Demorou mais trinta minutos antes de eu conseguir desligar Bernie do telefone. Eu não me importava com o dinheiro que a empresa ia perder; eu não me importava em não vender minhas criações para aqueles que precisavam delas... Eu não me importava com nada disso.
Soltando um longo suspiro, peguei o telefone de novo.
"Chefe?" grunhiu uma voz baixa assim que minha chamada foi atendida.
"Espalhe que a matilha Silverblood está sem supressores de cio. Se alguém precisar, pode ir até você e pegar de graça," eu disse. Fechei os olhos e me recostei na cadeira.
As coisas eram muito menos complicadas como uma ratinha. Tudo o que minha outra metade se preocupava era se eu estava aquecida e alimentada.
Sério.
Era só isso.
Parte humana de mim que complicava as coisas, e minha ratinha não ficava impressionada na maior parte do tempo.
"Entendido," veio a resposta. Ah, um homem de poucas palavras, que maravilha.
"Me avise se você precisar de mais."
O clique no outro lado da linha me informou que meu homem tinha desligado.
Como eu disse, Caleb era gente boa.
Agora que essa crise tinha acabado, voltei a estudar a fórmula na minha frente.
Algo não estava certo... mas eu não conseguia entender o quê.
Fod*-se, isso vai me deixar louca.
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A manhã chegou rápido demais para o meu gosto, mas eu consegui tirar uma soneca de 45 minutos, então eu estava de pé e pronta para ir assim que meu alarme tocou.
Eu me arrumei rapidamente para trabalhar na lanchonete e peguei uma lata de spray para cabelo antes de correr para fora de casa.
Eram apenas 6h da manhã, então o bairro estava bem tranquilo, mas Paul e Caleb já deviam estar trabalhando há uma hora, preparando tudo para o dia.
Meu trajeto era muito mais rápido como humana do que como ratinha, e eu estava entrando pela porta da frente às seis e quinze.
"Bom dia!" eu gritei assim que passei pela porta da frente. Eu me virei e travei a porta depois de mim, não querendo que mais ninguém entrasse. Eu ainda tinha mais quinze minutos para preparar a frente da casa para os clientes e não precisava lidar com pessoas antes do tempo oficial.
"Bom dia," chamou Paul da cozinha, e ouvi Caleb grunhindo sua saudação. Como eu, Caleb não precisava de muito sono.
Empurrei as portas que levavam à cozinha e sorri para os dois homens.
"Posso roubar o Caleb por um minuto? Prometo devolvê-lo," sorri, dando um rápido beijo na bochecha de Paul.
Caleb assentiu com a cabeça e limpou as mãos no pano que estava preso ao seu avental. Imagino que Paul o fez cortar todos os vegetais, e eu não ficaria surpresa se Caleb precisasse de um intervalo.
O homem imenso caminhou até mim, e eu o levei para a sala de descanso dos funcionários para podermos conversar. Visto que havia apenas quatro funcionários para o lugar inteiro, e Amber não viria até às 11h, era o lugar mais seguro para conversar.
"Sim, Chefe?" grunhiu Caleb olhando para baixo na minha direção. Quero dizer, o cara tinha bem mais de 6 pés de altura e o dobro do meu tamanho, então ele tinha que olhar para baixo e se encurvar se quisesse falar comigo.
Ele era um dos poucos transmorfos que passava a maior parte da sua vida no mundo humano. Ele se alistou no exército aos 18 anos e agora, aos 28, já tinha visto sua cota de 'mer*a' e queria se estabilizar.
Felizmente para nós, ele também era um bom cozinheiro.
"Um pequeno presente para você," sorri enquanto lhe entregava a lata de spray para cabelo que eu havia colocado na minha bolsa.
"Uh," respondeu Caleb enquanto lia a lata, depois ele passou a mão pelos seus cabelos espessos e pretos e me olhou de um jeito estranho.
"Não é o que parece, eu prometo," eu ri. "Pense nisso como um spray de invisibilidade."
A cabeça de Caleb inclinou-se de lado num ângulo tal que era fácil imaginá-lo como um corvo confuso. "Eu sei que os compradores precisam sentir seu cheiro para encontrar você. Mas se você precisar despistar alguém, borrife isso em você todo. Isso eliminará completamente o seu cheiro para que eles não possam encontrá-lo. Vai durar 24 horas a menos que você reaplique. Ou se você se transformar."
A boca de Caleb caiu aberta enquanto ele olhava de mim para o spray que ele estava segurando.
"Onde diabos você conseguiu isso? Você não pode deixar ninguém saber disso!" ele sibilou e olhou ao redor da sala pequena em que estávamos. Já que só havia uma geladeira, uma pia pequena e bancada, bem como uma mesa com duas cadeiras, eu não achava que haveria alguém por perto capaz de ouvir nossa conversa.
"Não se preocupe com isso," dei de ombros. Ninguém conseguiria me encontrar através daquele recipiente. Eu tinha certeza disso. Mas eu também não deixaria meu homem nas ruas, vendendo minhas drogas, sem a capacidade de se proteger.
"Você sabe o que aconteceria se isso caísse em mãos erradas? Assassinos fariam uma fortuna se livrando de transmorfos. Não ter cheiro os tornaria invisíveis! E o governo... fod*-se..." Eu poderia dizer que ele estava ficando agitado pelo fato de estar passando a mão pelo cabelo como se quisesse arrancar tudo.
"Assassinos fazem uma fortuna matando," eu ironizei, tentando aliviar a tensão na sala. "E já que você é o único com um recipiente disso, a menos que você o dê para outra pessoa, ninguém vai saber."
Caleb me estudou como se nunca tivesse me visto de verdade antes. "Eu não posso aceitar isso. É perigoso demais."
"Você vai aceitar. Pelo simples fato de que eu preciso que você fique seguro," dei de ombros considerando a conversa encerrada.
"Tudo bem. Mas só usarei em último caso," grunhiu Caleb.
"Nossa, acho que essa foi a maior conversa que já ouvi você ter," brinquei, batendo no peito do grandalhão. "Mas sério. Use se precisar, e não se preocupe com as consequências. Desde que eles não coloquem as mãos em você, tudo vai ficar bem."
E todos nós sabíamos a quem eu me referia.
Lobos malditos.