A alvorada mal tinha começado, os primeiros resquícios de luz esgueirando-se pelas janelas do dormitório, quando Ren cuidadosamente extraiu um pequeno pacote de sua mochila.
O silêncio da manhã era quebrado apenas pela respiração suave de seus colegas de quarto e os chamados distantes dos pássaros matinais.
Enquanto seus companheiros dormiam pacificamente, alheios ao que estava por vir, ele mediu uma quantidade precisa de pó preto, terra profunda que ele vinha coletando discretamente no limite da zona permitida.
O pó parecia absorver até a fraca luz pré-amanhecer, parecendo mais um vazio do que uma substância.
Era um material raro e difícil de encontrar, terra que havia conseguido absorver mana sem transferi-la para os depósitos de cristal próximos.
Nas profundezas que lhes era permitido alcançar, era realmente desafiador localizar, mas o conhecimento de Ren tornou a tarefa consideravelmente mais fácil, mostrando-lhe exatamente onde procurar e como identificar o artigo genuíno entre amostras de aparência similar, mas inúteis.
A terra profunda era o agente de selamento perfeito para o besouro do Taro, embora este detalhe não aparecesse em nenhum dos livros que seu amigo havia estudado tão diligentemente.
Ren podia se lembrar de ver Taro debruçado sobre tomo após tomo na biblioteca, procurando por informações que estavam bem diante dele, mas que foram mal interpretadas por gerações de estudiosos.
Liu havia mencionado a terra profunda como um componente necessário para algumas bestas da terra, mas ele havia associado incorretamente isso ao processamento em vez de ao selamento. Parecia ter sido pura sorte e coincidência que ele a tivesse mencionado...
Ele poderia talvez ter usado o argumento de Liu para facilitar a aceitação por parte do Taro, mas ele sabia que Taro lia vários livros sobre sua besta. Portanto...
Para evitar mais discussões e interrupções potenciais, Ren havia decidido manter este passo em segredo.
Quanto menos perguntas fossem feitas sobre seus métodos nesta fase, melhor.
Sob a proteção de seus lençóis, ele trabalhava com precisão cirúrgica. Cada grão do pó preto era medido exatamente, seus movimentos cuidadosos e deliberados.
O cristal que haviam processado com a luz da lua na noite anterior reagiu imediatamente ao contato com o pó preto, seu brilho gradualmente mudando até adquirir um tom marrom terroso.
A transformação era fascinante de assistir, a luz interna do cristal parecia pulsar e girar enquanto absorvia as propriedades do pó, como assistir solo dissolver-se em água clara, mas em reverso.
Essa era o tipo de interação sutil que os livros ignoravam completamente, focando, em vez disso, em reações dramáticas e transformações chamativas.
Quando Taro começou a se mexer, mostrando os primeiros sinais de acordar, Ren já tinha completado a preparação do cristal. A temporização foi perfeita, mais tempo e o selamento poderia ter sido muito forte, menos tempo e poderia não ter funcionado adequadamente.
"Bom dia," ele sorriu, segurando o cristal acabado. "Seu primeiro cristal está pronto."
"Ah, sim... sim, claro," Taro murmurou, ainda meio adormecido.
"Aqui," Ren estendeu o cristal brilhante para um Taro quase acordado, que o aceitou com mãos pesadas de sono.
Ainda sonolento e confiante, Taro pegou o cristal sem examinar seu brilho marrom muito de perto. Afinal, ele havia decidido confiar em seu amigo. Com um bocejo, ele ativou o processo de absorção.
Por um momento, nada aconteceu. O quarto permaneceu imóvel, a luz da manhã lançando longas sombras pelo chão.
Então, o fluxo de mana começou.
Os olhos de Taro se arregalaram quando a primeira onda de poder passou por ele. Era mais intensa do que ele esperava, muito mais potente do que os cristais de prática que ele havia usado antes.
A sensação era como mergulhar em água gelada, chocante, avassaladora, mas de alguma forma revigorante.
Mais uma onda atingiu, mais forte que a primeira.
E outra.
E outra.
Cada pulso de poder parecia se construir no último, criando um efeito cascata que fazia o corpo inteiro de Taro vibrar com energia.
