A luz suave das lâmpadas de néon iluminava o ambiente, refletindo no piso lustrado e nos painéis de vidro que pareciam mais uma parede do que janelas. Eu e Gregory acabávamos de entrar na Pizzaplex. O lugar era imenso, e a primeira impressão era de que poderia ser um labirinto. Crianças corriam para todos os lados, cheias de energia, mas havia algo no ar que me fazia questionar a real natureza desse espaço. Gregory, sempre tão observador, logo comentou sobre o labirinto de neons que o cercava.
— Esse lugar parece um labirinto cheio de néons —, ele disse, com uma expressão desconfiada.
Eu apenas concordei, mas meus olhos estavam fixos no cardápio à nossa frente. A verdade é que esse tipo de lugar, grande e cheio de atrações, era o paraíso para as crianças, mas também um lugar estrategicamente projetado para evitar muita confusão. Um espaço tão vasto certamente teria suas próprias maneiras de organizar o caos.
Apesar da distração com o cardápio, algo me fez parar. Era como se, ao pisar nesse lugar, uma sensação estranha tivesse invadido meu ser. Uma sensação que um humano, ou qualquer ser comum, não deveria sentir. Foi como se o próprio lugar estivesse... observando. Meus olhos se estreitaram involuntariamente enquanto analisava os arredores, tentando encontrar a origem daquele incômodo, mas nada parecia fora do lugar à primeira vista.
— Ei, Renier! Está ouvindo? — Gregory me chamou, arrastando minha atenção de volta à realidade.
Fiz um gesto vago com a mão, como se nada tivesse acontecido, e então olhei para ele.
— Você vai pedir alguma coisa, ou vai ficar aí parado? — perguntei, desviando rapidamente da distração. Gregory parecia desinteressado, como sempre.
— Não estou muito afim de comer, vou passar.
Eu sorri discretamente, não podia simplesmente deixar essa oportunidade passar em branco. Estávamos aqui para nos divertir, então que fosse. O robô de atendimento se aproximou, com sua estrutura metálica reluzente e uma tela digital onde as opções de pizzas e lanches se moviam em um ritmo acelerado. Era uma dessas engenhocas programadas para tomar as decisões por você, de uma forma bem eficiente.
Com um sorriso enigmático, ignorei o fato de Gregory ter dispensado a refeição e toquei a tela. Escolhi três opções de pizzas e dois refrigerantes, sentindo que isso não era apenas uma simples escolha de comida, mas sim uma maneira de trazer uma sensação de normalidade para aquele ambiente estranho.
— Se estamos aqui para nos divertir, então vou fazer isso por você, Gregory. Vamos aproveitar o que o lugar tem a oferecer. — Minha voz estava calma, quase indiferente, mas havia algo em meu olhar que dizia que eu estava mais interessado no que estava por trás desse lugar do que em qualquer outra coisa.
O robô fez uma leve inclinação, como se estivesse confirmando minhas escolhas, e se afastou. Agora, restava esperar e ver o que mais esse lugar tinha reservado para nós. Eu podia sentir que havia algo mais acontecendo aqui do que parecia à primeira vista. Algo que poderia mudar tudo, se eu fosse capaz de perceber.
Depois de alguns minutos de espera, o robô voltou, trazendo uma bandeja repleta de pizzas com sabores variados. O cheiro delicioso tomou conta do ar, e até eu precisei admitir que aquilo parecia melhor do que esperava. As pizzas tinham cores vivas, ingredientes cuidadosamente distribuídos e uma crocância que só de olhar dava para imaginar.
Gregory olhou para a bandeja com uma expressão incrédula, levantando uma sobrancelha enquanto apontava para o monte de comida.
— Você vai comer tudo isso? — ele perguntou, como se eu fosse algum tipo de lunático.
Eu não consegui evitar o sorriso que surgiu em meu rosto. Havia um brilho nos meus olhos enquanto pegava uma fatia com firmeza e mordia sem pensar duas vezes. O sabor me atingiu imediatamente, uma explosão de temperos e texturas que fazia meu paladar reagir de uma forma que eu não sentia há muito tempo. Soltei um suspiro satisfeito e, sem disfarçar minha felicidade, disse:
— Faz tanto tempo que eu não sentia um sabor assim... Parece quase nostálgico.
Gregory cruzou os braços e balançou a cabeça, ainda sem entender.
— Não entendo você. É só pizza. É barato, dá para comer em qualquer lugar. Qual é a graça disso? — ele perguntou, claramente intrigado com a minha empolgação.
Por um momento, hesitei em responder. Eu sabia exatamente o porquê da minha animação. A verdade era que comer, para mim, era mais um capricho do que uma necessidade. Meu corpo não precisava de comida para sobreviver, mas isso não significava que eu não pudesse aproveitar os prazeres que ela oferecia. Cada mordida era como reviver um pedaço de normalidade que eu tinha perdido há muito tempo.
