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Chapter 19 - Capítulo 18 - Discussão

No lugar em que Lucy havia sentido cheiro de sangue, dentro do buraco estavam os quatro singulares encostados nas paredes do local. Apesar de não ser um buraco muito profundo, tinha tanto sangue que formava uma poça que demoraria muito para secar, e junto disso estava a razão pela qual os ghouls não conseguiam se aproximar: corpos de pessoas com espuma na boca, outras com os membros retorcidos e até virados ao contrário, e uma delas com buracos perfeitamente esféricos no corpo.

Lucy só estava incomodada com a forma grotesca com que aquelas pessoas foram mortas. David e Mary estavam apenas fechando seus narizes por causa do cheiro horrível de carne apodrecendo aos poucos. Já Ethan estava praticamente hiperventilando, não só pelo odor como também pelo nervosismo, pois agora tinha visto mais uma coisa que singulares eram capazes com seus poderes.

O menino se agarra na camiseta de Mary e tenta se acalmar, não querendo olhar para a cena. Mary não sabia o que fazer naquele momento, Ethan parecia uma criança assustada que pedia conforto para a mãe, porém a albina não era isso, então o que ela poderia fazer? Mary se considerava fraca demais para afastar o garoto, então acaba apenas deixando ele se acalmar.

- Que lugarzinho hein. – David começa a dizer, ainda fechando o nariz com a mão.

- Ah, desculpa que não é uma banheira de hidromassagem, meu bem, mas que tal você olhar para a verdadeira culpada dessa situação? Bem aí na sua frente. – Lucy aponta para a assassina de heróis, que olha confusa, apesar de manter o olhar sem expressão. Lucy ia se aproximando enquanto falava. – Não se faz de desentendida não, por sua brilhante ideia de trazer uma ghoul pro nosso esconderijo, agora nós temos que dormir numa fossa de cadáveres!

- Eu precisava de informações. – Mary retruca, ficando de pé e se mantendo firme, Ethan se encolhe, ficando sentado, observando.

- Ah sim, descobrimos que ela foi uma conhecida do Ethan, que a transformação ghoul é irreversível, e que esse tal "Carniçal" é o responsável por isso e pretende transformar nossa vila em canibais. – Lucy diz com um tom sarcástico na voz. - Oh, olha só, a informação só foi boa pro Ethan, e o restante a gente já tinha entendido! – A ruiva estava brava ao ponto de sair vapor por seu corpo, já que seu sangue estava fervendo.

- Sobre os Heróis. – Mary acrescenta. Lucy a olha indignada e dá espaço para a albina ver os corpos naquele buraco.

- Mary, dá uma olhada, a gente descobriu mais sobre os Heróis caindo numa vala do que perguntando praquela ghoul. – Lucy aponta para a direção de onde vieram, em seguida ela se aproxima dos corpos, pega um deles sem dó e mostra o rosto com expressão vazia. – Tão vendo? Sem caninos enormes, ou seja, são humanos. Tem mais de um com os membros retorcidos, e tem esse com buracos esféricos, então parabéns. – Ela então joga o cadáver no chão de novo. – Descobrimos que os Heróis estão atrás dos ghouls!

- Mas parou para se perguntar por que não atacaram então? – Mary pergunta, calma e sem perder a razão.

- Eu sei lá! Talvez estejam ocupados demais olhando pra gente e rindo da nossa incompetência, não é?! – Lucy olha pro céu e grita, esperando que a resposta caísse dele.

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Longe dali, Victor e Rebecca observavam, sentados no terraço de um estabelecimento. Apesar de obviamente saberem o posicionamento do grupo por causa de Lucy, não conseguiam ignorar o cheiro de cadáver. Naquele momento, seus olfatos aguçados eram mais um problema do que ajuda.

- Eles ainda têm força para gritar? – Victor questionava.

- Humanos... São deliciosos, mas estranhos. – Rebecca diz, encostando a cabeça no ombro do canibal ao seu lado e só esperando se alguma hora os quatro iriam sair daquele buraco.

- Rebecca... – O rapaz começa.

- Hm?

