3333 anos atrás - Em algum lugar no Iraque
"Gilgamesh, não torne mais difícil para todos os seus irmãos e irmãs de Uruk."
"Mate-o!"
"Gilgamesh! Por todos os seus crimes, eu, Ur-Uruk, o condeno à morte!"
...
'Ah... Esse sentimento... Todos vocês vieram ver meu réquiem...' pensou Gilgamesh, com um sorriso no rosto.
Dezenas de guerreiros, armados e equipados com armaduras reluzentes, espadas, lanças e escudos enfrentavam Gilgamesh. Eles estavam na casa das centenas no início da batalha, mas nem todos conseguiram resistir ao poder desse vilão. Todos eram Magos, o que o povo babilônico costumava chamar de Despertos. Essas eram as forças de Babilônia, todos eles com direito a se chamar Guerreiros de Uruk.
Gilgamesh permanecia ali, impassível, sua expressão era tão fria quanto diabólica. Suas vestes estavam rasgadas, cobertas de sangue, o qual, a maior parte não era nem dele, seu olho esquerdo havia sido arrancado, com sangue saindo da ferida, seu braço estava tão queimado que já era inutilizável. Esse campo de batalha lhe custou muito. Mas custou ainda mais para aqueles que o enfrentaram.
Gilgamesh cedeu ao sentimento de morte. Ela estava perto, e era inevitável. O manto ensanguentado balançava ao vento frio do inverno como uma bandeira de guerra, enquanto ele levantava os braços e fechava os olhos para receber a morte. Esse breve momento de sentir a brisa foi tão agradável para Gilgamesh que ele usou uma parte de sua preciosa Quintessência, não tão preciosa já que ele iria morrer de qualquer jeito, para fazer aquele momento durar um pouco mais.
"Tsk, não ria de nós, desgraçado!" Um dos Guerreiros de Uruk fez um movimento, e uma bola de fogo foi lançada em direção a Gilgamesh, que então abriu o olho com raiva.
Sem sinal, ou sequer uma palavra, a bola de fogo desapareceu como se nunca tivesse sido conjurada. Todos os guerreiros ao redor ficaram surpresos, ficando ainda mais cautelosos nesses últimos momentos do vilão. Gilgamesh começou a rir.
"Sim... Excelente! Não me divertia assim há séculos!" Gilgamesh gritou em êxtase. Os guerreiros de Uruk ficaram furiosos com ele. Era como se ele estivesse zombando de seus esforços, mesmo na morte. "Venham até mim, Guerreiros de Uruk! Façam seu rei patético se orgulhar! Derrotem o vilão! Honrem os seus mortos!" Gilgamesh gritou, estalando os dedos e causando uma explosão na cara do guerreiro que lhe lançara a bola de fogo anterior, matando-o instantaneamente.
Ele saltou de volta para a batalha, mas foi interceptado por quatro guerreiros que cravaram várias espadas em suas costas, no meio do ar, fazendo-o cair no chão.
Gilgamesh cuspiu sangue, mas não havia mais lugar para sujar. O campo de batalha inteiro estava preenchido por corpos e uma neve vermelha de sangue.
No seu momento final, ele riu. Riu até não conseguir mais. Riu até que traumatizasse todos os Guerreiros de Uruk, fazendo-os lembrar de todas as pessoas que perderam por causa desse cão raivoso. Riu até eles perceberem que, mesmo com uma força tremenda de mais de duzentos guerreiros Despertos... Eles haviam perdido mais da metade daquele número para um único Desperto. Riu porque destruiu todos os ideais da Babilônia, e sua preciosa cidade de Uruk foi queimada até o chão.
Até seu último suspiro... Ele riu.
Sua vida inteira passou diante de seus olhos nos seus momentos finais. Ele se lembrou de olhar para cima, da Torre de Babel, quando ainda era uma criança, despertando, e então recordou sua lenta evolução em entender seu Avatar. Diziam que ele era sem talento, mas ainda assim evoluiu rapidamente em seu entendimento das Esferas da Realidade.
