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Contos de Domüm: O Profeta Escarlate & A Chama Primordial

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Synopsis
Em uma era de traição, preconceitos e guerra, a prova da existência de Deus é dado aos seres que precisam entender o seu verdadeiro significado antes que alguém o faça. Para isso aquele marcado deve herdar a Chama Primordial e trilhar seu caminho sem destino, onde irá encontrar ódio, medo, mas principalmente esperança. Nesse contexto um jovem de um vilarejo acorda para sua aventura, cercado por perigos e intrigas politicas e filosóficas. Onde ele irá aprender a verdadeira essência do amor, amizade e conseguir forças para lutar contra os dogmas do mundo.
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Chapter 1 - Vicissitudes

Vigésimo quinto dia da Primavera, Ano 178, 2° Era.

— Finalmente começou — comentou Adrios, enquanto andava em direção à bancada de inscrição ao meio dos outros competidores — Fenor, é aqui?

— Sim, achei que fosse meio óbvio pela quantidade de pessoas na fila. — Justificou Fenor com um sorriso puxado ao lado, com o mínimo de graça pela situação.

Os dois que acabaram se atrasando para tal, Adrios um humano jovem de cabelo castanho claro e curto, com uma roupa velha, praticamente trapos de uma coloração vermelha, que realçava o emblema da capital que o vilarejo servia, com uma mochila que carregava sobre as costas. Do seu lado Fenor, outro humano de cabelo escuro, que possuía um corpo mais próximo de um soldado, mas ainda assim jovial, e possivelmente com uma condição financeira melhor, pelo que se percebia com suas roupas que por si condizem pelo seu material sofisticado, devidamente bem trabalhado pra uma pessoa comum. Além disso, possuía o porte de uma adaga que deixava amostra do lado da sua cintura, incrustado por um tipo de jóia azul, que brilhava ao sol da manhã ao meio do punhal da mesma.

Ao chegar na praça do vilarejo de Drachen, um lugar por si calmo, se não fosse os mercantes e seus estabelecimentos, que se encontravam vendendo quinquilharias e serviços na área, desde artesãos, até confeccionistas e uma única taverna. Ou seja, um lugar lotado. Ambos foram indo adiante para a fila que se encontrava cheia de pessoas, seres de todas raças e etnias, desde orcs a gnomos e humanos, que viajaram de várias localidades pelo mundo de Domüm para tal evento. Onde por si Fenor e Adrios esperaram o momento da inscrição deles, no fim da fila.

— Sabe Adrios, eu sei que a chance de você passar, é muito pequena no teste de iniciação da Guarda Escarlate, mas saiba, te esperarei nas finais com muito, mas muito prazer. — Debochou Fenor com um sorriso de lado.

— Fenor, não é porque meus pais são camponeses que eu não sei me defender. Você sabe mais do que todo mundo sobre isso. — Disse Adrios em meio a fila.

— Não me lembro disso quando te salvei do Guliver e os comparsas dele — contradiz Fenor — na próxima, você se cuida sozinho.

Em um dos instantes, Adrios e Fenor perceberam em seus arredores que acabaram chamando a atenção de um dos guardas, estava tomando conta da organização e assegurando a segurança do lugar. Sua aparência física indescritível pela sua armadura, que acabava cobrindo totalmente seu corpo, desde seu elmo, e sua cota de placas consideravelmente pesada, com adornos vermelhos, e dourados que brilhavam, comprovando seu lugar na Guarda Escarlate, como um dos prováveis oficiais do teste. Ele se aproximou lentamente, em uma postura séria ao lado dos dois garotos e disse com uma tonalidade brava:

— Façam silêncio e resolvam isso lá dentro, já temos confusão suficiente para hoje com o número de recrutas. Bando de idiotas. — Reclamou o guarda enquanto olhava para ambos que estavam um pouco surpresos por terem sidos pegos despercebidos.

— Olha, está quase na nossa vez, só vamos ficar quietos, você sabe que é meu sonho desde criança me juntar a guarda. — Explicou Adrios ao seu colega, enquanto cruzava seus braços de forma ansiosa, olhando para outro canto e esperando o guarda se afastar.

— Tudo bem, aproveite o momento. — Fenor direcionou a resposta e voltou sua atenção para a fila à frente.

