Chereads / Life and Death: Lendas de Olímpia / Chapter 36 - Cria do Diabo I

Chapter 36 - Cria do Diabo I

Bem longe da ilha viva, em uma fortaleza orc afastada da civilização, um certo rei assistia de seu trono seus súditos festejando após mais um dia de colheita e caça muito bem sucedido, um sorriso orgulhoso nos lábios, a felicidade do povo era a sua maior prioridade como Khan e, até hoje, ele não havia falhado nisso uma única vez.

A música cessou por um breve segundo, sendo trocada logo depois por outra mais animada, logo três mulheres vestidas de maneira graciosa se dirigiram ao centro do salão. O Khan assistiu alegremente suas consortes rodopiando e jogando seus vestidos coloridos ao som da música e dos aplausos e gritos animados do povo ao redor.

Aplaudiu junto a todos assim que a apresentação foi finalizada e as três correram até seus braços, depositou um beijo em cada uma, puxando-as para se sentarem em seu colo, "Essa noite não pode ficar melhor" pensava ele antes de beber um gole generoso de hidromel, até seu celular tocar e interromper a farra.

-Dahlia, pode por favor...-Começou com a voz grave ressoando pelo salão agora silencioso, mas parou quando a mesma se levantara para pegar o aparelho.-Obrigado querida.

Sorriu ainda mais ao ver o nome na tela e atendeu na mesma hora.

-Alô? Princesinha! Que saudade de ouvir sua voz!-Dizia animado ao ouvir a voz do outro lado.-Serio? Que ótimo, princesa! Quando vocês chegam?-Seu sorriso morreu por um instante, ficando preocupado.-Pode falar querida, o que aconteceu?

As próximas palavras o fizeram arregalar os olhos e se levantar do trono, quase derrubando a consorte em seu colo:

"Eu tô grávida."

-De quantas semanas? Quem é o pai?-Suspirou depois de ouvir as respostas.-Tá, tudo bem, a gente conversa melhor quando você chegar tá bom? Ótimo, te amo, princesa.

-Notícias ruins majestade?-Dahlia lhe perguntou após ver o rei orc colocando o celular de volta na mesa.

Mas ao contrário do que os outros pensavam, o mesmo abria o maior sorriso que já havia presenciado o Khan abrir em muito tempo.

-Pelo contrário.-Se virou para o povo aguardando no salão e puxou todo o ar de seus pulmões para exclamar para todo o salão o ouvir.-Eu vou ser avô!

O salão mais uma vez se enchia de alegria e farra, enquanto o Khan virava mais uma copo de cerveja e puxava suas três damas para dançar em meio ao povo, o motivo da festa agora era outro, sua filha daria a luz a mais um guerreiro ou guerreira para a tribo!

Contrário a isso, bem longe dali, em Palermo, na Itália, uma comemoração acontecia, a celebração de um casamento na casa de um homem bastante conhecido e respeitado pela comunidade, do lado de fora as pessoas festejando e sorrindo sobre a luz do dia era um contraste com o que se passava em uma sala escura da residência.

Sentado em seu escritório, o padrinho recebia um antigo amigo querendo tratar de negócios acompanhado de seus soldados mais confiáveis, todos vestidos com seus ternos elegantes e discretos ouvindo a história do cidadão.

Com um olhar melancólico, o homem alisou a cabeça calva antes começar:

-Eu sempre amei muito a minha filha, ela é a luz da minha vida, por isso sempre dei muita liberdade a ela, tanto que nunca reclamei quando ela começou a sair com um rapaz de quem eu nunca fui com a cara.

O Don ouvia tudo calmamente, brincando com a aliança no dedo anelar, os olhos vermelhos analisando as feições do velho amigo.

-Há um mês atrás ele a levou pra sair com outros dois amigos, eles a embebedaram e logo depois tentaram abusar dela, ela obviamente resistiu, então eles a espancaram como um animal.-Os olhos do homem se enchiam de lágrimas se lembrando da cena.-O rosto dela ficou completamente desfigurado, ela ainda está se recuperando mas está claro que nunca voltará a ser a mesma, toda vez que ela se vê no espelho ela não consegue evitar o choro depois de ver o que eles fizeram com ela.

