Mesmo depois de abrir os olhos a escuridão era tudo o que via era a escuridão. Não era a mesma escuridão reconfortante de quando falava com sua mãe, aquilo era completamente diferente. Em meio ao silêncio daquele breu, ouviu-se de algo sendo arrancado do teto, e então caindo no chão causando um estrondo metálico.
De repente passos, ouviu os passos de várias pessoas vindo por trás, ao se virar encontrou um grupo de soldados todos armados até os dentes, apontando as armas de alto calibre para a escuridão e assumindo uma posição passiva com alguns deles ajoelhados e outros em pé, haviam se preparado para uma grande luta alí.
Tudo estava em silêncio, nenhum deles ousava proferir uma palavra sequer, foi então que um som estranho pode ser ouvido da escuridão, como uma respiração pesada sendo projetada por um alto falante, o som perdurou por um algum tempo até que na escuridão surgiram as chamas, chamas avermelhadas que iluminaram um ser à frente deles.
Aquela pessoa vestia uma armadura de couro, parecia acolchoada, algo que um aviador usaria, as chamas vinhas de um par de foices que o mesmo carregava, por um segundo Toga pensou ser Zakk, mas as armas que aquele ser carregava tinham os cabos muito menores que as do moreno, o rosto era escondido por uma espécie de capacete com o formato da cabeça de um corvo com lentes vermelhas cobrindo os olhos e um par de chifres na cabeça, a respiração robótica vinha daquela pessoa.
—Atirem a vontade!—O homem que parecia o comandante ordenou e os disparos deram início.
Das costas da pessoa um par de asas surgiu e o mesmo as usou para se defender dos tiros como um escudo, ao se aproximar dos mesmos, a pessoa abriu suas asas e uma corrente de ar mandou os soldados para cima.
Com uma agilidade sobre humana o homem do capacete de corvo avançou, cortando com suas lâminas, as chamas que cobriam as lâminas causavam cauterização das feridas que as armas causavam, a primeira vítima teve o estômago rasgado e agoniza de dor por longos e torturantes minutos antes de finalmente morrer, o segundo foi acertado no pescoço e morreu na hora já o terceiro teve o azar de ter seus braços e pernas arrancados e assim se seguiu o massacre.
Toga assistiu enquanto aquela figura misteriosa matava cruelmente todas aquelas pessoas, e quando apenas um homem restou ela o assistiu apontar sua calibre doze para o guerreiro misterioso tremendo da cabeça aos pés, o mesmo usou sua asa para se defender do primeiro disparo e lançou uma de suas foices na arma derrubando-a.
O corvo estendeu a mão na direção do homem e uma figura humanoide flutuante aparece em suas costas com a mesma pose por alguns segundos, uma força misteriosa puxa o guarda até ficar frente-a-frente com o assassino.
Ainda tremendo, o homem clamou aos Deuses olimpianos por ajuda e em uma voz robótica o corvo diz:
—Os Deuses te abandonaram.
A foice arremessada por ele anteriormente retornou para sua mão, não antes de atravessar a cintura do homem o cortando ao meio. Em um movimento de sua mão, o corvo jogou o que restou do corpo do homem de lado como se fosse lixo e continuou seu caminho.
Uma porta se levantou sozinha com a aproximação do corvo, e do outro lado vários pares de pequenos olhos o fitavam, eram crianças, as pequenas usavam uma espécie de macacão de prisioneiro e tinham uma coleira familiar em seus pescoços, aquelas com certeza eram as coleiros que bloqueiam dádivas, Toga deduziu que aquelas crianças eram prisioneiras da CONTROL.
Mas o pior ainda estava por vir.
O corvo levantou seu braço e fechou seu punho, ao fazer isso, uma espécie de névoa foi arrancada da boca de algumas delas e viajou até o punho fechado do corvo, seus corpos sem vida caem no chão e as poucas que não morreram começaram a gritar e a correr em direção ao fundo da sala, o corvo avançou para dentro e a porta se fechou, Toga cobriu a boca diante da cena, os gritos das crianças logo cessaram dando lugar à maldita respiração robótica.
—NÃO!
Toga se levantou bruscamente, ainda estava em seu quarto, em sua cama, com Zakk dormindo tranquilamente ao seu lado, parecia ter um sono bastante pesado para não acordar com o berro da orc.
Seu corpo suava frio, estava ofegante, era como se ela tivesse corrido ao redor da ilha viva por horas.
Isso não foi um sonho não é Toga?
A voz de "Hades" soou em sua mente, depois de tudo aquilo ela havia esquecido sobre ele.
Claro que não foi, era uma visão do futuro, se a minha mãe não estava lá então significa que o bastão foi passado pra mim.
A mesma respondeu ao falso Deus.
Que bastão? Do que você tá falando? Não era mais Hades, Zakk estava acordado, ele a fitava com aqueles olhos vermelhos vibrantes...