O tempo acabou passando, entre uns dez minutos eles acabaram chegando, onde se encontraram com dois guardas que não pareciam oficiais, principalmente por ter suas armaduras feitas de couro e outros materiais mais simples, além de um físico despreparado para tal. Fenor acabou se direcionando a eles:

— Com licença, nobres cavaleiros, eu e meu amigo aqui, estamos querendo participar do teste de iniciação da Guarda Escarlate. — Comentou o jovem de forma respeitosa.

— Nome, onde moram, idade e qual posição esperam tomar inicialmente? - Perguntou o guarda com uma voz cansada e sem interesse. — Guerreiro, mago ou batedor?

— Fenor Cerveja Negra e Adrios de Drachen, ambos daqui, nós dois temos dezessete anos e desejamos nos tornar guerreiros. — Explicou para o guarda.

— Ótimo, tudo anotado, então, podem entrar e se apresentar — apontou o guarda, enquanto esticava com sua mão algo para os dois — e peguem isso, são os broches de identificação do teste de iniciação para guerreiros.

— Obrigado. — Disseram os dois, enquanto pegavam da mão do mesmo colocando em suas camisas, e andavam para o local ordenado.

Chegando a tenda principal que se encontrava ao meio da praça do vilarejo, ambos se viram em meio de várias pessoas, entre eles elfos, anões e diversas criaturas que nunca haviam sido vistas antes por eles que só estavam aqui somente pelo desejo de fazer parte da aclamada Guarda Escarlate.

— Viu só que eu falei Adrios, não será fácil — afirmou Fenor — temos de dar nosso melhor.

— Como se eu não fosse. — Cogitou Adrios enquanto começava a andar na direção da multidão que estava se reunindo em um dos cantos da tenda.

— Ei, me espere — exclamou Feron — sabe que não pode ir andando assim sem mim.

— Ah tá bom, então vem logo. — retrucou o comentário.

Ambos andaram até o meio da multidão onde um oficial, elfo, de cabelos brancos e comprido com olhos esverdeados começou a discursar em cima de um pequeno palanque:

— Ouçam todos, sou o capitão Asmir da Guarda Escarlate, aqueles que possuírem o broche da iniciação para magos deverão me seguir, enquanto os batedores deverão seguir o oficial Dalasco — exclamou ao público enquanto apontava para o oficial — e por fim aqueles que possuem o broche de guerreiro deverão seguir o general Gnever.

O general, um homem virtuoso por aparência e pelos números de medalhas que possuía em sua armadura, um traje completo feito de seda vermelha da mais cara qualidade que era coberto por sua armadura de placas, que por si não era feito de um material comum mas algo que demonstrava uma presença mágica para todos aqueles que se aproximavam dele. Adrios e Fenor acabaram seguindo a divisão dos grupos, eles se apressaram para acompanhar o general, que por si acabou caminhando com sua parte dos integrantes novatos para fora da tenda, mais especificamente para fora do vilarejo onde estavam se aproximando de um tipo de estrutura, feito puramente de madeira.

— Ei... Adrios — sussurrou Feron — aposto que vai ser ali que será o torneio de iniciação.

— Sim, mas eles construíram rápido não foi? — Questionou o garoto. — Não me lembro de ter visto isso por aqui nos últimos dias.

Enquanto se aproximavam mais e mais as dúvidas deles se cortavam, era nitidamente um tipo de campo para os duelos, cercados por troncos de madeira bruta. Quando finalmente chegaram em sua entrada, o general que os guiava parou em frente do grupo comentando:

— Escutem bem, como vocês sabem, de dois em dois anos nós temos o recrutamento da ordem, e para aqueles desavisados que se declaram como guerreiros, terão de passar por um teste de suas habilidades. Sim, um teste de combate até a morte. — Afirmou o general enquanto apreciava a cara de assustado da maioria dos recrutas.

— Mas, senhor — questionou um anão com cabelo e barba alaranjados à frente —, não haviam nos avisado sobre isso, isso nunca aconteceu antes e é totalmente injusto.

— Infelizmente essas são as novas regras. Se vocês não tiverem o mínimo de coragem, saiam daqui e desistam enquanto ainda possuem tempo — falou o general.

Adrios e Feron se encararam por um instante, com uma expressão de medo e dúvida, entretanto sem perguntar duas vezes, Feron deu seu primeiro passo à frente, olhou para trás como quisesse certificar-se de algo e seguiu aqueles que decidiram passar pelo teste da iniciação. Entretanto, Adrios não conseguiu, diferente de Feron ele não foi capaz de ir a frente com seu sonho, pois sabia que não fazia isso para si, e sim pelos seus pais e seus amigos, que infelizmente não se justificaria o sacrifício, caso ele falhasse.

