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Chapter 2 - Que PORRA é essa?

As luzes de néon, intermitentes como estrelas artificiais, lançam um brilho frio sobre o balcão polido. O burburinho no bar diminui, engolido por um silêncio carregado. Não é a calmaria natural de uma noite preguiçosa, mas aquele tipo de quietude densa que chega depois de algo grande demais para ser compreendido imediatamente.

Moisés permanece imóvel, os dedos girando o copo vazio em um gesto mecânico, enquanto seus olhos seguem fixos no espaço onde, segundos antes, a projeção holográfica pairava. Ao lado dele, Marte-1549 inclina-se para frente, como se as palavras do anúncio ainda ecoassem em algum canto da mente.

— Que porra é essa? — A voz de Marte-1549 corta o silêncio, carregada de incredulidade. Ele aponta para o nada, o lugar onde o holograma desapareceu. — Outra civilização? Tipo II?! E aquele papo de que a gente era especial? Único? Você tá me ouvindo, Moisés?

A resposta demora. Moisés respira fundo, ainda preso à revelação que parecia explodir como fogos de artifício dentro dele.

— É, ouvi... — murmura, a voz grave com um peso novo. — É grande. Muito grande. Crescemos achando que estávamos sozinhos. E agora isso... Esfera de Dyson? Isso é coisa de ficção científica.

Marte-1549 recosta-se na cadeira, os olhos fixos na distância, como se tentasse enxergar além das paredes do bar, além de Marte.

— Como é que eles só descobriram isso agora?

A pergunta paira no ar como fumaça de cigarro. Moisés solta uma risada curta, mas sem alegria.

— "Só agora"? — repete, encarando o amigo com uma expressão cética. — Você sabe quanta coisa a gente não sabe, 15-4-9? Aposto que eles monitoram isso há anos. Só resolveram abrir o jogo porque não dá mais pra esconder.

Marte-1549 estreita os olhos, como se tentando furar o véu de segredos que o universo parecia esconder.

— Tá dizendo que eles já sabiam? — A voz dele abaixa para um sussurro carregado de suspeita. — E o que mais estão escondendo? E se essas... coisas... forem hostis?

Moisés desvia o olhar, encarando o balcão como se a resposta estivesse gravada no mármore.

— Isso é o que mais me preocupa, — diz, finalmente. — O cara do anúncio parecia empolgado, como se fosse o maior feito da humanidade. Mas a gente não sabe nada sobre o que tá por trás dessa Esfera de Dyson. Podem ser pacíficos... ou podem ser nosso fim.

Um calafrio percorre Marte-1549, mesmo na temperatura morna do bar.

— Você acha que eles podem vir atrás da gente? — Ele tenta sorrir, mas o nervosismo transparece na voz. — Tipo... se eles são tão avançados, podem até estar nos observando agora.

Moisés bate a mão no balcão, o som ecoando como um tiro no silêncio.

— Sempre foi você que queria explorar cada canto de Marte, fazer história, não é? — A expressão de Moisés se abre em um meio sorriso sarcástico. — Parece que a história vai te atropelar antes de você chegar lá fora, amigo.

Marte-1549 ri, mas o som é abafado, incerto. Ele encara a bebida que mal tocou, perdido em pensamentos.

— Não era essa a história que eu esperava, — admite, depois de um momento. — Sempre imaginei a humanidade explorando o universo. Mas nunca pensei em... outro alguém já estar tão à frente. É como se fôssemos crianças brincando de foguete enquanto eles constroem estrelas.

Moisés ergue uma sobrancelha, o sorriso desaparecendo.

— Bem-vindo ao espaço, 15-4-9. — Ele pega o copo e o levanta, os olhos cintilando com algo entre determinação e resignação. — Sempre achamos que éramos especiais. Talvez a gente seja só mais um ponto na fila, esperando a nossa vez.

O bar está cheio de sussurros agora, como se as pessoas tivessem finalmente encontrado suas vozes depois do choque inicial. Marte-1549 observa as reações ao redor, sentindo a tensão pulsar no ar.

— E agora? — ele pergunta, a voz mais baixa. — O que você acha que vai acontecer?

Moisés olha para ele, os olhos escurecidos por pensamentos que prefere não verbalizar.

— Não sei. Talvez tentem contato, talvez fiquem só observando. Mas uma coisa é certa... — Ele balança a cabeça. — Se tem uma coisa que os humanos não sabem fazer, é esperar.

Marte-1549 pensativo, mordendo o lábio inferior.

— E a gente? O que podemos fazer?

Moisés sorri, levantando o copo para um brinde improvisado

— Sobreviver, meu amigo. Sobreviver e ver onde isso vai dar.

Os dois brindam, mas a tensão no ar permanece. Marte-1549 observa o amigo e percebe que, apesar do tom descontraído, Moisés também está inquieto. Pela primeira vez desde que saiu do orfanato, Marte-1549 sente que o mundo lá fora é maior e mais perigoso do que ele poderia imaginar.

— Bora? — Diz Moisés após o brinde.

Marte-1549 concorda com a cabeça, o ambiente parece ter mudado. O som voltou, mas de forma dispersa e nervosa. As conversas, antes animadas, agora soavam tensas, como o vento que precede uma tempestade. Moisés e Marte-1549 largam os copos no balcão e caminham até a saída, os passos ecoando pelo chão metálico.

No momento em que atravessam a porta para o corredor principal, um grito agudo corta o burburinho da multidão.

Eu sabia! Eu sabiaaa! — A voz tem um tom metálico, reverberando pelo espaço como um alarme.