A rejeição de Aleph a consumia. A humilhação era ainda maior por não ter conseguido cumprir as ordens do rei Hayden de afastar o cavaleiro de Letícia. Rachel, movida por uma mistura de raiva e desejo de vingança, decidiu agir por conta própria. Na calada da noite, após certificar-se de que Hayden havia dispensado os guardas do corredor, dirigiu-se aos aposentos do rei.
— Aquele maldito cavaleiro me rejeitou! — esbravejou, sem preâmbulos. — Sir Aleph me desprezou!
— Se a abordagem direta não funcionou, use métodos mais sutis — aconselhou Hayden, com um sorriso frio. — Faça com que ele seja expulso do castelo! Destrua a amizade deles... "Se Laurenn considerar que esse cavaleiro é inadequado para Letícia, ele a impedirá que a acompanhe. E então eu poderei colocar um dos meus homens ao lado dela."
— Ele será expulso, custe o que custar — declarou Rachel, os olhos brilhando de fúria.
Rachel deixou os aposentos do rei antes do amanhecer, o plano de vingança tomando forma em sua mente. Hayden, porém, observou sua partida com um olhar calculista.
— Espero que não cometa nenhuma estupidez — murmurou, pensativo. — Caso contrário, terei que me livrar dela também.
No outro dia no período noturno, Rachel seguiu Aleph e observou que ele havia ido em direção ao dormitório dele. Enquanto isso, Laurenn estudava em seu quarto quando bateram à porta. Surpreso pelo horário, foi atender. Ao abrir, deparou-se com Rachel em prantos, com as roupas e os cabelos desalinhados. Ela correu para seus braços, abraçando-o com força, como se estivesse aterrorizada.
— O que aconteceu? Quem fez isso com você?
— Sir Aleph... Ele me atacou. Entrou no meu quarto e me forçou... a fazer coisas que não consigo dizer.
— Tem certeza de que foi ele? — perguntou Laurenn, preocupado.
— Absoluta. Não posso estar enganada... Você precisa expulsá-lo do castelo, depois do que ele fez — respondeu Rachel, o rosto banhado em lágrimas.
Laurenn a conduziu até o sofá, ofereceu-lhe um copo d'água e a cobriu com uma manta, sentando-se ao seu lado.
— Você consegue ficar sozinha por alguns minutos? Preciso resolver isso imediatamente.
Rachel o abraçou. Laurenn, porém, não viu o sorriso de satisfação que se formou nos lábios dela, confiante de que tudo ocorreria conforme o planejado.
— Espere aqui. Logo retornarei.
Assim que Laurenn saiu e fechou a porta, a postura de Rachel mudou completamente.
— Ele não terá álibi. A essa hora, já deve estar trancado em seus aposentos.
Laurenn questionou os cavaleiros sobre o paradeiro de Aleph. Alguns informaram que ele havia se recolhido aos seus aposentos, enquanto outros afirmavam tê-lo visto treinando com Hector. Decidido a esclarecer a situação, Laurenn dirigiu-se ao centro de treinamento, remoendo a estranheza da situação. Algo lhe parecia fora do lugar.
No centro de treinamento, Aleph ensinava técnicas de combate a Hector. Ao se aproximar, Laurenn demonstrava abatimento, levando Hector a supor que se tratasse de alguma reprimenda do Rei Hayden. Tentando animá-lo, Hector convidou-o para juntar-se a eles.
— Príncipe Laurenn, junte-se a nós! Nem vimos o tempo passar — convidou Hector, com entusiasmo.
— Há quanto tempo estão treinando? — perguntou Laurenn, preocupado.
— Mais de uma hora, acho... Sir Aleph está me mostrando umas técnicas interessantes — respondeu Hector, gesticulando com a espada.
Um alívio percorreu Laurenn. Aleph não era o culpado, o que evitava consequências desastrosas. No entanto, restava o problema do ataque a Rachel. Cogitou algumas hipóteses, mas se repreendeu por duvidar dela. Como poderia investigar o verdadeiro culpado, se é que existia um? Lembrou-se do aviso de Aleph, que havia descartado na época. Sua angústia era evidente.
— O que houve, Príncipe Laurenn? — perguntou Hector, percebendo seu estado.
Laurenn relatou o ocorrido.
— Não sei o que dizer — respondeu Hector, atordoado, levando as mãos à cabeça.
