As ruas movimentadas estavam cheias de pessoas e algumas barracas vendiam seus produtos aqui e ali, com vendedores ambulantes procurando algum cliente que comprasse seus itens.
Tudo era visto do primeiro andar de um restaurante. A varanda cheia de mesas, estava com clientes sentados e conversando entre si em um ritmo animado e alto.
Brandon olhava para a rua abaixo, enquanto James terminava sua sobremesa que tanto pediu e lembrou a mãe. Claire sorria e dava uma garfada em seu bolo de morango também. O amor pelos doces era algo compartilhado entre mãe e filho.
"Onde vocês querem ir depois? Algum lugar em mente?" Ela indaga, curiosa sobre o que eles diriam.
"Não tenho nenhum, senhora." Brandon disse simples.
"Também não sei, mãe." James falou, dando uma última garfada em sua sobremesa.
James viu que em seu prato só sobraram farelos, antes de se levantar e atrair a atenção dos dois para si. Com um pouco de vergonha ele se pronunciou.
"Eu, hm, vou ao banheiro. Podemos decidir quando eu voltar?"
"É claro, filho."
Ela disse, vendo seu filho sair, mas ficou um pouco decepcionada com a resposta dos dois. Nenhum dos dois tinha a menor ideia do que queriam ver, mesmo morando aqui. Embora Brandon saía no máximo para comprar livros, não para passeio, ela esperava que ele quisesse ir ao menos a algum lugar.
Com um suspiro, ela foca seu olhar em Brandon que voltou a olhar para a rua, com o queixo apoiado em sua mão. Seu olhar estava indiferente ao que via, mas parecia estar pensando em outra coisa.
E seus perspicazes olhos conseguiam ver através da fachada que ele mantinha.
"Brandon."
Ela o chamou e ele virou seus olhos para ela. Os mesmos olhos de James foram de encontro aos verdes do garoto que agora era um homem, mas ela ainda o via como o menino que veio com sua mãe trabalhar na mansão.
A expressão, sem reação, não escondia a verdadeira face dele para ela.
"Por que você está triste?" Ela indagou, analisando cada reação dele.
Condessa Miller percebeu, que por um momento, seus olhos quase se arregalaram com a pergunta que o surpreendeu.
"Eu não estou, senhora."
Porém a resposta vinda foi outra, mas não inesperada para ela.
"Não adianta mentir, Brandon."
Ele não respondeu e ficou em silêncio.
James apareceu, com um sorriso no rosto, não percebendo a leve tensão que ocorria na mesa ali.
"Onde nós vamos agora?" Ele questiona e a condessa sorri para ele.
"Estava pensando em andar pelas ruas, pode ser que encontremos algo para fazer."
"Ok."
James balança a cabeça, concordando. Brandon não responde, ficando em silêncio todo o momento até saírem, mas o garoto não nota.
Do mesmo jeito que pela manhã, havia pessoas indo e vindo pela estrada. Os cavaleiros estavam atrás do trio, enquanto James ia um pouco a frente e do lado da condessa estava Brandon.
O ruivo não sabia o que dizer depois de ser questionado de tal maneira pela mulher.
'Eu fui muito óbvio?'
Tal pergunta passou por sua cabeça, mas ele logo a descartou. Se tivesse sido óbvio, até o conde o teria perguntado ou algum dos empregados.
A condessa que era perceptiva demais. Uma característica que James havia adquirido, por isso ele conseguia lê-lo igual a ela, só não em tamanha maestria.
No entanto, não pôde deixar de ficar ansioso se ela havia percebido o motivo. Ela era muito esperta e não demoraria para ligar os pontos.
'Talvez ela até saiba.'
Um arrepio passou por sua espinha e a barriga ficou fria com o pensamento.
A senhora Miller não o perguntou, a todo momento interagindo com James e ele o respondia também, mas não da mesma maneira que antes. Ela sorria suave para seu filho animado e apreciava o passeio em si.
"Mãe, posso ir ali jogar?"
James parou e apontou para um lugar. Era uma barraca de jogo, onde tinha que acertar o alvo e ganhar um prêmio. Um jogo simples, mas divertido para ele.
