E daí que Aros está tentando resolver? Apenas o eliminar acabaria com tudo.
"Eu a trouxe majestade."
'A trouxe'? Era uma mulher? Se perguntou Laura.
"Deixe-a entrar." Anunciou o rei.
As portas se abriram completamente e Laura conseguiu ver mais de sua figura. A mulher que estava de frente a porta era uma linda mulher que tinha um corpo invejável. Seus cabelos eram longos da cor roxa. Seu uniforme por baixo de sua capa preta parecia um pouco familiar. Ela olhou mais e viu que tinha um brasão, o brasão da família real de Lálario. O brasão da família Silverstein.
Laura não pode deixar de franzir a testa contra a moça que se aproximava.
"Oh, é você Zerbst?" Diz o rei.
O que? Ele conhece essa mulher? Se perguntou Laura.
"Sou eu sim majestade, fico feliz que se lembra de meu nome."
"Tantas vezes veio me entregar as cartas, não tinha como esquecer. Deixa-me adivinhar, seria mais uma carta de Aros Silverstein."
"Sim, meu lorde já está ciente do avanço da rebelião."
A mulher dos invejáveis cabelos roxos, passou por Laura sem ao menos olhar para ela. Lógico que ela gostava de seus cabelos castanhos, mas ver uma cor de cabelo tão diferente a impressionou e a deixou encantada. Mesmo que não gostasse que aquela mulher fosse aliada aquele homem, Laura já admirava aquela mulher a sua frente sem nem mesmo conhecer seu passado ou saber sua verdadeira personalidade.
A mulher, denominada, Zerbst, andou em direção a mesa do rei e lhe entregou a carta. O rei parecia interessado no conteúdo e abriu rapidamente. O papel branco da mais alta qualidade parecia ser um belo entretenimento para o rei, já que seus olhos estavam tão fissurados que chegava a ser engraçado.
"Então Aros Silverstein já sabes quem é o líder?"
"Nós imaginamos que seja uma pessoa que não é muito querida pela gente. Pudemos rastrear alguns cheiros pela cidade e descobrimos que com certeza é dele. Meu lorde agradece se autorizasse a execução desse ser."
"Certo... essa tal pessoa está causando grandes problemas a meu reino e como disse que era um inimigo de vocês, deixarei nas mãos de vocês eliminá-lo a qualquer hora. No entanto, eu gostaria de estar junto no momento. Gostaria de ver o rosto do tal cretino."
"Direi isso ao meu lorde."
Foi nesse momento que Laura interviu, mesmo sabendo que aquilo era um assunto de extrema importância. Mesmo que deixasse seu pai envergonhado pela alguma coisa, ela precisava dizer algo.
"Eu quero estar junto também! Preciso ver o rosto de Aros Silverstein!" Ela disse.
Zerbst, a mulher dos cabelos roxos finalmente percebeu que havia outra presença na sala. O rei colocou a mão em seu rosto de vergonha e já estava se enchendo de fúria para repreender sua filha,
"Lau...!"
"Tudo bem, direi ao meu lorde isso também." Zerbst interrompe o rei.
O rei que iria repreender sua filha, mudou de ideia com a resposta firme de Zerbst. Era realmente amedrontador pensar em deixar sua filha presenciar uma execução, mas ela estava chegando na idade em que teria que saber sobre tudo isso. Nunca era tarde para educar a sua filha.
Zerbst se despede do rei se curvando e vai em direção a porta. Laura a observa até uns sete passos que ela dá pela sala. Sua mão encosta na porta da sala, até que...
"Deixa eu te perguntar..." Diz o rei.
"Hm?" Zerbst vira seu corpo para ouvir a fala do rei.
"Ele está aqui, não é?"
Essa foi a pergunta. Mesmo que fosse chocante e quase uma acusação, Zerbst não demonstrou desespero, ela apenas levantou suas sambrancelhas. Laura arregalou os olhos e não conseguiu encarar os dois ao mesmo tempo, mas soube que o clima havia ficado tenso.
"Infelizmente não posso responder esse tipo de pergunta."
"Tudo bem, não estava em mente que responderia. Mas se ele estiver aqui, diga a ele que não direi nada a ninguém e que pode me visitar a qualquer momento. Mas diga a ele que precisa ser rápido, pois algumas pessoas já estão descobrindo."
