A biblioteca do campus era quase sagrada para Jiho. O cheiro de papel envelhecido, o murmúrio distante de páginas sendo viradas e a luz suave filtrada pelas cortinas eram como um refúgio do caos do mundo exterior. Ele se sentava na mesma mesa, no canto mais afastado, onde podia observar sem ser observado. Ali, ele era apenas mais um rosto entre os estudantes imersos em seus estudos, invisível e intocável.
Naquele dia, Jiho estava perdido em um livro clássico de contos coreanos. Seus dedos deslizavam pelas páginas enquanto ele rabiscava anotações em um caderno. Ele adorava a complexidade das histórias antigas, as camadas de significados ocultos. Era um contraste gritante com sua própria vida, que ele julgava simples e sem graça. Contudo, para ele, essa simplicidade era um conforto. A previsibilidade o protegia do inesperado, do desconforto de interações sociais.
Ele ajustou os óculos enquanto escrevia, tentando ignorar o zumbido de uma notificação em seu celular. Era do grupo da disciplina de Literatura Clássica. Ele desbloqueou o aparelho, lendo com atenção a mensagem que acabara de chegar.
[Professora Park]: Alunos, o trabalho interdisciplinar foi definido. Vocês irão adaptar um conto clássico em uma peça teatral. Grupos serão formados aleatoriamente. Por favor, verifiquem suas equipes no portal acadêmico.
Jiho sentiu um calafrio. Trabalhos em grupo eram um pesadelo. Ele preferia mil vezes escrever um ensaio sozinho do que lidar com o desconforto de se expor para estranhos. Com um suspiro resignado, ele acessou o portal acadêmico.
Grupo 4: Kim Jiho, Yoo Seungmin, Han Junwoo.
Seu coração deu um leve salto ao ler os nomes. Jiho não conhecia Junwoo, mas o nome Yoo Seungmin era inconfundível. Ele já tinha ouvido falar do carismático estudante de Teatro que parecia estar sempre no centro das atenções. O contraste entre eles era tão evidente que Jiho já sentia o peso da ansiedade se acumular.
Enquanto Jiho processava a mensagem em silêncio, do outro lado do campus, Seungmin estava em meio ao caos usual da sala de ensaios. Ele vestia um figurino improvisado — um manto rasgado e um chapéu que mal se equilibrava em sua cabeça.
— Seungmin, pelo amor de Deus, leva isso a sério! — reclamou Taehyun, observando o amigo com um misto de exasperação e diversão.
— Levar a sério? Tae, o teatro é para nos libertar, não para nos prender! — Seungmin respondeu com um sorriso brilhante, girando dramaticamente como se estivesse no palco de um grande espetáculo.
Taehyun revirou os olhos, mas não conseguiu evitar um pequeno sorriso. Ele conhecia Seungmin há tempo suficiente para saber que o amigo usava seu humor exagerado como uma máscara. Seungmin era o tipo de pessoa que iluminava uma sala inteira, mas raramente deixava alguém enxergar o que se escondia por trás do brilho.
A notificação da professora interrompeu o momento. Seungmin parou de brincar e desbloqueou o celular, lendo a mensagem com uma expressão de leve desgosto.
— Um trabalho interdisciplinar... maravilhoso. Nada como ser obrigado a trabalhar com pessoas que você nunca viu antes.
— Talvez seja bom para você. Quem sabe você aprende a lidar com gente que não adora o chão que você pisa? — provocou Taehyun.
Seungmin ignorou o comentário e acessou o portal. Ao ver os nomes do grupo, ele levantou uma sobrancelha.
— Jiho... Acho que já vi esse nome antes. Ele não é aquele garoto da biblioteca? O quieto?
Taehyun deu de ombros. — Não sei como você consegue lembrar de nomes aleatórios.
— Ah, eu tenho uma memória excelente para coisas importantes — brincou Seungmin, piscando. — Mas também tem o Junwoo no grupo. Isso vai ser... interessante.
