O coração de Brandon estava pesado com os últimos pensamentos que teve. Mas era um fato inquestionável para si. Ele tinha medo e anseio, não havia como mudar por enquanto. A ansiedade de saber que a encontraria e até teria que interagir com Johannes era crescente. E mesmo que não queira, terá que enfrentar isso, como pensou anteriormente. Era inevitável. Porém a ideia parecia melhor do que ele ter que falar com Phillip, o qual somente apareceu na sua frente somente no dia que saiu com a senhora e James, e nem para falar com ele direito.
Mesmo assim, isso não o ajudou a se acalmar, mas significou que ele tentou ver de uma forma positiva a sua situação.
Os passos dele seguiram pelo corredor e chegaram até seu quarto, onde ele respirou profundamente e esfriou um pouco a cabeça. Seus olhos verdes foram até a mesa e ele também se sentou na cadeira, estando de frente ao espaço organizado que deixou e começou a trabalhar, tudo para que sua mente se ocupasse com outra coisa que não seja sua vida amorosa desastrosa.
Depois de algum tempo, uma presença atrás da porta foi sentida seguida por batidas. Brandon olhou para a porta de madeira por um instante e levantou-se, abrindo-a. Quem estava ali era Ferion, com o rosto um pouco mais suavizado do que ele viu mais cedo, mas ainda com a atmosfera sóbria que havia com ele.
Ele não achou que o veria mais hoje, depois que ele se despediu dele e foi reportar ao conde. Brandon pensou que se fossem se ver seria no dia seguinte quando ele fosse ao escritório de Ferion para trabalhar.
"Ferion, o que faz aqui?" Ele indaga.
O homem bonito de características da cor da noite não respondeu, mas sutilmente indicou se ele poderia entrar no espaço privado de Brandon. O ruivo parou por um instante e abriu espaço para que ele entrasse. Ele o viu adentrar e direcionar seu olhar por todo o lugar, parando na pelúcia que estava na cama, já que ele estava ocupado na mesa.
Era um pouco estranho isso, pois Phillip e James entravam ali com muita naturalidade e ele não ficou assim quando foi a primeira vez. Sua conexão com os outros era maior, então ele se sentia mais confortável com eles. Além disso, Brandon nunca pensou que aquele que o assustava quando menor entraria em seu quarto pela primeira vez. Era uma visão um tanto inesperada que ele fosse até seu quarto para discutir algo.
"Vim te avisar o que foi decidido. Achei que gostaria de saber." Ele respondeu parado no meio do quarto.
A porta atrás fechou e Brandon assentiu para as palavras proferidas pelo nobre. A curiosidade foi despertada nele. Seu jovem mestre disse que seu pai e ele conversariam sobre tudo assim que fosse relatado, mas ele deu uma direção do que ambos haviam se decidido fazer anteriormente. Ele esperava que não tivessem mudado de ideia.
"A punição de Ivor foi decidida como sendo cinquenta chicotadas e vinte anos de prisão que vai valer assim que os oficiais do governo se forem e a investigação deles forem concluída. Como o crime foi realizado no condado, então a punição dele é nossa responsabilidade."
Ferion começou, dizendo qual a penalidade que o criminoso irá sofrer pelos crimes que ele cometeu. Era bom saber que ele iria ser punido e que não era algo leviano. Cinquenta chicotadas era uma faixa comum para criminosos que não possuem crimes leves. Agredir crianças quando se é responsável por elas era algo que renderia bons anos de prisão, mas desviar dinheiro de uma instituição pública era uma transgressão que o império via como muito séria.
Era uma tristeza que a lei via como o desvio monetário como algo mais pesado que a violência infantil e Brandon só podia lamentar esse fato.
"Também prosseguiremos com o que eu havia informado antes. O apoio temporário será durante a investigação, enquanto ela permanecer em aberto, e iremos discutir um possível acordo com os agentes. Não há nenhuma mudança nisso."
"Isso é uma boa notícia." Diz Brandon aliviado.
Não havia mudado em nada do que ele havia dito antes. Sua maior preocupação sobre o assunto era que as crianças sejam mais prejudicadas do que já foram. E isso foi resolvido, ao menos por enquanto.
