— É isso mesmo? Por que você está zangado? Tem a ver com a gente? — questiona Amai com certo entusiasmo enquanto caminhava pela calçada, acompanhada pelos altos muros que separavam o terreno da rua.
Ela segura o smartphone com firmeza, enquanto os pequenos adereços e figurinhas de animações na capa rosa balançam suavemente ao ritmo do vento. Dá para sentir, sua voz transbordar de animação enquanto conversa com o rapaz, carregando um entusiasmo que vibra e preenche o ar ao redor.
— Sim, infelizmente… Mas, tipo, como isso vai funcionar? Com seu sobrenome, imagino que você seja bem ocupada, não é? — pergunta, sentado na maca.
Seus olhos alternam entre a sopa na bandeja sobre o colo e uma expressão de descontentamento, como se a refeição fosse mais um castigo do que um alívio.
"Comida para defunto…"
— Infelizmente? Que nada! Vai ser muito divertido! Pelo menos você vai ter companhia… alguém para te fazer parecer menos estranho para os outros… — ela graceja, tocando os lábios com a mão, como se estivesse afagando sua voz.
Sua expressão parece despretensiosa, quase brincalhona.
"Ele vai ficar uma fera…"
Enquanto pensa, suas bochechas ganham um leve tom rosado, e seu olhar se torna mais profundo, quase como se pudesse enxergá-lo do outro lado da tela digital.
— Estranho? — questiona.
E no mesmo instante, a colher plástica em sua mão se parte ao meio sob a pressão de sua força descontrolada, despencando na tigela e mergulhando na sopa quente.
O líquido borbulhante espirra para todos os lados, manchando a mesa sob seu colo com gotas escaldantes. E do outro lado da porta, o médico, que já se preparava para entrar, detém-se ao observar a cena pela pequena janela de vidro. Seu olhar de surpresa rapidamente dá lugar ao receio, e ele recua instintivamente.
"Vai que o estresse do exorcista explode ali mesmo… Esses caras devem lidar com uma barra diariamente…"
Pensou, enquanto um calafrio percorria sua espinha.
"Não serei eu a lidar com essa bomba prestes a detonar!"
Certo estava…
"Que diabos?! Por que, justo agora, uma garota?"
Ele praguejou, cerrando os punhos de frustração.
— Pois é… — ela respondeu, com um sorriso que beirava a provocação, sorte que ele não via. — E, já que estamos falando de um desastre, você também precisa melhorar muito profissionalmente! Sério, como pode um exorcista tão habilidoso quase demolir uma escola inteira só para lidar com um demônio daquele nível? — Ela continuou, a voz portada de ironia, enquanto caminhava com passos mais firmes e cheios de energia, sem nem olhar para trás.
As árvores do outro lado do muro também balançam suavemente ao vento, suas pétalas cor-de-rosa caindo ao chão e se espalhando aos seus pés. Elas criam uma bela pintura que contrasta com o clima cinzento e sombrio que domina o mundo.
— Ah… Eu… — Yamasaki tenta falar, mas as palavras tropeçam e se perdem no caminho, o fôlego se esvaindo enquanto ele luta para continuar.
— Eu? Nem tente, Yamasaki. Você é um garoto travesso, e sabe disso. Que tal diabinho trevoso? Combina perfeitamente com você! — ela dispara, cortando qualquer tentativa de resposta antes que ele consiga se explicar. As palavras dela chegam como flechas, rápidas e certeiras, deixando-o completamente desnorteado.
Para Yamasaki, conversar com ela é uma missão impossível. Suas habilidades sociais já são um desastre por si só, e diante daquela intensidade, ele só consegue se afogar mais.
— Vai se foder! Sério… — ele solta, em um misto de raiva e constrangimento, enquanto o rosto esquenta, ruborizado pela frustração.
— Haha, que boca suja… Mas bem, respondendo seu questionamento, não sou tão ocupada assim… Ser exorcista é a minha vida! — ela diz, soltando um suspiro cansado, como se a simples menção ao trabalho fosse um peso. Ela faz uma pausa, aguardando o tráfego diminuir antes de atravessar a rua. — Quando não estou treinando no refúgio da minha família, estou lá, aceitando missões nos quadros públicos… — Seus olhos brilham, como se a simples lembrança a energizasse, e ela se entrega a um breve desabafo.
"Finalmente…"
Pensou consigo, como se um peso fosse retirado de seus ombros. A conversa tomara outro rumo, e ele finalmente se via "levado" a sério.
— Entendi…
Do outro lado, o som das buzinas ecoa, misturado ao vai e vem apressado das pessoas… e, de repente, interrompe o silêncio:
— Bem, falamos mais quando tivermos uma missão para cumprir, certo? Deixo o resto com você… — diz, esboçando um sorriso fatigado, seguido de um bocejo, claramente mais interessado no descanso do que na tarefa em si.
— Espera!
