"Você tá louca?" a voz dela saiu de um jeito agudo e estridente que até ela se surpreendeu. Ela tampou a boca e limpou a garganta. Quando se sentiu confortável, apontou para Severus e o advertiu, "Se você ousar tocar em um dos meus frangos e patos, eu vou preparar ensopado de cachorro naquele dia. Adivinha quem vai ser o ingrediente principal dessa refeição?"
Severus a olhou com desprezo em seus olhos. Ele claramente a subestimava porque ela era mais fraca do que ele.
Ela percebeu que precisava cultivar com mais afinco para que pudesse subir de nível e dar uma surra nele. Por enquanto, era obrigada a ceder a ele.
Ela tomou um banho de dois minutos, dissolvia os cristais de alma em cinco garrafas de água e saiu do banheiro.
"Me segue e se comporta." ela o advertiu.
"Eu me comporto como eu quiser." Severus respondeu e a enfureceu mais uma vez.
Ela foi direto para a cozinha mas enquanto caminhava, ela podia sentir o doce aroma do mingau sendo cozido no ar.
"Algo cheira bem." Severus comentou.
Imagens do cachorro pulando numa panela de mingau cruzaram a mente dela e ela deu uma risada. Mas outra imagem dele saindo fervendo do mingau ileso e assustando a todos a fez acordar.
De jeito nenhum ela deixaria alguém saber que Severus era algo além de um cachorro normal.
"Não é para você, eu vou preparar a sua comida."
"Mas eu já estou com fome e isso cheira a comida. Por que você não pode me dar um pouco disso?" ele choramingou.
O choramingo dele soava mais como o rosnado de uma besta irritada. Se ele continuasse assim, logo estaria atraindo a atenção de muitas pessoas.
"Por que você não pode ser paciente? Você passou um século sem comer nada? Se você comer mingau, eu não te darei carne." ela o ameaçou.
Todos os cachorros amam carne afinal. Dada a escolha entre carne e mingau, seria apenas lógico que escolhessem carne.
Severus a seguiu em silêncio depois disso. Ela estava grata pelo silêncio que a permitia pensar.
Na cozinha, ela encontrou a mãe dela, que já estava comendo mingau de uma das tigelas decoradas com patos amarelos que ela preparou para Justin.
"Bom dia mãe."
"Bom dia Scarlet, como você está se sentindo hoje? Sua doença atacou novamente?"
"Não," ela respondeu.
"Eu descansei, tomei um remédio que meu professor me deixou e me sinto como uma mulher nova em folha. Onde todos foram?"
"Trabalhar." a mãe dela soprou a colher três vezes antes de levar a colher à boca de Scarlet. "Prova isso e me diz se acha que está bom."
Scarlet comeu o mingau e lentamente absorveu o sabor.
"Açúcar demais." ela disse.
"Eu vou dizer para eles reduzirem." a mãe dela saiu da cozinha e voltou para supervisionar a equipe de vinte mulheres que estavam encarregadas das refeições.
De todas as suas provisões, era o açúcar que mais a preocupava. O açúcar no seu armazenamento não duraria cinco meses se ela continuasse usando-o para todos os cidadãos.
À medida que ela pegava carne de boi congelada, molho de soja e outras especiarias de seu armazenamento, ela se perguntava como poderia remediar a situação o mais rápido possível. Não havia garantia de que em algum lugar da floresta Azul houvesse canas de açúcar ou beterrabas. Seria possível encontrar abelhas e produzir mel em larga escala?
Ela preparou um refogado de boi clássico e simples que não requeria ingredientes complicados ou um longo procedimento preparatório.
Em quarenta minutos, Severus estava com a cabeça enfiada numa tigela de comida.
"Não estou satisfeito ainda." ele reclamou quando terminou.
Ela tinha preparado cinco conjuntos esperando que a família pudesse comer alguns, mas pelo jeito que Severus os olhava com voracidade, ela sabia que ninguém mais os provaria hoje.
"Você precisa comer tudo? Você tem cinco estômagos?" ela perguntou a ele com muitas reclamações não verbalizadas em seus olhos.
"Um bom cão de caça é um cão satisfeito." Severus respondeu. "Você estava certa quando disse que eu mereço comer comidas maravilhosas. Teremos esta carne diariamente." Ele declarou como um rei para seu servo.
Ela queria esfaquear a boca dele com o garfo que estava segurando. Toda vez que ele abria a boca era para dizer algo enfurecedor. Onde ele achava que ela conseguiria carne? Ela não tinha visto gado algum neste planeta!!! Nem mesmo um javali ou um coelho.
Se ele comesse toda a carne em seu armazenamento, o que ela iria fazer?
Ela pensou nas palavras dele e elas de repente lhe deram uma ideia que ela não tinha considerado antes. Todo esse tempo ela estava reclamando da súbita interferência dele em sua vida sem ver um dos lados positivos. Ele era um cão de caça!!!! Se ele queria carne, ele poderia caçar e ela poderia cozinhar.
Ela pegou toda a carne que estava em uma grande bandeja e balançou na frente de Severus.
"Severus" ela disse.
"O que?" ele perguntou enquanto seus olhos seguiam a carne.
"Você gosta de comer carne, né?"
"Muito." ele respondeu. "Agora coloca isso aqui antes que eu coma você também."
Ela levantou a bandeja e disse, "Vamos com calma, veja bem, eu não me importo de cozinhar para você, mas você precisa fazer o que você faz de melhor, caçar. Se você caçar animais para que eu possa criar, eu cozinharei para você todo tipo de carne que eu conhecer.
Você sabia que existem mais de cem maneiras de cozinhar carne de boi. E temos também porco, frango, carneiro. Mmm, mm, mm. Tantos tipos saborosos de carne."
Ela podia ver Severus babando e ofegando com empolgação. Ele parecia menos um cão de caça e mais um cachorro de verdade.
"Termine esta refeição e nós podemos ir caçar bestas juntos, certo?"
Severus concordou e ela sorriu vitoriosa. Trocar uma bandeja de carne pelas habilidades de um cão de caça natural que não poderia ser ferido pelas bestas mutadas mais ferozes deste planeta era um bônus.
Ela continuou a acariciar a cabeça dele amorosamente enquanto ele comia. "Severus, acho que nós vamos nos dar muito bem."