Como esperado, não consegui dormir à noite. Sempre lembrava de seu rosto lindo como um deus, com aquele olhar doce como avelã. Tudo nele me encantava. Enquanto eu passava a noite inteira pensando o quão meu pai é lindo, não percebi que o dia havia amanhecido, logo menos Verônica veio me despertar, embora eu estava acordada passando a noite em claro. Quando ela entrou em meu quarto logo fingi que estava dormindo. Apenas ouvia o som das cortinas serem abertas, enquanto ela me acordava.
"Princesa." ela chamava pelo o meu nome.
Não acordei direto, apenas fingia que estava com sono, pois todos os dias mesmo eu acordando tarde era sempre difícil de se levantar. Ela acharia estranho eu acordar fácil.
"Princesa está na hora de acordar."
Apenas gemia e dizia para dormir mais um pouco. Continuei fingindo que estava com sono, até ela começar a fazer cosquinhas em mim. Ela sempre me acordava dessa forma. De início achava isso irritante, mas com o tempo, comecei a me acostumar. Além disso, é um ótimo método para fazer alguém acordar.
Me levantei, já que estava cansada de ficar a noite inteira deitada. Mas algumas empregadas vieram ajudá-la a me vestir. Ela olhava o guarda-roupas escolhendo um vestido que iria usar hoje. Enquanto Natália penteava meu cabelo fazendo uma longa trança, infelizmente era uma tortura já que ela sempre puxava-o meu lindos cabelos, que quando acordo está todo embaraçado. Eu estava distraidamente pensando no belo moço que é meu pai é, e como ele é o deus da beleza, quando uma das empregadas deu um grito tão estridente que parecia que alguém estava matando-a. Eu, Verônica e Natália fomos correndo ver o que havia acontecido, quando me deparei com a Doroteia no cabelo da empregada. Dorotéia é uma das minhas melhores amigas, e fiel companheira, ela sempre gostava de fugir de seu habitat. Ela é uma tarântula muito extrovertida que gosta sempre de fazer amigos, embora algumas vezes ela é meio melancólica, pois sempre tenta fazer novas amizades, nem sempre dá muito certo.
"Tira essa aranha de mim!" Gritava como se visse a pior coisa do mundo.
Eu peguei Doroteia para ela não se machucar, pois essa louca é capaz de matar minha bebezinha. Acariciei seus pequenos e lindos pelos, enquanto eu tentava acalmá-la. "Calma ninguém irá te machucar." Sussurrei docemente para Dorotéia.
"Princesa!" Verônica me chamou severamente. "Esses insetos não podem ficar mais aqui."
"Ela poderia me picar." Choramingou a empregada que a Doroteia estava em sua cabeça.
Rapidamente refutei:
"Tarântulas não são venenosas!" Gritei para todas ouvirem bem. "Aqui não tem nenhum inseto que faz mal! Então não tem nenhum problema em ficar aqui. Isso é descriminação sabia!"
"Mas Princesa," insistiu Verônica "aqui não é o lugar ao qual eles pertencem. Eles estarão mais felizes soltos na natureza, o lugar de onde eles nunca deveriam ter saído."
Nesse momento melancolicamente olhei para minha coleção de inseto e depois meus olhos voltaram para Dorotéia. Eu realmente amo minha coleção, mas também quero ver eles felizes. Antes gostava de fazer batalhas com eles, mas vi que era cruel demais. Então não faço essas coisas ruins com eles, no entanto se eles viverem aqui eles poderiam viver mais tempo, do que lá fora, o qual tem vários predadores cruéis. Nesse momento eu não sabia o que eu poderia fazer, não queria abrir mão deles, então comecei a chorar. Eu ainda sou egoísta demais para deixá-los ir, mas assim eles não iriam gostar mais de mim. Verônica me abraçava enquanto me consolava.
"Eu acho um exagero Verônica." Natália fulminou em meu favor. "Olha a carinha da Princesa."
Natália e Verônica são duas faces da mesma moeda. Verônica é sempre mais firme comigo do que a Natália, que é mais liberal. Natália sempre me deixa fazer tudo o que eu quero e sempre fica ao meu lado, enquanto Verônica sempre briga comigo e é mandona. Eu diria que Verônica é meu superego, enquanto Natália é meu ego e eu me encaixo como o ID. Juntos formamos o trio freudiano... Espera! Quem é Freud?
