('Que peça imprevisível...') Rui pensou consigo mesmo enquanto saía do Salão de Apresentação com Julian.
"É um pouco preocupante que você vá frequentar a Academia Marcial no mesmo grupo que ele. Cuidado com o garoto." Julian aconselhou.
"Pode deixar. Duvido que ele se dê ao trabalho de intimidar uma criança de treze anos, no entanto."
"Nunca se sabe."
Rui não achava provável que fosse se encontra com Nel. O sistema de treinamento e agrupamento não era como na Terra, onde colegas de turma tinham a mesma idade e ingressavam no sistema escolar no mesmo ano. Como o Caminho Marcial variava drasticamente de pessoa para pessoa, fazia pouco sentido simplesmente jogar pessoas da mesma idade na mesma categoria sem mais nem menos.
As pessoas desenvolviam suas Artes Marciais em velocidades diferentes, pessoas como Kane estavam muito à frente de outros estudantes apesar de serem muito mais jovens, fazia pouco sentido tratá-los da mesma maneira e treiná-los do mesmo jeito. Além disso, como a Arte Marcial era tão drasticamente única e pessoal, diferentes pessoas requeriam diferentes treinamentos. Fazia pouco sentido ser jogado no mesmo regime de treinamento. Uma grande parte do tempo Acadêmico seria também exploração por conta própria. Autotreinamento e autoaprendizado eram partes da jornada.
Justo quando Rui estava refletindo sobre os matizes do seu currículo Acadêmico-
"Rui! Que bom que você conseguiu."
Kane o chamou. Com os olhos verdes radiantes de alegria, ele correu em direção a Rui.
"E aí, cara, faz tempo." Rui disse em resposta, sorridente.
"É, faz tempo."
Rui olhou para seu guardião acompanhante. Um homem de meia-idade, com cabelo bem penteado e aparência bem-cuidada. Ele usava roupas luxuosas que, embora não chamativas o suficiente para atrair muita atenção, indicavam que ele não era apenas algum assistente insignificante. Rui notou um símbolo parecido com um brasão bordado em suas roupas formais, idêntico ao de Kane.
('Um brasão de família, hein?')
"Me diga, como você passou?" Kane perguntou curioso. "Eu vi alguém pegando seu distintivo."
"Não faço ideia, fiquei tão surpreso quanto você quando recebi a carta de admissão."
"Isso é estranho, mas ainda assim, quem se importa? Você passou, agora podemos ficar juntos." Kane sorriu.
"É, felizmente tive sorte o suficiente para ter passado."
De repente uma voz o chamou.
"Não foi sorte, Rui Quarrier."
Rui nem precisou se virar para saber quem o chamou. Ele reconheceu sua voz instantaneamente.
"Fae..." Ele disse. Ela estava sozinha, como adulta, não precisava de um Guardião. Ela vestia o que Rui jurava ser um sorriso falso. Era uma máscara perfeita e inscrutável que escondia suas emoções incrivelmente bem, impedindo aqueles ao redor de perceber suas intenções.
Rui apertou os olhos, cerrando o punho enquanto sua expressão se tornava séria. Ele não era uma pessoa vingativa, em vez de perseguir algo tão tolo como vingança por ser nocauteado por ela, ele preferia tirar o melhor daquela experiência e ficar forte o suficiente para nunca deixar que isso acontecesse novamente. Desde que não sofresse uma injustiça imoral, estava acostumado a olhar para frente. Ainda assim, ele não podia olhar com bons olhos para uma pessoa que basicamente intimidava os outros por diversão.
"O que você quer?"
"Nossa, você parece um pouco hostil."
"Isso tende a acontecer quando as pessoas me nocauteiam para se divertirem. Uma coisa é você me atacar pelo meu distintivo, outra coisa é atormentar os outros por diversão. Não gosto de pessoas assim."
"Tecnicamente foi autodefesa, não pretendia te nocautear, apenas lutar com você até que Nel estivesse livre, mas você foi forte o bastante para me forçar a usar todo o meu esforço." Ela deu de ombros.
"Isso é sofisma, você sabe." Rui suspirou em exasperação.