Assim que a cabeça toca o travesseiro, a voz suave da garota quebra o silêncio, despertando-o. Ele sente uma pressão na mente, obrigando-se a sentar rapidamente, piscando algumas vezes para afastar a sonolência enquanto seus olhos percorrem a estante e a cadeira vazia na sala hospitalar.
— O que foi!?
Ela aperta os lábios, controlando-se com esforço, evitando se deixar levar pela urgência das palavras que estavam prestes a escapar e, assim, acelerar ainda mais o coração dele.
"Ele é como um café…
Amargo, mas irresistivelmente viciante!"
— Não era nada! Vou te mandar uma mensagem quando confirmar tudo, combinado? — responde finalmente, refreando os pensamentos mais impetuosos que quase escaparam.
— Combinado… Até a próxima… — Bocejando mais uma vez.
— Até… Diabinho trevoso…
No exato momento em que ouve, vira o rosto em direção ao smartphone à sua direita. Ao revirar os olhos, o som do aparelho sendo desligado preenche o silêncio daquela sala.
Enfim, silêncio…
"Finalmente…"
Ele relaxa, entregando-se à exaustão. Sua visão se embaça, e, com um baque suave, sua cabeça encontra o travesseiro.
"Maldito Azaael…
Me deixa como um aparelho viciado…
A energia espiritual se esvai, como se estivesse perfurado…"
A garota prossegue apressada, seus passos rápidos ecoando na calçada enquanto murmura palavras baixas, distraída pela busca frenética por uma música no aplicativo. Ela atravessa mais uma rua e, sem hesitar, para na calçada, diante de um carro preto estacionado no fim da via. O veículo brilha de maneira enigmática sob a luz que escapa das nuvens, com um crucifixo prateado preso ao para-choque dianteiro.
E quando o carro finalmente arranca, Rasen conclui, por fim, a árdua subida da escadaria do prédio. O relógio marca 16h da manhã, e, ao alcançar o topo, uma expressão de alívio se espalha por seu rosto, como se tivesse deixado para trás o peso de um desafio difícil.
Diferente dos demais andares, ali só havia uma porta e, à esquerda, um quadro de um navio navegando em águas tranquilas. Parecia uma embarcação antiga, dos períodos mais sangrentos de Aija, quando nenhum império conseguia se erguer e os povos se chamavam Fujianos.
Ao empurrar a porta, ele finalmente revê seu único amigo, ou ao menos, a pessoa mais próxima disso.
— Foram vinte e cinco dias… que pareceram cinquenta! — exclamou Romero, o tal, enquanto se deixava cair, quase derrotado pela espera, em uma poltrona surrada, no fundo daquele ambiente abafado.
O lugar exalava o peso do tempo, com livros espalhados de maneira caótica pelo chão, como se cada página fosse uma testemunha silenciosa de algo esquecido por outros mas lembrado por ele.
Na mesa, coberta por uma grossa camada de poeira, repousava um mapa. E Rasen, imperturbável, se manteve em pé sob o arco da porta, os olhos absorvendo cada detalhe da cena, como se aquele cenário não fosse apenas um simples espaço, mas uma palco crucial em um jogo maior.
Que estava prestes a iniciar, o botão "start" para ser pressionado.
— Realmente, mas agora estou aqui! — Ele deu o primeiro passo, seus dedos deslizando pelo mapa.
— Então, me conte, o que você descobriu?
— Foi uma experiência reveladora… No monte Hierosolyma, senti a presença da luz do anjo Gael, como se sua essência, sua vontade, permanecessem impregnadas no ar, como se a própria alma dos fundadores estivesse entrelaçada àquele lugar — ele diz, seu olhar distante enquanto continua a caminhar pelo recinto, seus passos ecoando suavemente no silêncio. — Isso me faz questionar por que a ordem foi estabelecida em Aija. As terras ali são áridas, desprovidas de fertilidade, e, no entanto, Niftar e o anjo decidiram fundar naquele local. Há algo de profundamente significativo por trás dessa escolha, não há? — pondera, como se a resposta estivesse oculta nas sombras daquele passado distante.
— Dinheiro, questões políticas… E com a ordem em Aija, o imperador fortaleceu sua posição junto ao povo. É um jogo de poder, onde cada movimento é calculado! — comenta, com um tom cínico, como se desmascarasse a verdadeira natureza por trás das ações dos homens. — Mas Niftar e Gael, com suas visões além do óbvio, devem ter percebido algo sagrado nessas terras!
Ao parar enquanto o ouve, ele contempla uma pintura que retrata um anjo cedendo lugar a um demônio. Há luz em sua queda e escuridão nos céus ao redor. A imagem é uma alusão a uma verdade que lhe agrada: ao se tornar um "demônio", ele se vê como um mal necessário…
— Realmente! — a certeza em sua voz era inconfundível. — Enfim… voltei com mais perguntas do que respostas! — ele diz, enquanto faz um movimento teatral tocando com firmeza um dos móveis antigos ao seu redor, um armário, deixando marcas de dedos na camada de poeira que o recobre.