Meio que eu já estava conformada que o melhor para os meus insetos era sua liberdade. Entre uma vida longa e próspera e uma vida efêmera, mas com liberdade a escolha é sempre a liberdade. Então eu acho que meus bebezinhos estarão mais felizes com sua liberdade. Eu parei de chorar e enxuguei meu rosto decidida a libertar meus adoráveis nenéns.
"A Verônica tem razão" disse melancolicamente. "Meus insetos serão mais felizes lá fora."
Eu coloquei Dorotéia em seu potinho, enquanto me arrumava para sair. Minhas empregadas ajudaram a levar meus lindos amiguinhos para o jardim. Eu pedi para nos deixarem a sós para termos um momento de despedida. Comecei a libertar a Matilde, Lindo Valdo, Francineide, Marislaine, Erivelton, Edmílson, Josenildo, Cleverson, Claudeniza, Benedita, Domitila... Quando ia pegando um por um e me despedindo, lembrava-me outrora como se fossem tempos distantes e nostálgicos com os meus únicos amigos.
Nunca me dei bem com os outros anjos, pois eles sempre queriam brincar com a nojenta da Sabrina. Sempre seguia ela para onde ela for e sempre puxava o saco dela, além de ser umas chatas. Porém meus adoráveis insetos eram meus companheiros e sempre estava lá para o que eu precisar. Eles eram um ombro amigo e sempre escutava minhas reclamações, sem mesmo me julgar. Eu sou muito grata a eles, e eles merecem sua felicidade. Mas quando chegou a vez da Doroteia, lágrimas escorreram de meus olhos.
Doroteia eu sempre tive um pouco mais de afeição por ela, não sei exatamente o por quê, eu acho que ela sempre me acompanhava nos lugares e sempre estava em meu ombro, além dela comer os mosquitos que me picaram. Ela era alguém solitária como eu, sempre queria fazer amigos, no entanto por conta de sua aparência ninguém queria ser amigo dela. Eu fui a primeira e a única amiga de Dorotéia, espero que ela encontre outras aranhas de sua mesma espécie, assim ela não ficará mais sozinha, quem sabe ela pode até encontrar um belo marido.
"Oh Doroteia" chamei pelo seu adorável nome. "Você sempre estará em meu coração."
Eu pensei que estaria tudo bem em ela partir, porém não consegui segurar minhas lágrimas e comecei a chorar. Ela nesse momento estava em minhas mãos, poderia deixá-la morando comigo, já que não haveria nenhum problema em ela ficar. Assim eu não ficaria mais sozinha. Não! Não posso ser egoísta, um anjo sempre deve ser altruísta, assim nunca poderei ser um anjo melhor. Rapidamente coloquei Doroteia perto de uma margarida, antes de desistir da ideia de deixá-la. Mas era doloroso demais para suportá-lo, então eu saí correndo em direção ao bosque.
Sempre que me sentia triste gostava de chorar no coreto, lá era um lugar agradável e silencioso, sempre havia um sentimento de ternura e conforto, como um lugar misterioso quase mágico como se fosse meu próprio paraíso. Estava chorando muito para não perceber que o tempo estava mais lento ou eu estava correndo muito rápido para chegar em um instante. Cheguei no coreto e estava prestes a sentar no banco, quando eu me deparei com um belo moço. Sempre brincava aqui, mas nunca havia visto esse belo rapaz, talvez ele não vinha aqui direto ou... Lembrei-me que meu pai havia dito para brincar na parte da manhã, talvez ele queria que eu conhecesse esse moço, mas por que? Não sei quais são seus motivos, mas uma coisa é certa, eu não gosto desse homem.
