Já faziam quase quatro anos desde que eu reencarnara. Minhas pernas finalmente se desenvolveram o bastante para que eu pudesse andar, e, além disso, consegui aprender a falar a língua deste novo mundo.
Meu novo nome era Vanitas, que meu pai diz significar 'valente'. Aprendi que nossa trupe era uma grande família de artistas itinerantes, os Therion. Isso explicava o afeto de meu pai pelo instrumento de madeira. Não éramos meros artistas, como poderia inicialmente supor. Ao contrário, éramos uma grande e renomada companhia de artistas itinerantes, conhecida em todo os quatro reinos de Roshar. Nosso status não era de um grupo de vagabundos fazendo apresentações por uns trocados ou uma refeição, mas sim o de artistas da corte, vassalos do nobre Barão Greenweed.
As terras do Barão Greenweed se localizavam ao sul da República, um dos quatro reinos que formavam o mundo de Roshar. Entre esses reinos, a República era a maior em tamanho e população. Eu aprendi sobre isso em um dos livros que estavam na pequena biblioteca da carroça de Shae, nossa principal dançarina.
Falando em livros, a biblioteca de Barão Greenweed era uma vasta caverna de conhecimento; com mais de cem volumes, ela se erguia como um templo do saber. Desde que retornássemos em segurança, ele não se importava se pegássemos emprestados um ou dois exemplares.
Foi ali que me deparei com as fascinantes histórias do Grande Valoran, um mago cujas habilidades transcendiam a imaginação. Ele conhecia o nome de todas as coisas, invocava relâmpagos com um simples gesto, transformava qualquer coisa em pó com suas poderosas chamas e até deslizava pelo vento quando assim desejava.
Em uma dessas estórias épicas, Valoran enfrentava e superava com bravura as garras do Sombraim, seres sobrenaturais astutos que o haviam aprisionado em uma torre intransponível. Nessa narrativa, ele transformara a parede de pedra da torre em fina areia, e, ao caminhar sob o céu, parecia descer degraus invisíveis como se fossem escadas etéreas.
Durante meus primeiros anos de vida, suas aventuras eram as que mais fascinavam. E foi dessa forma que comecei a aprender a ler.
A chegada de nossa trupe a pequenas cidades era um evento que superava em grandiosidade até mesmo a combinação da Copa do Mundo com as Olimpíadas. Normalmente, nosso bando consistia de pelo menos oito carroças e mais de duas dúzias de artistas: atores, acrobatas, músicos, mágicos, malabaristas e bobos da corte; todos membros da minha família.
Meu pai, Meridan, era o melhor ator e músico que se poderia encontrar. Minha mãe, Zarith, possuía um talento inato para as palavras e um pequeno conhecimento mágico. Ambos eram pessoas de beleza radiante, com peles claras e sorrisos fáceis. Eram Therion até a medula, e isso era tudo que você precisava saber sobre eles, exceto, talvez, que mamãe tinha uma origem nobre antes de se unir à trupe.
Ela me contou que papai a conquistou com canções doces e palavras ainda mais doces, persuadindo-a a deixar um "inferno entediante e miserável" para trás. Essa vida "entediante e miserável" referia-se a Três Corações, uma cidade onde visitamos parentes uma vez, quando eu era um bebê recém-nascido.
Meus pais nunca formalizaram seu casamento em uma igreja, e isso nunca me incomodou. Eles se consideravam casados e não viam necessidade de fazer um anúncio oficial a qualquer governo ou a Deus. Respeitei essa postura. Na verdade, eles pareciam mais felizes e leais do que muitos casais oficialmente casados que conheci desde então.
Nosso mecenas era o Barão Greenweed, um nome que abria portas que, sob circunstâncias normais, estariam fechadas para os Therion. Em troca de nosso serviço, usávamos as cores verde e cinza e contribuíamos para a reputação dele em qualquer lugar que fôssemos. Uma vez por ano, passávamos duas semanas em sua propriedade, oferecendo entretenimento para ele e sua família.