O padrinho gesticulou a uma bela mulher em pé ao seu lado, a mesma estendendo um copo de água ao homem, depois de um gole e mais alguns soluços logo se recompôs.

-Mil perdões... Não está sendo fácil falar sobre isso.-Deu mais um gole e ajeitou a postura na cadeira.-Eu fui à polícia como todo cidadão de bem, o juíz os sentenciou a cinco anos de prisão, mas logo depois suspendeu a sentença e os três ficaram livres no mesmo dia, eu fiquei lá naquela côrte como um imbecil, os três desgraçados riram da minha cara quando saíram.

O Don coçou a barba branca por fazer, não era a primeira vez que ouvia aquilo e era pouco provável que seria a última, apesar da idade.

-Foi aí que eu disse a mim mesmo: Só o Don Hammond pode fazer justiça.

Passou a mão pelos cabelos grisalhos e suspirou antes de responder.

-Por que você foi a polícia? Devia ter vindo a mim primeiro.-A voz calma, porém fria e cortante.

-O que o senhor quer? Me diga o quer de mim, eu faço qualquer coisa, mas por favor, faça isso por mim.

-E o que você quer?

O homem observou discretamente as outras duas pessoas ali com certa apreensão, se levantou e cruzou a mesa, sussurrando no ouvido do padrinho, após retornar a seu acento, viu o mesmo coçando a barba outra vez, com um olhar de desconforto.

-Isso eu não posso fazer

O homem apoiou as mãos na mesa e encarou o Don nos olhos.

-Eu pago o quanto você quiser.

-Nos conhecemos a muito tempo velho amigo, mas é a primeira vez que vem a mim pedir por um conselho ou pedir pela minha ajuda, nem lembro a última vez que convidou pra um café na sua casa apesar de eu ter apadrinhado a sua filha, mas sejamos sinceros, nunca quis minha amizade porque sempre teve medo de ficar em débito comigo.

-Nunca quis me envolver em problemas.

-Eu entendo, depois que se casou o seu negócio decolou, você tinha uma linda esposa, uma filha inteligente, a polícia te protegia, não precisava de um amigo como eu.-Parou um breve segundo para fazer carinho no pastor alemão sentado comportado ao seu lado.-Mas... Agora vem a mim e diz "Don Hammond, faça justiça." Mas você não pede com respeito, nem me chama de padrinho, ao invés disso você vem até a minha casa, no casamento da minha filha e me pede para matar por dinheiro.

-Tudo o que eu peço é justiça.

-Isso não é justiça, sua filha ainda está viva.

-Então faça eles sofrerem, como a minha filha está sofrendo agora, quanto devo te pagar?

Em resposta, o Don se levantou calmamente e em sinal de respeito, um soldado que permanecia sentado se levanta também.

-Che cavolo... O que eu fiz pra merecer ser tratado com tamanho desrespeito? Se tivesse vindo a mim por amizade, os pilantras que machucaram sua filha estariam sofrendo agora mesmo.-Atravessou a sala calmamente ficando de frente para o amigo.-E se porventura um homem de tamanha honestidade como você fizesse inimigos então eles seriam meus inimigos. E o senhor seria temido.

O homem engoliu em seco.

-Ainda posso ter sua amizade?-O Don apenas fez um gesto amplo com a cabeça, assistindo o homem se curvar e estender a mão.-Padrinho?

O Don deu sua mão ao homem, que a beijou como forma de respeito.

-Muito bem.-Disse o Don apoiando o braço no ombro do amigo enquanto o guiava para a porta.-Talvez chegue um dia em que você tenha que fazer um favor para mim, mas até lá...

Abriu a porta e sorriu sem mostrar os dentes para seu amigo.

-Aceite a justiça como presente de casamento.

O homem finalmente pode relaxar e devolveu o sorriso do Don.

-Grazzie, padrinho.

-Prego.

Assim que o homem sai, a mulher dos cabelos vermelhos se aproxima de seu Don.

-De esse ao Otto, quero gente confiável, do tipo que não exagera, não somos assassinos, apesar do que esse homem diz.

-Papa.-Chamou o outro presente, um celular com alguém na linha, o padrinho sorriu ao ver o nome na tela.

-Mio figlio, mi manchi! Come va?-Sorriu ao ouvir a voz do filho pela primeira vez em muito tempo.-Que bom, eu estou bem, todos estamos, suas irmãs não param de perguntar sobre você, quando você vem nos ver?

