Passaram-se dois dias após a nossa luta contra a Isabella. Karol recebeu alta e voltou ao trabalho no mesmo dia, como ela consegue? Tudo o que eu menos quero é vir trabalhar aqui, nesse emprego de merda. Ainda mais por ter que lidar com o babaca do nosso chefe. Imaginem o ser mais asqueroso e repugnante possível, agora imaginem ter que obedecer esse ser, esse é o nosso chefe.
Eu até poderia explicar tudo o que torna o Jefferson um verdadeiro lixo humano, mas eu acabaria aumentando muito a contagem de palavras, mas só pra vocês saberem com que tipo de pessoa nós temos que lidar todos os dias: Que outra pessoa no mundo obrigaria as funcionárias mulheres a usar um "uniforme" que mais parece a roupa padrão de uma prostituta? É claro que é o Jefferson. Mas é claro, não satisfeito, esse desgraçado obriga apenas as funcionárias mais jovens a se vestir assim.
Pra não parecer óbvio, existe uma espécie de calendário mostrando os dias que as garotas têm que usar essas coisas e é claro que são só os dias em que ele está presente na lanchonete. Sério, tem que ser cego pra não perceber o que esse maldito pervertido faz, nesses dias, os homens tem trabalho dobrado enquanto elas ficam apenas na limpeza sobre a "supervisão" dele. Quando uma delas se abaixa pra limpar as mesas ele sempre está lá, atrás delas, ele nem disfarça mais quando olha pras bundas delas.
Às vezes, ele chama uma menina pra uma "conversa" no escritório dele, eu não faço ideia do que acontece lá, as garotas sempre mudam de assunto quando eu pergunto, mas é bem óbvio. Todo mundo aqui precisa do emprego, essa é a pior parte, essas garotas se sentem presas. Elas dependem de dinheiro e esse asqueroso se aproveita disso pra satisfazer os próprios desejos pervertidos. Isso me irrita!
—Volte ao trabalho Ridley!—Falando no diabo... A voz rouca dos anos e anos dos cigarros que ele não para de fumar me dá dor de cabeça, ainda mais quando ele grita tão perto do meu ouvido, a cabeça calva de me causa náuseas mas não tanto quanto a barba cinza desgrenhada, esse cara deve ter o dobro da idade dessas garotas.
—Desculpa.—Nem me dou o trabalho de esconder o desprezo na voz e no olhar, tenho certeza que ele sabe muito bem do meu ódio quanto a sua pessoa.
Voltei a fazer qualquer coisa aleatória enquanto vigiava cada passo do escroto, acabo notando a Karol ao longe, o ferimento dificulta seus movimentos, mas ela se esforça mesmo assim, Jefferson não merece uma pessoa tão esforçada quanto ela. Meu corpo todo trava quando ele se aproxima dela, consigo perceber que a Karol também travou. É impossível não perceber o desconforto na linguagem corporal dela.
Foco totalmente a minha audição, é quase um superpoder só meu, mesmo com todo o barulho a minha volta eu consigo focar apenas em um único som, dá pra ouvir a conversa deles nitidamente:
—Coitada, tá doendo querida? Você tá mais lenta que o costume hoje.—A maneira como ele fala... É como se falasse com uma criança... Nojento...
—Não tá mais doendo tanto, eu tenho que voltar ao trabalho...—É quase como se eu mesmo pudesse sentir as mãos nojentas dele tocando o meu corpo do mesmo jeito que tocam ela.
—Não precisa se esforçar tanto, meu bem. Passa no meu escritório depois, garanto que eu te faço melhorar rapidinho.—Uma das mãos dele desce demais, a Karol se afasta na hora e vai limpar outra área como desculpa, sinto uma raiva incontrolável se apossar do meu corpo, eu não controlo mais os meus movimentos.