Ele de fato era um homem bonito, com longos cabelos negros espalhados em seus rosto, quase escondendo totalmente seus olhos vermelhos que dava a impressão de ser uma fera horrível. Seus olhos eram da cor dos meus, mas meus olhos eram delicados como uma joia enquanto os deles pareciam de monstros horrorosos. E aqueles olhos me olhavam friamente como se eu fosse um inseto — embora fico feliz que meus bebezinhos não tenham conhecido ele —, apesar de que, se eu não gostasse de insetos, até poderia estar ofendida. Porém de certa forma não me assustei com aquele moço, ao invés de medo eu tinha aversão a ele. Poderia estar errada, ele pode ser um bom rapaz que devido sua aparência poderá causar um mau entendido, por isso irei ser uma fofa com ele.
Sentei-me ao lado dele, esperando perguntar do porque eu estava chorando, no entanto ele não olhava para mim, como se eu não estivesse ali. Claro que eu não gostei dessa, mas precisava aturar ele. Comecei a supor que ele é apenas tímido e teria vergonha de começar uma conversa, então eu lhe ajudei.
"Oi!" Fiz uma carinha fofa, mas ele virou sua cabeça como se estivesse me evitando. Quem ele pensa que é! Me evitando dessa maneira. Pensei comigo mesmo, então guerra ele quer, guerra ele terá. Mudei-me de assento, sentando na direção a qual estava olhando, cruzando com a vista dele. "Você está triste?" Percebi que seus globos oculares mexeram de maneira abrupta para mim. Continuava a olhar de maneira indolente, e esse olhar me deixou com muito, mais muita raiva. Respirei fundo para não me descontrolar, até que ele finalmente abriu sua boca.
"O que você quer?"
Credo! Não precisa ser tão grosso. Seu grosso!
Calma, calma, sou uma linda princesa encantadora, qualquer um pode cair com os meus encantos. Preciso ter um pouco mais de paciência com esse daí. Assim poderei descobrir o por quê meu pai iria querer que eu me encontrasse com ele.
"Quero ser sua amiga." Olhei com pura ternura, claro que essa ternura era falsa, apenas uma arma que eu tenho.
"Aff..."
Só isso que você tem a me dizer? Nada mais?
"..."
Ora seu @$%*!
Voltamos a programação normal.
Ele não olhava para mim, mas sim para o nada. As coisas que cruzavam seus olhos eram apenas um monte de velhas árvores nada interessante de se olhar. Se fosse uma bela paisagem que tirasse suspiro de quem a via, então eu poderia entender. Mas tudo o que tinha neste local era completamente normal.
Talvez, não seja a paisagem que lhe faz ficar aqui, mas sim seu ambiente estranhamente sereno que nos rodeia. Desde que encontrei esse lugar, uma onda de bem estar e nostalgia surgiu diante de meu peito. Era agradável estar aqui, como se eu estivesse em um bosque encantado, o qual uma energia boa nos envolvesse. Desde então, sempre passava o tempo aqui.
Esse moço deveria sentir a mesma coisa que a mim.
Me peguei cativada com o seu olhar pairante. Ele estava perdido em seus pensamentos, mas nada existia em sua volta além dos seus próprios devaneios. Parecia que nada mais no mundo importasse para ele, apenas esse pequeno momento de pairação.
Mas ele tinha um olhar triste, um olhar solitário. Ele não tinha mais nada além de seus próprios pensamentos. Talvez não sejam devaneios que estão vagando em sua cabeça, mas reminiscências de uma época que nunca irá voltar. Uma época a qual ele era feliz.
De alguma forma quero consolá-lo, mas como? Não sou muito boa nesse negócio de consolação, nunca consolei ninguém. Vai que eu piore?
Bem, se eu não sei consolar, então vamos descontrair o ambiente! Vai que dá certo, mas se não dar...
"Moço, olhe minha aranha!" disse enquanto o surpreendia mostrando Doroteia.
Eu acho que mostrei perto demais, pois ele deu um afastamento com a cabeça. E por conta que foi muito abrupto, ele acabou ficando surpreendido por um instante.
Com medo que ele fosse grosso comigo de novo, não deixe brechas. Baixou a Anne Shirley em mim.