— Por mais que tentemos compreender, a verdadeira natureza desta realidade sempre nos escapa; estamos apenas arranhando a superfície, deixando um mar de perguntas sem resposta — responde Romero, com o olhar brilhando como uma estrela nascente, encantado pelas palavras de seu amigo. — Por isso… nós somos necessários! — É claro que ele já tem uma ideia, e essa ideia o fascina profundamente.
Até alguém como Rasen percebe.
— Verdade…
Ele então esfrega os dedos enquanto recita o trecho de um livro, que os dois conhecem bem: "Nunc autem videmus per speculum in aenigmate, tunc autem facie ad faciem; nunc cognosco ex parte, tunc autem cognoscam sicut et cognitus sum…" Observa a poeira microscópica cair à sua frente.
É como um disparo, em meio ao caos, que reverbera insanidade por onde passa e atinge o coração de Romero.
— Isso nos força a reconhecer as limitações de nosso conhecimento superficial e a buscar modificar o destino… Cheguei à conclusão de que o simulacro da criação, a espiral que Schattenstein imaginou para um mundo perfeito, é a nossa melhor ideia: um mundo sem verdades, apenas harmonia!
E os dois discutem com uma sintonia impressionante, cada um complementando o argumento do outro.
— Mas, para alcançar isso, precisamos que minha espiral tenha um estoque de energia… um estoque que supere os limites que conhecemos! — responde, continuando o assunto que começaram há algum tempo, antes mesmo de ele viajar.
— Sim, e é exatamente por isso que estamos aqui, Rasen, neste lugar tomado por ratos — diz ele, olhando ao redor e arqueando as costas sobre a cadeira. — Meu plano é simples: vamos roubar o Cubo da Maldição Eterna, um objeto de Nível Apocalipse, armazenado e protegido no nível 17 da zona de contenção! Fica a apenas quinze minutos daqui… — revela.
Um sorriso soberbo então surge em Rasen.
— É verdade, como pude esquecer? Lembro quando o cubo foi descoberto. As lendas diziam que foi forjado a partir do desespero dos homens. Disseram haver mais de cem demônios mundanos selados dentro dele… seria uma fonte de energia inigualável! — confessou, compartilhando o entusiasmo do amigo. — Mas há dois problemas: como invadir sem ser interrompidos por um exército de exorcistas e como lidar com tantas entidades se o cubo for aberto? É um desafio até para mim… no máximo, conseguiria aprisionar dez com minha técnica inata expansiva… mas… — disse ele, pensativo, refletindo sobre os obstáculos à sua frente.
— Eu sei, mas vamos por parte… temos alguns dias até lá, e só preciso de seis exorcistas! — interrompe.
— Seis? — ele dá um suspiro, meio incrédulo.
— Sim, apenas seis. Meu plano é criar uma distração no dia da invasão da zona de contenção. Com sorte, isso fará com que todos os exorcistas se voltem contra nós. Se Milk for tão eficiente quanto imagino, conseguimos conter os celestiais por tempo suficiente! — ele responde. — Mas, com o cubo em mãos, temos que ser astutos. Na verdade, seremos os mais ousados! Você vai liberar todos os demônios, controlados ou não, e, conforme o caos se instala, a energia negra que será consumida em sua espiral virá do medo, terror e desespero que dominarão o ar!
Seus olhos pousam novamente no mapa entre os livros enquanto ele termina de falar, delineando os próximos passos do plano. Caído ali, após uma forte ventania, que invade pela janela sem vidraça.
"Energia em transformação, ainda não domada por um instinto… entendi!"
Pega na hora, ao invés de lidar com o trabalho de exorcizar entidades e usar a energia restante, o foco é criar energia e absorver enquanto independente de uma racionalidade formada.
— Dois planos suicidas! — admite, após essa breve reflexão, observando a palma da sua mão, onde a energia flui como uma espiral de dentro para fora. Então, ele fecha a mão e olha para Romero. — Perecer pelo nosso ideal ou dar ao mundo uma segunda chance? Parece justo! — ele exclama, determinado.
Ou parece… ao menos, naquela época…
— Assim somos, iluminados! — parafraseia, levantando-se energicamente da poltrona. — Bem, já que você chegou, que tal recrutar um rapaz comigo? Ele passou pelo mesmo caos que você…
— Eu? Não, Romero, não consigo convencer ninguém com essa minha cara… — responde, pegando o smartphone do bolso e soltando uma risada fria. — E, na verdade, preciso fazer uma visita… você entende, não?
O homem sorri de lado ao ouvir, enquanto pega um de seus livros e o segura entre a cintura e o cotovelo direito.
— Claro, nos vemos mais tarde, então, meu amigo… — e, antes de sair, ele para na porta. — Sigilo, hein! — o aviso surge como uma ameaça.
Um tolo, se pensa que será cumprido…