Não era época de festival, mas não era incomum encontrar locais assim pelas ruas. Havia até mais algumas quando se chegava à praça, pois era o local ideal em que tem a maior concentração de pessoas de todas as idades.
"Tudo bem. Mas Carl irá te acompanhar."
Ela concordou e um cavaleiro de cabelos e olhos castanhos, de aparência comum, assentiu e seguiu junto a James. O garoto estava motivado a ganhar um prêmio e exibir suas habilidades.
Senhora Miller o olhou se distanciar, antes de sorrir para Brandon e o encarar. Ele sentia que sabia o que aconteceria pelo olhar que ela lhe dava.
"Agora que James não está aqui, vamos continuar nossa conversa de onde paramos."
Sua voz era simpática, mas tinha um ar sério que demonstrava que ela não estava brincando, embora tivesse um pouco de suavidade nela.
Ambos se sentaram em uma área aberta de uma loja que havia por ali. Era um comércio de alimentos com uma área externa com mesas que permanecia ao lado da entrada. O local fornecia visão direta para onde James estava para confirmar sua presença e segurança. Também tinha alguns clientes, mas eram poucos e não estavam próximos, iguais aos cavaleiros que também se sentaram, mas não tão perto.
Era o suficiente para terem uma conversa particular, sem ninguém escutar se conversassem em uma certa altura.
Rapidamente, uma mulher de cabelos pretos sorriu e começou a atendê-los, trazendo o cardápio e anotando as bebidas pedidas, pois nenhum deles via necessidade de comer devido ao fato deles terem acabado de almoçar. Suas roupas eram comuns e somente um avental à sua frente diferenciava ela como funcionária ao invés de uma pessoa comum.
Quando ela terminou de atender, rapidamente trouxe os pedidos e colocou na frente dos dois com cuidado e gentileza. A todo o momento, ela não pôde deixar de se perguntar se havia algo de errado, porque nenhum dos dois falava nada ou sequer reagiu. Isso a fazia sentir um pouco nervosa, mesmo que a mulher tenha feições gentis e o homem fosse um indiferente, mas parecia educado.
Com um breve aceno, a mulher de cabelos negros se afastou, indo para outras mesas, suspirando de alívio por sair dali. A condessa notou e riu um pouco, para descontrair. Brandon a olhava nervoso, um medo começava a surgir dentro de si, com o rumo que poderia tomar essa conversa.
"Então, por que não me conta o porquê de estar triste?" A mulher de cabelos roxos disse. "E dessa vez sem mentiras, por favor."
"..."
Ele não falou nada, igual à primeira vez. Somente com os olhos vidrados para a bebida à sua frente de cor laranja. A mente voltava ao motivo dele estar chateado. Brandon não conseguiria falar isso para ela, na verdade, nem poderia, já que era um caso que envolvia o filho dela.
Por mais que ele a conhecesse a anos, nunca se sabe quando um simples fato, e algo que ele é, mudaria o comportamento da pessoa, ou talvez, seja melhor dizer, que mostraria as verdadeiras cores dela.
A nobreza, em especial, era muito sensível a tal ocorrência, tanto que quase condenavam àqueles que se envolviam entre si como do mesmo sexo. A maioria valorizava tradições, valores, linhagem e outros, e alguns se achavam superiores em algumas maneiras e desprezavam os outros por muito menos, dando diversas desculpas e culpando o outro por ser daquele jeito.
E se fossem de classes distintas, com uma parte tendo menos poder, de origens desconhecidas e, por conseguinte, um plebeu, era óbvio o que aconteceria.
Afinal, o que não faltava no mundo eram pessoas preconceituosas.
Porém, por mais que Brandon acreditasse que a Claire não fosse do jeito que estava pensando, ele não conseguia falar. Não havia nada garantido. Sua mente vagava para o lado negativo e ele tinha muito a perder; até Phillip também. O homem poderia ter lhe traído, mas não significava que ele merecesse passar pelo inferno sem esperança apenas porque ele contou à sua mãe o que aconteceu.
O pior que poderia acontecer apenas com algumas palavras suas seria a sua morte e a do outro, pois não havia como se proteger.
Os olhos tremeram e demonstraram a ansiedade que estava tentando esconder.
'Eu não posso.'