Me aproximei lentamente sem tirar meus olhos do homem à minha frente, ouvi ele murmurar um "vagabunda" quase inaudível quando a Karol se afastou, chamei seu nome quando me aproximei o bastante, cerrei meus punhos com tanta força que minha mão ficou vermelha. Meu punho acertou seu rosto assim que o mesmo se virou pra me encarar, vi alguns dentes podres voando de sua boca junto com uma boa quantidade de sangue antes do seu corpo atingir o chão totalmente inconsciente.
—Eu me demito.—Olhando em volta pude perceber os olhares assustados direcionados a mim, até mesmo o da Karol.—Arrume as suas coisas, vou pedir pra alguém nos buscar.
—O que!?—Ela finalmente despertou do choque inicial.—Ficou maluco!? Eu preciso desse emprego!
Me aproximei com cuidado, não quero assustá-la, segurei seus ombros firmemente. Meus olhos não desviavam dos dela, mesmo que eu precise olhar pra cima pra encarar essa garota.
—Confia em mim?—Ela me olhou cheia de confusão por algum tempo antes de soltar um suspiro.
—É melhor que você saiba o que está fazendo.—Um sorriso confiante toma meus lábios.
—Tudo sob controle.—Assisti enquanto ela se afastava, mas então percebi que o desgraçado já estava se levantando, não perdi tempo, acertei outro soco que o nocauteou na hora.
Os mais espertos voltaram a trabalhar como se nada tivesse acontecido, mas ainda havia alguns curiosos à nossa volta. Lhes direcionei o olhar mais intimidador que eu podia, levei o indicador aos lábios em uma ameaça silenciosa, acho que eles entenderam o recado. Saí do restaurante pouco tempo depois, já estava pedindo um Uber, vou tirar a Karol daqui, não vou mais tolerar que alguém a trate desse jeito. Foi a última vez!
Não sei porque eu estou tão preocupado com as pessoas ultimamente, mas eu não me importo muito, eu estaria morto sem eles, tenho que ajudar do meu jeito também.
Parei por um instante observando o estacionamento, pensando em várias coisas. Não contei nada sobre o que descobri pra minha mãe, não sei se posso confiar nela depois de descobrir suas mentiras, eu reconsiderei tudo o que ela me contou sobre o passado depois daquilo. Quantas outras mentiras ela havia me contado? Ela já havia me contado que eu tinha um irmão gêmeo, que ele havia morrido um ano depois do nascimento.
Ela até me falou o nome dele, eu acho que era...
Vergil...?
—Aonde pensa que vai?
Meus pensamentos foram interrompidos pela voz dele, esse cara não cansa de apanhar? Me virei pra encarar a pança enorme do Jeff, esse cara tá me dando nos nervos. Mas... parece ter algo diferente nele, o ar a nossa volta parece rarefeito, uma sensação incômoda em meu peito, isso é diferente da sensação de um Fable, isso tá vindo... dele?
—Ninguém mais vai rir de mim...—Ouvi um sussurro antes dele avançar numa velocidade surpreendente.
Desviei por pouco do ataque, ouvi um estrondo, havia um buraco na parede onde o punho dele havia acertado, não tive tempo pra respirar quando ele veio pra cima outra vez. Chamei o Hatter e segurei seu punho por muito pouco, tive dificuldade, esse cara tá muito mais forte que qualquer pessoa normal. Tive que usar as duas mãos pra empurrá-lo e ativei a manopla. Acertei um soco com toda a minha força usando o Daredevil, ele cruzou os braços pra se defender e acabou nem se mexendo.
Tentei outra vez, mas dessa vez ele se esquivou e segurou meu pulso nem sequer se incomodando com o calor extremo da manopla, com a livre ele segurou o pescoço do Hatter e o levantou do chão, a pressão que senti no meu pescoço era demais, eu comecei a sufocar.
Não desisti ainda, abri um portal ao meu lado e comandei o Hatter a enfiar o pé nele, a sola da bota acertou o queixo através de um portal criado abaixo do seu rosto, eu estava livre. Parece que os chutes do Hatter são mais potentes que os socos, então vamos focar nisso. Concentrei o calor na bota e esperei o movimento do desgraçado.
