Aura caminhava com passos firmes e um olhar decidido pela escadaria de mármore vermelho. O brilho do material reluzia à luz fraca que adentrava o ambiente, refletindo o nome do lugar: Palácio Carmesim. Cada detalhe remetia à antiga glória daquele espaço, mas a sensação que envolvia o lugar era de abandono e desolação.
Ela permitiu que seus olhos percorressem os arredores. As colunas imponentes, os arcos decorados e os corredores extensos estavam desertos. Não havia um único som além de seus próprios passos ecoando pelo mármore frio. A ausência de guardas ou súditos incomodava-a profundamente.
— Estranho... — murmurou para si mesma.
Aura sempre governou com mãos firmes. Seus soldados eram leais até o último suspiro, treinados para proteger o reino e seu povo, mesmo ao custo de suas vidas. Se a Guardiã do Caos realmente havia usurpado seu trono, onde estavam os soldados? Por que o Palácio estava tão vazio, como se fosse uma casca esquecida do que já foi?
O caos que assolava o território deveria ter reunido as forças ali, no coração do reino. No entanto, tudo indicava o contrário. Um pensamento sombrio começou a tomar forma em sua mente, mas ela afastou-o com um suspiro profundo.
De repente, o som de uma explosão colossal rasgou o silêncio. Aura se virou rapidamente, seu olhar fixando-se no horizonte ao sul. Uma onda de energia, violenta e perturbadora, varreu os céus. Era como se o próprio tecido do mundo estivesse sendo distorcido. Aura sentiu os pelos de sua nuca se eriçarem, enquanto a intensidade daquela emanação atingia seus sentidos.
— Renier... — sussurrou, seu olhar arregalado.
Ela observou por alguns instantes, hipnotizada pelo caos. Aquele poder que emergia da luta de Renier com a Sombra era quase incompreensível, beirando a insanidade. Aura sabia que ele estava enfrentando algo muito além do ordinário.
Depois de um momento, fechou os olhos e respirou fundo, buscando foco. Ela não tinha tempo para se preocupar com ele. Renier estava travando sua batalha e, agora, era sua vez de enfrentar a dela.
— Não posso vacilar agora — disse para si mesma, sua voz carregada de determinação.
Voltando-se para a entrada do Palácio, Aura fixou o olhar nas portas monumentais que levavam ao saguão do trono real. Elas eram feitas de madeira escura, entalhadas com figuras antigas de demônios e reis, agora cobertas por camadas finas de pó, como se tivessem sido negligenciadas por anos.
Aura ergueu o queixo, seu orgulho e sua raiva renovados. A Guardiã do Caos havia tomado seu trono, mas aquilo terminaria ali. Este era seu Palácio, seu Reino, e ela não permitiria que a invasora permanecesse impune.
Com passos firmes, ela se aproximou das portas. Cada movimento seu ecoava no vazio do grande corredor. Aura sabia que do outro lado daquela entrada estava seu destino, sua oportunidade de redenção, ou seu fim.
Parando diante das portas, ela estendeu as mãos e as empurrou com força. O som das dobradiças ecoou como um grito em meio ao silêncio. A escuridão do saguão do trono parecia esperá-la, pronta para revelar o que lhe aguardava.
Ela entrou sem hesitar, a determinação em seu coração ofuscando qualquer traço de dúvida ou medo. O confronto final estava prestes a começar.
Os passos de Aura ecoavam na escuridão do saguão, o som de seus pés firmes sobre o mármore ressoando pelo vasto corredor. A penumbra que envolvia o espaço parecia querer engolir a sua presença, mas ela caminhava com uma confiança inabalável, indiferente ao vazio que a cercava. Cada movimento seu refletia a soberania que, por direito, era sua. Não importava que o Palácio estivesse deserto ou que as sombras se adensassem ao seu redor. Ela retornava como dona daquele lugar, sem hesitar, sem medo.
Porém, no silêncio pesado do ambiente, uma voz feminina cortou o ar com uma suavidade quase sedutora, mas carregada de uma ironia insuportável.
— Que ousadia, voltar a este Palácio de forma tão autoritária. Não se esqueceu que, da última vez, perdeu todo o seu orgulho aqui? — A voz soou com uma risada baixa, ecoando pelas paredes como um sussurro venenoso.
Aura parou por um breve momento, seu olhar escuro fixando a origem da voz. Não havia receio em sua postura. Ela sabia o que enfrentaria.
— Não terei medo de adentrar o que é meu — respondeu com a calma de uma rainha, sua voz carregada de desdém. — Não vou me esgueirar por meu próprio território. Este é o meu Palácio, e entrarei como uma Rainha deveria.
A risada que se seguiu foi carregada de um prazer perverso. Ela podia sentir a presença da inimiga se materializando nas sombras à sua volta. Como se um truque de mágica tivesse sido feito, as chamas nas pilastras se acenderam de repente, iluminando o espaço sombrio e revelando, finalmente, o que estava à sua espera no final do saguão.
Lá, no trono, estava uma figura imponente e ao mesmo tempo provocante: uma kitsune de nove caudas negras, sua presença dominando a sala. Os olhos vermelhos que brilhavam com uma malícia incomparável fixavam-se nela, sem nem um pingo de receio. Suas pernas estavam cruzadas de maneira casual, mas a postura exibia uma graça sedutora. Seu yukata escuro, adornado com lírios vermelhos, esvoaçava suavemente, revelando a sua pele imaculada e sua beleza inquietante. Seu rosto estava descansando sobre seu braço apoiado no encosto do trono, um sorriso travesso nos lábios, como se a visão de Aura fosse um espetáculo fascinante.
A kitsune não se mexeu, permanecendo no trono como se a própria sala tivesse sido feita para ela.
— Queria ver o Guardião Negro — ela falou, a voz saturada de desdém. — Esperei tanto tempo por essa luta, mas o que aparece? Uma Oni, mais uma vez. Que tédio...
Aura sentiu a irritação crescer dentro de si, um calor crescente em seu peito. O tom da kitsune, a maneira como a desdenhava, tudo parecia uma brincadeira, algo tão trivial. Ela, a Rainha dos Demônios, sendo tratada assim por uma usurpadora!
— Tédio? — Aura respondeu, seu olhar se tornando gelado, sem a menor sombra de hesitação. — Aceitarei minha derrota de qualquer maneira, em um combate. Mas você, não merece estar no trono de Rainha. Não tem nem a honra de ser chamada assim.
A kitsune sorriu ainda mais, sua expressão se tornando mais provocante.
— Eu sou Siryus — ela disse com uma calma venenosa, os olhos brilhando com uma malícia incandescente. — E não importa o que você ache de mim. Uma Guardiã toma o que deseja, sem permissão. E se você não gostar... Bem, basta sujar o chão com o seu sangue, assim posso te mostrar o quanto a Rainha dos Demônios é... fraca.
Aura sentiu um ódio profundo surgir dentro de si. A provocação de Siryus era mais do que um simples desafio; era uma afronta à sua autoridade e ao seu passado.
Mas ela não estava ali para discutir palavras. Ela sabia o que deveria fazer. A batalha estava prestes a começar. A verdadeira Rainha não se importava com o que seus inimigos pensavam. Ela se importava com o que estava para acontecer, e o que aconteceria, seria o fim daquela arrogante Siryus, a Guardiã do Caos.
Continua…