Para cada cem mil pessoas, apenas uma tinha a capacidade de Despertar para a magia. E naquele número escasso, duzentos e quatro guerreiros se reuniram para matá-lo. Isso realmente o desapontou. Sua jornada terminou ali.
Ou ao menos, foi isso que ele pensou.
A Idade Antiga...
A Idade Média...
A Idade Moderna...
Ele reencarnou em cada período histórico.
Ele foi visto como o maior demônio de todas as eras. Como tal, foi caçado por outros Despertos... Ele não pôde viver o suficiente para evoluir.
...
"Ei! Sai dai, porra! Todos vocês!"
O jovem Gilgamesh, agora sem nome, estava cansado, babando, seu corpo infantil não suportava tamaho trauma físico. 'Essa é a quarta... Não, a quinta vez já...' pensou enquanto se levantava e continuava andando.
Neste mundo moderno, as pessoas já não se chamam mais de guerreiros, nem usam armaduras brilhantes ou empunham espadas e escudos. Bem, ao menos Gilgamesh não havia encontrado nenhum espadachim nos últimos seis anos de sua vida. Então, por que ele estava sonhando tudo isso? Ele não foi à escola para aprender sobre essas coisas; nunca poderia fazer isso em sua situação atual.
Também era extremamente novo para absorver essas informações.
Todas as noites, ele sonhava com esse homem chamado Gilgamesh, como se fossem suas próprias memórias, como se ele fosse Gilgamesh, mas ele era apenas uma criança, uma vítima. O problema em questão: o cérebro de criança dele não conseguia sustentar sua última personalidade, nem seu conhecimento. Não quando ele ainda não Despertara. Ele nunca viveu o suficiente após Despertar. Não podia conhecer os efeitos completos da reencarnação, mas... Ele não era aquele último Gilgamesh.
Não até que ele despertasse para a realidade!
Toda vez que ele dormia, desde que ele era um bebê, pequenas partes de memórias vinham à sua mente. Memórias de uma vida infantil como plebeu na França medieval, ou como um britânico na Revolução Industrial...
Todas essas memórias eram curtas. A única memória longa o suficiente para fazê-lo sonhar tantas vezes com uma única pessoa era o sonho em que ele era um homem mesopotâmico chamado Gilgamesh. Junto a esses sonhos, havia noites onde ele era pessoas em diferentes períodos da história, mas toda vez que ele passava por um evento que esses sonhos chamavam de 'Despertar', logo ele estava morto.
Era um conjunto de pesadelos constantes por seis anos até que ele começasse a sonhar com esse homem chamado Gilgamesh. Ele foi um dos primeiros Magos da humanidade. Desperto pela Torre de Babel. Usou seu poder em uma busca constante para ultrapassar a humanidade, mas foi cercado pelas forças de Uruk e morto ali mesmo.
Nesta vida, Gilgamesh era uma vítima de tráfico humano. Ele estava em um contêiner escuro e sujo cheio de outras crianças. Quando o homem gritou para todas as crianças assustadas saírem do contêiner, ele moveu o aço de enrolar e a luz do sol bateu em seus olhos com força.
Havia três homens: um homem branco grande e gordo com um charuto na boca, um homem negro tão magro que quase dava para ver seus ossos, e um latino bigodudo.
As crianças gritaram de medo e tentaram evitar aqueles homens, se aproximando da parede do contêiner, mas seus esforços foram em vão.
"Eu gosto desse aqui." O homem grande e gordo soltou muita fumaça enquanto ria, agarrando o braço de um dos meninos, sorrindo de forma cruel enquanto o olhava.
"Não! Não! Meu irmão não!" Uma das meninas gritou quando um dos criminosos puxou o braço do irmão dela, mas então, o latino simplesmente deu um chute na cabeça da menina, mandando-a para o chão com uma concussão que a fez desmaiar.
"Cala a boca a porra da boca, sua fudida!"
'Então... Em que ano estou agora? As coisas devem ter mudado de novo.' Esse pensamento surgiu na mente da criança. Mas não era dele... Era de outra pessoa.