Ele avançou sem medo em minha direção, desviei junto com o Hatter e levantei minha perna, o chute foi certeiro nas costas dele, o fazendo cair no chão com tudo, pra garantir que ele não vai se levantar, concentrei o poder do Daredevil e acendi uma pequena chama nas suas roupas, quando percebi sua tentativa de se levantar, intensifiquei as chamas e as espalhei pelo seu corpo. O cheiro de carne queimada se espalhou rapidamente junto aos gritos de dor. Ele se debateu no chão na tentativa de apagar o fogo, mas aquelas não eram chamas naturais, não iriam se apagar contra minha vontade, não demorou até o desgraçado morrer e deixar apenas o cadáver chamuscado pra trás.
A fumaça negra que subiu quando eu apaguei o fogo parecia ter vida própria, não sei se enlouqueci mas posso jurar que vi um rosto se formar nela, mas não é loucura, aquela fumaça tomou uma forma! Uma criatura esguia, eu podia ver os ossos esticados na pele negra, a boca era repleta de dentes afiados, não havia olhos, os braços eram longos, quase chegavam nos pés, as garras eram enormes, aquela coisa inteira era simplesmente enorme!
Eu acho que olhou pra mim... Sua boca se contorceu e seus dentes estalaram, seu rugido estridente ecoou pelo lugar e então ele desapareceu, correndo nas quatro patas pra longe e sumindo de vista como se nunca tivesse estado ali, mas por mais que ninguém tenha visto, sua imagem vai ficar em minha mente por um bom tempo.
O que quer que aquilo seja, as mulheres nesse restaurante ficavam presas com aquilo no escritório...
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Karol estava confusa.
Ela me disse que nunca havia visto nada parecido na vida. Eu sei bem o que eu vi, aquilo não foi invenção da minha cabeça, foi real demais pra não ter sido nada. Estávamos no carro agora então limitamos nossa conversa, não queríamos que o motorista ouvisse, mas mesmo assim, a aparição daquela criatura me perturbou imensamente.
Ao mesmo tempo, tinha muitas dúvidas em minha mente. Por que Karol deixou que aquele homem a tratasse daquele jeito? Ela já havia sofrido algo parecido antes, deveria ser quem menos toleraria algo assim...
—Karol...—Ela parecia estar tão absorta em seus pensamentos quanto eu, pois pareceu despertar de um transe quando a chamei.—O que acontecia naquele escritório quando aquele homem as chamavam?
Ela se calou por um longo tempo, parecia pensativa, eu preciso saber, o que aquela... coisa... fazia com as mulheres do restaurante?
—Eu... eu não sei... Eu não me lembro...—Analisei suas expressões em busca de qualquer sinal de desonestidade, mas não havia nenhum, aquela era a verdade, a terrível verdade...—Eu só me lembro de entrar e depois sair meio cansada, eu não me lembro de nada do que acontecia lá.
Tem algo errado aqui, essa perda de memória era obra da criatura, não havia dúvidas, será que era algum tipo de sugestão hipnótica? Se fosse o caso, o efeito deveria ter passado depois que o Jeff morreu, mas talvez eu devesse ter matado a criatura também pra que o que quer que ela tenha feito perdesse o efeito nas vítimas, isso tudo é perturbador.
Apoiei a mão em seu ombro, meu corpo e minhas palavras estavam no automático outra vez.
—O que quer que tenha acontecido, eu vou estar aqui pra te apoiar, não importa o quão terrível a verdade realmente seja.—Como fico feliz em ver seu sorriso, é maravilhoso, ela deveria sorrir com mais frequência.
—Valeu, nem acredito que te julguei como um babaca no começo, você é um cara legal Ridley.—Ouviram isso? Ela me chamou de Ridley! Eu devo estar sorrindo feito um besta agora.—O que foi?
Ela ficou confusa pela minha felicidade repentina.
—Você acabou de me chamar Ridley.-Seu rosto esquentou na hora, meu sorriso só aumenta com a vergonha dela.
