Capítulo 6
A maldita Coca-Cola
Alex:
Me forço a sair de cima do Gabriel o mais rápido possível. Como uma brincadeira simples quase me fez beijá-lo? Me sento o mais longe dele que consigo naquele sofá. Ele se ajeita parecendo estar tão sem jeito quanto eu.
- Você já pensou em reclamar, com o dono do prédio, sobre esses pássaros? - ele reclama. - Eles podem trazer qualquer tipo de doença, sabia?
- Calma, são só pássaros, Gabriel. - me levanto indo até a cozinha e espantando eles da minha mesa. - Mas e aí? Vamos ter a bendita aula ou você já desistiu de me ajudar?
Pergunto abrindo a geladeira e retirando duas garrafinhas pet de coca-cola, levo uma até ele, lutando ao máximo para deixar o clima ameno entre nós. Eu não quero que ele pense que estou surtando por conta de um beijo que nem aconteceu. Mesmo que eu esteja surtando internamente nesse momento.
- Mudou de ideia sobre o meu plano? Há uns minutos atrás você estava querendo desistir e agora ...
- Acho que você está certo sobre eu precisar me socializar mais. - Tomo um gole da minha coca e volto a sentar ao lado dele. - Talvez seja hora de eu ter um relacionamento.
- Sério? - ele pergunta, virando o rosto pra mim.
- Sim. - digo, pensando friamente. - Acho que você abriu a minha mente sobre isso.
- Ok.
- Bom, tenho que concordar que sair com alguém pode mesmo me ajudar a esquecer o que sinto por você. Então, o quanto antes eu conseguir isso, melhor pra nós não é mesmo?
- É... - Ele me olha de um jeito estranho, mas confirma. - Realmente.
- Então é isso. Qual seu primeiro conselho sobre flertar?
- Certo. Deixa eu pensar...- Ele deixa a cabeça pender para o lado enquanto obviamente pensava em algo. - Primeiro, não me leve a mal, mas você precisa caprichar melhor no seu humor quando estiver tentando socializar com um possível ficante.
- Como assim? Eu não vivo de mau humor.
- Alex , toda vez que vamos ao Red Moon você fica de cara fechada, como se estivesse odiando estar ali. Isso sempre afasta possíveis pretendentes.
- Você é meio tapado mesmo, não é?
- Hey? Por que está me xingando?
- Gabriel, já passou pela sua cabeça que meu humor ruim era causado pelo fato de que eu via você beijando Deus e o mundo naquele lugar?
- Ahhh... - ele fica visivelmente constrangido com minhas palavras. - Me desculpe, eu não…
- Eu não quero que você se desculpe. Não é culpa sua...
- Eu sei, mas ...
- Esquece... Eu sei que você está certo. Vou melhorar meu humor, prometo. - reforço o que digo, abrindo um largo sorriso para ele. Mas em vez de ele ficar contente, parece que ele fica mais irritado ainda.
Gabriel:
Aquele sorriso seria suficiente para qualquer um se sentir atraído pelo Alex . Então era mais do que óbvio que ele não precisava de nenhum conselho meu para se dar bem na paquera.
Tenho certeza de que a causa dele sempre estar sozinho era por que ele fazia questão de afastar quem quer que se mostrasse interessado.
- Bem, se você continuar sorrindo assim, vai conseguir quem quiser.
- Já ouvi isso antes. - ele diz parecendo presunçoso.- Uma vez, o Leo disse que o cara que eu gostava era um idiota por não reparar no meu sorriso.
- O quê? Você falou de mim pra ele? - Droga, estou muito irritado. - E ele ainda me chamou de idiota?
- Primeiro, eu não disse seu nome pra ele. - Alex explica sorrindo. - E segundo... Você é: Gabriel, o idiota.
Pego uma almofada e jogo nele.
- Ok, vamos voltar à aula. Além de sorrir, tente demonstrar interesse pelo que a pessoa está falando. Mesmo que não seja interessante.
