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Chapter 4 - Capítulo 4: Vozes do Passado

A chuva finalmente começou a cair em Nova York. Grossas gotas tamborilavam contra a janela do consultório, enquanto Dr. Michel permanecia sentado em sua cadeira, olhando para o prontuário de Lorena. Ele sabia que, para muitos, seu trabalho era apenas uma profissão, mas para ele, era algo muito mais profundo, quase uma missão pessoal.

Dr. Michel: (pensando) "Trinta e oito anos. Às vezes parece que vivi mais do que deveria, mas outras vezes, parece que foi muito pouco."

Ele suspirou, repousando os cotovelos na mesa e passando as mãos pelo rosto. Era raro que um paciente mexesse com ele de maneira tão intensa, mas Lorena... havia algo nela que ele não conseguia ignorar.

Dr. Michel: (pensando) "Ela me lembra tanto da Emily..."

O nome, apenas em sua mente, fez com que um aperto surgisse em seu peito. Emily. Sua noiva. Aquela que o havia ensinado o verdadeiro significado de lutar, mas que, ao mesmo tempo, lhe mostrou como o câncer podia ser implacável.

Ele fechou os olhos, permitindo-se voltar no tempo, mesmo que soubesse o quanto isso ainda doía.

Emily era vibrante, cheia de vida e apaixonada por pequenos detalhes. O modo como ela fazia tudo parecer mais bonito, mesmo nos dias mais sombrios, era algo que ele nunca esqueceria. Quando o diagnóstico chegou, ela enfrentou a notícia com coragem, dizendo a ele que o câncer não a definiria.

Dr. Michel: (pensando) "Ela lutou como ninguém. Enfrentou cada sessão de quimioterapia, cada cirurgia, cada revés... Mas o câncer é uma guerra silenciosa. Você luta contra o seu próprio corpo, contra algo que não consegue ver, mas que está ali, consumindo você."

Ele se levantou da cadeira, caminhando até a janela. Observava a chuva que escorria pelo vidro, sentindo o peso das lembranças. Emily havia perdido aquela guerra. Ele estava ao lado dela até o último momento, segurando sua mão enquanto ela dizia que o amava, mesmo quando a dor era insuportável.

Foi depois da morte dela que ele decidiu se especializar em oncologia. Não era uma escolha fácil, mas ele sentia que era a única coisa que fazia sentido.

Dr. Michel: (pensando) "Eu não consegui salvá-la, mas talvez eu possa salvar outras pessoas. Foi o que pensei na época. Mas a verdade é que, desde então, nunca mais fui o mesmo."

Desde a morte de Emily, ele nunca mais se permitiu amar verdadeiramente. Houve mulheres em sua vida, é claro. Encontros casuais, tentativas de recomeçar. Mas nenhuma delas conseguia preencher o vazio que Emily deixara. Ele havia se enterrado no trabalho, dedicando cada minuto de sua vida a salvar outros, como se isso pudesse redimi-lo de alguma forma.

Dr. Michel: (pensando) "Eu sou bom no que faço. Totalmente comprometido. Mas às vezes me pergunto se isso não é só uma desculpa para evitar enfrentar o que realmente sinto."

Ele voltou para a mesa, pegando novamente o prontuário de Lorena. Ela era tão jovem, apenas 24 anos, e tinha uma bebê de apenas seis meses. A forma como ela mencionou Beatriz na consulta o tocou profundamente. Era como se cada palavra dela carregasse um peso enorme, mas também uma esperança quase desesperada.

Dr. Michel: (pensando) "Ela não está lutando apenas por ela. Está lutando pela filha. Isso é algo que nunca vi antes. A maioria das pessoas luta por si mesma, pela própria sobrevivência, mas Lorena... ela luta por amor."

Ele folheou os papéis, analisando os exames que Lorena havia trazido. Algo dentro dele dizia que precisava ter certeza. Precisava de mais detalhes, de mais clareza. Não podia deixar passar nada.

Dr. Michel: (pensando) "Talvez eu consiga dar a ela a chance que não consegui dar para Emily. Talvez, desta vez, eu possa fazer algo diferente."

O pensamento trouxe um calor inesperado ao seu peito, algo que ele não sentia há anos. Não era apenas uma obrigação profissional. Havia algo mais.

Ele se lembrou do olhar de Lorena, da maneira como seus olhos brilhavam mesmo quando estavam marejados de lágrimas. Ela não era apenas uma paciente. Ela era uma mulher que carregava o peso do mundo nos ombros e, ainda assim, se recusava a desistir.

Dr. Michel: (pensando) "Ela tem uma força que me surpreende. E aquela menininha... Beatriz. Tão pequena, tão inocente. Eu nunca quis ter filhos, mas, de alguma forma, só de ouvir Lorena falar dela, sinto que faria qualquer coisa para garantir que essa criança tenha sua mãe ao lado."

Ele colocou o prontuário de lado, decidindo que faria tudo o que estivesse ao seu alcance para ajudar Lorena. Ela merecia essa chance. Beatriz merecia essa chance.

Enquanto a chuva continuava a cair lá fora, Dr. Michel percebeu algo que não admitiria em voz alta, pelo menos não ainda. Ele não estava apenas tentando salvar Lorena. De alguma forma, ajudar aquela jovem mãe era uma maneira de se salvar também.