Brandon fechou e apertou a mão em seu joelho, um sinal para se acalmar e recuperar a compostura. Ele não podia, nem mesmo para a mulher à sua frente, que praticamente o tratou como um filho. Se fosse sua mãe, seria mais difícil para ele, imaginar sua reação, se ela o abraçaria ou o condenaria, se ela dissesse que tinha orgulho ou desgosto. O olhar de decepção ou uma reação extremamente negativa não seria bom, seja qual das duas viesse.
Se não era fácil falar para um estranho, o quão difícil será para as pessoas que realmente estima? Quanta coragem ele deveria reunir para dizer? Ele conseguiria?
E Brandon sequer tinha uma pessoa que deveria estar ao seu lado, lhe apoiando, quando esse momento chegasse.
A Claire o observou, vendo como ele não dizia nada, embora parecesse que tinha algo a dizer. A escolha dele foi decidida quando conseguiu reunir calma, mas não disse nada. Ele não diria, mesmo para ela. Era visível em seus olhos firmes, mas um tanto sombrios.
"Deve ser algo sério para não querer me contar. Agora entendo o porquê de James não estar próximo a você, mesmo que saiba que você esteja triste." Ela disse e sorriu um pouco amarga. "Você quer saber como eu sei? Foi no chá de ontem, assim que o vi, percebi."
Seu tom era suave e doce, soando carinhoso para ele. Isso o fazia se sentir um pouco ruim, mas era algo que ele tinha que fazer. A senhora Miller olhou então para James, mas a expressão permaneceu a mesma, assim como ela olhava para Brandon.
"Eu havia ido lá porque vi James fazendo alguns truques, você sorria com os lábios, mas seus olhos pareciam tristes. Eu queria conversar sozinha com você, mas quem diria que ele queria vir? Pelo menos isso rendeu algumas roupas novas para ele, já que em breve começarão os eventos sociais novamente."
Ela riu e ergueu os lábios, sorrindo para a figura de seu filho jogando um dardo no alvo, mas errando o alvo. Ela voltou seu olhar para os olhos verdes que a fitavam com atenção.
"Desde que você era criança e ficava um pouco triste, não era algo que gostava de demonstrar na frente dos outros, ainda na frente de sua mãe ou de mim. Não conseguia entender o porquê, já que Phillip demonstrava isso. Acho que era semelhante a Ferion, mas ele também não escondia, então não sabia o motivo."
Ela falou, tomando um pouco da bebida avermelhada que havia pedido. Brandon entendia tudo o que ela estava falando, notando que ontem ele havia feito exatamente aquilo e em outras vezes anteriores. E até mesmo neste momento.
"Mas eu conseguia perceber e você voltava a ficar feliz logo algum tempo depois. Eu perguntava para sua mãe o que havia acontecido e ela sempre me respondia sobre o que era e dizia que havia conversado com você. Não sei como, mas ela tinha o talento para apagar esse olhar triste em seu rosto para que voltasse a sorrir."
Pela primeira vez, na conversa, a expressão da Miller não estava agradável. Era como se uma melancolia se apoderasse da atmosfera. Brandon também sentiu, afinal, ele tinha a mesma expressão que a condessa. As memórias que antes não se recordava, desabrocharam em sua mente, como um filme. Os dois compartilhavam dos mesmos sentimentos de saudades e carinho. Alguém importante para eles de maneiras diferentes.
A condessa olhou firme para o rosto silencioso do garoto, mostrando sua seriedade. Contudo, ele conseguia sentir calor naquela expressão.
"Eu não sou sua mãe, Brandon, nunca poderei, e nem irei, tomar o lugar que é dela. Ela era uma mulher incrível e ótima, eu admito. Era uma mãe muito boa também, adorei a ajuda dela com meus filhos. E por isso, sou muito grata por ela."
Os olhos esverdeados e claros na luz do sol estavam tremendo, com as palavras da condessa.
"Mas isso não quer dizer que eu não o vejo como um de meus filhos, mesmo sem sangue. Que eu não o levo em consideração. Eu quero ver você feliz, sabe? Sem esse olhar triste, mas com os mesmos sorrisos que você fazia quando estava animado com algo ou quando brincava com James."
Sua voz, tom, expressão e olhos, eram todos sinceros. E Brandon sabia disso, mesmo assim, ele somente a ouviu.