O início da minha vida neste novo mundo foi como viver em um interminável parque de descobertas. Meu pai costumava recitar grandes monólogos para mim durante as longas viagens de carroça entre as cidades. Quase sempre, ele recitava de memória, sua voz ecoando ao longo de centenas de metros de estrada. Eu o acompanhava na leitura, assumindo papéis secundários para aprender a ler e escrever no idioma local. Ele me encorajava a tentar as partes mais notáveis, e eu aprendi a amar a sensação das palavras certas.
Além disso, ele me iniciou na arte da música. Aprendi que o instrumento que ele tanto venerava nas tardes de ócio era chamado alaúde, e ele me ensinou todos os acordes principais quando eu ainda tinha dedos pequenos e gorduchos. Com o tempo, as lições se tornaram mais desafiadoras, e, por algum motivo, meu pai parecia se divertir cada vez mais com isso.
Mamãe e eu compúnhamos canções juntos. Às vezes, meus pais encenavam diálogos românticos, enquanto eu os acompanhava nos livros. Para mim, não parecia apenas uma brincadeira. Eu tinha alguma noção da astúcia com que estava sendo ensinado.
No entanto, sempre que eu tentava conversar com ela sobre magia, um descontentamento parecia preencher seu olhar e o assunto era prontamente desviado. Nunca me atrevi a confrontá-la sobre o incidente que ocorreu quando eu ainda era um bebê, quando ela usou algum tipo de magia do vento para me salvar de uma queda iminente. Seria, afinal, estranho reter memórias de algo que aconteceu em uma fase tão precoce da vida.
Após muito tentar, a vida me revelou o motivo de ninguém querer conversar comigo sobre magia. Neste mundo, onde a religião venerava um Deus chamado Ardonai, qualquer contato com o sobrenatural era considerado heresia. E, naturalmente, isso abrangia tudo o que estava relacionado à arte da magia.
Isso apenas fazia com que meu interesse pelo assunto crescesse cada vez mais.
Ambos dedicavam-se incansavelmente à criação de uma canção que já há anos cultivavam, viajando de cidade em cidade em busca de qualquer fragmento de informação sobre o Lanis e sua esposa, Lyra — personagens que protagonizavam grandes histórias naquele mundo, assim como o Grande Valoran. Não compreendia completamente o motivo pelo qual meus pais se atraíam por temas oriundos de uma história infantil. Mas uma coisa era certa: nenhuma das músicas que criaram, até hoje, poderia ser considerada menos que sublime. Cada uma era uma obra-prima, na sua mais pura essência.
Era uma criança curiosa: rápida com perguntas e ansiosa para aprender, sempre em busca de qualquer nova informação sobre este mundo. Com acrobatas e atores como meus professores, não é surpresa que eu nunca tivesse desenvolvido medo das aulas ou do risco de quebrar minhas pernas, como seria normal para uma criança.
As estradas eram mais seguras naqueles dias, mas as pessoas prudentes ainda viajavam com nossa trupe por questões de segurança. Elas complementaram minha educação de maneira única.
Adquiri um conhecimento superficial das leis da República com um advogado itinerante, que, embriagado ou pomposo demais para perceber que estava ensinando um menino de cinco anos, me transmitiu muito mais do que poderia imaginar. Aprendi a arte de trabalhar a madeira com um caçador chamado Hamon, que viajou conosco por quase uma temporada inteira. Descobri os sórdidos bastidores da corte imperial de Mitreza, outro dos quatro reinos, com... uma cortesã.
Como meu pai costumava dizer: "Chame um plebeu de plebeu; diga pão, pão, queijo, queijo; mas sempre chame uma prostituta de senhora. A vida delas já é difícil o suficiente, e ser educado nunca fez mal a ninguém."
Nadja tinha um leve aroma de canela, e aos seis anos, eu a achava fascinante, sem saber exatamente por quê. Ela me ensinou a nunca fazer em particular aquilo do que não quisesse ouvir falar em público e me alertou a não falar durante o sono.
Por favor, não a julgue por isso. Suas intenções eram boas.