A expressão do Don foi de feliz para confusa em segundos.

-De quantas semanas?-Ouviu a resposta.-O que planejam fazer?

Após longos segundos, o Don voltou a perguntar.

-Tem certeza? Isso não é algo que possa desfazer depois.-Após ouvir a resposta, o sorriso do padrinho se abre outra vez.-Che figo! Você amadureceu tanto meu filho, vocês tem que vir pra cá, quero conhecer minha nora o quanto antes! Pelo jeito vamos poder aproveitar alguns enfeites de casamento da sua irmã.

Mais uma breve pausa.

-Certeza? Tudo bem, vou avisá-la e vê se me ligue mais vezes, sua mãe e eu paramos de brigar a um tempo, eu sei que toda as nossas brigas estavam te deixando desconfortável com a vida aqui em casa, mas estamos fazendo terapia como você sempre nos recomendou e está funcionando, acho que nunca vi mãe se abrir tanto comigo, era o que estávamos precisando.-Mais uma breve pausa.-Eu que te agradeço, arrivederci filho.

Após desligar e guardar o celular no bolso, lágrimas caíram dos olhos rubros do Don, atraindo a atenção de seus filhos.

-Tudo bem papa?-A mulher perguntou apertando seu ombro levemente com um semblante preocupado.

-Tudo ótimo.-respondeu dando uma leve fungada, e sorrindo para sua primogênita.-Seu irmão nos dará meu primeiro neto.

-Isso é incrível papa! Temos que comemorar, quando ele vem pra cá?

-Vemos isso depois que você voltar do Brasil.

A mulher solta uma risada anasalada.

-E por que eu iria pro Brasil?

-Por seu irmão, ele precisa de ajuda com um assunto de última hora, leve os soldados mais confiáveis.

A mulher apenas assente e sai da sala em passos apressados.

...

Zakk e Toga desligavam os celulares e se entre-olhavam, a parte fácil já estava feita, agora vinha a parte difícil. Ao longe era possível ver o Cristo Redentor dando boas vindas às lendas, aquela era a primeira parada.

-Tem certeza que isso é necessário? Eu sei me defender bem sozinha.

-Tenho inimigos poderosos em todo o mundo, no Brasil não é diferente, não quero você e o nosso filho correndo riscos.

-Mesmo assim, não queria incomodar sua família com isso, sua irmã deve ser uma mulher bastante ocupada.

Zakk sorria com as lembranças da irmã, sabia que ela faria de tudo por seus irmãozinhos, ainda mais agora que havia descoberto estar perto de ser tia.

-"Um homem que não se dedica a família não é um homem de verdade." Meu velho sempre nos educou com isso em mente, pode ficar tranquila que a Medea vai ficar feliz em ajudar.

Toga sempre tentou imaginar alguém que fosse ao menos metade do que Zakk era, quando ela soube que os filhos mais velhos da família Hammond eram apelidados de "Crias do Diabo". Podia ver o porquê do moreno ser merecedor do título, mas só de lembrar da natureza sádica do menor, Toga não conseguia nem imaginar o que alguém como Medea poderia ter feito para merecer o apelido.

-Como ela é?-Perguntou inconscientemente, percebendo o sorriso do menor aumentar mais ainda.

-Pra mim e pros meus irmãos ela é a nossa irmazona superprotetora, pros inimigos da Horseman ela é uma víbora, uma mulher com uma língua afiada que uma hora aperta sua mão e na outra te esfaqueia pelas costas.

Aquela era uma resposta que Toga não esperava, sempre imaginou Medea como uma guerreira habilidosa como o irmão, mas pelo visto era mais manipuladora, isso não a tornava nem um pouco menos perigosa que Zakk, talvez fosse até mais.

-Espero não irritar ela.-Se apenas uma das irmãs dele era tão perigosa assim, Toga não conseguia nem imaginar o resto da família.

Longe dali, em um aeroporto afastado no Rio de Janeiro, um jatinho particular da Horseman se preparava para o pouso, a passageira mais importante admirava a beleza do mar sobre a praia atrás dos óculos escuros.

Um rapaz adentrou a cabine principal, seu nervosismo era visível, Medea havia ouvido falar dele, aptidão em combate corpo-a-corpo, bom atirador, reflexos rápidos, um pouco tímido, mas como a mesma pensou o analisando de cima a baixo: Vai servir.