"Isso é..." Taro ofegou enquanto o poder continuava a crescer. "É demais..."
Liu saltou da cama no momento em que viu as veias de Taro começarem a brilhar com uma radiação azul inconfundível, o sinal revelador de envenenamento por mana.
As linhas azuis traçavam padrões sob sua pele como rios de luz.
"O que você fez?!" Liu avançou em direção a Ren, pânico evidente em sua voz. "Eu te disse que estavam supercarregados! Olhe para suas veias!"
As linhas azuis estavam se espalhando rapidamente pelos braços de Taro, que agora lutava para respirar. A mana fluía descontroladamente pelo seu sistema, muito mais do que seu corpo podia processar normalmente. Cada pulso fazia o brilho ficar mais brilhante, mais intenso.
"Precisamos levá-lo ao ambulatório," Liu já estava procurando freneticamente por seus sapatos. "O medicamento para envenenamento por mana é caro, mas se ele não o receber logo..."
"Espere," Ren manteve sua compostura, embora seus olhos nunca deixassem Taro. Seu calmo parecia quase sobrenatural diante de tal perigo.
"Esperar?! Ele está tendo um envenenamento massivo por sua causa!"
Min também havia acordado com a confusão e observava a cena com crescente preocupação, sua serpente d'água enrolando-se ansiosamente em seu braço.
"Só..." Ren levantou uma mão, "espere mais um momento."
As veias de Taro agora brilhavam com intensidade crescente, sua respiração havia se tornado errática, e gotas de suor apareciam em sua testa. Todos os sinais indicavam um caso grave de envenenamento por mana.
"Calma," Ren segurou firmemente os ombros de Taro. "Respire comigo. Devagar."
"A mana..." Taro ofegava, as linhas azuis pulsando brilhantemente sob sua pele.
"É muito, eu sei," a voz de Ren permanecia calma, controlada. "Mas seu besouro pode lidar com isso. Você só precisa guiá-lo corretamente."
Liu assistia da porta, dividido entre correr por ajuda e a estranha certeza no comportamento de Ren.
"Sinta o fluxo," Ren continuou. "Perceba como está se acumulando em seu peito? Você precisa movê-lo. Faça-o circular primeiro para seus braços."
Taro acenou fracamente, focando na sensação. Lentamente, as linhas azuis em seus braços começaram a desaparecer enquanto ele direcionava a energia.
"Bom. Agora, deixe um pouco fluir para suas costas. Seu besouro é uma criatura da terra, a mana deve se sentir mais natural fluindo para baixo."
Min prendeu a respiração enquanto observava as linhas azuis mudarem e gradualmente enfraquecerem, seguindo o controle de Taro.
"Um excesso temporário de mana não é ruim se você souber como controlá-lo," Ren explicava enquanto guiava Taro. "Sua besta é projetada para isso, ela só precisa que você ajude a distribuí-la corretamente."
Gradualmente, a respiração de Taro se normalizou.
As linhas azuis quase que completamente desapareceram, deixando apenas um brilho fraco sob sua pele que parecia mais saudável do que perigoso.
"Como você se sente?" Ren perguntou após vários minutos.
"É... diferente," Taro flexionou os dedos, surpreso. "Eu me sinto mais forte, mais conectado ao meu besouro. Isso é normal?"
"É como deveria ser," Ren sorriu, finalmente soltando seus ombros. "Os cristais tradicionais têm menos mana para evitar o envenenamento. Mas seu besouro pode lidar com mais para encurtar muito o período, contanto que você o guie corretamente."
Liu se aproximou novamente, sua expressão dividida entre o espanto e o ceticismo. "Como você sabia que funcionaria?"
"Porque eu conheço bestas melhor do que os livros sugerem," Ren respondeu simplesmente. "E este é apenas o primeiro dia."
Taro se levantou, experimentando sua nova sensação de poder. Não apenas ele havia sobrevivido ao aparente envenenamento, ele se sentia melhor do que nunca.
O primeiro cristal havia funcionado exatamente como Ren havia planejado.
Noventa e nove mais, e a evolução do besouro seria inegável.