"O nome dela é Dorotéia e ela é minha melhor amiga. Muitos têm medo dela pois sua aparência é meio desagradavel para as pessoas — uma coisa que eu não concordo — olha só, ela é toda peludinha que nem um cachorrinho ou um gatinho. Não vejo quase nenhuma diferença entre esses três animais. Apenas Dorotéia tem 8 olhos e pernas, mas de resto ela é uma gracinha. Muitos pensam que ela é venenosa, mas está errado! Tarântulas não são venenosas, apenas algumas espécies, mas até agora ela não me picou, então tá tudo bem. Ah! Sabia que a Viúva negra devora seus maridos? Mas isso todo mundo já sabe, seu nome entrega tudo. Mas sabe também que os Louva-a-deus fêmeas também devoram seus maridos? Louva-a-deus são muitos legais: eles sabem lutar e comem lagartos e sapos. Não dá para acreditar! Aquele inseto bonitinho pode ser tão mortífero! Falando em insetos mortíferos. Existe uma Falsa viúva-negra, mas por que falsa? Pois elas não tem veneno igual a verdadeira Viúva Negra. — Mas você deve estar se perguntando "então como podemos diferenciá-las?" e eu lhe respondo caro perguntador! Elas tem uma cores diferentes, assim fica mais fácil de diferenciá-las. Entendeu?"
Acho que acabei me empolgando um pouquinho.
Gosto de conversar sobre vários tipos de assuntos, mas o que eu mais gosto é falar sobre insetos. Acho tão fascinante, mas pena que quase não tenho ninguém para falar sobre.
Minhas cuidadores têm pavor de insetos e sempre quando eu mostro um novo inseto, elas apenas dizem: "Que nojo!" E quando não estou de olho, elas tendem a matá-los. Por conta disso eu tenho que ficar de olho em meus insetinhos
Mesmo sabendo que esse moço não tem o mínimo de interesse neste assunto e ser uma conversa unilateral, eu não me importo. Mesmo não prestando atenção no que eu digo, não serão motivos para eu não falar sobre este assunto.
Quando terminei o meu monólogo, deixei uma pergunta inconsciente. Sabia que ele não iria me responder apropriadamente, mesmo assim queria ver sua reação.
"Não lhe ensinaram boas maneiras?" disse com uma voz áspera. "Crianças tagarelas, são sem educação."
Apesar de eu esperar uma resposta como esta, mesmo assim eu fiquei irritada.
Ele vem falar de educação, mesmo ele aparentando não ter. Ele é um adulto e eu sou uma criança — que nem cheguei na idade de começar os meus estudos —, qual dos dois está mais errado? Claro que é ele! Já é um marmanjo com vinte e poucos anos carregado nas costas. Ele deveria saber que é errado e muito insensível falar assim para uma criança de 4 anos. Ainda mais ele não sabendo com qual criança está falando. Eu! Filha do Imperador deste vasto império!
Sorte que eu estou indulgente, se fosse qualquer princesa, não saberia se esse moço teria um futuro.
Enfim, vou lhe mostrar como alguém com educação deveria agir.
"Moço, se for desagradavel com todo mundo, assim ficará sozinho."
Por um momento, percebi que ele havia ficado surpreso por minhas palavras sábias, mas não por muito tempo. Ele se levantou para ir embora, sem mesmo dar uma satisfação.
"Onde está indo?"
Minha pergunta pode parecer meio ríspida, mas essa era a intenção. Não serei mais uma princesinha boazinha com esse moço sem educação. Sou do tipo que trato a pessoa da maneira que me trata, então se quer ser respeitada por mim, por consequentemente tem que me respeitar.
Não passarei mais mão na cabeça do moço.
Por incrível que pareça, ele não me respondeu, mas continuou a dar as costas para mim.
"Não vai me responder?" disse enquanto seguia.
"Por que deveria dar alguma satisfação para uma pirralha?"
O que esse verme acabou de dizer? — Desculpa verme por te ofender assim, espero que perdoe essa criança. Esse safado realmente me chamou de pirralha? Ah, não deixarei dessa forma assim não. Sou a maior barraqueira do Céu. Como esse canalha ousa falar assim comigo, a princesa desse império. Olha quando eu for mais próxima do meu pai, mandarei essa canalha direto para prisão por desacato.
Olhei rudemente para essa imbecil e com total repúdio lhe respondi em sua altura.
"Por educação! Uma coisa que você aparentemente não tem!"