-Eu fui instruindo a escolta-la senhora.

A voz do rapaz quase falhou por um segundo.

Os cabelos vermelhos como fogo presos em um rabo de cavalo alto, ondulados e volumosos, algumas mechas caiam por seu rosto, a pele pálida sendo a única coisa herdada do pai, uma camiseta branca com a gravata e o paletó pretos e abotoaduras douradas com a letra H entalhada nelas, a calça e o sapato social preto, Medea se levanta. Os 1,89 reforçando a superioridade sobre ele, os lábios avermelhados pelo batom se curvando em um sorriso ladino, quase predatório enquanto a mulher se aproximava com dois copos de whisky nas mãos.

-Está nervoso, querido?-A voz num misto de divertimento e doçura, como se o desconforto do garoto lhe divertisse.

-M-Mil perdões, eu nunca estive tão perto de alguém da família antes.

-Não se preocupe meu bem, eu não mordo, beba um pouco, você precisa relaxar.

Receoso, o garoto pegou o copo que Medea estendia em sua direção e bebeu um gole, vendo o sorriso da víbora se intensificando, a viu tirar o porta cigarros do bolso do paletó, bastante elegante, com as iniciais da mulher entalhadas em dourado, tirou um cigarro e o acendeu, deu uma longa tragada e expeliu a fumaça longe do menor.

-Melhor?-O rapaz assentiu.-Ótimo, preciso de você totalmente relaxado, alguém armou uma emboscada para nós.

O rapaz olhou pela janela e entrou em pânico, vendo vários homens armados com armas de alto calibre, não teriam como enfrentar todos eles. Voltou sua atenção para Medea...

A mesma ainda sorrindo e bebendo com o cigarro aceso entre os dedos, sentada ali com as pernas cruzadas.

-O que nós vamos fazer?

Medea bebeu mais um gole finalizando a bebida.

-Eu posso nos tirar dessa, mas preciso de você, posso te tornar invencível, mas esse poder não vem de graça, está disposto a jogar fora a sua humanidade por ele?

Hesitou outra vez e olhou pela janela tentando encontrar alguma saída daquela situação, uma que não envolvesse aquilo. Mas não encontrou, apenas assentiu, viu Medea mostrar os belos e perfeitamente alinhados dentes em outro sorriso ladino.

-Só mais uma pergunta, por acaso você é comprometido?-O rapaz a olhou confuso por um momento mas acenou negativamente.-Melhor ainda.

Com a mão livre, ela o chamou com um gesto do dedo indicador, como um predador atraindo sua presa, o rapaz a viu tirar os óculos enquanto se aproximava, os olhos, aqueles olhos amarelos com aquelas pupilas verticais o chamando, se gravando em sua mente queimando sua imagem na mente do garoto, só quebrou o contato quando sentiu algo puxando sua gravata, era ela.

Dessa vez ele havia se aproximado mais do que jamais imaginaria, seus lábios haviam sido tomados por ela, a língua bipartida se enrolando na sua, nessa mesma hora, sentiu uma sensação estranha em seu peito, um calor se espalhando por todo o seu ser, ele sentia como se pudesse quebrar um homem ao meio com as mãos nuas.

Sem perceber, os olhos amarelos precatórios dela agora eram os seus.

-Mate.

A voz dela ecoou em sua mente, a ordem que ele acataria com prazer, sua visão foi nublada e ele acordou algum tempo depois, estava na pista de pouso, os homens armados de antes caídos ao chão, ensanguentados, sem vida, ele havia feito aquilo, suas mãos estavam cobertas de sangue. Ouviu os passos dela se aproximando, ela parou a sua frente, segurou seu queixo o fazendo encarar seus olhos hipnotizantes.

-Bom garoto.

Foi tudo que ela disse, antes de se virar e caminhar para longe, olhando por cima dos ombros.

-O que está fazendo aí bobinho? Venha, temos muito a fazer.-Tirou outro cigarro e o acendeu na boca.-Mal posso esperar pra conhecer minha cunhada e os amiguinhos do meu irmão, será que tem algum bonitinho pra te fazer companhia?

Medea deixou o lugar, deixando os cadáveres para trás.