- Eu só quero que você saiba... Mesmo que eu tenha que ficar contra toda a família, eu vou ficar do seu lado. – Victor diz, segurando a mão dela.

- Victor... – Rebecca suspira e aperta um pouco as mãos que se entrelaçam. – Me desculpa fazer você passar por tanto só por minha causa... Eu vou me desculpar com eles, eu prometo.

- Tá tudo bem, eu que escolhi fazer isso... – Victor responde, beijando a mão da ghoul e voltando a olhar para frente. Rebecca olha isso e lacrimeja um pouco enquanto percebia seus erros.

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David se aproxima de Lucy gentilmente.

- Lucy, se acalma. – Ele tenta encostar no ombro da ruiva, que se vira para ele, furiosa.

- Eu tô completamente calma! – Lucy retruca, com vapor saindo de seu corpo de tão nervosa que estava. O rapaz fica um pouco assustado e logo começa a lentamente colocar sua mão congelada na direção do pescoço dela.

- É... Eu consigo ver. Lucy, nesse caso, por incrível que pareça, eu vou ter que dar um desconto para a Mary. Minha névoa não dura para sempre, não daria para eu dormir muito por exemplo. – Ele encosta a mão, a pele de Lucy estava fervendo.

- Você tá de que lado afinal, David? – A ruiva questiona, indignada por seu namorado não a estar apoiando naquilo, e também aponta o dedo praticamente na cara de Mary. Lucy sente uma dor em sua mão e ouve um som de algo quebrando, e, quando olha para ela, seu indicador estava quebrado.

- Para de apontar pra mim. – Mary responde. A singular de sangue olha confusa e um pouco indignada para seu dedo, porém já estava se acalmando, graças a David.

- Urgh! Que seja. – Ela resmunga enquanto colocava seu dedo de volta no lugar e ele se regenerava. Após isso, ela vai para o canto novamente. – Eu vou dormir, e vocês deviam fazer a mesma coisa se não quiserem virar janta.

David apenas olha, pensando em como deveria consolar sua namorada. Mary não demonstra reação e somente se vira, perguntando para Ethan.

- Algum sinal de ghoul próximo?

- N-não... – Ele responde, já havia parado de lacrimejar, mas ainda estava se abraçando encolhido.

Mary e David se olham, olham para Lucy e Ethan e a albina diz:

- Ela é por sua conta. – A albina responde, indo na direção de Ethan.

- Você é muito cara de pau. – David diz, acenando negativamente e indo na direção de Lucy.

- E você continua reclamão. – Mary responde e se senta ao lado de Ethan, que novamente começa a sentir muito cansaço e lentamente vai fechando mais e mais os olhos. Neste caso, até mesmo Mary estava começando a sentir dificuldade de manter os olhos sempre abertos. Ela se encosta na parede do buraco, e logo Ethan encosta em seu ombro, pois não estava aguentando equilibrar a própria cabeça.

David se aproxima e tenta conversar com Lucy, porém ela se abraça e vira o rosto.

- Dorme, David, senão depois você reclama de insônia. – Lucy traz um assunto particular à tona. – E não me venha dizer que não estou dando apoio suficiente para você, bebezinho traumatizado.

- Achei que tivéssemos superado isso, Lucy, vai trazer assunto particular à tona? – Ele diz com um olhar indignado.

- Vou. – Lucy responde, impaciente, e voltando a virar o rosto.

- Beleza, quando voltarmos, vamos ter uma bela discussão, Maria Sangrenta. – David responde e vira o rosto para o lado contrário.

- Ótimo! – A ruiva encerra aquele bate-boca. Mary apenas observava tudo sem dizer nada, tentando manter Ethan acordado, pois não sabia o que podia vir.

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Pouco tempo se passou, e, por mais que estivessem com sono, David e Lucy não conseguiam dormir, não aguentavam ficar brigados e eles jamais dormiriam nesse dia. Eles aos poucos vão se olhando e notando o olhar de arrependimento em cada um, até que os dois eventualmente se viram e ficam de frente um para o outro. Apesar do chão duro e o cheiro de sangue apodrecendo a carne dos cadáveres, David e Lucy acabam ficando pertos um do outro novamente.