Ao voltar para sua casa, na parte leste da pequena vila de Drachen, Adrios se encontrava totalmente reflexivo pela sua perda da oportunidade e futuro inconclusivo. Entretanto, em um dos cantos, escondido em meio as pequenas brechas das cabanas que ali se encontravam, algo chamava sua atenção. Uma voz que sussurrava por seu conhecimento:

— Ei, ei garoto — chamou a voz sussurrando —, quer uma balinha?

Felizmente ou não, a pessoa, ou por si a "criatura" que estava escondida nas sombras, não era muito difícil de ser notada, estamos falando de um coboldo, um ser pequeno mas não minúsculo como um gnomo, escamas como a de um dragão e uma aparência por si humanoide, se não fosse a sua mandíbula por si reptiliana, junto com seus olhos que brilhavam intensamente no escuro.

— Está falando comigo? — Perguntou Adrios.

— Não, estou falando com a outra única pessoa desse lado da vila, que por questão de coincidência está atrás de você — respondeu de forma grossa o coboldo. — Claro que estou falando com você retardado.

Em um dos instantes, o coboldo deu seus primeiros passos a frente, acabando que que por si saindo de seu esconderijo, mostrando finalmente a sua aparência, escamas alaranjadas e roupas comuns, uma camisa coberto por um colete de couro e bem no seu bolso da frente, um tipo de monóculo, feito do que parecia ser cobre, tirando isso, a única coisa que chamava a atenção era a sua mochila, que era devidamente maior do que se era esperado de uma criatura do tamanho dele carregar, com pedaços de metais de diversas cores e formatos saindo para fora, fazendo vários ruídos enquanto ele se mexia em direção de Adrios.

— Prazer, meu nome é Lucius Kastus Engenium — se introduziu ao humano. — vendedor e confeccionista de artefatos mágicos e engenhocas, acredito que você tenha algo do meu interesse.

— Me desculpe senhor , mas acho que está se precipitando, eu só sou um camponês. — Argumentou o garoto.

— Eu não estou falando de você, e sim do que está na sua roupa — comentou apontando. — quanto você quer por ele?

— Isso? Acho que aceito vinte moedas de sonero por ela. — Falou Adrios com uma cara de dúvida.

— Bem, se é o que você quer aqui está — dirige o seu comentário enquanto retira do seu bolso uma quantia de dinheiro e entrega ao jovem — cinquenta moedas de sonero, acho que é mais que o suficiente, correto?

— Mas, por que? Eu nem te conheço. — Perguntou Adrios.

— Olha, você quer um trabalho mas acabou falhando na única chance que você tinha correto? Eu sei como é garoto e eu posso te dar uma oportunidade — respondeu o coboldo. — e não, não estou falando de nada de errado, somente uma expediçãozinha se é que me entende.

— Bem, acho que não tenho nada pra fazer e o dinheiro é útil. Mas não é o bastante pro equipamento senhor — argumenta Adrios pro coboldo.

— Não se preocupe, as despesas serão minhas, me encontre na taverna hoje mais tarde e tudo será explicado — falou o pequeno coboldo enquanto pegava da mão de Adrios o broche. — aliás, meu nome não é "senhor" e sim Lucius, agora se me der licença, até o mais tardar.

De uma forma esquisita, Adrios considerou suas possibilidades, ele teria o mínimo de aventura e finalmente sairia pro mundo afora, sendo pago para isso. Não do jeito que ele previu mas sua chance de sair vivo talvez seria maior, entretanto somente talvez seria uma ilusão, feita por ele mesmo pra conseguir alcançar seus objetivos de uma forma fácil? Estaria ele errado se aceitasse tal trabalho?

Ao passar da caminhada árdua, Adrios finalmente regressou a sua moradia, um lugar não tão afastado da praça, mas próximo dos extremos do vilarejo, uma pequena e confortável barraca que por si o limo cobria suas laterais de madeira de cedro, entalhado rusticamente com runas. Independente da sua má vontade de se sentir culpado por ter desistido, Adrios andou lentamente até a porta da casa, estendeu sua mão direita, entretanto ansioso parou por um instante confuso em seus próprios pensamentos de como explicar a situação para seu pai e sua mãe.