"O que quero dizer é, que irei lhe apoiar e escutar quando você precisar. Mesmo que demore um pouco, estarei disponível quando quiser falar do que lhe aflige. Acredito que seria o mesmo que ela faria caso estivesse aqui. Você entende o que quero dizer?"
Ela indagou, não desviando os olhos do rosto dele por um segundo. Ela tentava passar o máximo que podia para fazê-lo compreender.
E, como se tivesse conseguido, ele balançou a cabeça suavemente, para responder a pergunta dela, permitindo-se respirar depois de segurar sem nem ao menos perceber.
"Sim, senhora."
"Isso é bom."
Ela o ouviu dizer, sorrindo um pouco para ele. A criança à sua frente estava um pouco abalada. Mas ela disse o que queria dizer, pois era tudo verdade. Ela se preocupava com ele, e não era comum ele ficar triste, ainda mais do jeito que está, sem sequer demonstrar.
"Mãe!"
Uma voz gritou alto e atraiu a atenção dos dois. James ia correndo na direção da área externa da loja com algo que parecia uma raposa em seus braços de cor laranja. Carl vinha atrás dele, acompanhando seus passos. O homem levava seu trabalho a sério.
"Oi, querido. Conseguiu algo?"
"Hm, sim." Ele assentiu, antes de voltar seus olhos para Brandon e entregar o animal de pelúcia em suas mãos. "Tome, é para você."
O ruivo arregalou os olhos para o item que estava em suas mãos depois que James o entregou de surpresa. Ele não pensou que ele daria a pelúcia para ele.
"Mas é seu. Você ganhou."
Ele apontou, olhando entre ambos. James sorriu para a fala de Brandon.
"Eu consegui algo para mim."
James pegou algo de seu bolso e mostrou para Brandon e sua mãe. O objeto em questão era um estilingue, um item que poderia conseguir com facilidade.
"Um estilingue?"
"Sim! Eu gostei. E foi Carl quem conseguiu a raposa… Não sou tão bom no tiro ao alvo."
Ele comentou um pouco deprimido, expresso em seu rosto com um pouco de vergonha. Brandon aperta um pouco a pelúcia e assente, ajeitando a pelúcia em seu colo.
"Obrigado, James." O garoto sorri alegre.
"Filho." A condessa o chama, atraindo seus olhos castanhos. "Há algo para a mãe também?"
O garoto ficou rígido e os olhos se arregalaram de surpresa. Ele não havia conseguido nada para sua mãe, pois as últimas vezes que tentou não conseguiu nada e pedir para Carl não teria graça.
"Não… Desculpe."
"Tudo bem." Ela não se sentiu ofendida e deu um sorriso suave. Era uma face que não combinaria com a fala seguinte. "Meu filho só se importa com Brandon."
"Isso é mentira!" James gritou alto, negando sua afirmação.
"Claro, claro." A condessa agitou as mãos, como se as palavras proferidas pelo seu filho fossem meras desculpas.
"Mãe!"
Brandon vendo aquilo se envergonhou um pouco, ele sabia o que a senhora estava fazendo, sendo um pouco dramática e querendo constranger James, mas não conseguiu esconder um leve traço de vergonha no rosto porque ele foi citado ali.
A senhora Miller estava se divertindo e era visto por ele pelo leve levantar dos lábios que ela estava se contendo ao ver a cena de seu filho tentar mudá-la de ideia.
Ela sempre gostou de brincar com seus filhos, às vezes constrangendo eles ou dando uma ideia diferente quando eram jovens, porém isso diminuiu conforme cresciam, pois ficavam mais perceptivos às suas táticas. Contudo, ela também melhorou seu arsenal com o passar dos anos.
"Vamos a outros jogos! Eu vou conseguir algo para você!"
James vendo que sua mãe não acreditava nele, exclamou bem alto e agitado. Ele iria conseguir algo para ela que ela gostasse.
A senhora Miller sorriu para ele, para sua imagem um pouco vermelha e os cabelos roxos balançando com a agitação que sentia.
"Então quer conseguir algo para mim?"
"Sim!"
"Não é uma ideia ruim, temos tempo." Ela disse. "Tudo bem para você, Brandon?"
"Sim."
"Ok, então vamos."