"Ah, agora que você está aqui. A senhora me disse que iremos à capital por sua causa. Devo te dar os parabéns por conseguir méritos o suficiente para ser convocado para a Celebração da Vitória. Isso, por si só, é algo que é de muita honra."
E realmente era.
A Celebração de Vitória era um evento que ocorria após a guerra ou após um marco de grande impacto para todo o império e visava premiar aqueles que se destacaram ou tiveram as maiores contribuições para a conclusão. Para um nobre, isso era o mesmo que trazer prestígio, honra e riqueza para sua casa e seu nome, uma valorização grande; enquanto que para um plebeu pode ser considerado algo como uma sorte grande ou algo que mudaria completamente suas vidas, pois isso poderia render-lhes uma ascensão de status, dinheiro ou uma recompensa até maior que isso.
A fama de tal evento era tanta que todos tinham consciência de que isso acontecia. Ainda mais em tempos em que haveria tais recompensas. Muitos pensavam no que aqueles recompensados pelo próprio imperador receberiam por seus feitos.
"Obrigado."
Ferion agradeceu. Ele não teve motivos para ser modesto ou fingir que era algo trivial. Isso, ele reconhecia, era sua conquista.
"E eu agradeço por vir me informar sobre o que decidiram."
"Não é nenhum incômodo isso. Você foi muito importante. Isso é o mínimo que poderia fazer." Uma pausa ocorreu. "Com sua licença."
Ao terminar o que tinha a dizer, Ferion deu uma última olhada em volta e saiu do quarto, despedindo-se de Brandon antes de ir embora. O ruivo o olhou abrir a porta e ir, sentindo-se um pouco mais leve depois que o estranhamento que sentia foi embora.
*
Dois dias haviam se passado e um suspiro saiu dos lábios de Brandon ao apertar a gravata em seu pescoço. A imagem refletida mostrava suas feições masculinas e o cabelo vermelho que pareciam chamas, com uma expressão que mostrava um pouco de cansaço e nervosismo.
Quando ele estava sozinho, somente ele, permitia-se mostrar uma infinidade de faces que aqueles que só o viram de relance ou tinham pouco contato achariam surpreendente. E a causa para que ele estivesse assim era a mulher que iria com ele comprar vestidos.
Durante a noite, Brandon não conseguiu dormir pensando como agiria, como seria a saída e o que poderia acontecer. Não era um costume dele agir assim, mas quando sua ansiedade atinge tal ponto, ele passava a noite em claro, pensando e pensando, dormindo pouco horas depois do comum. Isso já havia acontecido outras vezes também.
Com um último olhar na superfície espelhada, Brandon olha para suas roupas, vendo que estava pronto. Um terno preto e camisa branca, com uma gravata borboleta. Parecia a roupa de um mordomo, mas era um pouco diferente do usado por Kevin. Ele respira fundo e abre a porta, saindo de seu quarto e indo para a entrada da casa, onde encontraria a senhora e Johannes.
Os ruídos dos passos soaram no ambiente foram apagados por outros quando ele passava por alguns servos. Um sorriso meio verdadeiro aparecia ao cumprimentar os outros funcionários e conhecidos. No entanto, não teve tempo para conversar, ele tinha trabalho a fazer, assim como os outros.
Ele parou em frente a porta e bateu três vezes, abrindo-a quando ganhou permissão. Brandon estava parado, vendo as duas mulheres em vestidos casuais, mas que ainda tinha um toque refinado, conversando. O homem não conseguiu fazer nada. Ele estava esperando elas notarem sua presença, porque seria uma falta de educação interromper sua conversa. Havia também o fato de que ele não queria interagir com Johannes, a qual ele, relutantemente, teve que admitir que estava bonita com a xícara entre seus dedos.
Claro, sua expressão era a mesma de sempre. Indiferente. Como uma máscara que não muda de expressão mesmo com os sentimentos correndo soltos.
Claire, a Condessa Miller, levantou-se de seu lugar assim que notou ele que ficou do lado de fora da sala. Ela o cumprimentou como sempre, um sorriso no rosto que era tão característico dela quando sempre o via.
"Olá, senhora. Bom dia."
"Bom dia, Brandon. Você finalmente chegou. Nós estávamos tomando um pequeno chá enquanto esperávamos. Mas agora que chegou, podemos ir." Ela falou, caminhando para ele. "Estou animada para saber que vestidos nós vamos escolher para uma ocasião tão importante. Um vestido lindo para chamar a atenção de todos no baile, não seria ótimo?"