Ao final de sua apresentação, se curvou perante a todos os ouvintes de sua bela arte enquanto era aplaudido e agradeceu a todos expondo:

— Deveras estou gratificado ó venerada plateia, intitulo-me Rivorg de Akysia e estarei no estabelecimento até enjoar-me. — Esclareceu Rirvog enquanto finalmente desceu do estrado para se sentar numa das mesas do canto da taverna.

Após o fim da apresentação, a taverna teve seus visitantes a se sentarem por inteiros e se acalmarem, Adrios aproveitou a chance para procurar por Fenor em meio as pessoas. Ao procurá-lo, andando até o meio do estabelecimento Adrios rapidamente acaba que ouvindo uma voz em meio a taverna, uma voz conhecida:

— Garoto, aqui. — Gritou em meio a multidão o coboldo para chamar a atenção de Adrios.

Ele se virou e em uma das mesas, o coboldo chamado de Lucius e o morto vivo que se denominava de Rirvog o encaravam. O coboldo por si parecia apontar para uma das cadeiras livres da mesa dele com objetivo de convidá-lo a se sentar. Adrios percebeu e se dirigiu à mesa, se sentou em meio aos dois.

— Ótimo que chegou cedo, primeiro tenho de apresentá-los, Rirvog esse é o garoto que te falei. -Explicou Lucius enquanto mexia no seu copo de bebida de forma ansiosa.

— Prazer, acredito que meu amigo não perguntou seu nome, qual seria esse? — Perguntou Rirvog à Adrios.

— Meu nome é Adrios senhores. — Disse o garoto.

— Vejo que arranjou um escudo, um pouco enferrujado. Não acha que é melhor jogar essa tralha fora? — Instigou o coboldo.

— Acho melhor não, era do meu avô. Para uma coisa tão antiga, está incrivelmente em um bom estado. Eu acho. — Explicou o humano.

— E sua arma, garoto? Vai me dizer que não possui nem ao mínimo um instrumento para bater na cabeça de um inimigo? — Perguntou Rirvog enquanto do seu chão pegava o cavaquinho - Se quiser emprestado pode ficar com o meu.

— Rirvog se aquiete, já é o sexto instrumento que você perde desde que saímos de Sonnen — implicou Lucius.

— Me desculpe senhor grosso, só estava querendo ajudá-lo — comenta Rirvog de maneira desinfeliz.

— Não se preocupem, eu vou comprar algo antes de sair, se o acordo do trabalho for o suficiente para eu aceitar — explicou Adrios.

— Claro, mas antes, ô garçom, traz outra rodada daquela de dois soneros pra cá, pros três. — exclamou o Lucius pro servente que passava um pouco distante da mesa, que por si confirmou ter ouvido para o mesmo.

— Bem vamos lá, você irá ficar com vinte e cinco por cento do nosso lucro total. Seja ela em vendas de equipamentos e afins. Se você achar um item sem nossa ajuda, é seu, caso contrário iremos repartir de acordo com a divisão do lucro. - exemplificou o coboldo - De início nós pagaremos pelo seu equipamento, mas coisas simples tudo bem? Nada de exagerar.

— Faça trinta por cento e estamos fechados? — Respondeu Adrios ao Lucius de forma nervosa.

— Vinte e cinco e eu e o Rirvog te ensinamos o que a gente puder. — Aplicou o coboldo na negociação.

— Que? Eu não tenho vez nessa escolha não? — Reclamou o esqueleto.

— Xiu, morto não fala — Exemplificou para Rirvog com certa comicidade.

— Eu aceito, mas me digam. Qual será o primeiro trabalho? — Perguntou o jovem.

— Rirvog, explique pra ele por favor enquanto eu vou dar uma olhada lá fora? — Pergunta o coboldo.

— Tudo bem, só tome cuidado. — Disse o morto-vivo.

Lucius acaba se levantando e saindo da mesa com demasiada pressa após ter terminado sua bebida, Adrios se pergunta o motivo de tal pressa mas ele possui uma breve sensação de que iria entender daqui a poucos momentos.

— Vamos lá, já ouviu falar das ruínas abissais, correto? — Questionou Rirvog a Adrios.

— Não, nunca ouvi falar sequer desse nome. — Respondeu ao esqueleto.

— Esses camponeses, enfim. São ruínas que dizem que vão tão fundas mas tão fundas que não possuem fim. Estão cercadas de monstros e tesouros que acabam aparecendo lá graças a fendas criadas pelo caos do lugar. - Explicou com um devido cansaço.