Olha, não permitirei que fala assim comig-"
"Quieto!" gritei profundamente. "Agora irá ouvir verdades!" continuei. "Eu não sei onde eu estava com a cabeça em querer ser amigo de um chato!" Não esperei uma resposta dele, apenas disse tudo o que eu queria. "Nunca em minha vida conheci uma pessoa tão cruel e insensível quanto tu! Além de ser um paspalho arrogante!" Continuei a gritar com todo o ar de meu pulmão. "Você deveria estar no livro dos recordes como o Maior Bocó do Mundo," e continuei a gritar "então quando as pessoas lerem, vão desejar dizer: Nossa como essa cara é um bocó. E outra pessoa irá falar assim: Coitado dessa garotinha ela não merecia ter conhecido um otário como ele." Nesse momento eu estava transbordando em fúria, sem mesmo pensar, disse. "Sim! Você é um otário é isso que você é!"
Nesse momento voltei-me a si. Quando terminei de falar tudo o que me vinha à cabeça, percebi o meu erro. Sabia que essa pessoa era perigosa, mas por um momento eu esqueci, e este foi o meu erro. Foi tão bom falar tudo o que quiser, se estivesse no Céu seria logo repreendida, e sempre me contive — na medida do possível —, mas agora que não havia ninguém para me deter, extrapolei além da conta, deveria ter parado em "paspalho arrogante", no entanto estava tão extasiada que perdi a noção do que estava falando. Quando percebi a cagada que eu fiz, sem pensar sai correndo. Queria muito ver a expressão que ele fez, mas estava tão desnorteada quando eu xingava que não olhei para ele, apenas fechei os olhos e saia todos os xingamentos que lhe contei. Mas agora estava tão apavorada dele correr atrás de mim e nem mesmo eu olhei para ele.
[...]
Atrás de uma árvore, o belo moço que parece um deus, põe-se a rir. Ele nunca havia pensado que aquela garotinha teria um gênio forte, como a mãe. Aqueles xingamentos eram realmente engraçados, tentava-se se controlar, para não chamar atenção para si. Ele achava muita graça na expressão que o moço dos longos cabelos negros.
Ainda estava desnorteado, nunca imaginaria alguém falar com ele dessa maneira, muito menos uma garotinha que depois da resposta dele, deveria chorar.
Crianças choram com palavras rudes, mas essa criança ao invés de chorar, xingou com tudo o que tinha. Sem medo das consequências que iria causar.
Ele nunca havia se deparado com uma situação dessas. Todas as pessoas que ele conviviam sempre que mediam suas palavras, temendo que qualquer erro poderia resultar em morte. Ele era alguém severo e rígido, todos sabiam que desagradá-lo seria punido severamente.
Com apenas um olhar, ele domava a aristocracia, ninguém tinha tido coragem de xingá-lo.
Por conta disso não sabia como reagir em uma situação dessas ,apenas ficou quieto tentando entender o que estava acontecendo. Não havia oportunidade de falar alguma coisa, pois aquela menina não o deixava. E quando finalmente ela terminou de falar, fugiu tão rápido quanto um relâmpago.
"Marvin!" chamou o moço dos longos cabelos negros.
O homem mais lindo que um anjo, se aproximou do amigo que ainda estava em um estado de atônito, mas quando sentiu a presença do rapaz bonito voltou-se a si. Ele ainda estava meio desnorteado, porém conseguiu dar um olhar indiferente, fazendo o rapaz lindo calar-se rapidamente.
"Sua Majestade, o que acabou de acontecer?" disse em um tom brincalhão tentando se conter para não rir.
Ele não respondeu rapidamente, mas depois de um breve silêncio seguiu-o.
"Então foi para isto que você me pediu para eu vir hoje?" Ele estava bastante bravo. "Para encontrar uma maldita pirralha sem educação?"
"Vossa Majestade, não fale dessa maneira" respondeu com um ar meio melancólico. Talvez esteja triste diante da atitude que um pai fala de sua própria filha. Era muito lamentável...
"Devo puni-la como faço com qualquer um que me desacate?"
"Vossa Majestade nem brincando irá fazer isso" disse preocupadamente, mas sem perder a compostura. "Não me importo de ser punido, mas aquela criancinha não sabia o que estava fazendo. Não é culpa dela."