Por um momento, a imagem do assassino com o capacete de corvo piscou em sua mente como um flash de memória, e a mesma teve que apoiar a mão na cabeça para aliviar a pontada de dor que se seguiu.
—Você tá bem? Se sente mal?—O moreno a segurou pelos ombros com seu olhar preocupado, com uma visão como essa Toga não podia evitar um sorriso.
—Eu tô bem, não se preocupa.—Toga respirou fundo, e isso é o suficiente para que dor cessasse.—Respondendo a sua pergunta, minha mãe era a oráculo da nossa aldeia, esse poder é hereditário e começa a se manifestar no fim da adolescência, antes era a minha mãe quem tinha as visões diretamente do mundo dos mortos e me contava o que podia, agora parece que eu finalmente estou pronta pra ter as minhas próprias.
—E você teve uma agora? O que aconteceu nela que te deixou tão chocada?
—Não posso dizer, esse é um dos efeitos colaterais, você é incapaz de falar diretamente sobre uma visão, por isso que a maioria fala em enigmas.
—Mesmo assim, o que quer que você tenha visto, eu vou fazer o possível pra te ajudar a impedir.—Zakk diz antes de depositar um selinho rápido em seus lábios e se levantar.—Levanta, hoje é dia de treino.
Os últimos dias passaram pela mente da orc como um flash, após os ataques, Gallien descobriu a participação da CONTROL nos incidentes, através dos relatos dos alunos.
Isso é mais grave do que eu pensei, quero todos na árvore grande no meio da ilha amanhã bem cedo, chegou a hora do verdadeiro treinamento começar. Foi o que ele disse, o que quer que havia de tão especial naquela árvore, todos sabiam que a partir do momento que colocassem o pé perto dela...
A guerra contra a CONTROL estaria declarada.
—Acha que ele vai nos tornar soldados?—A pergunta da orc causa silêncio no moreno.
—Acho que já somos Toga.—Depois do dia em que foram atacados por todos os lados era difícil dizer se aquela guerra já não havia começado.
Em silêncio, Zakk saiu do quarto.
Foi aí que Toga havia se lembrado de uma coisa, no dia em que saiu da aldeia seu pai havia lhe confiado um objeto que pertencia a sua mãe. Quando as visões começarem, coloque essa medalha no peito, só aí você vai ser a verdadeira guerreira que a sua mãe sempre quis que você fosse.
A orc se levantou e abriu seu armário, escondida entre as roupas estava uma pequena caixa de papelão bastante discreta, ao abrir Toga se deparou com o objeto mais uma vez, um pequeno medalhão verde em forma de coração, parecia bastante a marca da escola da natureza: galhos de uma árvore formando um coração.
Não havia grampos ou algum alfinete nele para que Toga pudesse prendê-lo à camisa, àquilo parecia mais um ímã.
Toga respirou fundo, e aproximou o objeto do peito, foi como se o medalhão ganhasse vida, saltou da sua mão e grudou em sua pele.
Um brilho verde emanou do objeto, Toga assistiu o medalhão projetar a luz sobre seu corpo e então sentiu a sensação de estar vestindo uma armadura placa por placa, a sensação se estendeu por todo o seu corpo até que a mesma sentiu algo como uma tiara se prender em sua testa, a luz se dissipou e lá estava o resultado: aquela era a antiga armadura de sua mãe.
Placas e mais placas de aço orc cobrindo cada pequeno centímetro de seu corpo em uma coloração verde musgo e alguns detalhes se estendendo pelo peitoral na forma de raízes pintadas de preto sobre o aço, na cabeça ela usava uma tiara, a mesma possuía um formato H percorrendo a testa, os lados de seu rosto e subindo em um par de pequenos chifres acima da cabeça sendo o único detalhe que a diferenciava da sua mãe com o medalhão no centro de tudo.
Aquela era uma tecnologia que apenas um ferreiro orc era capaz de reproduzir, uma mistura de magia e nanotecnologia sem igual, com apenas um pensamento a armadura se recolheu e o medalhão saltou de volta para sua mão, Toga sorriu ao perceber que mesmo após a morte, sua mãe continuava cuidando dela.
Ativou a armadura outra vez e saiu do quarto com um sorriso orgulhoso estampado em sua boca.
...
Estavam todos ali, todos prontos para um treino intenso.
A árvore era simplesmente gigantesca, a sombra dela cobria de forma opressora os ali presentes, eles todos olhavam as folhas balançando de maneira quase hipnótica, até Toga quebrar o silêncio ao se aproximar de Alexis:
—Onde você deixou a sua irmã?
—Amarrei ela no porão, depois daqui vamos ter uma conversinha com ela.—Respondeu ele estalando os punhos, talvez não fosse só uma "conversinha" ao final.
Já Morgana ainda pensava no que havia revelado a Jun-ho, ela havia decidido não revelar ao resto do grupo, o medo de não receberem bem a resposta e a julgarem a impedia. Viu Ulfric passar por ela sem nem mesmo olhá-la e abaixou o olhar.