— Não tenho ideia do que seja esse "Caos" que vocês falam mas, só entrar lá matar os monstros e pegar o que der dinheiro pra gente. É isso? — Indagou Adrios de maneira sútil.

— Exato, simples assim. Será uns quatros dias de caminhada daqui. Ninguém nunca entrou lá, e se entraram nunca voltaram à superfície. — Alegou Rirvog ao jovem.

— Pronto então, mas cadê o Lucius? Não sabia que ele iria demorar tanto lá fora. — Questionou Adrios.

— Estranho, vamos lá fora ver isso. — Disse Rirvog enquanto se levantava da mesa em conjunto com Adrios.

Ambos passaram pelo meio da taverna onde ouviram uma gritaria na frente do estabelecimento, vindo de uma voz que gritava com ódio, entretanto o próprio Adrios conhecia muito bem.

— Então foi você, seu coboldo ladrãozinho de merda! — gritou Fenor.

Rirvog com uma resposta rápida acaba que se levantando e passando por Adrios que por si consequentemente puxou seu escudo nas costas e acompanhou o morto-vivo, visto que ao se aproximar da porta decide chutá-la, todavia chamou a atenção de todos no local, com um estrondo de batida enorme na porta que estraçalhou a maçaneta da mesma.

Do lado de fora, Lucius estava sendo estrangulado na parede da taverna por Fenor: totalmente sufocado e ainda por cima mal conseguia tocar os chãos com seus pés, ou muito menos falar.

— Fenor, solte ele. — Pediu Adrios calmamente.

— Adrios? Foi você? Você está ajudando essa criatura asquerosa? — Perguntou Fenor enquanto soltava o coboldo ao chão.

Lucius que por si caiu de uma forma brusca, com o pescoço machucado respondeu de maneira rápida:

— Não, ele não tem nada haver com isso - disse enquanto tossia constantemente ao meio da frase.

— Silêncio verme! - Gritou Fenor com o coboldo caído enquanto guardava sua adaga de volta à bainha.

— Olha, eu não te conheço, mas acredito que deve estar havendo um engano aqui - replicou Rirvog pra Fenor.

— Não há enganos, esse malfeitor acabou furtando documentos sigilosos da Guarda Escarlate. — Explicou o novo integrante da Guarda.

— E teria prova disso? — Perguntou o esqueleto.

— Não, mas irei levá-lo ao general. — Alegou Fenor.

— Fenor, por favor. Você não precisa fazer isso. — Pediu Adrios.

— Você desiste da Guarda por medo, e agora está ajudando criminosos? Você sempre foi um fraco Adrios, você me dá nojo. Que Talon tenha pena de você. - Arrazoou o mesmo.

De um momento de confusão para o espasmo, Adrios se lembrou, de todos momentos de humilhação, durante todo esse tempo que passou com Fenor e se perguntou a si mesmo: "Como isso é um amigo?". A raiva queimou como um fogo ardente no fundo do seu coração até os seus punhos que contorceram involuntariamente se apertando e fechando. Algo a mais estava dentro dele, e ele finalmente sentia a força de vontade mais pura da alma se energizando pelo seu corpo.

— O que foi? Eu fiz o bebê chorar? - ridicularizou Fenor na frente de todos que estavam olhando a situação.

E foi o suficiente, Adrios por si acabou perdendo seu controle no instante. Ele foi totalmente cegado pela frenesi da raiva e ódio que se segurava durante todos esses anos de convivência, seu instinto tomou conta do seu desejo de matar, a vontade máxima de parar aquela dor que ardia tão forte como uma facada em suas costas. Seu punho direito espontaneamente explodiu com uma chama luminosa de cor carmesim que brilhava e ascendia praticamente qualquer sombra em uma área de seis metros de diâmetro, enquanto o restante do seu corpo atendia a necessidade de tirar o total proveito do golpe, o seu escudo que estava sendo segurado pela mão esquerda vibrou de uma maneira perceptível a todos na área, seus pés rasparam pelo chão feito de terra de forma bruta, trazendo com si um rastro, junto com a transição do seu peso para o movimento do braço de maneira perfeita, como se ele já soubesse exatamente o que fazer.