—————
No dia seguinte, Jiho chegou à sala de estudos da biblioteca cedo demais. Ele queria se preparar, organizar seus pensamentos e evitar qualquer situação embaraçosa. Ele colocou seus materiais sobre a mesa e começou a revisar o conto que seria adaptado. Seu foco era absoluto, mas sua mente não conseguia afastar a ansiedade da iminente interação com os outros membros do grupo.
Quando o relógio marcou a hora combinada, passos apressados e um riso alto quebraram o silêncio. Jiho levantou os olhos e viu um jovem alto com um sorriso radiante entrar na sala. Era Yoo Seungmin.
— Você é o Jiho, certo? — perguntou Seungmin, aproximando-se da mesa sem cerimônia.
Jiho assentiu, ajeitando os óculos. — Sim. E você é... Seungmin?
— Em carne e osso! — Seungmin jogou a mochila sobre a cadeira e se sentou com um movimento despreocupado. — Então, você gosta de livros, certo? Parece que vamos nos dar bem.
Jiho não respondeu imediatamente. A energia de Seungmin era avassaladora, e ele não sabia como reagir.
Antes que a conversa pudesse se aprofundar, a porta se abriu novamente, revelando Junwoo. Ele entrou com uma postura confiante, seus olhos avaliando os dois já sentados.
— Parece que temos um grupo interessante aqui, não? — disse Junwoo, puxando uma cadeira e sentando-se com elegância.
Seungmin lançou um olhar de soslaio para Junwoo, reconhecendo a familiaridade tensa entre eles. — Interessante é uma palavra... adequada.
Junwoo sorriu, mas o sorriso não alcançou os olhos. — Estou curioso para ver como isso vai funcionar. Um amante dos livros, um ator e... bem, eu.
Jiho sentiu o peso da dinâmica que já começava a se formar. Ele não era fã de conflitos, mas parecia que as próximas semanas seriam tudo menos tranquilas.
—————
Os primeiros minutos foram marcados por silêncios desconfortáveis e trocas de olhares avaliadores. Seungmin tentou quebrar o gelo com piadas, mas Junwoo parecia mais interessado em analisar as fraquezas do grupo.
— Então, Jiho, você já pensou em como podemos transformar esse conto em algo teatral? — perguntou Junwoo, sua voz carregada de uma formalidade que deixava Jiho ainda mais nervoso.
— Eu... ainda estou pensando — respondeu Jiho, tentando evitar o olhar direto de Junwoo.
Seungmin interveio, percebendo o desconforto de Jiho. — Ei, calma aí, Junwoo. Estamos aqui para discutir juntos. Que tal começarmos com ideias gerais em vez de pressionar o Jiho?
Junwoo levantou uma sobrancelha. — Não estou pressionando. Só acho que é importante termos uma direção clara desde o início.
— Certo, mas talvez possamos fazer isso sem parecer uma entrevista de emprego — rebateu Seungmin, mantendo o tom leve, mas firme.
Jiho olhou para Seungmin, surpreso com a intervenção. Era estranho, mas ele se sentiu um pouco mais à vontade.
A reunião continuou, com ideias sendo jogadas na mesa e momentos de tensão entre Seungmin e Junwoo. Jiho, embora tímido, conseguiu contribuir com algumas sugestões que, para sua surpresa, foram bem recebidas por Seungmin.
Quando a reunião terminou, Jiho guardou seus materiais em silêncio, enquanto Seungmin se inclinava contra a mesa, observando-o com curiosidade.
— Você é bem quieto, não é? — comentou Seungmin.
Jiho parou por um momento, sem saber o que responder. — Eu... prefiro ouvir.
Seungmin sorriu. — Talvez isso seja uma boa coisa. Eu falo demais, então você pode me equilibrar.
Jiho sentiu o rosto esquentar, mas não respondeu. Ele não estava acostumado a pessoas como Seungmin, mas havia algo nele que era intrigante... e um pouco assustador.