Zerbst apenas acenou com a cabeça, mas se recusou a responder. Ela então desta vez saiu pela porta da sala e deixou o recinto. Por mais que Laura dissesse aquilo momentos atrás, ela congelou. Ela não imaginava por nada que Aros pudesse estar em Sagólia naquele momento. Laura sabia das histórias de Aros durante o acidente e sem dúvidas ele era perigoso.
***
A noite chegamos novamente na hospedagem e tinha algo na qual precisava me preocupar.
Se Kisirel era mesmo o líder da rebelião, não seria difícil eliminá-lo já que ele é ridiculamente fraco. Mas eliminá-lo não é uma boa opção como Lukia havia me falado a algumas semanas atrás. Sem contar que Asura ficaria extremamente chateada se eu partisse para uma violência como essa sem autorização.
Eu estava trocando cartas com o rei de Sagólia e sabia que a situação estava cada vez pior. Se não me engano a rebelião já estava invadindo o centro e quanto mais se expandirem, pior será de lidar. Zerbst e Zannith estavam dando duro para tentar controlar a situação, fazendo ações as espreitas. Como dar anúncios antecipados para os guardas ou tampar as passagens para os outros distritos com um "pequeno acidente".
Era difícil pensar em negociar com Kisirel. Afinal durante o acidente eu o humilhei da pior forma. Destruí seu reino, fiz ele ver como era fraco e explodi sua cabeça. Tenho certeza que apenas uma conversa não resolveria em nada.
"O que devo fazer?" balancei minha cadeira de madeira enquanto olhava para o teto que incrivelmente estava limpo.
"Está pensando em Kisirel de novo?" Diz Asura.
"Você me lê por completo, isso é incrível."
"É um dos poderes que adquiri andando ao seu lado."
"Espero que o meu chegue rápido, para que eu possa saber sempre no que estiver pensando. Algo como "Asura está pensando em flores.", assim em um instante chegaria com um buque. Seria ótimo, não é?"
"Na verdade, não quero que leia meus pensamentos."
Quando olhei para Asura de novo, ela estava com o rosto virado para o outro lado e tentava esconder sua vergonha. Eu não sabia naquele momento no que ela estava pensando, mas com certeza era algo errado. Seja sobre mim ou de outra pessoa.
De repente, ouvimos batidas na nossa porta.
TOC TOC TOC!
Eram toques acelerados e fortes. Eu e Asura nos olhamos desesperados, porque não estávamos usando nossos disfarces. Se a pessoa que batia na porta quisesse abrir com tudo, iria descobrir tudo e com certeza o plano teria ido buraco a baixo. Mas felizmente havia dado tempo. Ou nem precisávamos...
"Greed-san, Asteth-san, se estiverem dormindo me desculpe, mas algo preocupante está vindo lá fora! O grupo rebelde... o grupo que é contra Aros Silverstein está avançando agora para nossa região. Eles vão chegar aqui."
Reconhecemos a voz e era Silka.
Sua voz havia claramente um tom de desespero. Mesmo atrás da porta, podíamos ouvir sua respiração ofegante. Pela sua voz frágil, parecia que ela estava prestes a chorar. Mas manteve-se firme para repassar as informações. Eu vi o rosto de Asura e ela estava claramente com um rosto de pena.
"Por favor, se tiverem ouvindo, encontre-nos perto da taverna."
Depois disso, ouvimos seus passos até a escada que depois cessaram e houve um momento silencioso. Asura estava com os olhos arregalados e tudo que pude pensar naquele momento era... Kisirel. Ele estava movendo seu grupo rebelde muito mais rápido do que pensava.
"Aros, você estava certo... ele sabe que você está aqui." Diz Asura.
"..."
Não se passou nem um segundo dessa fala e começamos a ouvir barulhos no lado de fora. Eram gritos e passos altos como se fossem marchas de soldados. O cheiro incessante de multidão começou a entrar pelos meus narizes, o clima tranquilo que antes era aquele lugar, estava começando a se estragar.
De repente, uma pedra quebra a janela da hospedagem e cai no meio do quarto.
"O que é isso!?" Disse Asura, claramente perturbada.
Eu cheguei mais perto e peguei a pedra que fora arremessada. Na pedra, havia apenas um papel claramente amassado e colado de qualquer jeito. Coletei o papel e abri para ver seu conteúdo e nada me surpreendia. Com uma escrita feia propositalmente, a tinta escorria pelo papel como em um filme de terror.
"Eliminem Aros Silverstein." Isso estava escrito.