Um soco, foi o necessário. E foi a única coisa que todas as outra pessoas notaram com tamanha velocidade imposta pelo garoto, enquanto atingia o lado esquerdo do maxilar de Fenor que infelizmente não teve nem sequer um momento para perceber ou muito menos reagir a tal golpe, acabou perdendo a consciência enquanto seu corpo e sua face era tomado por labaredas que cresciam de forma escaldante, e seu corpo que por si era disparado a parede do estabelecimento na frente da taverna em cheio, destruindo qualquer resquício de decoração e gerando tamanho buraco na construção.

— Eita porra. — Dizia Rirvog enquanto estava totalmente pasmo com o que acabou acontecendo, olhando a destruição do ambiente com pedaços de pedras e poeira por todos os cantos.

Do outro lado da rua, ouviram passos corridos, o coboldo que estava sentado e um dos únicos que não estava chocado com a situação se levantou e chamou a atenção de ambos:

— Vocês dois me sigam, guardas estão vindo! — Exclamou ele.

Adrios que finalmente havia voltado a si mesmo, não teve um segundo para se questionar o que tinha ocorrido por ali, e mais uma vez seu instinto falou mais rápido decidindo seguir o coboldo.

Lucius , Rirvog e Adrios aumentaram seus passos enquanto ouviam gritos pedindo pra que eles parassem. Seguiram a estrada até onde eles conseguiram e entraram em um dos becos entre duas casas para tentar despistá-los.

— Pelo amor de Melindua, algum de vocês tem alguma ideia boa para sairmos daqui?

— Sem ideia, e você Adrios? — Perguntou Rirvog.

— Deem um segundo ainda estou tentando entender tudo que aconteceu — disse Adrios enquanto tentava pegar fôlego.

— Adrios, você mora por aqui, faça algo antes que a gente vá preso seu arrombado! — Brigou Lucius de forma a implorar.

— Me sigam rápido. — Disse Adrios enquanto corria para atrás de uma das casas ao estreito do muro do vilarejo que separava a floresta das pessoas e era seguido por ambos.

Um buraco, um pouco pequeno. O coboldo por ser menor acabou passando de primeira, Adrios em segundo com bastante dificuldade e Rirvog que por sua estrutura acabou que tendo alguns pedaços da sua ossada caindo ao chão mas acabou pegando logo após.

— Estamos livres? — Perguntou o coboldo.

— Sim, vamos nos afastar por enquanto, por favor. — Pediu Rirvog.

— Só aumentem os passos, o pessoal da guarda não brinca em serviço — argumentou Adrios.

— E acha que não sei disso? Meu amigo, eu odeio esses caras. — Disse Lucius enquanto se levantava e passava as mãos em suas próprias roupas, limpando seu equipamento.

— E as suas coisas, mochilas e afins? — Perguntou Adrios.

— De noite a gente entra escondido e pega, relaxe. — Comentou Rirvog enquanto se levantava e colocava suas ossadas no lugar.

Eles se abaixaram para se esconder, começaram a caminhar por dentro da floresta que fazia interseção com o pequeno vilarejo ao norte.

Adrios finalmente voltou a sua consciência normal e conseguiu colocar os fatos em sequência perguntando para Lucius e Rirvog:

— Então, vocês querem me contar o que aconteceu lá atrás? — perguntou o mesmo.

— Como você acha que conseguimos o mapa das ruínas abissais? — Questionou Lucius.

— Se a gente tivesse simplesmente comprado da mão deles seria extremamente mais fácil — disse Rirvog.

— E eu vou comprar na mão desses ladrões de merda Rirvog? — Perguntou bruscamente Lucius a Rirvog.

Enquanto eles discutiam sobre como poderiam ter conseguido tal façanha, Adrios se lembrou do que tinha feito com Fenor. Seria aquilo magia como sua mãe havia lhe dito? Ele encarou pela primeira vez seu punho direito que havia feito aquele golpe, e percebeu. Um tipo de tatuagem da tonalidade mais escura havia se mostrado, no seu pulso, uma cabeça de dragão que seu corpo serpenteava e se alastrava em volta do seu braço.

— Está bem, Adrios? A gente não imaginava que você fosse tão proficiente com magias de aniquilação pra fazer aquilo.

— Nem eu, eu nem sei o que é magia de aniquilação. — Respondeu de forma sincera Adrios.

— Pera, pera, pera. O que? — Questionou exclamando Lucius — Como assim você não sabe?

— Eu não sei, nunca ouvi falar desse termo. — Respondeu Adrios.

— Você nunca leu um livro sequer da Sociedade Arcana? — Inquiriu Rirvog com um fundo questionamento.