Os olhos de Fae brilharam. "Independentemente disso, você passou por mérito próprio. O departamento de Admissão da Academia Marcial não é incompetente."
"Eu perdi meu distintivo, isso é zero pontos para mim, claramente abaixo da média. Eu falhei nos critérios para passar."
Fae riu suavemente.
"Quem disse que os pontos têm algo a ver com o critério?"
Rui lhe lançou um olhar confuso. "Mestre Aronian disse."
"Mestre Aronian..." Ela continuou. "..Disse que o critério era a critério deles. Ele nunca disse que a realização do objetivo era uma aprovação garantida. Nem disse que falhar no objetivo era uma reprovação."
Rui olhou para ela, sem se divertir. Tecnicamente, ela estava certa. A formulação de Mestre Aronian realmente coincidia com o que ela disse, pelo que ele se lembrava. Ainda assim, se um objetivo é fornecido com o intuito de avaliar os candidatos, não era óbvio que o resultado de sua tentativa seria relevante para sua avaliação?
"Você está se apegando a trivialidades de novo." Ele retrucou.
"O resultado dos distintivos foi, francamente, irrelevante desde o começo. Os examinadores apenas queriam jogar os candidatos em conflito uns com os outros e avaliar o desempenho deles dadas suas circunstâncias." Ela explicou. "Você foi um alvo para os candidatos desde o começo. Mesmo assim, você conseguiu manter seu distintivo quase até o fim apesar de ser mais jovem e, portanto, mais fraco do que a maioria dos outros candidatos, você conseguiu isso através de táticas engenhosas. Embora tenha perdido seu distintivo, você o perdeu para mim, a candidata mais forte. E mesmo assim, seu desempenho contra mim foi bastante impressionante, considerando tudo. Todos esses dados entraram na avaliação do departamento de admissão sobre você."
Rui lançou um olhar cético para ela. Então ela o atacou sabendo que seu desempenho contra ela o beneficiaria em vez de prejudicar? Parecia conveniente. "Você parece muito informada sobre assuntos que deveriam ser classificados dentro da Academia. Como você poderia saber de tudo isso?"
"Ela tem uma Sábia Marcial como avó." Kane interrompeu. "Não tem nada que a Academia possa esconder de um Sábio Marcial. Ela deve ter conseguido um monte de informações e usado isso a seu favor."
Rui podia ouvir um pouco de rancor em seu tom. Fae lhe lançou um sorriso cortês em resposta.
"Há quanto tempo, jovem mestre Kane."
"Gostaria que tivesse sido um pouco mais longo, não vou mentir." Kane franziu o cenho.
"É só comigo ou está ouvindo um pouco de ressentimento em sua voz. Ah, você está com ciúmes que eu brinquei com o Rui aqui em vez de você no Exame, você deve estar nessa idade, afinal."
Kane, sendo o adolescente que era, mordeu a isca.
"Você-!" Rui colocou uma mão em seu ombro, puxando-o para trás.
"Calma, Kane." Ele aconselhou, antes de lançar um olhar exasperado para Fae.
('Ela está provocando e está gostando.') Rui refletiu desamparado. ('Esses dois claramente têm alguma história. Não tem como essa hostilidade passiva surgir do nada. Seria por causa de seu orgulho como descendentes de Sábios Marciais? Kane nunca me pareceu do tipo orgulhoso, e Fae parece estar meio que brincando, embora eu não consiga entender nada sobre ela por baixo daquela máscara.')
Ainda assim, a conversa havia confirmado suas suspeitas de que ela vinha de uma família Marcial, isso explicava em parte sua grande proeza em combate, ela não lhe parecia um gênio como Kane era.
('Kane tem talento natural e potencial ilimitado, mas a aptidão dela me parece mais como o produto de um treinamento insano e força de vontade, e pura experiência.')
Mesmo que ele não fosse particularmente fã de sua fachada de temperamento, ele tinha que reconhecer e respeitar o incrível empenho com o qual ela alcançou seu atual nível de poder.
"Vamos relaxar, pessoal." Ele tentou aliviar a atmosfera tensa. Ele não tinha certeza do que era o problema entre esses dois, mas preferia que não escalasse.