- Desculpa... – Lucy quem começa. Não conseguia nem mesmo olhar nos olhos de seu amado por vergonha.

- Eu que me desculpo... Eu não sei onde tava com a cabeça em te chamar daquilo... – David tenta calmamente aproximar sua mão da de Lucy, que acaba aceitando o gesto. – Sua mão sempre me aquece, sabia?

- E a sua sempre me acalma... – Lucy dava um sorriso sutil enquanto escondia sua vergonha.

Mary observa tudo isso como se fosse uma distração para não dormir. Com isso ela também aproveita para teorizar a respeito do casal. Parecia que o relacionamento deles continha, além do básico, que era respeito e compreensão, talvez uma espécie de troca. David: um singular de gelo, o único capaz de acalmar Lucy, uma singular de sangue, a única capaz de fazer o coração de David bater mais forte.

Ela mesma acaba tendo uma vaga lembrança de uma pessoa por quem ela costumava sentir isso, sentir-se nervosa por algo bobo, sentir um calor no peito quando abraçada. Mary se perguntava onde atualmente estaria essa pessoa e também diz para si mesma que não poderia demonstrar esse tipo de afeto frequentemente, senão Ethan acabaria ficando mais e mais acomodado, portanto, de guarda baixa.

- Lembra quando você ainda tinha problemas em controlar sua raiva? Você quase sempre desmaiava quando eu te esfriava... – David diz, um misto de brincadeira com felicidade.

- Para... – Lucy fica mais envergonhada e cobre seu rosto com a mão. – Bom... Eu lembro quando você era uma pedra de gelo com qualquer um... Menos comigo. Eu... Não me importaria de continuar assim, m-mas não é bom para a vila.

- É... Eu acho que, se não fosse por você, eu provavelmente ainda seria frio daquele jeito. – David diz, arrumando os cabelos de Lucy, mesmo que eles estivessem um pouco ruins de passar os dedos por causa do sangue.

- Mas você tem que parar de ser esquentadinho também. – Lucy adiciona esse ponto, sorrindo sarcasticamente.

- Ei, foi você quem decidiu me aquecer. – David sorri e encosta sua testa na de Lucy.

Após isso, os dois acabam se lembrando de um detalhe e levantam o corpo um pouco, notando que Mary estava ali do outro lado do buraco, só olhando, sem falar nada. Com relação a Ethan, não sabiam se ele estava ou não dormindo já.

- Quê? – Mary pergunta, como se quisesse falar para fingir que ela não estava ali.

Lucy olha para David e sorri e, então, ela levanta e vai até o lado de Mary, sentando no chão, e David acompanha, ficando ao lado de sua amada.

- Mary. – Lucy a chama calmamente.

- Hm...? – A albina olha de canto de olho para a ruiva, provavelmente por cansaço.

- Foi mal, às vezes eu acabo surtando... Ainda estou aprendendo a controlar melhor esse problema com meu poder. – Lucy abraça suas pernas enquanto fala, David encosta a cabeça na parede atrás de si e aproveita para tentar dormir, já que imaginava que as duas começariam a conversar.

- Esquece isso... Eu tô concentrada em verificar se os ghouls vão se aproximar. – Mary diz, seu olhar cansado dizia muita coisa para Lucy. A ruiva olha para Ethan, ao lado dela, lutando para se manter acordado. Mesmo que Mary já tivesse permitido ele dormir, o menino não queria.

- Mary, me diz... Foi muito difícil cuidar dele, ensinar ele a lutar? – Lucy pergunta. Talvez pelo sono, Mary não conseguia ter a frieza necessária para ignorar a pergunta, então ela chacoalha um pouco a cabeça e começa a falar depois de hesitar um pouco.

- Não vou negar... Principalmente no começo. Ainda é... – Mary diz, olhando para frente ainda.

- Então por que não descansa? – A ruiva pergunta.

- Não quero, e não posso...