- Isso é um porre. Fingir que a conversa é interessante a troco de que? Se o cara não tiver um papo legal, prefiro voltar para casa e ler um bom livro.
- Por que você prefere ler, a transar? - pergunto no intuito de deixar ele constrangido. Mas não é bem isso que acontece.
- Por que eu prefiro mil vezes transar com um cara interessante. Acho que não sou atraído apenas por beleza. Pra mim a pessoa tem que ter o pacote completo.
- Então, o tal do Leo tem o pacote completo?
- Digamos que sim.
Por que eu me sinto desconfortável ao escutar ele confirmar isso tão rapidamente? Era estranho, porque mesmo eu sabendo que ele gostava de mim durante os últimos dois anos, estou curioso pra saber por que ele nunca tentou nada comigo. Eu sei que ele me conhece melhor do que ninguém. Ele sabe quem eu sou de verdade, claro que ele tentaria fugir desse sentimento.
- Por que você nunca tentou nada comigo, Alex ? - As palavras saem da minha boca antes que eu pense na bagunça que isso pode se tornar.
- O que? - ele arregala os olhos diante da minha pergunta. - Gabriel... Eu não ...
- Desculpe. Eu não devia ter perguntado sobre isso. - Esse tipo de conversa era perigosa.
- Não, não tem problema… Eu gosto que você seja sempre sincero comigo. Gosto de saber o que se passa na sua cabeça... Na verdade, esse seu jeito verdadeiro de ser foi o que fez da nossa amizade o que ela é até hoje. - Ele faz uma pausa e continua. - Quando comecei a gostar de você não foi algo apenas físico. Então me controlar perto de você não era tão difícil.
- Como assim?
- Eu queria sua amizade. Eu gostava demais da nossa cumplicidade que rolou logo de cara. Foi tão natural o modo como a gente se conectou. O modo como você confiou em mim tão facilmente. Que eu jamais iria querer perder isso apenas por conta de um desejo físico. E isso me fez NÃO querer tentar fazer sexo com você.
Ele não queria sexo comigo? Nem mesmo uma vez? E novamente o desapontamento me perturba.
E do nada veio à minha mente todas as vezes em que eu estive aqui nesse mesmo sofá, sentado sem camisa enquanto jogava videogame por horas e ele ficava ao meu lado apenas lendo ou estudando. Nenhuma vez ele sequer me olhou de modo diferente. Será que eu não era... Bom, eu não era desejável para ele? Mas então, que tipo de amor era esse que ele dizia sentir por mim?
Minha mente explode cheia de teorias malucas e cada uma delas me deixava mais e mais com um humor duvidoso.
Eu o vejo levar a garrafinha de coca cola a boca e enquanto ele bebia o líquido gelado, fui hipnotizado por seu perfil. Era muito tentador olhar para ele assim... E céus, ele estava apenas tomando uma coca-cola. Como ele poderia parecer tão sexy neste momento? Inferno. Eu nunca olhei para meu melhor amigo assim.
Quando uma pequena gota de coca cola escorre de seus lábios, automaticamente eu abro minha boca como se desejasse suga-la direto de sua pele. Esse pensamento maluco me faz levantar num rompante, sentindo meu coração acelerado e meu corpo acordado de um modo muito louco.
- Banheiro. - digo simplesmente, e me dirijo para lá sem olhar para trás.
Droga.
Assim que fecho a porta, me olho no espelho e vejo minha expressão totalmente agoniada refletida ali.
Que porra estava acontecendo comigo? Ele é meu amigo. Ele acabou de dizer que lutou dois anos pra manter nossa amizade e que sexo estava fora de questão. Nossa amizade era mais importante. Estou totalmente de acordo. Afinal, o plano de fazer com que ele deixasse de gostar de mim era no intuito de manter nossa amizade.