Hector, sem mais conseguir esconder a verdade, revelou a Laurenn o comportamento dúbio de Rachel, descrevendo seus encontros secretos com diversas pessoas. Explicou que sua hesitação em compartilhar a informação vinha da dificuldade em encontrar o momento e a maneira certa de abordar o assunto delicado. Aleph, buscando uma solução prática, sugeriu:
— Use as leis do reino a seu favor.
Ele então explicou a Laurenn que, segundo a legislação, falsas acusações de agressão e difamação eram crimes puníveis com severas consequências, incluindo prisão e banimento. A ideia era que, Rachel confessasse a mentira, evitando maiores danos e transtornos para todos os envolvidos.
Laurenn, dividido entre a incredulidade e a necessidade de agir, retornou ao quarto, incerto se deveria colocar o plano de Aleph em prática. Rachel o aguardava, aparentemente aflita. A tensão no ar era palpável.
— Você já expulsou Aleph do castelo? — perguntou ela.
— Por que o interesse em sua expulsão? O correto seria julgá-lo. Mas Aleph tem um álibi.
— Impossível! Eu o vi entrando em seu quarto.
Rachel percebeu o deslize. A contradição entre sua afirmação e a acusação anterior de ter sido atacada em seu quarto não passou despercebida por Laurenn. Ele decidiu usar a artimanha sugerida por Aleph, ainda que um pouco diferente do planejado.
— Segundo as leis do reino, você não pode mais ser minha noiva — declarou Laurenn.
— Como assim?
— A futura rainha não pode ter tido relacionamentos amorosos anteriores.
— Ninguém me falou sobre isso!
— Infelizmente, é a lei. Prefere desistir por vontade própria? Se a verdade vier à tona, será difícil para você conseguir outro casamento.
A fúria de Rachel se intensificou. Não apenas falhara em prejudicar Aleph, como agora era ela quem estava sendo descartada. Laurenn, lutando para conter o nervosismo, aguardava a resposta. Para sua surpresa, Rachel começou a rir.
— Ainda bem que me livrei de você! Já não aguentava mais suas falas melosas, príncipe idiota! — esbravejou, estapeando Laurenn e saindo.
Com a porta fechada, Laurenn tremia. Manter o teatro sugerido por Aleph havia sido um desafio. Levou a mão aos olhos, contendo as lágrimas.
— "Fui um idiota por não perceber e por não conseguir lidar com isso sozinho"— lamentou-se.
Abalado, Laurenn sentia o peso do relacionamento destruído por sua incapacidade de lidar com a situação. A manipulação de Rachel e a revelação de sua verdadeira natureza deixaram marcas profundas.
Rachel marchou furiosa até os aposentos do Rei Hayden, esmurrando a porta sem qualquer cerimônia. A atitude desrespeitosa inflamou o rei, que a puxou para dentro com violência.
— Que atrevimento é esse?! Sabe que horas são? E se alguém a visse? — sibilou Hayden, segurando-a com força.
— Quero desistir do casamento! Não consegui expulsar aquele homem, e Laurenn descobriu... certas coisas — respondeu Rachel, ofegante.
— Explique-se! — rosnou Hayden, a fúria crescente em seus olhos.
Num acesso de ira, Hayden agarrou Rachel pelo pescoço, apertando com força. Ela se debatia, buscando ar, implorando por misericórdia com um fio de voz.
— Incompetente! Não consegue se livrar de um simples cavaleiro e ainda se expõe ao ridículo?!
Ele a arremessou longe. Rachel caiu no chão, tossindo e arquejando.
— Desapareça da minha frente se preza pela sua vida! Não quero me dar ao trabalho de me livrar de um cadáver — vociferou Hayden, a voz carregada de desprezo.
Na manhã seguinte, durante a reunião do conselho, o Rei Hayden anunciou a desistência de Rachel do casamento real, informando que ela havia deixado uma carta e retornado para sua família.
— Majestade, essa é uma oportunidade para fortalecermos laços políticos com um casamento com a nobreza de outro reino — sugeriu o conselheiro de relações exteriores.
— Discordo. Devemos priorizar a política interna. Enfrentamos uma crise econômica e precisamos incentivar a produção nacional — argumentou o conselheiro de finanças.
Os conselheiros aguardavam a decisão de Hayden. Este, buscando evitar o fortalecimento político de Laurenn, declarou:
— Concordo com o foco na política interna. Avaliarei as candidatas que me forem sugeridas.
A notícia animou os conselheiros, que viram a chance de apresentar suas filhas como potenciais noivas para o príncipe.