É claro que ele não iria falar nada pra você Morgana, ele só sente pena de você igual todos os outros... Pensou para si, o incômodo que sentia pelo sol não era nada comparado a indiferença dele, em todos os anos que se conheciam ele sempre foi indiferente, por que isso mudaria agora?
—Ei Morgana, você tá bem?—Ao ouvir aquela voz grossa e potente do lobisomem, o olhar da ruiva se acende instantaneamente, ele a olhava com certa preocupação no olhar.
Morgana analisou cada centímetro de seu rosto, aqueles olhos cinzas penetrantes sem emoção alguma, os lábios carnudos e grossos e os dreads soltos caindo pelos ombros, aquele garoto poderia ser um Deus grego se não fosse descendente nórdico.
O rosto pálido da Morgana ganhou um leve tom rosado quando percebeu no que estava pensando e que não havia o respondido de tão hipnotizada estava.
—Desculpe ter preocupado vocês, eu tô bem melhor agora.—Disse tão rápido que quase tropeçou nas palavras, Ulfric apenas acenou positivamente com a cabeça e desviou o olhar.
—Que bom, não estava afim de carregar peso morto se o treino for em dupla.—Respondeu ainda não olhando para ela.
A felicidade da vampira durou pouco, nunca havia recebido um balde de água fria tão grande na vida, mas então pensou um pouco sobre o que ele disse e percebeu que se ele a escolhesse como dupla as coisas não pareciam tão perdidas assim.
Chase era o único quieto do grupo, ele ainda não havia processado tudo o que havia acontecido mas sabia que havia um poder imenso dentro de si. Após ter vencido a Gueixa no dia anterior, o mesmo achou melhor guardar sua espada, agora o mesmo tinha a própria espada guardada em uma bainha nas costas e a espada da Gueixa na cintura, uma coisa era certa, se ele sacasse a sua própria espada significaria caos e destruição.
Tinha que ter muito cuidado ou acabaria ferindo seus companheiros ou um inocente.
Foi então que a árvore começou a emitir um som estranho, como uma máquina enorme se ativando, as folhas enormes cobrindo parte do tronco se abriram para revelar uma passagem na base da árvore.
Eles se entreolharam em busca de quem seria o primeiro a adentrar, essa sendo Toga, logo sendo seguida por Zakk e Chase, logo todos estavam dentro, o interior parecia como uma base militar altamente avançada, existiam várias portas fechadas em volta da sala e um sofá grande o bastante para que todos coubessem ali, Gallien estava sentado ali, assistindo a uma tela de TV que se ligava a uma câmera instalada em Olímpia, no quarto de Henry, o representante da CONTROL infiltrado na escola, o mesmo parecia estar só dormindo.
—Ele não vai fazer nada enquanto não o atrapalharmos.—O professor profere sem tirar os olhos da tela.
—Acho que a situação é pior do que nós pensamos, não é?—Toga estava certa, ninguém poderia saber ao certo o quão poderosa a CONTROL é.
—Considerando que fomos os únicos capazes de determinar os planos deles, acho que também somos os únicos capazes de para-los.—Gallien olhou para tudo à sua volta, a árvore...—Esse já foi um lugar onde semideuses poderosos se reuniam, esse era nosso lar, nosso lugar seguro num mundo devastado pela guerra, agora não passa de uma memória sombria de um acontecimento trágico.
Gallien se levantou e olhou todos alí.
—Na guerra contra os titãs eu fazia parte de um esquadrão de elite chamado Lendas de Olímpia, esse lugar era nossa base, uma árvore criada a partir de uma semente da árvore do mundo, foi aqui que enfrentamos Tifão e encerramos a guerra.—Gallien teve que respirar fundo para continuar, falar daquilo não era fácil, ainda mais na frente deles.—Mas a vitória cobrou um preço alto, eu fui o único que sobrevivi aquele dia—Ele teve que enxugar uma lágrima prestes a cair.—Me desculpem por isso, as feridas ainda não...
Mas agora não era a hora de falar no passado, haviam coisas mais importantes no momento, e mesmo que todos ali estivessem emotivos e prontos para confortar seu professor, agora não era hora pra isso.
—Chamei vocês aqui porque chegou a hora de virarem adultos.—Disse tirando uma pequena caixa de papel do bolso, dentro dele Gallien tirou uma carta, era um baralho de tarot e a carta em sua mão era a do eremita.
—A partir de hoje vocês serão as novas Lendas de Olímpia, vou treinar vocês de verdade a partir de agora e vamos atrás da CONTROL, mas primeiro cada um de vocês vai tirar uma carta, isso vai determinar a função de vocês nessa equipe.
A primeira a se aproximar foi Toga seguida por Zakk, ambos tirando respectivamente a Imperatriz e o Imperador, Gallien olhou para as cartas por longos segundos, segundos esses que foram o suficiente para os assustar, e então se virou para eles outra vez.
—Muito bem, vocês são os líderes da equipe.