—Não vai se acostumando idiota!-Ela desvia o olhar, ela não faz ideia que acabou de criar um monstro, vou fazer de tudo pra ouvir ela me chamar de Ridley outra vez a partir de agora!—Enfim, pra onde a gente tá indo?
—Você vai ver.
Aos poucos o carro vai se aproximando do nosso destino, estávamos no centro da cidade, chegando na parte comercial daqui, o carro virou em uma rua mais tranquila, era difícil ouvir toda a barulheira da cidade daqui, o lugar perfeito pra uma loja com mais conforto, paramos na última casa, era bastante familiar pra mim, já que vi a Isabella ser arremessada da janela do segundo andar, isso mesmo, a mesma casa abandonada em que lutamos da última vez, só que dessa vez, completamente reformada e transformada. Devem estar se perguntando como eu reformei esse lugar em apenas dois dias, mas isso não vem ao caso agora.
O importante é que agora não é mais uma casa, é uma loja. Uma cafeteria, pra ser mais exato, esse vai ser o nosso ponto seguro em todo esse inferno, o nosso santuário, também vai ser o meu primeiro negócio, o Sunrise abre as portas amanhã como um ponto neutro e protegido.
—Vem, tem alguns quartos no segundo andar.—Ela me segue em silêncio enquanto eu abro a porta da frente.
Assim que adentramos o lugar me deparo com um lugar bastante aconchegante, é bem diferente daqueles lugares onde você sente que tudo não passa de uma tentativa de alguma empresa gigantesca de arrancar cada centavo dos seus clientes, parecia natural, era um lugar onde você realmente se sentia valorizado como pessoa, e não como uma carteira ambulante. Tinha algumas mesas com bancos acolchoados de couro bastante espaçosos e confortáveis, o balcão era enfeitado com algumas vitrines que eu planejava enfeitar com bolos, pães e doces variados, atrás haviam três prateleiras lotadas de potes de grãos, tem grãos bastante exóticos aqui também, cortesia da empresa da minha mãe, a qualidade deles é comprovada.
Dei uma breve olhada no cardápio, nada mal, na minha opinião. Tinha a cara de um estabelecimento vintage, ainda não tinham preços, mas já adianto que as pessoas vão adorar os beber o melhor café da cidade por um preço acessível.
—Tem um banheiro no segundo andar, acho que seria uma boa ideia você tomar um banho.—Ela acena e faz seu caminho até a escada que ficava na cozinha logo atrás do balcão.
Enquanto ela subia, coloquei meu avental, hora de mostrar minhas habilidades, se tem uma coisa de que eu me orgulho é do meu café, não querendo me gabar, mas algumas pessoas o consideram o melhor da cidade. Peguei grãos brasileiros, um dos melhores do mundo, um pouquinho de açúcar e o tempo certo é a chave, o aroma de café recém passado é um do qual eu me acostumei, acho que vai ser o cheiro que esse lugar vai ter de agora em diante. Enchi uma xícara bem a tempo de vê-la descer as escadas em uma roupa casual, uma simples calça jeans e um top preto, ela entra no salão respirando fundo, um sorriso enfeita seus lábios outra vez.
Aponto pro banco a frente da xícara ainda quente de café e ela se senta prontamente.
—Não sabia que você sabia fazer café, acho que você não é tão incompetente assim.—Apenas sorrio, assim que seus lábios se encontram com a bebida, seu olhar se acende instantâneamente, surpresa toma sua face.—Esse é... O melhor café que eu já bebi...
—Surpresa?—Peguei a fatia de torta de maçã que eu estava guardando e coloquei à sua frente enquanto ela ainda se recuperava do choque.
—Como você...?—Ela continua surpresa.
—Acho que eu não sou tão incompetente assim. Relaxa, você vai ter muito tempo pra aprender.—Estendi a chave dela.—Nós abrimos às nove e fechamos às cinco e meia, o seu uniforme ainda tá chegando então você pode trabalhar com uma calça e uma camisa por enquanto, o salário inicial é dois mil e quinhentos, a gente acerta tudo depois mas eu já tenho os contratos aqui comigo.
