**Capítulo 1: O Encontro nas Sombras**
Clara estava em seu lugar habitual, no canto mais silencioso do Café da Lúcia, um refúgio que a cidade, sempre agitada, parecia ter esquecido. A chuva batia suavemente nas janelas, criando um ritmo constante que fazia o ambiente parecer mais íntimo e acolhedor. Ela tinha o hábito de se perder nas palavras de seus livros, ou nas próprias histórias que tentava escrever, mas aquele dia estava diferente. A página em branco diante dela parecia um desafio impossível de vencer, e o café esfriava lentamente enquanto ela fitava o vazio.
Foi quando ele entrou. Theo.
Ele parecia ter saído de uma dessas fotos antigas que ela tanto adorava. O casaco escuro, os cabelos bagunçados, e os olhos, ah, aqueles olhos. Profundos, como se guardassem histórias e segredos que ele não sabia, ou não queria, contar. Ele olhou rapidamente para o ambiente, como se procurasse algo, ou talvez alguém. O olhar cruzou com o de Clara por um breve segundo, mas foi o suficiente para fazer seu coração acelerar sem explicação.
Theo pediu um café, o mais simples, sem açúcar, e se dirigiu à mesa mais próxima. Não era a primeira vez que ela via pessoas entrarem e saírem do café, mas havia algo nele que capturava sua atenção de maneira diferente. Ele parecia fora do lugar, mas, ao mesmo tempo, profundamente familiar.
Clara tentou ignorar a sensação crescente de curiosidade, mas não conseguiu. Algo nela, talvez uma parte do coração que ela nem sabia que existia, começava a se abrir lentamente, como uma flor que hesita antes de desabrochar.
Foi então que, como se tivesse lido seus pensamentos, Theo se levantou e, sem hesitar, caminhou até sua mesa.
— Posso me sentar? — A voz dele era suave, mas firme, como se estivesse acostumado a fazer perguntas difíceis.
Clara olhou para cima, surpresa, mas logo o convidou com um sorriso tímido. Ele sentou-se de frente para ela, e a conversa começou naturalmente, como se fosse o próximo passo inevitável. Falaram sobre o tempo, sobre a cidade, sobre a chuva que fazia as pessoas se esconderem, mas logo a conversa tomou outro rumo. Theo revelou ser fotógrafo, alguém que via o mundo através das lentes, capturando a beleza nas coisas mais simples, mas também nas mais obscuras.
Clara sentiu um calafrio. Algo na maneira como ele falava sobre o que via através da câmera lhe fazia pensar que ele também via algo além do físico, algo que estava escondido nas sombras, tal como ela.
— E você? — Theo perguntou, os olhos fixos nela com uma curiosidade palpável. — O que você vê?
Clara hesitou. Ela não estava acostumada a falar sobre si mesma, muito menos sobre suas histórias, suas inseguranças e medos. Mas naquele momento, algo a fazia querer confiar naquele estranho que agora parecia tão familiar.
— Eu vejo... eu vejo histórias, acho. — Ela sorriu de leve, como se estivesse desvendando um segredo. — Histórias que precisam ser contadas, mas às vezes eu não sei como.
Theo a observava atentamente, como se a analisasse de uma maneira que ninguém jamais fizera antes. Ele parecia perceber mais do que ela estava disposta a mostrar.
— Eu entendo. — Ele disse, com uma leveza que a surpreendeu. — Às vezes, as histórias só precisam de um empurrão. E quem sabe, talvez você encontre o seu caminho por aqui.
Clara não sabia o que responder. Algo no jeito dele, na tranquilidade e na confiança que transparecia, a fazia sentir-se vista, compreendida. Mas, ao mesmo tempo, havia uma tensão no ar, algo que ela não conseguia identificar, uma sensação de que ele estava escondendo algo. Algo que não se podia ver com os olhos, mas apenas sentir.
O tempo passou mais rápido do que ela imaginava, e antes que pudesse perceber, a tarde já estava se despedindo. O café começava a esvaziar, e Theo se levantou para ir.
— Eu... — Clara começou, sem saber o que dizer, mas ele a interrompeu com um sorriso.
— Nos vemos em breve. — Ele disse com um brilho enigmático nos olhos. — Às vezes, as coisas boas acontecem quando menos esperamos.
Ele se afastou, deixando Clara com um misto de sensações. Ela não sabia o que exatamente havia acontecido ali, mas algo em seu interior havia mudado, e o vazio que antes preenchia sua vida começava a ser substituído por uma curiosidade que ela não conseguia controlar.
Naquele momento, Clara soube que sua história estava apenas começando.