— Não. — Respondeu de forma sincera.

— Ok garoto, você pode ter até nascido com a proficiência de Fogo, mas ninguém nunca conseguiria ter feito aquilo de primeira, nem eu consigo com eletricidade algo parecido e olha que tenho anos aprendendo. — Indagou Lucius a Adrios.

— Não estou mentindo e olha, eu fui perceber por agora mas essa marca — diz Adrios enquanto se interrompe de andar para mostrar a mesma ao grupo — apareceu do nada no meu braço após aquele golpe.

— Que porra é essa Rirvog? — Questionou assustado Lucius ao esqueleto.

— E eu sei lá porra, tenho cara de adivinho? — Retrucou Rirvog.

— Bem, não tô sentindo nenhum tipo de dor, devo me preocupar? — Perguntou Adrios.

— Claro que deve cacete, isso não é normal não — diz Lucius enquanto pega o braço do garoto - a gente precisa achar um lugar para acampar o mais rápido possível.

— Venham, dá pra ver daqui uma caverna mais lá ao fundo — diz apontando o esqueleto — se tivermos sorte não terá nenhuma criatura.

O grupo acabou seguindo até o local, uma gruta em meio a floresta. Suas paredes estavam cobertas por musgo, e seu chão era dividido por uma parte de pedras e outra submersa por um pequeno riacho que se dava do lado de fora para dentro do local.

— Aqui está bom. — Diz Rirvog.

— Concordo. — Completa Lucius.

— E eu estou morto — comenta Adrios enquanto se jogava ao chão, com muito cuidado pela sua exaustão — nem sei como vocês aguentaram tanta correria e essa andada após.

— Simples garoto, anos de prática. Você se acostuma. — Diz o coboldo.

— Tá, será que vocês podem falar com meus pais quando forem pegar as coisas? — Indagava Adrios.

— Sua mãe é Arauta da Igreja da vila não é? — Pergunta Rirvog.

— Sim, como vocês sabem? — Questionou-se o humano.

— Meio óbvio, pra uma pessoa nunca ter saído de casa e muito menos aprendido nada sobre magia. — Exprime Lucius de forma a expressar desdém pelas prováveis ações da mulher.

— Ei ela me ensinou, tá? — Revela Adrios pro grupo.

— Sim, senhor "não sei o que é magia". — Enuncia com comicidade o coboldo.

— Não seja duro com o garoto, ele pelo menos se dá muito melhor na prática do que você, Lucius. — Afirma Rirvog enquanto cruzava seus braços.

— Ah a gente vai ver isso amanhã, garoto, amanhã vou te dar umas lições de magia. — Avisa Lucius.

— E isso é bom né? — Interrogou Adrios ao Lucius.

— Sim, claro que sim. — Afirmou o coboldo enquanto sorria e ria baixo.

Assim passaram o restante da tarde até escurecer, Rirvog que acabou pescando, Lucius que acabou montando o acampamento com Adrios.

— Pronto, Rirvog bora? — Perguntou Lucius ao esqueleto.

— Vamos, Adrios só fique deitado e tome cuidado. — Comenta Rirvog.

— Relaxem, eu só vou dormir mesmo. — Explicou Adrios enquanto se deitava ao lado da fogueira, na cama feita de folhagem.

Ambos Lucius e Rirvog acabaram saindo, mata adentro atrás de pegar de volta o que era deles, e Adrios decidiu deitar para descansar graças a seu dia exausto. Pegou sono de forma rápida recapitulando o que havia ocorrido.

E em uma pulsação sentida durante seu breve devaneio, uma luz branca que ofusca todo seu campo de visão, não sentiu nenhum tipo de incomodo, muito pelo contrário, ele não sentia nenhum dos seus músculos, entretanto sabia que estava acordado. Um sonho lúcido talvez? Já tinha ouvido falar sobre isso mas não tinha nenhum controle por aqui, muito menos conseguia acordar. Quando finalmente após parar de pensar, uma mensagem ecoou em sua mente:

— Possuirá dois anos para assolar, o mais puro mal que habita no coração. — Advertiu, aquilo que não possuía tonalidade, muito menos uma linguagem, nem forma.

Entretanto era totalmente entendível, Adrios tinha certeza que algo anormal assim não podia ter acontecido.