"Acho que esse é o propósito de ir atrás dos vestidos, senhora." Brando respondeu casualmente.
"Tem razão. Mas é a primeira festa da minha primeira nora. Isso é algo importante, por isso devemos ter em mente de conseguir algo deslumbrante."
Brandon sentiu um gosto amargo quando ouviu as palavras "primeira nora", pois isso o fazia se lembrar de sua situação e daquela mulher que não havia pronunciado nada desde que ele chegou. Ele se perguntou se a condessa também agiria assim se tivesse sabido de seu relacionamento com Phillip antes da guerra. No entanto, ele logo descartou tal questionamento, pois era algo inútil de qualquer maneira.
"Condessa, tudo o que eu quero é um vestido que não vá envergonhar a família Miller e meu futuro marido." Johannes falou, com seus olhos curvados em meia lua. Ela parecia a representação da inocência e sinceridade.
"Entendo. Isso é ótimo, então. Com a minha recomendação e a de Brandon, você não precisa se preocupar com isso. Meus gostos são muito elogiados e Brandon tem um talento para esse tipo de coisa. Ele sempre me acompanha quando vou comprar vestidos e roupas para James."
"Oh." Johannes fita Brandon que retribuiu o olhar com desinteresse aparente. "Então irei confiar em você para me ajudar."
Como se não tivesse olhado para ela de maneira impassível, Brandon deu um sorriso simpático que cresceu em seus lábios e a expressão suavizou. Johannes o fitou um pouco incrédula, pensando que aquilo só poderia ser uma ilusão de sua mente.
"Irei fazer o máximo possível para lhe ajudar, Srta. Attwater."
A voz clara e calma junto com uma postura educada passaria uma atitude de confiança para qualquer um que a visse. Certamente, se fosse outra pessoa, ela teria acreditado em Brandon e achado muito respeitoso, porém, Johannes não acreditava naquilo de nenhuma forma. E ela realmente não o culpava por isso.
*
Brandon estava tentando não pensar em nada. Mais especificamente, do ambiente e com quem estava. Ele estava virado para a janela a todo o momento e sentado no canto junto à ela, olhando para fora e a paisagem dos prédios se movendo. Parecia que nos últimos dias, desde que os jovens mestres voltaram, ele estava saindo mais ultimamente.
Anteriormente, não havia muitos motivos para Brandon sair da mansão, mas não quer dizer que ele não tinha que sair. Brandon acompanhava o senhor quando tinha que ir aos territórios ou simplesmente fazer uma inspeção, além disso, ele costumava sair com a condessa para comprar roupa ou quando ela não suportava ficar em casa e queria um passeio. Embora houvesse uma guerra e o condado ficasse na parte ocidental do império, lado também onde o reino inimigo ficava, e o conde sempre se preocupava com a segurança, ela gostava de ir algumas vezes, nem seu marido poderia segurá-la.
Havia também casos em que ele tinha que comprar alguns livros para ler e colocar em seu quarto como parte da decoração e seus objetos preciosos. Também quando ia comprar um presente ou algo do gênero. Em suma, ele tinha que sair, mas não era frequente como estava sendo até agora.
No dia seguinte à chegada de Ferion e Phillip, ele saiu com Claire e James; depois foi a breve ida ao quartel com Ferion; as idas ao orfanato e agora a loja de vestidos. Se fosse como antes, talvez ele saísse umas duas vezes no mês ou uma vez por semana. Não precisaria ser em um curto período de tempo tantas vezes.
Só que se fosse apenas isso, estaria tudo bem. Ele não se incomodava em sair, era trabalho, mas se pudesse, não queria. Era confortável viver e ficar na mansão. Talvez fosse apenas algo que sua personalidade contraiu depois de passar tanto tempo naquela mansão e pensar que era confortável, mas a presença feminina que estava à sua frente era o que realmente o estava deixando desconfortável.
A loura sentada com uma postura um tanto pobre, mas ainda sim, podia-se ver uma beleza nela, era a fonte de seu desconforto.
