O sol brilhava sobre o centro da cidade, onde Lya e Eren caminhavam entre os feirantes, os aromas das especiarias e ervas misturando-se no ar. O dia parecia comum, até que uma presença fez o ambiente mudar.
— Ora, ora… — A voz profunda e carregada de diversão veio de perto. — Se não é a minha Deusa, perdida entre os mortais.
Lya virou-se de imediato, sentindo um arrepio percorrer-lhe a espinha ao encontrar o olhar dourado de Kaen. Ele estava ali, casualmente inclinado contra um poste de pedra, um sorriso provocador nos lábios. Rael, ao lado dele, parecia igualmente satisfeito com a surpresa.
— O que fazes aqui? — Eren perguntou, de imediato em alerta.
Kaen ignorou-o por completo, focando-se apenas em Lya. Deu um passo em direção a ela, a sua presença avassaladora.
— Vim buscar o que me pertence — disse ele, num tom suave, mas carregado de intenção.
Lya sentiu o coração acelerar. A forma como ele a olhava fazia-a perder momentaneamente a linha de pensamento. Havia algo nele que a puxava, um magnetismo impossível de ignorar. Mas antes que pudesse responder, Rael interveio.
— Que dramático! — exclamou, cruzando os braços. — Tens de parar com essa mania de fazer entradas impactantes. As pessoas vão achar que ensaias em frente a um espelho.
Kaen lançou-lhe um olhar de soslaio, mas o sorriso não desapareceu.
— Apenas falo a verdade — respondeu ele, aproximando-se ainda mais de Lya. A sua voz era baixa, hipnótica. — E tu sabes disso, minha Deusa. Ou vais continuar a fingir que não sentes o mesmo?
Lya abriu a boca para responder, mas nada saiu. Sentia-se dividida entre o desconforto e uma atração inexplicável. Eren, por sua vez, não disfarçava o aborrecimento.
— Tu és insuportável — resmungou Eren, cerrando os punhos.
— E irresistível, não te esqueças dessa parte — acrescentou Rael, lançando uma piscadela para Lya. — Não é, minha querida futura rainha?
Lya piscou rapidamente, o calor subindo-lhe ao rosto.
— Eu… eu não sei do que estás a falar! — retrucou, tentando recuperar algum controle. — Não sou propriedade de ninguém e não gosto desse tipo de insinuação.
Kaen inclinou a cabeça ligeiramente, estudando-a com interesse. Depois, com um sorriso que parecia prometer mais do que simples palavras, murmurou:
— Não quero te aborrecer minha doce e bela feiticeira, mas já não suportava a saudade.
Kaen, sem perder a compostura, estendeu a mão em direção a Lya, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
— Que tal um jantar esta noite, minha Deusa? — perguntou, a voz suave como seda, mas carregada de intenção. — Tenho certeza de que teríamos muito a conversar, longe dos olhos curiosos.
Lya sentiu seu estômago dar um salto, o convite a atingindo de maneira inesperada. Por um momento, seu olhar encontrou o dele, e aquele brilho dourado parecia penetrar-lhe na alma. Ela não sabia o que sentia, mas uma parte de si desejava aceitar, ainda que sentisse uma resistência interna crescente.
Rael, com um sorriso travesso, não deixou a oportunidade passar.
— Ah, o bom e velho convite para jantar. Kaen, sabes bem como fazer uma entrada, mas quem te viu e quem te vê… — disse ele, olhando para Lya com um ar de quem sabe algo que os outros não sabem. — Mas, cuidado, ele não é só mestre nas palavras. Às vezes, conquista com uma garfada... e com um sorriso. Só não sei se vais conseguir fazer Lya retribuir, hein?
Lya sentiu uma pontada de ciúmes, algo que não podia negar, ao ver o olhar de cumplicidade entre Kaen e Rael. Uma sensação desconfortável apertou-lhe o peito, algo que ela não sabia como lidar. Tentou esconder, mas as palavras de Rael, mais do que o sorriso de Kaen, a haviam afetado de uma maneira estranha. Por que sentia isso? Não podia ser… Ela não o conhecia, e, ainda assim, uma parte dela queria estar ali, com ele, em qualquer lugar.
Eren, já farto da situação, puxou-a pelo braço com um leve gesto brusco.
— Não vou ficar aqui a ver essa cena — resmungou, o olhar fuzilando Kaen e Rael, como se a simples presença deles fosse um insulto.
Kaen manteve-se impassível, mas o sorriso sedutor não desapareceu do seu rosto. Ele observou Eren com um toque de diversão nos olhos, mas a sua atenção rapidamente voltou para Lya.
— Não precisas de decidir agora, meu amor — disse ele, a voz doce e melosa. — Mas a oferta permanece. Será que conseguirás resistir?
Lya inspirou fundo, forçando-se a recuperar o controle. O olhar intenso de Kaen sobre ela era uma armadilha tentadora, mas não deixaria que ele pensasse que podia envolvê-la assim tão facilmente.
— Agradeço o convite, mas a resposta é não — disse, a voz firme e inabalável.
Kaen arqueou ligeiramente uma sobrancelha, claramente intrigado, mas sem demonstrar qualquer desapontamento. Pelo contrário, o seu sorriso apenas se alargou, como se tivesse recebido exatamente a reação que esperava.
— Ah… então recusas-me assim, sem hesitação? — murmurou ele, num tom que desafiava a própria negação dela.
Lya sustentou o olhar dele, mantendo a postura firme, embora sentisse o coração disparado no peito. Não podia negar a atração que aquele homem exercia sobre ela, mas isso não significava que cederia.
— Sim — respondeu sem vacilar. — E agora, se não te importas, temos mais o que fazer.
Rael soltou um assobio baixo e divertido.
— Isso foi um golpe direto, Kaen. A princesa aqui não está nada impressionada com os teus encantos.
Kaen riu suavemente, os olhos dourados faiscando de interesse.
— Engano teu, Rael. Se não estivesse impressionada, não precisaria lutar tanto contra isso.
Lya crispou os lábios, recusando-se a reagir à provocação. Virou-se para Eren.
— Vamos.
Eren não perdeu tempo em puxá-la para longe dali, claramente satisfeito por saírem daquela conversa. Mas, enquanto se afastava, Lya sentiu o olhar de Kaen cravado nela, como uma promessa silenciosa.
E, por mais que tentasse ignorar, algo dentro dela ardia com a certeza de que aquele não era o fim.