Novamente ele não responde, praticamente não tem nenhuma reação. Suas lágrimas foram enxugadas com delicadeza, enquanto o abraço ficava mais apertado. Ele sentia todo o carinho que ela estava lhe dando, mas não conseguia reagir.
"Olha suas mãos, estão geladas. Muito geladas. Quanto tempo você está aí?"
Segurando seu marido pelas mãos, ela o levanta e começa a levá-lo rumo à cama.
"Se for para ficar ai parado é melhor vim para cama, lá tá quentinho. No chão a única coisa que você vai ganhar é um resfriado."
Ela então o deita na cama e o cobre com um edredom.
"Fica aí quietinho que eu vou fazer um café para nós. "
Nada se passava em sua cabeça, ele estava congelado olhando para o teto. Enquanto isso, sua esposa entrava na cozinha e se deparava com o café já pronto.
"Ué, mas ele já fez o café?"
Ela começa a olhar em volta e repara que a cadeira estava fora do lugar, junto com alguns papéis e uma xícara de café. A primeira página que estava aberta.
"Será que ele ficou assim por causa desses papéis? O que será que é isso?"
Ela começa a ler e a preocupação que ela tinha vai dando lugar a raiva.
Raiva do seu marido ter acreditado naquilo e ter ficado naquele estado.
"Como isso mexeu com a cabeça dele? Ele é super inteligente e tem uma ótima saúde. Não acredito que esse textinho o deixou nesse estado! Vou ter que puxar a orelha dele."
A esposa do professor entra no quarto com a página que marcava a data da morte de seu marido em uma das mão
"É sério isso, amor? É sério que você ficou nesse estado por causa disso aqui? Esse texto maluco, essa história absurda? Como você, tão inteligente, tão racional, pode acreditar em uma bobagem dessas?"
Ainda deitado, olhando para o teto.
"Não é o texto... Não é o texto que me deixou assim."
"Então o que foi? Porque eu cheguei em casa, toda animada, e você me ignora, se joga na cama e depois fico te vendo nesse estado deplorável! Preciso entender o que está acontecendo."
Ele vira lentamente a cabeça para ela com os olhos marejados.
"Eu... Eu vou morrer."
Pausa, rindo nervosamente.
"O quê? Do que você está falando?"
O marido se senta na cama, pega os papéis sobre a mesinha de cabeceira e diz:
"Esses são meus exames. O médico confirmou. É um câncer avançado... Eu só tenho três meses de vida."
Paralisada, a raiva foi desaparecendo dando lugar ao desespero.
"Não, isso... Não pode ser verdade. Você... Você parecia tão bem…"
"Eu também achava. Mas os exames não mentem.
Ele leva os papéis dos exames até ela.
"Aqui... O parecer médico. Tudo está aqui."
Sua esposa pega os exames com as mãos trêmulas, lê rapidamente, os olhos ficam arregalados. Ela fica totalmente desnorteada, sem saber para onde olhar e o que fazer.
"Não... Não pode ser... Não você! Você sempre foi tão forte, tão saudável! Deve haver algum engano, outro teste, uma segunda opinião…"
Balançando a cabeça, com uma expressão de derrota ele responde.
"Não há erro. Eu já perguntei. Eles fizeram tudo o que podiam... Não há nada mais a ser feito."
Os papéis caíram ao chão, as mãos de sua mulher já não haviam mais espaço, porque as duas mãos estavam ocupadas no rosto do seu marido, ela olhava no fundo dos olhos dele, praticamente encostando testa com testa.
"E você ia esconder isso de mim?! Você ia carregar esse peso sozinho? Por quê?"
"Porque eu não queria te machucar... Não sabia como dizer. Ainda não sei. Eu só... Eu só precisava de tempo para processar."
Ela o abraça com força, lágrimas escorrem pelo rosto dos dois.
"Você não está sozinho nisso. Entendeu? Não está sozinho! Nós vamos passar por isso juntos, cada minuto, cada segundo. Eu não vou deixar você se isolar assim."
Ele aperta ainda mais o abraço.
"Desculpe... Eu só não queria te fazer sofrer."
"O sofrimento faz parte, mas o amor também. Nós vamos enfrentar isso juntos. Não importa o que aconteça."
Eles ficam alguns minutos apenas abraçados e nem percebem o tempo passando, até que o silêncio é quebrado pela esposa.
"E essa data de morte? O que é isso? 22 de janeiro de 2028?"
"Isso foi um maluco que apareceu no consultório… Mas não quero falar sobre isso agora".
"Eu também não quero, o que precisamos fazer agora é marcar uma consulta com outro médico, precisamos de outra opinião. E dessa vez eu vou junto".
"Não adianta amor, os exames e o diagnóstico estão bem detalhados… Esse médico possui uma excelente reputa…"
"NÃO QUERO SABER, vamos buscar uma segunda, terceira, quarta opinião, vamos continuar indo em médicos até esgotarem as alternativas. Estamos entendidos?"
"Sim senhora".
Os dois soltaram algumas risadas leves e o clima pesado ficou um pouco mais leve.
"Vou voltar a fazer o café, por favor descanse enquanto isso. Irei avisar no trabalho que irei faltar e já cuidarei de marcar uma nova consulta"
Seu marido sem hesitar voltou para cama e novamente ficou deitado olhando para o teto.
Vários pensamentos passavam por sua cabeça.
Enquanto isso, ao mesmo tempo que fazia o café, sua mulher ligava para o trabalho e já emendava marcando uma consulta.
Poucos minutos se passaram e ela voltou para o quarto com uma xícara de café.
"Trouxe o seu cafezinho, toma ele rapidinho e já se arruma. Você tem médico daqui a 45 minutos."
"Como você conseguiu uma agenda assim tão rápido? Quanto isso vai custar?"
"Não importa, vamos!"
Ver sua esposa tão preocupada e agitada deu uma acordada nele, além de gerar um fio de esperança.
Aos poucos ele se levantou e trocou de roupa, mal terminou de tomar seu café e já foram para o consultório.
"Então doutor, meu marido fez esses exames e não gostamos muito do resultado. Gostaríamos de uma segunda opinião. O senhor consegue avaliar?"
"Me deixe ver"
Disse o doutor enquanto ajeitava seu óculos e inspeciona minuciosamente os exames.
"Então doutor? É grave?".