"Então de quem é?"
Mesmo a culpa sendo de ninguém, o moço mau humorado busca um culpado para puni-lo. Se buscar um culpado seria ele mesmo. A pessoa que abandonou sua própria carne e sangue, só para ter um culpado pela morte de sua esposa.
"Creio que não tenha um culpado" cautelosamente disse, temendo que a situação piore, mas havia algo que ele não poderia deixar de dizer. "Majestade, se fosse um pouco mais atencioso, a criança não iria ficar brava com o senhor. No começo ela foi simpática, não é?"
Não houve resposta.
"Se Vossa Majestade não estava em um bom momento, poderia explicá-la que não queria conversar. Ela iria entender e deixá-lo em paz" disse o mais cauteloso possível.
"O que aquela criança estava fazendo aqui?" perguntou mudando totalmente de assunto.
"Brincando." disse enquanto afinava a voz para soar algo engraçado.
Claro que não era a resposta que o imperador queria ouvir, porém Marvin não poderia deixar a oportunidade passar. Marvin sempre gostava de descontrair quando o ambiente estava meio pesado. Algumas vezes dava certo, fazendo o imperador cair na gargalhada, mas outras não. Mas desde que a Antiga Imperatriz morreu, nunca mais conseguiu dar uma risada sincera.
Lançou um olhar ameaçador, que significava para não fazer esse tipo de 'gracinha'. Infelizmente não deu certo para Marvin.
Marvin pigarreou antes de responder:
"Vossa Majestade" endireitou sua postura e respondeu seriamente, diferente de poucos segundos atrás. "Não consegui me livrar da Princesa."
Marvin era inteligente o suficiente para interpretar a pergunta do imperador. Uma pessoa normal poderia entender que o imperador estava perguntando: por que essa criança está neste coreto? Mas para os ouvidos treinados de Marvin, entendeu corretamente o que o imperador queria dizer: Essa criança não deveria estar nos palácios. Era o verdadeiro significado
Quatro anos antes, o imperador não havia conseguido matá-la e por consideração a sua antiga esposa deixou-lá vivendo. Mas ele havia ordenado que se livrasse daquela criança, jogando-a no lixo ou dando para algum plebeu que quisesse cuidá-la. Marvin, que era conhecido como o braço direito do imperador e o homem mais bonito do universo, não teve coragem de livrá-la, então arrumou um palácio para aquela criança viver. Ele sabia que ninguém iria dizer sobre aquela criança e sabia que logo ele iria descobri-la, mesmo assim, fez o que fez.
"Como que ela pôde viver todo esse tempo no Palácio Noroeste sem eu ficar sabendo a respeito?" Ele estava extremamente bravo, porque Marvin desobedeceu às suas ordens.
"Vossa Majestade, lembra que ordenou que ninguém falasse a respeito sobre a Antiga-Imperatriz e a Princesa?" deu uma leve pausa e continuou. "Todos seguiram a ordem fielmente."
Não era surpresa que o imperador sentiu, mas sim, uma clareza óbvia que ficou irritado de si próprio. Não se sabe o motivo exato de sua irritação, mas poderia ser que ele deu uma ordem que não funcionou da maneira que ele queria, ou porque ele esqueceu dessa ordem e ficou irritado por causa que não se lembrou dela.
"Vamos! Tudo isso me deixou com dor de cabeça."
"Sim, Vossa Majestade" respondeu Marvin enquanto o seguia. No entanto, Marvin precisava perguntar algo para o imperador, se não, não conseguiria dormir a noite de preocupação. "Majestade, como ficará a situação da Princesa? "
O imperador permaneceu em silêncio por um instante. Marvin havia abaixado a cabeça, uma melancolia atingiu seu peito. "Não deveria ter me intrometido nisso" pensou Marvin cabisbaixo. "Por minha culpa, a Princesa…"
"As coisas ficarão como estão. Desde que ela não volte a aparecer diante de meus olhos."
Marvin não pôde deixar de sorrir aliviado, todavia não foi só um sorriso de alívio, mas sim, de felicidade. Pois agora ele sabe que as coisas irão mudar.