Os homens zombaram, arrastando-os para fora como gado. O corpo magro de Gilgamesh tropeçou, seus joelhos fracos pela desnutrição e pelas inúmeras noites de medo. Mas algo na luz do dia acendeu uma faísca há muito esquecida dentro dele; um poder enterrado e esquecido, agora surgindo incontrolavelmente à superfície.
'Oh... Agora eu posso ver...'
Nos últimos seis anos, esse garoto sonhou com esse homem chamado Gilgamesh. Um vilão que destruiu a cidade de Uruk na Grande Babilônia. Um homem que matou centenas de milhares de homens, mulheres e crianças por séculos apenas para ficar mais forte, a tal ponto que todos os magos do mundo conhecido naquela época se uniram para enfrentá-lo de uma só vez. Após sua morte, ele reencarnou várias vezes, mas sempre foi morto por outros magos que rastreavam sua alma e o matavam ali mesmo. Até mesmo quando ele era apenas uma criança. Nunca deixavam ele evoluir de novo.
Seu pulso se move, uma sensação de energia ilimitada crescendo dentro dele. Em um instante, sua visão se embaça com memórias: rituais antigos em templos sombrios, feitiçaria de pura força destrutiva, batalhas onde sua vontade sozinha obliterava exércitos inteiros... Era tudo o que ele sonhava sobre Gilgamesh. O poder o inundava com uma raiva primitiva, não dirigida aos homens diante dele, nem às crianças ao redor. É simplesmente uma fome, uma sede implacável pela destruição.
Um dos homens ri e estende a mão, apontando sua arma para as crianças. Mas, quando seus dedos se aproximaram do gatilho para ameaçar, os olhos de Gilgamesh se tornam afiados. O homem engasga, seu braço dissolvendo-se em uma névoa fina, o sangue espirrando nas crianças ao redor.
"O q-que, porra!" O homem gordo recuou, a confusão e o terror substituindo sua diversão.
Nesse segundo, Gilgamesh se torna algo imparável.
'Nesses breves momentos de despertar... Hehheheheeheheh... Eu posso matar a todos!'
O poder ruge de dentro dele como uma tempestade, despedaçando tudo e todos ao seu redor. Um homem é lançado para trás, seu peito implodindo, as costelas se estilhaçando com um estalo nauseante ao ficar para fora de seu torço. Os outros tentam correr, mas uma força invisível os arrasta para trás, torcendo seus membros em formas grotescas enquanto seus ossos estalam sob a pressão.
Um grito ecoa enquanto uma criança próxima é despedaçada pela força do despertar de Gilgamesh, seu corpo pequeno partido ao meio pela pressão. Outros gritam, tentando se proteger, mas não há escapatória. O container se torna uma câmara de horrores, o metal se curvando e torcendo ao redor deles, o ar pesado com o fedor de sangue e carne queimada.
Membros são arrancados, corpos explodem em chuvas de carne, os gritos das crianças se misturando em uma cacofonia de terror. Os lábios de Gilgamesh se curvaram em um sorriso, embora sua mente esteja quase perdida na onda de poder, uma êxtase sombria inundando-o enquanto o sangue respinga em seu rosto. Ele não renasceu; ele estava livre, sem restrições, uma tempestade de vingança e violência.
Quando o último grito se esvai, Gilgamesh fica quase sozinho em meio à carnificina, o silêncio sendo interrompido pelo som do sangue pingando das paredes e do teto do container. O chão estava coberto de fragmentos de ossos, membros torcidos em ângulos não naturais, corpos caídos em montes, seus olhos arregalados e sem vida podendo apenas expressar o horror. Encharcado de sangue e cercado pelas ruínas causadas pelo seu despertar, Gilgamesh respira o aroma metálico com satisfação. Pela primeira vez em milênios, ele se sente vivo.
Ele riu pensando em alguns aspectos de seu passado. Como aquela visão era satisfatória e como já havia feito isso tantas vezes que se tornara algo banal.
Agora ele podia ver o grande cenário em que estava: Um enorme porto cheio de contêineres, mas agora manchado de sangue. Ainda havia algumas crianças sobreviventes.
"Um massacre... Eu ainda sou foda pra caralho!" De repente, ele ofegou.
Então, sua visão ficou escura. Ele simplesmente caiu no chão, inconsciente.