Depois de algum tempo desacordada, a transformação do Wendigo finalmente se completou. Um brilho vermelho intenso acendeu na cavidade escura de seu crânio de cervo, iluminando a direção para onde seus olhos estavam fixos.
Ela estava envolta no paletó escuro de Renier, retirado de seu uniforme escolar, que a cobria de forma improvisada para trazer algum conforto naquele ambiente gélido. Seu olhar vagou pelos arredores até pousar em Renier e Aura, sentados ao redor de uma fogueira que estalava suavemente. A luz das chamas era abafada pela densidade da Floresta Perdida, onde o céu estava invisível, mas o frio crescente sugeria que a noite havia caído do lado de fora.
Caminhando lentamente, ela se aproximou da fogueira. Seus movimentos estavam mais controlados, e, conforme observava seu próprio corpo, a magnitude da mudança se tornava ainda mais evidente.
— Ah, finalmente acordou — disse Renier, olhando para ela com um misto de alívio e curiosidade. — Depois dessa transformação toda, você acabou desmaiando. Como está se sentindo? — Ele fez um gesto para que ela se sentasse ao lado da fogueira, abrindo espaço.
Ela parou por um momento, fitando as chamas enquanto refletia.
— Eu... Me sinto mais forte, sim... — respondeu, analisando as mudanças físicas em seu corpo. A aparência grotesca de antes havia desaparecido, substituída por uma pelagem escura que delineava uma silhueta mais feminina, especialmente em sua cintura. — Mas não menos... estranha — murmurou, quase como se confessasse a si mesma.
Aura, que a observava com olhos atentos, inclinou a cabeça, intrigada.
— Provavelmente, quando você ingeriu a carne daquele Pesadelo, seu corpo reagiu não só internamente, mas também fisicamente — afirmou, sua voz carregando um tom de fascínio acadêmico.
O Wendigo sentou-se no tronco ao lado de Renier, mantendo os olhos fixos em suas mãos, agora diferentes, enquanto um novo sentimento emergia dentro de si. Não era vazio; era algo que ela não sabia nomear.
— A fome... — ela comentou, hesitante, como se testasse o peso de suas próprias palavras. — Aquela fome insaciável... não está mais aqui. Alguma coisa mudou na minha natureza.
Renier observou-a com um sorriso discreto, mas genuíno. Ele parecia tão satisfeito quanto curioso.
"Interessante... Talvez a fome insaciável tenha desaparecido como uma consequência de ingerir a carne de um ser que não pertence à sua cadeia alimentar," pensou ele, animado com as implicações.
Seu olhar recaía sobre ela com uma mistura de orgulho e alívio. A nova forma do Wendigo não era apenas uma evolução; era o início de algo mais profundo, uma mudança que talvez nem ela ainda compreendesse completamente.
— Ótimo com ela, agora acordada devemos dar continuidade ao que estamos planejando? — perguntou Aura, de forma séria.
O Wendigo estava confuso. — Vocês fizeram algo? O que estão planejando? — indagou ela intrigada.
— Enquanto você estava desacordada, Renier fez uma busca pelos arredores, — informou Aura, enquanto estava esticando os braços para se espreguiçar. — O local do pilar dessa floresta maldita, está tão perto daqui…
— Então estamos pensando enfrentá-lo, mas quando cheguei naquela área, embora a densidade de energia fosse forte, não havia sinal de nenhum monstro, nem mesmo nos arredores. — afirmou Renier observando a cauda felpuda do Wendigo se mexer, ao lado dele.
— A área daquele lugar, não é um simples domínio… e sim um desafio, — afirmou o Wendigo.
— Desafio? — perguntou Aura, intrigada.
— É necessário que apenas uma pessoa entre no domínio, quando isso acontece uma barreira se forma ao redor impedindo que ninguém saia ou entre, — informou ela, com o brilho carmesim de seus olhos fitando o Renier. — E obviamente, ou só irá sair se um dos oponentes morrer, e ninguém que entrou saiu…
Renier olhou para um lado e para o outro, pensativo. — Ótimo, vou enfrentar o monstro que está naquele lugar, certo, Aura? — indagou ele, voltando o olhar para ela.
— Como quiser, afinal o meu objetivo é ver se seus poderes são o que dizem, Guardião Negro, então se quiser enfrentar ele sozinho, não vou me opor, — afirmou Aura com um pequeno sorriso surgindo, desejando ver o poder de Renier.
— O-o que? Você ouviu o que eu disse, Renier? — indagou o Wendigo, preocupada.
Renier ergueu-se, e logo fez um carinho entre os cabelos dela. — Eu vou ficar bem, então fique à espera que logo estarei de volta, — afirmou ele, dando um sorriso.
O toque suave em sua pelagem, fez com que o Wendigo, abanar a cauda felpuda fazendo algumas folhas mortas voarem para longe.
— Ah, o que acho que o nome Wendigo, não serve muito para você agora, não acha? — perguntou Renier, ao mesmo tempo que pensava em um nome para ela. — O que acha de Malo?
— Malo… parece um bom nome, para um novo ser… — afirmou ela, gostando do carinho que estava recebendo.
"Parece até que ela foi domada pelo Renier, e ele nem parece ligar tanto quanto ele não liga", pensou Aura, olhando para a cena com curiosidade e um leve aborrecimento.
Renier se afasta agora, de quem se chamava Malo, e olha para Aura. — Estamos perto o suficiente do território do monstro, não sei o que acontecerá lá dentro, então fiquem em alerta com qualquer coisa vinda de fora do território, — afirmou Renier.
Malo e Aura, acenam com a cabeça, possíveis monstros poderiam as atacar enquanto a barreira estivesse erguida, outros monstros poderiam vir para tentar ver o que estava acontecendo.
Renier sai caminhando, pegando sua foice, indo em direção ao território do monstro que é o pilar dessa floresta. Aura, porém, logo grita para Renier como um incentivo.
— Não vá morrer, viu? — gritou ela, animada.
Renier riu levemente, apenas levantou a foice como sinal de uma resposta positiva não só para Aura, mas para Malo também, que parecia apreensiva ao deixá-lo seguir sozinho. Após ve-lo sumir em meio a escuridão da floresta.
Aura logo volta o olhar para Malo. — Nosso objetivo agora, é garantir que ao redores fiquem livres após o Renier derrotar o monstro daquele território, — afirmou ela, com um toque de liderança.
Malo, levou a mão ao queixo de seu crânio pensativa. — De fato… se Renier o derrotar, vai ser como um alerta para os demais monstros, — informou ela. — Quando isso acontecer, podemos nos ver cercado por todos os lados.
— Exato, então Renier lida com o que está lá dentro, é nossa responsabilidade será lidar com que estará aqui fora, — afirmou Aura, olhando para Malo de forma séria. — Posso contar com sua força nesse momento?
Malo a olhou de o brilho vermelho em seus olhos se intensificaram levemente. — Se for pelo Renier, então sim, irei lutar, então pode contar comigo — afirmou ela determinada. Ambas as duas estavam convictas que Renier sairia vitorioso daquele desafio, mas enquanto as duas do lado de fora, era outro problema sem saber a quantidade de monstros que iriam enfrentar.
E como será que o desafio que Renier enfrenta naquele território hostil, mesmo com seus poderes e habilidades fora do comum, porém sua própria natureza pode acabar fazendo-o, mudar a forma como luta…
Continua…