Ela parecia ter dificuldade em acompanhar, mas ficou em silêncio enquanto eu falava.
—Espera aí!—Ela se levantou gesticulando pra que eu parasse.—Você tá me contratando sem mais nem menos? Não tem nem uma entrevista?
Sorri travesso.
—Tem experiência com chefes babacas?
—Você nem imagina.—Ela me responde cheia de sarcasmo.
—Então tem toda a experiência necessária, seja bem vinda ao Sunrise.—Devolvi o sorriso e o tom sarcástico e me inclinei em sua direção.—Você começa amanhã, será um prazer trabalhar com você, senhorita Nancy.
Estendi a mão em sua direção e ela apertou em um aperto de mãos de brincadeira, e então caímos na gargalhada, era bom saber que mesmo com todo o sofrimento a nossa volta, ainda podíamos sorrir e gargalhar.
É bom saber que mesmo após tudo o que ela passou, ela ainda é capaz de sorrir e gargalhar...
—Karol.—Tive que segurar a risada ao ver sua boca cheia de torta, essa seria uma conversa séria.—O sofrimento acabou por hora, mas você precisa dar valor a si mesma, eu entendo que você tá tentando sobreviver, mas me diz, vale mesmo apena abrir mão da sua dignidade por dinheiro?
Ela sabia bem do que eu estava falando, se rebaixar daquele jeito, ceder aos toques daquele homem, deixar que ele fizesse o que queria só pra manter o emprego. Eu entendo a mente dela, entendo que é difícil se impor e ter respeito pelo próprio corpo quando todos à sua volta não respeitam, mas pra acabar com a opressão, antes é preciso eliminá-la de sua mente por completo. Seguro sua mão ainda descansando no balcão, posso sentir seu corpo todo travar. Há um turbilhão de pensamentos passando em sua cabeça, seus olhos transparecem isso perfeitamente, ela se sente perdida, confusa.
—A partir de hoje, quero que me prometa uma coisa, nunca mais deixe alguém te tocar daquele jeito, nunca mais deixe alguém te tratar como um mero objeto.—Segurei seu rosto com a mão livre, algumas lágrimas solitárias rolaram e tive que limpá-las.—A partir de hoje, quero que me prometa: Você vai ser dona de si mesma.
Mais algumas lágrimas desceram, era um choro silencioso, uma súplica entalada na garganta de alguém que perdeu o respeito por si mesma, que abriu mão da própria felicidade a muito tempo, alguém que a vida não deixou ser criança. Queria que esse momento não terminasse, queria tê-la vulnerável em meus braços pra sempre, porque então eu teria como garantir que ninguém nunca mais iria feri-la, eu garantiria sua segurança, aqui, sob minhas asas. Pois eram essas as minhas vontades, as vontades de mantê-la ao meu lado, segura.
Mas todo pássaro deve voar livre, deve estar livre pra cair e abrir vôo novamente, livre pra aprender com os próprios erros e os erros dos outros, me sinto orgulhoso pois sei que ela é forte. Ela é mais forte que tudo, e não importa o quanto o mundo a jogue no chão, Karol... Não, Alice, vai sempre se levantar pra lutar outro dia. E se depender de mim, é uma luta pela qual ela não vai passar sozinha.
—Termine o café, vai acabar esfriando.—Só a soltei quando percebi que estava calma, ela precisa pensar por si mesma agora, a decisão de mudar é só dela.
Após beber o resto do café, pude notar ela analisando o próprio reflexo no fundo da xícara de porcelana. Tentava encontrar algum resquício da garotinha que ela uma vez foi, a menina que acreditava em contos de fada e em uma saída milagrosa do pesadelo que era sua infância, mas ambos sabemos que aquela não era mais ela, Alice não existia mais, Karol era quem ela realmente era, sua versão final e definitiva. A mulher à minha frente era uma tela em branco, e eu seria aquele que iria presenciar a bela arte que se formaria ali.
—Eu prometo...—Não precisamos de mais palavras, não há mais o que ser dito, apenas uma mulher começando a trilhar a estrada da verdadeira liberdade.