"Você é louco", Daphne cuspiu, furiosa. "Totalmente delirante se você pensa que eu concordaria. Eu estou prometida a outro".
Contrastando, o homem parecia estar eufórico. Seus olhos haviam perdido um pouco de sua frieza. Ele riu, sorrindo carinhosamente para Daphne como se ela fosse sua verdadeira amante. Se ela não soubesse melhor, até teria se enganado com o olhar que ele deu a ela.
Ela sabia melhor. Isso não o impediu de mexer com a cabeça dela.
"Sim, eu sei. O pobre Príncipe Nathaniel simplesmente terá que conviver com essa pequena decepção. Não se preocupe com isso", ele disse confortador, acariciando a bochecha dela. Ela estremeceu.
"Não seja ridículo. Ainda há tempo para você acertar as coisas. Me solte imediatamente! Eu tenho que me casar com ele!"
"Hmm..." ele inclinou a cabeça em consideração, antes de dar a ela um sorriso zombador. "Não".
Daphne sufocou um grito exasperado, os dedos dela tremiam enquanto ela ansiava por apertá-los em volta do pescoço de seu captor e espremer. Enquanto isso, o homem apenas assistia a ela gritar com um sorriso indulgente, como se ela fosse um animal de estimação fazendo um escarcéu.
"Você vai descobrir que eu sou um marido muito melhor do que o Príncipe Nathaniel". Ele continuou, "Afinal, o que é um príncipe comparado a um rei?"
"... Um rei?" Daphne empalideceu, olhando o homem com cuidado de cima a baixo.
Não podia ser o Rei Atticus, podia? De acordo com as histórias, ele deveria ser um velho homem enrugado!
"Você é o Rei Atticus?" perguntou Daphne, ainda incrédula. "De Vramid?" Quando o homem não respondeu, o sangue de Daphne ferveu. "Não minta para mim, todo mundo sabe que o Rei Atticus deveria ser um velho. Você tem certeza de que não é o filho dele?"
O Rei Atticus, segundo o conhecimento do reino de Reaweth, era um velho homem enrugado que fez um pacto com o diabo por seus poderes. Contos de sua crueldade e sede de sangue eram bem conhecidos em Reaweth - na verdade, o Rei Atticus era um conto popular usado pelos pais para assustar crianças malcomportadas. Eles alegavam que o Rei Atticus roubaria crianças indisciplinadas enrolando seus longos dedos arranhados em volta dos tornozelos delas enquanto dormiam, e os devorava em seu sótão em troca de poder amaldiçoado.
Daphne havia tratado esses contos como pura besteira, uma história de ninar inventada por pais desesperados para que seus filhos se comportassem. Somente agora, ela percebeu que teria preferido o bicho-papão que roubava crianças ao invés da coisa real.
O homem zombou, murmurando amargamente para si mesmo. "Claro que eles diriam isso. Não é tão conveniente? Mentiroso até os ossos... "
"Desculpe?"
"Se é nisso que as pessoas em Reaweth acreditam, o sistema educacional do seu país precisa de uma reformulação... Princesa, abra os olhos e olhe bem para mim."
Ele levantou o queixo dela novamente, olhos âmbar encontrando os dela. Desta vez, ela encarou diretamente o olhar dele, e seu coração, traidor que era, pulou uma batida. Era completamente injusto que alguém tão desagradável tivesse um rosto tão bonito.
Apesar de Daphne não querer, ela olhou para ele. E que visão para os olhos o homem era.
Seus olhos eram poços profundos e rodopiantes do que lembrava ouro líquido. Combinado com seus lábios rosados e pele pálida que a lembrava da neve poeirenta lá fora, Daphne nem mesmo teria se surpreendido se ele se declarasse um anjo.
Bem, ou pelo menos, talvez se ela ainda não tivesse tido o luxo de interagir com ele, ela teria pensado nele como um. Com uma personalidade assim, ele ser um anjo era completamente impossível.
"Isso parece o rosto de um velho para você? Ou talvez você esperasse por um velho que morreria em cima de você durante a sua noite de núpcias? Você certamente tem gostos estranhos para uma princesa."
Daphne gaguejou, seu rosto ficando vermelho.
"O quê?! Como ousa― eu nunca―! A audácia―"
Ele passou a mão na parte inferior das costas dela, uma zombaria de conforto.
"Infelizmente, se você quer um velho enrugado, terá que ficar comigo pelos próximos cinquenta anos. Não é muito tempo. Tenho certeza de que vou me tornar agradável para você. Eventualmente."