Johannes estava na carruagem junto com ele e estava ao lado de sua futura sogra. Naturalmente ela entendia que precisava marcar pontos com a condessa, ou seja, ficar bem para ela e agir como uma nora deveria agir. Isso seria uma ajuda para o plano de Phillip e também, caso ela realmente se casasse com seu noivo, não queria ficar no mal lado da família de seu marido. Se acontecesse, poderia significar dificuldades em sua vida, coisa que ela não queria.
Por isso, ela não recusou quando Claire a convidou para ir comprar um vestido para ela. Phillip também havia dito que sua mãe gostava de ir pessoalmente às lojas, chamando aqueles comerciantes para a mansão quando estava com preguiça ou doente, quando conversavam sobre seu dia a dia. Johannes também sabia qual era o tipo de evento que iria e, embora não fosse uma nobre e nem daquele país originalmente, sabia que as roupas que comprou junto com Phillip não eram onde suas roupas poderiam ser usadas em tal lugar, em um acontecimento de tal magnitude.
Certamente, ela tinha sua suposição que para eventos imperiais, ainda mais os de vitória, vestidos chiques e que poderiam se destacar, além de serem específicos para festas. Os que ela tinha, casuais, de dormir e de sair, não eram adequados para tal evento. Era por isso que ela aceitou.
No entanto, ela não sabia que Brandon iria também. Ela ficou um pouco surpresa por ele aparecer e pela senhora responder simpaticamente sua saudação assim que ele havia chegado. Parecia que eles tinham um relacionamento muito melhor do que ela supôs na festa do chá, quando achava que ela era amigável com ele. E ela viu que, diferente da festa do chá, a forma como Brandon parecia responder a senhora parecia muito mais sincera do que naquele momento com as outras mulheres.
Johannes realmente foi capaz de perceber que havia acertado quando pensou que o que ele estava dando a aquelas mulheres era um sorriso falso e uma gentileza profissional que era praticamente educação. No entanto, igual naquela época, ele ainda era ilegível para ela ler. Pensamentos e emoções escondidas que eram difíceis de captar. Somente a certeza de que ele realmente não tinha uma boa impressão dela era confirmada pelos olhares e os claros sinais de desconforto que ele mostrava quando estava com ela.
Johannes era uma atriz em sua cidade no reino de Torzik. Ela costumava atuar em um teatro e viu muitos aristocratas, plebeus, atores e outros muitos tipos de pessoas. Sua profissão era interpretar e consistia no ato de se expressar de diversas formas com seu rosto e corpo. Então, foi possível notar que ele não estava bem consigo, embora fosse muito sutil. Só não estava no mesmo nível que a Condessa Miller em perceber que Brandon estava realmente desconfortável com isso.
E por ele estar assim, é que ela não se sentia muito à vontade com ele.
Seu coração não era frio para ignorar o que o homem estava passando e tratar como um nada, e uma ligeira sensação de culpa permeava sua mente com a visão. Brandon estava claramente incomodado com ela, a mulher que está noiva daquele a quem ele amava. Ela nem conseguia imaginar como ele deveria ter se sentido quando viu e ouviu que eles estavam noivos e a maneira como eles se tratam em públicos - tudo combinado, é claro.
Ela soube de seu relacionamento por Phillip, quando ele propôs sua ideia, embora ela ache que tal intenção de Phillip seja muito egoísta e, sinceramente, desprezível, mas ela vem como prioridade primeiro, ainda mais em sua situação. Johannes já viu muitas pessoas desse tipo, então não tinha preconceitos. O que mais havia no teatro em que trabalhava era aristocratas com suas amantes ou com seus namorados secretos. E era sempre uma fonte de fofoca nos bastidores.
Então, ela tinha informações de como era a relação dos dois. Uma certa ideia, embora não tivesse muitos detalhes específicos, apenas relatos que Phillip havia lhe dito e uma descrição de como era Brandon, que parecia ter mudado ao longo dos anos e desviado das histórias que ouviu. E mesmo com essas mudanças, parecia que ele ainda tinha sentimentos pelo homem que lhe salvara.
Johannes realmente não o culparia se ele fosse um pouco hostil com ela. Mas tudo o que ele fazia era mostrar-lhe uma cara indiferente e tratar ela com uma educação profissional que todo servo deveria ter, quando se encontravam, apesar de estar desconfortável consigo.
Sinceramente, ela não conseguia entender o porquê de Phillip fazer uma coisa tão estúpida dessas, se ele tem um homem desses com ele.