Eu preciso me acalmar, respirar e colocar meus pensamentos em ordem. Jogo uma água fria em meu rosto, pra tentar amenizar o calor que subia pelo meu pescoço e se espalhava pelo resto do meu corpo e saio como se estivesse muito seguro de mim nesse momento.
Quando retorno a sala Alex estava digitando freneticamente no celular, com um sorriso no rosto.
- Com quem você está falando? - pergunto, curioso.
- Ontem eu adicionei o seu amigo no Instagram e estamos conversando.
- O quê?
- Você não achou mesmo que eu iria às escuras, não é? E bom, ele realmente parece um cara bem legal, como você disse.
- Hum... É. Eu disse...
- Acho que pode dar certo. - ele fala ainda sorrindo para o celular.
- Hum? - pergunto, confuso.
- Seu plano, pode dar certo. Realmente tem grandes chances de dar certo, Gabriel. Eu estou adorando conversar com ele...
Ver o Alex animado assim, sorrindo daquele jeito que o deixava mais interessante aos meus olhos estava me fazendo surtar.
Caramba. Eu estava fodido.
Alex :
Eu estava estranhando o mau humor e a quietude do Gabriel. A tal "aula" não deu em nada. Nenhum conselho importante, nenhuma dica que surtisse efeito real.
Ele se despede de mim, dizendo que precisava voltar urgente pra casa. E depois disso, só nos encontramos na aula. E ele também estava estranho lá.
Começo a me preocupar... Eu tinha certeza que ele não iria querer se afastar de mim depois que soube dos meus sentimentos. Ainda mais quando ele mesmo formou aquele plano maluco para que nossa amizade tivesse a chance de continuar.
Será que ele está receoso de que eu não deixe de gostar dele? Pensar nisso aperta meu coração. Eu juro que vou me esforçar, Gabriel. Não vou deixar esse sentimento destruir nossa amizade. Não vou...
Então, no dia seguinte acordo tentando parecer o mais animado possível. Vou pra doceria e trabalho normalmente, tentando não ficar nervoso conforme as horas iam passando. Como sempre perto da hora de eu ir pra casa, Gabriel aparece para me buscar e apenas vê-lo faz as borboletas em meu estômago ficarem alvoroçadas.
E novamente ele está quieto. Como se estivesse pensando em algo ruim o tempo todo. Durante o trajeto até meu apartamento tento puxar assunto com ele, mas ele apenas responde de modo monossilábico. E isso acaba me deixando irritado também.
Então assim que desço do carro, fecho a porta com uma força exagerada, coisa que sei que ele odeia. Mas foda-se.
Agora éramos os dois de mau humor.
Ele me segue, ainda calado. Quero perguntar o que há de errado com ele, mas não tenho coragem. Vou até a geladeira e pego minha garrafa de coca-cola mas dessa vez não ofereço uma a ele. Se ele quiser, ele que pegue.
Eu estava morrendo de sede então, viro a garrafa de coca toda de uma vez, e só percebo que deixei derramar um pouco quando sinto os dedos do Gabriel sobre meu rosto. Mais precisamente onde havia escorrido um pouco da coca cola.
Aquele simples toque me fez estremecer. Sentir seus dedos quentes sobre minha pele, me arrepiou por inteiro.
Mas o que ele fez a seguir é que me deixou totalmente duro.
Ele levou os dedos aos próprios lábios e sugou os resquícios da coca cola que havia retirado do meu rosto. E fez isso olhando diretamente pra mim.
Porra. Como é que se respira mesmo?
Gabriel:
Aquela maldita coca era a única culpada pelo que eu estava prestes a fazer. Não era possível me controlar agora. E não estou nem aí para as consequências do meu ato, porque tudo que eu queria era sentir o gosto da coca cola direto dos lábios do Alex . E, inferno... Penso nisso e em menos de cinco segundos me aproximo desesperado dele e faço o que estava com vontade de fazer desde ontem.
O beijo como se nada mais importasse.