- Não... Você quer, mas tá fingindo que não quer. Mary... Se é para proteger o Ethan, por que não o deixou na casa? – Lucy pergunta e a albina demora um pouco para responder.

- Eu não sou a mãe dele para determinar se ele vai ou não fazer algo... No final é ele quem decidiu vir, então... Eu não posso dormir. Eu o estive treinando, mas ainda não está totalmente pronto para esse mundo. – Mary responde, sem perder a calma ou a compostura.

- Nem você tava pronta, Mary. Mas então... Já que não quer dormir, você já pensou em algum plano contra os ghouls? – Lucy pergunta. A albina coça um pouco os olhos antes de continuar.

- Não consigo planejar direito..., mas eu penso que, se nos separássemos em duas duplas, dispersaríamos as forças deles... E talvez assim conseguiremos eliminar boa parte da força de ataque dos ghouls. – Mary diz.

- Separar? Não é arriscado isso? – Lucy pergunta.

- Eu consigo lidar com vários, disso eu tenho certeza. Eu só estava correndo até agora porque queria garantir a segurança de Ethan... Fora que provavelmente, se enfrentássemos eles todos de frente, logo perceberiam a situação e chamariam esse tal de "Carniçal". E sabe-se lá o que esse daí pode fazer, o mais arriscado seria enfrentar eles realmente de frente... – Mary responde, suspirando e tentando ficar acordada.

- Bom, pensado dessa maneira... Faz sentido. Mas Mary... Hora ou outra vamos ter que descobrir quem é esse tal "Carniçal" e dar um jeito nele. – David diz, ainda encostado na parede.

- Eu sei, não estou nervosa sobre isso, e sim pelos tais Heróis que podem estar por trás disso. – Mary responde, olhando para os corpos naquele buraco.

- Esquece isso por enquanto... Se quisessem atacar já teriam atacado, precisamos descansar, também aproveitando que parece que os ghouls se aquietaram. – Lucy diz, tentando olhar as ruas.

- Não preciso, estou acostumada a dormir pouco. – A albina diz.

- Pouco quanto? – Pergunta a ruiva.

- Uma hora... – Mary responde e deixa Lucy cansada só de ouvir.

- Meu deus... Mary, dorme, senão você não vai conseguir proteger nem o Ethan cansada desse jeito.

- Besteira, eu devo ser exemplo para ele do que deve ser feito... – A assassina diz, cruzando os braços.

- Besteira é você achar que isso é bom, ele tá praticamente dormindo já... – Lucy mostra Ethan.

Com isso, as duas notavam um brilho estranho no horizonte. Era nada mais do que o Sol.

- Ah, fala sério... Tá amanhecendo e passamos a noite em claro. – Diz o singular gélido, colocando a mão em seu rosto.

- Hm... O quê? – Ethan dizia com os pensamentos mais lentos que o restante.

- Isso não é problema, David... – Mary retruca.

- Pra você talvez, mas eu nunca passei uma noite acordado. E se eu acabar dormindo e algo acontecer? E o pior é que algo SEMPRE acontece. – David diz, forçando os olhos a ficarem arregalados para ver se não dormia.

- Se eles tentarem algo... Não é só nos movermos? – Ethan pergunta, com a voz bem fraquinha. Mary, notando isso, tira da mochila uma garrafa de água e faz o menino beber um pouco, gentilmente.

- Não podemos nos mover para sempre, Ethan. Temos que descansar alguma hora... – Lucy responde.

- Não, este é o melhor momento para atacar. – Mary diz, coçando os olhos novamente.

- Perdão? – David questiona, como se quisesse acreditar que aquela frase era brincadeira.

- Eles são preferencialmente noturnos... Durante o dia eles devem descansar, então esse deve ser o nosso melhor horário. – Mary acrescenta, deixando Lucy e David se perguntando o que deveriam fazer.

- Talvez... Esteja certa... – Lucy confirma.

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Não haviam se passado nem cinco minutos. Ethan estava dormindo com a cabeça encostada no colo de Mary, que por sua vez estava encostada na parede, também em sono profundo. Por fim, David e Lucy estavam um apoiado no outro, sem sinais de estarem acordados.