"Cinquenta anos... Só por cima do meu cadáver! Eu não vou me casar com você mesmo que você seja o rei!" Daphne gritou, enfurecida. Ela preferiria se casar com um monstro de tentáculos do que com ele. Sua mão se moveu para esbofetear ele.
Os olhos do Rei Atticus brilharam um ouro mais brilhante. O corpo de Daphne congelou, como se estivesse imobilizado por outro poder. Ela queria falar, gritar e berrar, mas então sua boca se recusou a se mover. Ela não conseguia formar uma única palavra.
"Minha querida, isso não depende de você", disse o Rei Atticus pesarosamente, mas seus olhos eram aguçados e divertidos. "Estamos realizando nosso casamento agora. Você pode aparecer em lágrimas ou com um sorriso em seu rosto, não mudará o resultado."
Daphne piscou furiosa.
"Servos, preparem o padre e o salão", ordenou o Rei Atticus. Para surpresa de Daphne, um bando inteiro de empregadas apareceu e se dispersou, exceto por uma.
"Sua Alteza", ela perguntou timidamente. "Você vai desfazer o encantamento? Ou deixar a princesa se limpar?"
"Não. Ela dá tanto trabalho. Não podemos deixá-la se afogar na banheira."
Daphne riu um pouco incrédula, embora esse fosse o limite do que ela podia fazer.
O Rei Atticus fingiu não notar. "Seja uma querida, Maisie, e apenas a ajude a trocar para seu vestido de casamento e a ajude a pentear o cabelo." O Rei Atticus deu de ombros, de forma nãochalante.
Daphne lançou um olhar furioso para ele, desejando que ele se transformasse em cinzas. Ele sorriu.
"Mas eu vou deixar você falar, Esposa. Senão ficaremos entediados."
"Seu canalha, você vai pagar por isso!" Daphne gritou no momento em que pôde. O tal canalha apenas acenou em uma despedida zombadora.
"Princesa Daphne, eu vou te acompanhar até seu quarto para se trocar", disse Maisie, e Daphne foi forçada a apertar os dentes e suportar a total indignidade de ser carregada por uma empregada como se fosse um saco enorme de batatas.
Ela foi rapidamente deixada em um quarto.
"Sentimos muito por isso", disse uma empregada. "Sua Alteza normalmente não é assim."
"Difícil acreditar", Daphne murmurou com indignação em voz baixa.
As empregadas simplesmente deram uma careta e sorriram, incapazes de comentar mais. Daphne não tinha certeza se era porque elas não queriam entreter ela ou não ousavam. Afinal de contas, a princesa não ficaria surpresa se cabeças começassem a rolar por causa de línguas afiadas.
Daphne foi rapidamente apertada, preparada e enfeitada como uma boneca em questão de momentos. Ela vestia um delicado vestido branco que milagrosamente lhe cabia perfeitamente. Ele tinha mangas longas e transparentes que lembravam um sino e renda delicada em volta do corpete do vestido. Seu cabelo foi escovado e penteado em um coque perfeito, uma pequena tiara repousando no topo da cabeça dela.
As empregadas sequer se deram ao trabalho de perguntar a Daphne sobre sua opinião do traje. Assim que tudo estava no lugar, Daphne foi levada às pressas novamente. Desta vez, as empregadas a carregaram por um longo corredor e passaram por várias curvas e viradas, parando em frente a duas grandes portas.
"Boa sorte, Vossa Alteza", disse Maisie com um sorriso. A empregada convenientemente ignorou o olhar de puro horror que capturou as feições de Daphne em um aperto de morte. "Que você tenha um casamento abençoado."
"Espere... Espere, não―!"
As grandes portas se abriram antes que Daphne pudesse terminar adequadamente a frase. Um clarão de luz ofuscante quase cegou Daphne enquanto ela piscava, virando a cabeça para longe da porta. O som de trombetas estridentes e do órgão tocando a marcha nupcial clássica imediatamente soou. Acima de tudo, ela ouviu a voz do arauto anunciando a chegada dela.
Com um olhar entreaberto pelas pálpebras, Daphne avistou o homem bonito - embora diabólico - no final do altar. Mesmo de longe, ela não pôde deixar de notar o sorriso dele, curvado em um sorriso de ironia.
"Apresentando Sua Alteza Real, Princesa Daphne de Reaweth!"