Ulisses viajou, mas como? Se a agenda dele não tinha nada... eu dei uma olhada hoje quando cheguei. É abertura do festival e todos têm que estar aqui. Ele até mandou Júlio vir.
Mesmo depois da minha cena de ciúme possessivo, eu tinha certeza que ele ia me procurar, mas nada, também peguei pesado. Chamei ele de "homem galinha". Eu sou uma anta mesmo! O homem ficou comigo ali, fez questão de me dizer que não era traia. Mas o que eu poderia fazer? Ver aquela modelo perfeita com a camiseta dele e ainda fazendo charme, meu sangue ferveu! Agora vou ter de procurar ele e me desculpar. Raquel tem razão, eu ando muito possessiva. Já sou uma senhora de 35 anos e não uma menina de 15 anos agindo como dona do primeiro namorado.
Vamos deixar esses pensamentos pra lá, preciso colocar o Júlio na linha com os gastos. Ele vai ter que aprender a trabalhar com orçamentos.
- Ana? - Júlio retorna.
- Oi meu querido, entre. Vamos conversar e ver seus orçamentos para os próximos eventos.
- Ana, eu estive olhando as projeções, mas quero salientar que na maioria das vezes, nos eventos ou nas feiras, podem acontecer imprevistos que nos levem a fugir do cronograma.
- Sim, eu compreendo, mas você sai muito fora do planejado sempre, Júlio. Desde que eu estou aqui, eu venho acompanhando para assim fazer o planejamento do próximo ano.
- Mas Ana, você tem que entender que, por exemplo, a festa da Uva que será no próximo mês, no ano passado o frio foi monstruoso. Eu tive de colocar um aquecedor para deixar o nosso espaço mais confortável e agradável. Argumentou Júlio.
- Sim, eu compreendo Júlio, não sou uma megera. - Ela sorri.
Júlio é todo sorriso, nem parece que estava levando bronca.
- Vamos combinar o seguinte, nos próximos eventos eu vou destinar as verbas e mais um adicional de 15% sobre o valor do orçamento para imprevistos. Mas só pode gastar se realmente precisar, não vai achar que pode tudo. - Dou uma picadela e sorrio.
- Combinado, Dona Ana.
Estendo a mão para firmar nosso acordo e ele me devolve a sua.
- A propósito, Ana, está na hora do almoço. Pode me dar a honra?
- Nem percebi, eu não iria sair pra almoçar, mas já que o convite foi feito eu topo.
Chegamos à cantina da cooperativa. Era o local de quase todos ali. Bernardo mais adiante com a Marcia e a Giovana almoçado.
- Júlio, vamos almoçar com eles.
- Ana, não me levaria a mal, mas que queria almoçar apenas com você. Pode ser?
- Tá. O que será que ele quer? Não gosto desse tipo de suspense. Percebo que ele e o Bernardo se encaram por um longo tempo. Nossos pratos chegam e até então as conversas são amenidades.
- Ana, vou falar sem rodeios, até porque não gosto de enrolar.
- Claro, pode falar.
- Aninha, sábado à noite eu que levei aquelas meninas pra casa. O Ulisses não tinha ideia. Quando ele saiu do restaurante, ele me falou que ia correr e às vezes ele fica a noite fora correndo, é um costume de loboo... digo dele. Confesso que a ruiva ficou um tanto frustrada porque ele não estava em casa. E eu estava tão empolgado na morena, que não vi a hora que ela foi para o quarto do meu irmão e tirou a roupa dela e colocou aquela maldita camiseta, Ana.
- Júlio, você não precisa me justificar nada.
- Preciso, sim. Meu parça, não é um galinha, Ana! Ele tá louco por você. Somos homens, claro! Os hormônios são mais fortes, às vezes, que a razão, mas ele quer você. Ele ficou puto. Colocou a moça pra fora de casa e saiu bufando com a merda que fiz.
Tudo o que o Júlio me fala me deixa ainda mais confusa. Eu tento argumentar.
- Eu compreendo. Na hora tive uma crise boba de ciúmes, um tanto possessiva, mas depois que pensei direito e estou até com vergonha. Eu não sei o que pensar. É a segunda vez que ficamos juntos. Mas o frenesi com ele é muito além do normal. Na primeira vez que transei com ele, você acredita que ele me mordeu.
- MORDEU??! - Ele me pergunta com espanto.
- Sim, isso mesmo, mordeu. Não sei por que estou contando isso. Nunca contei a ninguém, mas com você a conversa é solta, pois você é próximo dele.
- Ana, não somos parente de sangue, mas nos consideramos primos-irmãos, eu dou minha vida por ele. Ele se tornou meu alfa.
- Alfa? - Pergunto com um ar de curiosidade.
- Putz, falei demais... sim, Ana. Alfa, aquele que lidera, que me ajuda quando eu preciso, uma mania boba que tenho de chamar ele assim.
- Sei, compreendo.
Mas uma palavra que está anotada na minha mente, "Matilha, Romênia, alfa, lobo" - acho que vou fazer algumas pesquisas na internet sobre isso.
- Viu, não se preocupe. Eu ia procurar ele hoje para conversar sobre o mal-entendido, mas agora vou ter de esperar ele voltar. Suspiro e volto a me concentrar no meu prato.
O Almoço com o Júlio foi bem descontraído. Ele me disse que conheceu o Ulisses quando ele tinha 15 anos. Ele era um menino de rua, sem família, e a comunidade o adotou, então para Júlio, hoje Ulisses é sua família, alguém por quem dá a vida.
Enfim, aonde o Ulisses foi? - Iria sondar à Julia, a recepcionista. Ela sempre sabe das coisas.
Só no final da tarde descobriu que ele foi para o acampamento. Segundo o Bernardo ele estava muito estressado e precisava de um tempo com a natureza. Então o recurso era esperar.