Mas, obviamente, não podia dizer isso para Gregory. Em vez disso, limpei a borda dos lábios com o dorso da mão e brinquei:
— É porque você não sabe apreciar as coisas boas da vida, Gregory. Isso é mais do que comida, é uma experiência.
Ele revirou os olhos e voltou a se encostar na cadeira, me observando enquanto eu continuava atacando as pizzas, um pedaço após o outro. Eu sabia que ele ainda estava intrigado, mas deixei que ele guardasse suas dúvidas para si mesmo. Às vezes, era mais fácil manter o mistério do que entregar verdades que ele ainda não estava pronto para ouvir.
A cada fatia, eu aproveitava não apenas o sabor, mas a pequena sensação de estar... vivo, pelo menos por um momento.
O sabor da pizza ainda explodia no meu paladar enquanto Gregory me encarava, visivelmente intrigado com a quantidade que eu já tinha comido. Eu podia sentir o julgamento pairando no ar, mas ignorei. Afinal, ele não entendia o que aquilo significava para mim, e, sinceramente, não fazia questão de explicar.
No entanto, antes que Gregory pudesse abrir a boca para me provocar, as luzes se apagaram parcialmente, e o ambiente foi tomado por um show de luzes vibrantes vindas do palco. Uma voz ecoou pelos alto-falantes, carregada de entusiasmo:
— Senhoras e senhores, os Rockstars estão agora na área!
Me virei na direção do palco, e não pude evitar um pequeno sorriso ao observar o que vinha a seguir. A cortina se ergueu, revelando os animatrônicos em poses cuidadosamente elaboradas. Mesmo de onde eu estava, era impossível negar a presença deles. Cada movimento, cada gesto parecia calculado para impressionar.
Glamrock Freddy segurava um microfone, a figura imponente dele transmitia uma autoridade quase palpável. Ao lado dele, Roxanne Wolf assumia sua posição com uma guitarra vermelha que também funcionava como teclado. Algo nela capturou meu interesse imediatamente, talvez fosse o design ousado, talvez fosse a personalidade que parecia transbordar de cada movimento.
Minha atenção se desviou para Glamrock Chica, que também segurava uma guitarra. Ela parecia... fofa, eu admiti mentalmente, especialmente em comparação à Roxanne, que exalava um ar mais selvagem e confiante. Montgomery Gator, por sua vez, parecia o típico fanfarrão. Metido demais para o meu gosto, mas eu não podia negar que tinha presença.
Foi nesse momento que me dei conta de algo estranho. Cada um deles parecia ter uma "personalidade". Algo em seus gestos e comportamentos me fazia sentir que havia mais ali do que simples inteligência artificial programada. Aquilo acendeu uma fagulha de curiosidade em mim, algo que eu não podia ignorar.
A banda começou a tocar, suas vozes e instrumentos ecoando pelo espaço. As crianças ao redor pareciam hipnotizadas, dançando e cantando junto com o repertório animado. Mas enquanto a maioria via apenas um show divertido, meus instintos me alertaram. Algo não estava certo.
Ativei os Olhos das Revelações discretamente. Meu campo de visão mudou, revelando o fluxo de energia dos animatrônicos. E foi então que notei. O sistema de Freddy estava instável. Os padrões de energia dele oscilavam, tornando-se caóticos. Antes que eu pudesse reagir, ele entrou em pane.
Com um baque surdo, Glamrock Freddy desabou no palco, o microfone rolando para longe. O som cessou instantaneamente, e os outros animatrônicos pareciam congelar no lugar, como se tivessem sido desativados.
A voz dos robôs de segurança ecoou pelo salão:
— Atenção, visitantes. Glamrock Freddy passou por um pequeno mal funcionamento. Ele será removido para manutenção. Por favor, permaneçam calmos.
A multidão começou a murmurar, e alguns funcionários correram para o palco, tentando manter as aparências.
Olhei para Gregory, que já parecia inquieto na cadeira. Sem hesitar, me inclinei em sua direção e sussurrei:
— Essa é sua deixa. Se você veio aqui para descobrir o que aconteceu com seus amigos desaparecidos, agora é a hora. Entre no Freddy.
Gregory me encarou, claramente surpreso, mas acenou com a cabeça. Ele se levantou, ajeitando sua mochila enquanto olhava ao redor.
— E você? Como vai se esconder? — ele perguntou, visivelmente preocupado.
Peguei mais uma fatia de pizza, dei uma mordida despreocupada e olhei para ele com um sorriso confiante.
— Confie em mim. Vá se esconder no Freddy. Eu cuido do resto, — afirmei piscando para ele.
Ele hesitou por um segundo, mas acabou concordando, desaparecendo no meio da confusão enquanto eu continuava comendo. Afinal, a melhor forma de passar despercebido é parecer que você não tem nada com isso.
Continua...