De segundo relance o branco em sua volta ganhou cores e formato, um cenário deserto. Até onde ele olhava não havia fim, muito menos vida. As únicas coisas que restavam era poeira no meio das enormes crateras do chão, e o céu coberto por nuvens pretas que se intensificaram com trovões e raios ao céu.

Quando uma enorme ventania abriu sozinho as mesmas nuvens. Um ser em meio aos céus, uma criatura bestial, gigantesca. Sua cabeça era como se fosse a de um dragão com seis chifres, suas escamas eram roxas por todo seu corpo em conjunto com seus seis membros e suas seis asas que batiam fazendo um estrondo aos céus junto com os trovões. Que por si notou a presença de Adrios? Sua face se virou a ele, mesmo a milhares de quilômetros de distância, seus olhos brilharam de uma cor púrpura enquanto sua mandíbula abria enunciando:

— Естне хиц финис темпорум? — Uma voz devastadora, que por si só precisou emanar uma frase e uma onda de energia caótica de brilho e cor violeta acabou que sendo projetado em um raio de diâmetro que só crescia a cada instante, destruindo e desintegrando tudo aquilo que tocava na mais pura e intensa lava e magma para após o plasma e o fim.

Com o fim de tudo a imagem se voltou ao branco, Adrios se sentiu o mais fraco dos seres perto de algo tão assustador e inexplicável, se perguntava a ele mesmo como algo tão poderoso poderia existir? Mas mesmo assim, mais uma vez quando ela parou de pensar, uma nova mensagem se opôs a ele:

— Aquele que se renuncia do caminho, saiba que não és um escolhido e sim um peão. - Advertiu, aquilo que não possuía tonalidade, muito menos uma linguagem, nem forma.

Adrios se questionou, por que isso estava acontecendo com ele? Ele não era digno, ele não tinha o mínimo de experiência. Ele só sabia que não era um escolhido, mas sim uma ferramenta, um peão em meio a tantos outros que seriam usados e sacrificados por um objetivo, a proteção de Domüm.

Em meio a esse instante uma nova visão foi dado a ele, o vazio que ali se encontrava havia se tornado uma sala por si, cheio de tomos e todos tipos de livros, ao lado mesas com vários potes de vidros com formatos estranhos e líquidos de diversas cores que borbulhavam. Uma figura em meio ao centro que surge do vazio, um homem velho de roupão azul, barba e cabelos grisalhos longos que segurava nas suas mãos um cachimbo. Adrios não o conhecia mas sentia muita intimidade com o mesmo, como se já tivesse o visto antes e também sentia que devia encontrá-lo imediatamente.

Por si tudo voltou ao vazio novamente. E ao instante que Adrios teve pra apreciar novamente o momento de paz, sentiu ele algo o puxando para baixo, ele não sabia o que era, mas só que devia se deixar levar por isso.

Ele se retomou ao presente e viu o ponto branco sendo retomado pela escuridão, quando finalmente abriu seus olhos, a luz do dia ofuscava na sua frente duas figuras, ambos o morto-vivo e o coboldo.

— Seu pai mandou te entregar isso. Adiante que temos coisas pra fazer meu jovem. — Comentou Rirvog enquanto entregava a carta às mãos de Adrios.

Adrios que de forma inconsciente por causa do sono abriu e terminou lendo em sua mente:

"Meu filho,

Palavras não descrevem minha preocupação com o mesmo, eu e sua mãe sabemos que nunca iria fazer tal feito por maldade.

Escolha sabiamente cada passo, não tenha preguiça, muito menos medo. Mas pense e sempre questione tudo e todos. Independente de ser seu pai, serei teu amigo sempre.

Não precisa se tornar rico, muito menos sábio, somente consiga o que você precisa para sobreviver, a menos que custe o bem dos outros.

Com isso me despeço até a próxima temporada.

Lucarino de Drachen."

— Vocês não vão acreditar no sonho que eu tive - disse Adrios enquanto estava se levantando com a pouca força que ainda restava pela manhã.

— Sem tempo irmão, no caminho você nos explica. Temos muitas coisas pra fazer até chegarmos em Sonnen. — Disserta Lucios para Adrios — Rirvog, me dá um pouco mais do café que a mãe dele nos entregou?

— Acabou, acabei tomando tudo — Discorre o morto-vivo.

Por fim, eles se arrumaram e partiram para continuar a jornada que mal havia começado, o caminho era longo e trabalhoso. Quatro dias de caminhada que com certeza seria inusitado e cheio de dificuldades.